Capítulo VIII

   O céu estava acinzentado, o vento gélido tocava as árvores escuras daquela floresta assustadora, a lua não era visível, muito menos o pôr do sol, estava tudo em tons mortos. O cheiro da mata adentrou as narinas de Dalila. A mesma corria, suas pernas estavam cortadas por cacos de vidro, seus pulmões pegavam fogo, a dor que sentia era imensa, não maior que sua vontade de sobreviver.

   A cada passo que dava, sentia como se facas entrassem em seu corpo, mas não podia parar, sabia que estava indo em busca de socorro e só assim poderia vingar a morte de tantas pessoas. Conforme se passavam os segundos, a temperatura caia e o vestido dela não podia a aquecer, todavia esse não era seu pior desconforto, mas sim os cacos de vidro e a sensação de que iria ter um ataque cardíaco a qualquer segundo.

  Olhava em vigia para trás com medo de que estivesse sendo seguida, entretanto, não havia nada e nem ninguém. Parou de correr quando sentiu um espinho adentrar seu calcanhar, foi ao chão. Resmungou em sinal de dor. Já apoiada na terra, retirou com cuidado os cacos de vidro e o espinho que a furava. Respirou fundo e sentiu uma pressão enorme a esmagar.

   Por alguns minutos, quase cinco, Dalila ficou sentada e logo em seguida se deitou, seu corpo estava se recuperando da corrida de mais ou menos vinte minutos, não que ela não fosse acostumada a fugas extensas. E assim que seu coração se acalmou, pode perceber fatos estranhos ao seu redor. Não havia sons de animais, nem sequer um grilo, aliás, nem um mísero inseto ela viu durante sua escapatória. Além de que a paisagem era esquisita para tal lugar, árvores tão imensas e escuras, que mais pareciam da floresta negra na Alemanha, sabia disso por ter visto um documentário sobre tal. Por alguns segundos cogitou a possibilidade de não estar mais em Nova Orleans.

   Sentou-se e sentiu seu corpo se arrepiar, estava anoitecendo e ela não queria ficar naquele lugar extremamente bizarro sozinha, ainda mais sem saber se estava fora de perigo ou não. Se levantou e passou a seguir em frente, ainda desconfiada por não haver sons, apenas do vento tocando as árvores e de sua respiração.

   O chão estava coberto por folhas secas e raízes. Juntou suas mãos ao entorno dos braços, afim de se esquentar. Respirou fundo, sentindo arder seus ferimentos. Seus dentes batiam freneticamente um ao outro, suas pernas bambearam e ela percebeu estar com febre, provavelmente precisava de um médico para cuidar de seus ferimentos.

   Em sua visão semi emaranhada, conseguiu ver algo brilhante não muito distante. Se apegou na possiblidade de ser uma estrada. Caminhou até lá, seus olhos se encheram de água na tentativa de se manter fixada na mesma. A cada passo, uma nova esperança. De longe, conseguiu ouvir algo estranho, um pedido de socorro. Bateu seus punhos contra os ouvidos — Não, de novo não — pensou. Seu corpo se arrepiou após um vento estranho passar por seu corpo, teve um medo irracional.

   Continuou caminhando, a luz fraca ficava mais perto. Ela estava se sentindo cada vez mais fraca, ao ponto de quase se rastejar até lá. Finalmente conseguiu chegar ao final. Era uma estrada asfaltada, com uma luz forte em cima do poste e não muito longe dali, um casebre feito de madeira rústica. Sorriu e suspirou um tanto aliviada. Em passos quase arrastados, sentiu pequenas pedrinhas perfurando seu calcanhar, não doeu, apenas incomodou.

   Viu que um raio clareou a estrada ainda mais, sentiu uma gota de chuva tocar seu corpo febril, a fazendo tremer um pouco. Não fazia idéia de que horas eram, mas estava mais escuro do que quando saiu. Não havia movimentação, imaginou que fosse por isso o local escolhido pelos assassinos. Atravessou aquela estrada e se pôs para perto da casa. Não era cercada. Estava em frente a mesma. Olhou pela última vez para trás, engoliu seco. Seus punhos tocaram a porta de madeira. Fez esforço para não cair. Ouviu passos em aglomeração de dentro. Aos poucos a porta foi se abrindo.

— Boa noite, quem é você? — uma mulher e um homem, ambos adultos, com olhar de desconfiança, mas que ao mesmo tempo fez um enorme sorriso surgir no rosto da vítima.

— Socorro... — suas pernas perderam a fixação e a menina se foi ao chão em questão de segundos.

  Desesperados, pegaram ela e cuidadosamente foi colocada em cima do sofá da sala. A mulher, de cabelos castanhos, olhos verdes e pele branca, tocou a testa de Dalila, arregalou os olhos ao sentir sua temperatura elevada.

— Ela está queimando em febre — virou para seu marido. Ele a olhou de forma suspeita.

— Vá preparar uma água morna pra dar um banho nela, essa menina está fedendo — fez uma cara de nojo — fedendo a sangue.

— Ela deve ter se machucado no meio da mata — Dalila estava pousada na sofá. Seus olhos estava fechados e sua respiração ofegante, além de estar empadada de suor e com as pernas sujas de sangue.

  A mulher saiu em busca de água para mornar. Enquanto a menina respirava com dificuldade. O homem, de aproximadamente trinta anos, cabelo preto e barbado, se aproximou. Ele sorriu ao vê-la. Ela estava inconsciente, senão era provável que sairia correndo, por já ter visto aquele olhar outras vezes, viu do tio, sujeito que já tentará se aproveitar dela antes de Lisa. Bem... depois Lisa...

— Você está segura aqui — ele tocou a cabeça loira da latina.

   Tossiu, ainda de olhos fechados.

— Eu vou cuidar muito bem de você — ele se afastou, a deixando sozinha.

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   Do lado de fora o som de trovões e pingos de chuva tocando o telhado. Sentiu um toque por seu rosto, lentamente abriu seus olhos. Ele estava lá.

— Xi, volte a dormir...

— Não... — a voz de Dalila saiu como um sopro.

  O dono da casa estava desnudo, quase se jogando a favor dela. Estava imóvel, ele aos poucos passou a remover a coberta que tampava seu corpo febril. Seu coração estava acelerado e seus olhos transmitiam puro pânico. Lembrou-se de quando era criança, seu coração acelerou ainda mais. Ela quis gritar, mas seus pulmões doíam. Aos poucos o fazendeiro foi retirando sua roupa. Seus mãos foram de encontro ao peito dele, tentando o empurrar, inutilmente. Olhou de relance para a enorme janela de vidro e viu uma figura de homem parada olhando o interior da residência, seu coração gelou, sentiu seu corpo se arrepiar.

— O que foi? — o homem indagou enquanto retirava a peça superior de sua roupa.

   De repente alguém bateu na porta de madeira, neste momento o coração do homem acelerou. Já era madrugada, ele estava um pouco assustado com o que poderia ser, ou quem. Foi até uma escrivaninha que ficava no canto da sala, lentamente abriu a gaveta, retirou de lá uma arma. Andou até a porta.

— Quem está ai? — falou desconfiado.

  Não obteve resposta, apenas outra batida na madeira, três toques. Lembrou que costumava fazer isso quando criança, era o toque para entrar na sociedade que ele e seus amigos haviam criado.

— Quem está ai?! — repetiu novamente.

  Um trovão o fez saltar, mas ainda sem resposta. Ouviu o ranger das escadas, virou-se com rapidez e viu sua esposa.

— Querido? Quem está ai?

   Dalila ainda estava deitada no sofá, semi nua, assustada, as lágrimas escorriam por seu rosto. — aquilo só poderia ser um pesadelo — fechou seus olhos bem fortes. O fazendeiro viu a maçaneta girar. Deu um passo para trás. O mais estranho foi ver que a porta estava se abrindo, mesmo trancada.

   Ele mirou seu revólver e ficou preparado para atirar.

— Oi, preciso de Aju... — o homem que estava do lado de fora deu um passo para trás e levantou os braços em sinal de rendição.

— Por Deus, quem é você? — a mulher arregalou os olhos.

— Quem é você? O que está fazendo aqui?

— Me chamo Bálder, meu carro quebrou, preciso de ajuda.

   Ao ouvir esse nome, Dalila sentiu um choque por todo seu corpo. Ele estava todo molhado, seu cabelo escorria por seu rosto, ele estava com uma camisa social branca, colada ao corpo.

— Por que não me respondeu?

— Com o barulho dos trovões eu não consegui te ouvir, peço perdão.

— Não... — a voz de Dalila saiu como um suspiro.

— Não posso te ajudar, vá embora.

— Não gostei do seu tom — o homem foi se aproximando.

— Se afaste, ou eu atiro! — engatilhou a arma.

  Bálder gargalhou e continuo andando na direção do homem.

— Eu avisei — atirou contra o homem, que deu um passo para trás. Outro e mais outro, foram três disparos ao todo. Bálder foi ao chão como papel. — Matar em legítima defesa, não é crime.

  Dalila sentiu um pequeno alívio e um desespero ao mesmo tempo angústia, pois sabia que o homem a molestaria. De repente, ele pôs suas mãos no chão, todos olharam para Bálder.

— Não pode matar o demônio — Bálder sorriu e se levantou. Sua camisa branca estava toda suja de sangue.

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