Capítulo 20
Deixei aquelas três malucas lá e entrei no carro, que para a minha surpresa se encontra cheio de crianças, até um bebê. Quem leva uma criança de dois anos para um jantar sem uma babá? Ops, esqueci, a babá sou eu, perfeito.
Como sou uma gênia, quis dar uma de inocente perguntando, quem ficará com essa criança? Que no momento se encontra no colo de Tomas.
— Não sabia que Tiana viria, com quem ela ficará no jantar? — Dei uma de desentendida, devido ao meu atraso gerando umas crianças nada contentes, algo que não tinha percebido até o momento.
— Não vamos para o jantar agora, tem o casamento da minha tia primeiro — disse o senhor intromissão na conversa dos outros.
— Casamento? Pensei que fosse... — Olhei para o meu patrão. — O senhor não me disso sobre o casamento. — Indaguei insatisfeita por ser feita de idiota.
— Você iria de qualquer forma, só não achei importante, — falou sem dar importância — então, já que você quer tanto saber, será o casamento da minha irmã mais nova Sicília, a minha intenção foi não criar alarde sobre o acontecimento, impedindo a fuga da senhorita — comentou como se não fosse nada.
Não acredito nisso, como ele foi capaz? Vocês devem estar pensando, é só um casamento? Todavia, não é apenas um matrimônio, já imaginou se alguém do meu passado aparecer? Nessas festas de rico todo mundo se conhece. Acalme-se, isso não vai acontecer. Imagina, é uma chance em um milhão disso se concretizar, mas como a minha sorte é grande, já tenho a certeza. Então, tenho que ficar alerta a qualquer sinal de perigo.
Não comentei mais, apenas encostei a minha cabeça no vidro do carro e fechei os olhos, me desejando sorte, pois hoje é o meu dia. Por quê? Simples, Tiana está dormindo e se tudo der certo ela vai dormir à noite toda. Mas como a minha boca é grande, assim que acabo de pensar a bicha acorda, logo, quando ela me enxerga estende os bracinhos na minha direção.
— Vire ela para lá, não posso amassar o vestido — falei para Tomas que já está querendo se livrar da irmã, enquanto sou observada pelo canto do olho do senhor Martilhe.
Peguei a menina, porque está tem pretensão em chorar. A sentei no meu colo e continuei olhando a rua. Após um tempo ela começou a brincar com os fios do meu cabelo e apertando o meu rosto.
— Chega mocinha, vai estragar a minha maquiagem e não estou no clima para aparecer na festa parecendo uma palhaça de circo.
— Como se já não fosse cotidianamente — sussurrou Tomas.
— Quem vai ser o palhaço de circo aqui será você, senão calar a boca. — Abaixei o tom também.
Ele virou o rosto para a sua janela, por qual motivo esse menino não é quietinho igual os irmãos?
— Chegamos — disse o senhor Martilhe estacionando o carro.
Finalmente, a inquietação perfurante já estava me atingindo.
— Lembrem-se da conversa de mais cedo — falou encarando os filhos com um olhar que até me deu medo.
Parece que hoje os diabinhos viraram anjos, senão o coro come.
— Alguém pode me ajudar a descer? — perguntei, pois estou tendo dificuldade para sair do enorme carro, por causa do vestido e uma criança atormentando o meu juízo.
O senhor Martilhe pegou a minha mão e me ajudou a sair, logo após passou uma mão ao redor de minha cintura e me guiou até a entrada.
— O senhor está muito perto, até os seus filhos estão olhando, imagina as outras pessoas — cochichei sorrateiramente.
— Aprenda algo sobre mim, não dou a mínima para o pensamento alheio — sussurrou provocando arrepios no meu cangote.
Apenas dei um sorriso sem graça para as crianças entenderem que não estou concordando, e quando falo crianças, falo do Tomas.
Entramos em um prédio luxuoso com uma fachada dourada como se estivesse saído de algum filme de Hollywood, com muitas luzes, com elegância. O local está cercado de cadeiras e um altar onde a cerimônia será celebrada. Já tem muita gente no lugar, fazendo com que chamemos muita atenção ao entrar.
Assim que adentramos, um homem vem nos cumprimentar. Ele parece ter 40 anos e é muito parecido com o gostosão me agarrando... quer dizer.... ele se parece muito com o senhor Martilhe na versão mais velha. Com uma pele bronzeada, olhos verdes, cabelo escuro, alto, aparentando ter mais de 1,80 de altura e um porte forte.
— Pensei que nunca mais apareceria. Mamãe está com saudade, cara, não é certo sumir do seio familiar logo após o nascimento da filha. — comentou o homem se posicionando na frente do senhor Martilhe.
— Nem bem cheguei, e já tenho que ouvir sermão. — Revirou os olhos.
— Tudo bem, hoje você escapa. — Desdenhou, como se não estivesse afetado.
Parece que não sou a única que tenho problemas de relacionamento.
— E a dama quem é? — Dirigiu a sua atenção a mim.
— Essa é Bela. — Colocou a mão na minha cintura sugestivamente. — Esse é meu irmão idoso com personalidade de garanhão. — Expressou um sorriso sugestivo.
Quem ele pensa que é para colocar o braço em minha volta? Era só o que me faltava.
— Um belo nome, para uma bela mulher. — Seu irmão beijou a minha mão em um gesto galante, enquanto Tiana balançava a mão freneticamente para ele.
— Você já teve cantadas melhores, parece que o casamento te enferrujou.
— Nem me fale, aquela pantera é fogo — confabulou em devaneios.
Não acredito que ele está conversando com o irmão abertamente na minha frente, isso não pode ser realidade.
Cocei a garganta para eles lembrarem da minha presença e das crianças.
— Vamos nos sentar, Sicília deve estar chegando — proferiu o irmão de Ryan dirigindo-nos para outro canto.
— Se ela é atrasada por vida, imagina para o próprio casamento. — Os dois começaram a conversar sobre a irmã.
Enquanto isso, comecei a observar o local com Tiana ainda em meus braços. O lugar possuí uma arquitetura moderna, aparentando grandes salões de festas, em uma tonalidade clara característica. O ambiente é decorado com jarros de flores e plantas silvestres, trazendo um toque natural a decoração chique do lugar, que aparentemente tem como tema: luxo na selva, uma visão bem contraditória posso assim dizer. Enquanto estou analisando cada apanhado do lugar, Mark e Ryan engatam uma discursão sem importância, com vários pitacos sobre as suas aparentes vidas.
— Fiquei sabendo que o senhor Mark Martilhe finalmente planeja ter um filho, se não me engano você não disse que o melhor sonho é estar acompanhado de várias mulheres. Em controvérsia, agora está casado e prestes a ter um herdeiro. — Sorriu abertamente.
— Quer brincar? Tudo bem, não foi você que tinha o sonho de casar e construir uma família imensa? Mas só conseguiu uma parte dos filhos. — Mark Caiu na gargalhada.
Dessa vez fiquei com pena, ainda bem que as crianças já tinham entrado na brinquedoteca, enquanto a noiva não chegava. Acho que nenhuma criança merece ouvir isso. E por qual motivo estou interessada em escutar a conversa deles? Tenho que parar com isso, ele é meu chefe, não deveria estar preocupada com os seus sentimentos.
O senhor Martilhe mudou rapidamente de assunto parecendo ter ficado chateado. Acho que ele tem vergonha disso, pois, pela sua aparência e atitude, não parece um homem que já sonhou em se casar na vida. Está mais para um mulherengo em ascensão.
Aproveitei a oportunidade e observei mais do local. Estamos em um pátio, onde têm mesas arrumadas por toda a parte e um grande lustre no meio do salão em um formato de rosa, embelezando mais ainda o local decorado com todo os tipos de flores, sendo agraciado por cores mistas entre dourado e branco. Enquanto isso, sou tirada novamente dos meus pensamentos quando Ryan me chama.
— Venha Bela. — Me indicou a cadeira e se sentou ao meu lado, enquanto o irmão se acomodou ao seu lado, guardando um lugar para a esposa.
— Posso ficar com ela para você descansar. — Ofereceu Ryan, vendo Tiana em meu colo.
— Não precisa, já me acostumei, e se o senhor a tirar daqui vai ser um berro que só — respondi sem transmitir muita importância.
— Tudo bem. Vou chamar as crianças. — Saiu em direção a brinquedoteca.
— Ele gosta de você — disse Mark do nada, me pegando completamente desprevenida.
Quê? Não, não venha com esse assunto. Estou cheia de pensamentos esquisitos, não aguento mais. Com certeza essa família não está fazendo bem para a minha sanidade. Preciso de um novo emprego urgentemente, se eu passar mais um tempo aqui vou enlouquecer.
— O senhor deve estar vendo coisas — falei aparentando não ter dado a mínima importância.
Ele apenas me observou dando um sorrisinho de lado e virou para o outro lado. Ufa! Me livrei dessa, mas não por muito tempo, tenho certeza. Após uns minutos uma mulher acomoda-se ao seu lado mantendo um diálogo aberto.
Ela é negra, deve ter a minha altura, olhos e cabelo ébano. Posso dizer, algo nessa mulher a destaca dos demais, pois, é notável que onde ela chega à atenção foca na sua pessoa. Não estou falando pela beleza, mas algo que não sei explicar, a torna única. A sua presença é marcante, disso não tenho dúvida. Mas é claro, esses pensamentos ficaram só comigo, jamais teria uma apreciação de cara por alguém que não fosse eu.
— Então, você é a namorada de Ryan? — perguntou aparentando curiosidade.
Era só o que me faltava, todo encanto que tive por ela desapareceu em apenas um segundo, por causa dessa pergunta besta.
— Sou apenas... — Me interrompeu quase me atropelando na conversa.
— Olá, bem-vinda a família. Sou Zandara esposa de Mark, esse garanhão aqui. — Apontou para o irmão de Ryan.
Revirei os olhos e, dirigir a minha atenção para algo mais interessante.
— E essa linda? — voltou novamente a papear.
— É Tiana. — Olhei para Tiana que está agarrada ao meu peito encarando a moça.
Estranho, por que ela não sabe que a menina é sobrinha do marido? Parece que nunca a viu antes.
— Ela já sabe falar? — Apertou a bochecha da criança.
— Deve saber, mas nunca vi. — Não demonstrei interesse.
— Sério? Pela idade dela já deveria estar pronunciando algumas palavras. Sou fonoaudióloga e psicóloga, tendo especialidade em pediatria. — Apertou novamente a bochecha da criança — Mark peça ao seu irmão para levá-la na minha clínica, temos que analisar isso de perto. — Evidenciou o seu conhecimento em relação ao parentesco.
— Claro, querida. — Deu atenção a sua mulher e voltou a conversar no celular.
— Ficarei feliz se você também for. — Analisou cada expressão minha, pude perceber pelo seu semblante e olhar.
— Por quê? — perguntei intrigada, porque não sou nada deles.
— Ela parece ver você como mãe e isso é importante para o tratamento. — Finalizou.
Quase tive o infarto, era só o que me faltava. Mentira, tenho certeza de que essa doida varrida está vendo coisas. O meu dilema é, quanto menos crianças no mundo melhor. Então, por qual motivo irei me aproximar de uma? Nem se eu estivesse louca. Que fique claro, se isso acontecer podem me internar num hospício.
Apenas dei um sorriso de desânimo e encerrei a conversa. Após um tempo, finalmente Ryan chegou com as crianças. Não demorou muito e o casamento começou.
Não gosto de casamentos, parei de gostar quando aquela santa da Dália apareceu na minha vida. Desgraçada, destruiu tudo o que tinha e ainda terminei como a vilã da história. Na época fiquei tão enraivada que perdi o controle. Me arrependo de algumas coisas que causei, mas outras foram artimanhas do destino. Por causa disso, até hoje sofro as consequências. Afinal, posso dizer com propriedade, não é nada interessante ter o noivado desmanchado.
Respirei fundo e observei a noiva entrar na igreja, ela está radiante. Pena que essa felicidade vai durar pouco, é sempre assim. A minha tutora de língua estrangeira sempre dizia que nada é para sempre, aprendi isso da pior forma possível.
Olhei para Ryan e o observei mais de perto, é notável a felicidade dele pela irmã. Diferente de mim, ele está com o meio sorriso no rosto admirando a cerimônia. Enquanto estou o observando, ele dirigiu sua atenção a mim, me pegando no flagra, para não gerar assunto, me virei rapidamente para o lado oposto, evitando alguma cena constrangedora.
Ainda com turbilhões de pensamentos em minha mente continuei assistindo o casamento normalmente, depois disso, aproveito a oportunidade para pegar um ar fresco, já que toda essa atmosfera está me enchendo.
Quando finalmente passo pelo salão, já que estou livre, pois entreguei Tiana a Zandara. Me acomodei perto de uma janela, tendo uma visão privilegiada do jardim do lado de fora, enquanto uma música lenta toca, e vários casais vão para a pista de dança.
— Você não acha solitário demais ficar aqui sozinha? — perguntou Ryan após me conceder alguns minutos de sossego.
— E você não tem mais o que fazer do que ficar me atazanando? — respondi em um tom nada cordial.
— Não sei o motivo, mas cada palavra sua me atrai, mesmo que não simpatize com o sadomasoquismo. — Se aproximou sugestivamente de mim.
Tenho que admitir essa frase quase me fez rir, mas me contive e voltei ao meu semblante original, passivo.
— Não quero ser incisiva, porém, não vejo preocupação em relação a sua pessoa em estar conversando com uma empregada. — Tentei evidenciar o máximo de emoção possível em cada palavra.
— Se me preocupasse com a opinião dos outros teria convidado uma socialite qualquer, conquanto, me diga você, o glamour da nata da sociedade nunca te atraiu ou a senhorita já experimentou e comprovou que não é bom como todos imaginam? — Senti seus dedos tocarem superficialmente a pele do meu braço, enrolando o seu braço envolta da minha cintura elegantemente.
Tenho certeza de que essa indagação foi mais do que simples palavras, então, o que ele sabe sobre mim? Possuo a convicção do meu interesse em brincar com fogo? Porque dessa vez não sairei queimada se não der certo, logo, serei completamente fulminada.
— Que tal uma dança? — Repousou uma de suas mãos na minha.
Hum?! Por que não? Se estou na fornalha é para me queimar. Apertei sua mão com mais firmeza e me deixei ser guiada por ele, em cada passo que dávamos senti os olhares dos seus possíveis familiares e amigos em nossa direção, mas isso não me fez recuar, não agora. Pela primeira vez em anos me deixei ser livre, ao menos por alguns segundos, afinal de contas, o que uma dança com o homem dos seus pensamentos pode causar? Não sei, mas quero descobrir.
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