Capítulo 30
— Bela, à noite podemos sair, fale com seus amigos. — Me deu um beijo enquanto colocou Tiana em cima de mim, me acordando de supetão. — Preciso trabalhar. — Saiu batendo a porta, aumentando a minha dor de cabeça, sendo que Tiana se encontra agitada em minhas pernas.
— Ótimo, não poderia ter uma manhã melhor. — Levantei-me calmamente indo em direção ao banheiro para fazer a minha higiene e a de Tiana.
Enquanto me arrumo com a ajuda de Helena que alguns minutos depois chegou ao quarto, aproveito o pouco tempo de folga e ligo para Lúcia.
— Você pode sair hoje à noite? Já que é sábado — indaguei já sabendo a sua resposta.
— Claro, vou falar com Cam. — Desligou, ainda me dando o tempo de ouvir algo quebrando e um som de alguma criança chorando.
Tendo isso em vista, pedagogia é com certeza a graduação que jamais escolheria.
Aproveitei o pouco descanso, e procurei o melhor restaurante ao ar livre da cidade, ótima oportunidade, utilizando o Google Maps. Pelo que me lembro, quando Philip veio aqui pela primeira vez ele falou de um restaurante muito tranquilo e famoso para casais, então, esse será perfeito. Fiz a reserva no nome de Ryan, e eles encaminharam para a sua secretária, então, assim que ela fizer a confirmação irei receber uma mensagem.
Enquanto aguardo passo a manhã toda com as pernas pro ar, tendo uma Tiana sempre do meu lado. Aproveito a oportunidade e ando em direção a biblioteca da casa, enquanto tento encontrar a porta correta. Em meio aos corredores escuros do primeiro andar, sem querer adentro uma sala de jogos, onde encontro Alexandre jogando um de seus games. Ele está tão entretido que nem percebeu a minha presença, já que deixei Tiana com Helena para não atrapalhar a minha eminente leitura.
— Por que você está aí parada olhando para o ar? — Continuou jogando.
— Você percebeu? — perguntei confusa, já que pensei que ele não tinha notado.
— Como não teria visto, já que você fez questão de bater todas as portas do corredor. — Continuou sem me encarar.
Não dei importância a sua indagação e decidi voltar a procura da bendita biblioteca, mas antes que me retirasse ouvi a sua voz.
— Você pretende ficar? — O seu tom saiu calmo, muito diferente da sua voz energética, totalmente diferente do tom passivo de Anthony e dá voz média em um tom de escárnio de Tomas.
— Ficar aqui? — Me virei ainda um pouco confusa.
— Não, com a gente. Não me lembro muito da mamãe, mesmo que só faça dois anos que ela morreu, bom, na verdade sei que quanto mais o tempo passar não me recordarei dela. — Olhou para o chão.
Suspirei, não sou feita para ser terapeuta de criança. Acalmei meus instintos e andei calmamente me sentando ao seu lado, já que ele se encontra em um puff.
— Mesmo que você não tenha lembranças dela, ela sempre vai estar aqui. — Apontei para o seu coração e ele olhou para mim. — Também não me recordo da minha mãe.
— Sua mãe também morreu? — perguntou demonstrando curiosidade.
— Uma sim, mas a outra não sei. Fui adotada quando tinha 8 anos, não tenho lembranças da minha mãe biológica, mas nunca deixei de pensar nela, entende? Sei que ela me deu para adoção pensando no meu bem, e agradeço a ela por isso, senão não teria conhecido a mulher que me ensinou tanto. — Sem perceber expressei os sentimentos que escondi durante anos.
— Não sabia que você tinha sentimentos. — Colocou a mão na boca percebendo a besteira que ele falou. — Desculpa Bela, não quis dar uma de Tomas.
— Você pode não perceber, porque sou uma ótima atriz, mas ainda sou humana. — Ri com o seu comentário.
— Obrigado, só não quero que você vá embora, a casa se tornou mais engraçada com você aqui, e Tomas também se tornou mais feliz. — Me abraçou depois de terminar a sua fala, me pegando de surpresa pela sua demonstração de afeto.
Fiquei sem palavras, mas resolvi retribuir,afinal de contas, não vou deixar de ser a Bela por causa de um abraço. Como nãotinha nada para fazer, resolvi ficar o restante da manhã com ele, um tempodepois Helena deixou Tiana comigo para terminar os seus afazeres.
Finalmente já é noite, agora me encontro perfeitamente arrumada, com um vestido sirena que destaca as minhas curvas, sendo realçada por um tecido azul-claro, combinando com o pingente prata no meu pescoço, já que não estou com brincos. Calcei um scarpin branco e usei uma fita da mesma cor para amarrar meu cabelo em um rabo de cavalo com fios cacheados descendo por todo o penteando.
Encaro o meu reflexo no espelho, optei por pouca maquiagem evidenciando os meus traços asiáticos, apenas para trazer uma harmonia no rosto utilizei um batom nude.
Quando já estou pronta, Ryan sai do closet devidamente arrumado, com uma blusa social rosa e uma calça na mesma pegada preta, todos do conjunto Armani, seu favorito. Enquanto ele coloca seu cinto, me encara.
— Perdeu alguma coisa aqui? — Essa é minha resposta perante o seu olhar.
Ele apenas ri e vai em direção ao banheiro.
Quando deu 19h saímos, nos despedimos das crianças que estão na sala de jogos brincando e seguimos o nosso caminho. Durante o trajeto não comentamos nada, apenas fomos acalentados pelo silêncio majestoso da noite.
Quando entramos no salão, a recepcionista veio nos atender, nos direcionando a mesa reservada onde se encontram Lúcia e seu namorado Cam, que coincidentemente é o mesmo homem que vi em uma noite conversando com Dona Linda devidamente fardado com o uniforme do exército.
Agora próximos, pude contemplar o seu perfil, sendo salientado pela luz clara do local, seus olhos mel ainda estão mais claros pela iluminação do lugar combinando perfeitamente com a sua pele morena, o seu porte é forte e contido, com seu cabelo bem cortado a nuca. Resumindo, tenho que admitir, ele e Lúcia combinam plenamente.
Quando chegamos ao local ele me cumprimenta com um sorriso e Ryan com um aperto de mão. Nos acomodamos, e o silêncio é quebrado por Lúcia.
— Bela você fez uma ótima escolha, amo lugares com mesas ao ar livre, ainda mais tendo um belo jardim para apreciarmos à vista — comentou parecendo realmente feliz. — Esqueci de apresentar. Esse é Cam Achie, ele é Major do exército nacional.
— Ah! Sim, senão me engano, me encontrei com você em uma noite — pronunciei.
— Sim, tinha acabado de voltar do quartel, então, resolvi visitar Lúcia — respondeu normalmente.
— Esse é Ryan... — Fui cortada.
— Sou o noivo dela, é bom conhecer os amigos da Bela. — Claro que ele teria que comentar essa palavra.
O jantar foi normal, apenas conversei com Lúcia sobre futilidades, enquanto Ryan e Cam se entreteram nos mais variados assuntos, pareciam duas mulheres.
Agora estou aqui no carro achando que vou voltar para casa, mas estamos pegando um caminho totalmente diferente.
— Para onde vamos? Vai dar 22h. — Categorizei a hora, afirmando o tempo tardio.
— É uma surpresa. — Apenas continuou olhando para a estrada sem me encarar.
E lá vamos nós, o que mais falta acontecer? Para a minha surpresa, estamos em frente a uma reserva da cidade.
— Você pretende me matar e esconder o meu corpo nessa mata? — Perguntei quando ele saiu do carro com uma pequena cesta em mãos.
— Não, vamos fazer um piquenique a luz da lua. — Pegou minha mão me direcionando para adentrar um pouco a reserva.
— Você já não comeu demais? Vamos embora, não vejo necessidade para isso. — Tentei desviar o caminho.
— Não corte o clima. — Continuou a caminhar.
— Qual clima? Só se for o frio e a chuva iminente. — Minha voz soou rasgada em desacordo.
Quando finalmente chegamos no ponto que ele queria, nos sentamos em um pano que ele estendeu no chão. Contemplei a lua cheia que estranhamente se encontra iluminada até por demais para uma cidade grande.
— Quando minha esposa morreu, tinha o costume de vir aqui com as crianças para eles não se sentirem sozinhos, comentava que a mãe deles era uma dessas estrelas e ela sempre estaria olhando para nós. — Encarou o céu.
— Sabia que é feio mentir para as crianças? — Ele riu e me encarou, tendo seus olhos verdes em uma tonalidade totalmente diferente.
— O que você faria se eu mentisse para você? — Tenho certeza de que vi algo diferente no seu semblante.
— Te matava. — Ri um pouco.
— É sério. — Seu rosto escureceu.
— Fugiria, é o que sei fazer de melhor. — Coloquei minha mão na sua, e me aproximei dele. — Mas tenho certeza de que você não fará isso, pois já sabe que me perderia para sempre. — Assim que acabo de falar sinto seus braços me envolverem.
— Não é simplesmente como se eu quisesse te enganar, é que tem vezes que a vida nos traz opções sem nos conceder a chance de recusa. — Senti o seu aperto se tornar mais forte.
— Você quer me dizer alguma coisa? — perguntei ainda em seus braços.
— Não, apenas não quero que você desista de mim. — Me beijou.
O encarei ainda contrariada, estranhando esse diálogo todo "pra lá de esquisito", mas relevei, afinal de contos não posso desconfiar de tudo ao meu redor pelo resto da vida. Tendo em vista que fiz isso por bastante tempo, desde a traição de Sebastian sendo mais precisa. É realmente impressionante como algumas coisas podem marcar as nossas vidas de maneiras tão diferentes, que chega ao extraordinário, seja para um bem ou mal. Depois disso não falamos mais nada, apenas dormimos perante as estrelas. Algo que gostei muito de fazer.
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