5° Capítulo: O Custo da Verdade


Aquelas escritas aterrorizantes ao lado do desenho da forca deixaram Elizabeth desestabilizada. Após alguns segundos de susto, a garota tomou coragem, deu três passos à frente, devagar, em direção ao espelho, e apagou o desenho com movimentos bruscos. Quando finalmente terminou, respirou fundo e encarou seu reflexo. A situação que havia sido obrigada a enfrentar nos últimos dias estava afetando criticamente sua aparência. Seus olhos estavam avermelhados e fundos, acompanhados de olheiras que podiam contar uma história a quem os encarasse. Sua cor dourada já não existia; a única coisa que restava era uma silhueta pálida e apática, consequência das noites em que mal conseguiu pregar os olhos.

Ela se abaixou para abrir o armário debaixo do espelho, procurando sua nécessaire. Colocando-a em cima do pequeno balcão, pegou seu corretivo e começou a aplicá-lo nas olheiras, tentando disfarçar os sinais de exaustão. A última coisa que queria era que sua família percebesse que algo estava errado, principalmente sua mãe. Não queria ter que criar uma explicação plausível para o que estava acontecendo. E quem olhasse de fora poderia pensar: por que ela não conta à mãe? Talvez fosse ajudar, falar com alguém, pedir ajuda. No entanto, isso já havia se tornado um problema grande demais; seu medo era piorar ainda mais a situação. A última coisa que queria era envolver mais pessoas no problema que ela mesma gerou.

Ela precisava aplicar algo muito leve, discreto, já que normalmente usava pouca maquiagem, apenas uma base e um batom fraco, quase na maioria das vezes ficava imperceptível a quem convivia com ela. Mas, naquele dia, algo a inspirou a mudar; se fosse para chamar atenção, que fosse pela maquiagem e não pela situação. Pegou uma sombra preta e a aplicou sobre suas pálpebras. Procurou um batom que combinasse, mas não encontrou o que queria. Lembrou-se então do estojo de sua mãe, guardado no fundo do armário. Ao abri-lo, encontrou um batom vermelho maçã que já tinha a visto usar algumas vezes. Passou-o nos lábios, sentindo-se linda, mas ainda faltava algo. Pegou um rímel e alongou ainda mais seus cílios, que já eram naturalmente volumosos.

Ela percebeu que os poucos minutos que lhe restavam antes de se atrasar estavam se esgotando rapidamente. Deu uma última olhada no espelho, sorrindo ao ver o quão bela estava. Afinal, ela era apenas uma garota de 17 anos, vaidosa, que ansiava por uma vida normal, livre das perturbações paranormais causadas por aquelas malditas fitas. Com pressa, arrumou a bagunça que havia deixado na pia, pegou sua bolsa e saiu apressada pela cozinha. Seus pais mal tiveram tempo de notá-la, mas mesmo assim, perceberam que sua aparência estava diferente do habitual.

Aonde será que ela vai com essa maquiagem? Será que se apaixonou por algum garoto da capela? — Raquel comentou com o pai, sorrindo.

Elizabeth caminhava apressada, com passos largos e a mente distante, focada apenas em chegar ao orfanato a tempo. O trajeto habitual, que antes fazia com prazer, agora parecia um fardo que ela desejava evitar. Sua personalidade, outrora calorosa e tranquila, estava se tornando cada vez mais fria e distante, isso era uma forma dela se blindar, se proteger de qualquer mal que poderia passar pelo seu caminho, beirava a paranoia. Quando chegou aos portões do orfanato, faltavam apenas cinco minutos para o seu horário. No entanto, avistou o coveiro saindo do cemitério e indo em direção a um casebre ao lado da igreja, onde morava. Sem pensar duas vezes, decidiu alterar sua rota e segui-lo. Embora tentasse fingir que estava tudo bem, não conseguia esquecer as recentes experiências perturbadoras que vivenciou. Ela precisava de respostas, e Albert poderia ter alguma informação valiosa.

Ao se aproximar, Elizabeth esforçou-se para manter uma postura amigável e descontraída, apesar das suspeitas persistentes sobre o possível envolvimento de Albert com as fitas. Ela sabia que estabelecer uma "amizade" com o coveiro poderia ser crucial para obter informações sobre os mistérios que a atormentavam. Considerando que ele morava nas proximidades, acreditava que, inevitavelmente, ele poderia saber algo relevante.

— Oi? — ela disse ao se aproximar.

— Ah, oi, senhorita Elizabeth. Está muito bonita hoje — respondeu Albert, virando-se para ela.

— Obrigada. Não te vi mais por aqui, por onde andava? — perguntou.

— Estive um pouco doente, por assim dizer. Este inverno tem sido particularmente rigoroso, e, apesar de estar habituado às adversidades, admito que não lido muito bem com elas. — ele sorriu, mostrando os dentes, e que sorriso.

— Eu... ahn — Elizabeth se perde logo ao começar, surpreendida pela beleza do coveiro que não havia notado antes. — Queria saber se, por acaso, você viu alguém suspeito entrando no orfanato fora de horário. Mas acho que você não deve saber... — concluiu com um sorriso, tentando disfarçar sua timidez.

— Infelizmente, não sei nada a respeito. Peço desculpas. Talvez seja melhor consultar a senhorita Smith para obter uma resposta.

— Não, nem vou. Mas não é nada importante — falou pensativa.

— Aconteceu algo de que eu deva saber? Se precisar desabafar ou compartilhar algo, sou um excelente ouvinte — Albert disse, aproximando-se e olhando-a com uma expressão que misturava preocupação e curiosidade.

— Na verdade, ainda não estou certa se posso confiar em você. Não conheço nem mesmo seu nome, e esta é a primeira vez que conversamos. Mas, por ora, está tudo bem; nada aconteceu. — Elizabeth sorriu, tentando amenizar a situação. — Peço desculpas por ser tão franca, é apenas que estou passando por um momento complicado e prefiro manter um certo grau de cautela.

— Ah, entendo perfeitamente. Peço desculpas se pareci invasivo. Apenas quis enfatizar que, se algum dia sentir a necessidade de desabafar, não me veja apenas como "o coveiro". — Um sorriso simpático, quase irresistível, surgiu após suas palavras.

Elizabeth ficou em silêncio, visivelmente desconcertada com o homem que estava em sua frente. A sensação de que ele era uma ameaça parecia se dissipar, retirando todas suas suspeitas. Um rapaz tão encantador e aberto não parecia o tipo de pessoa que esconderia segredos, a menos que houvesse uma razão muito convincente. Agora, o desafio era descobrir se ele realmente tinha algo a esconder ou se suas suspeitas eram infundadas.

— agradecida pela compreensão, Albert. Se precisar desabafar, sei onde te encontrar — disse ela, mantendo um tom amigável e formal, ocultando cuidadosamente qualquer emoção que pudesse ter sentido.

Albert abaixou levemente a cabeça em um gesto que parecia ser tanto uma despedida quanto uma promessa de apoio. Elizabeth acenou em resposta e, com um breve sorriso de agradecimento, se despediu.

Ao se dirigir ao saguão principal do orfanato, ajustou a roupa e preparou-se para o dia, apesar de tudo ela tinha tarefas e obrigações a cumprir. Dirigiu-se ao quarto das crianças, determinada a focar em sua rotina e deixar qualquer adversidade para resolver depois de seu turno.

— Crianças, acordem, está na hora do café — falou, esforçando-se para se concentrar em sua demanda, ultimamente estava mais difícil fazer isso do que as tarefas em si.

Os pequenos, ao ouvirem a chamada dela, correram em sua direção, abraçando-a calorosamente. Seus pijamas lisos e opacos, semelhantes às roupas de hospital, se atenuavam na manhã fria. Depois de escovar os dentes, dirigiram-se ao refeitório, cada um ocupando seu lugar habitual com a familiaridade de sempre. Enquanto a maioria era radiante e alegre, Chloe, uma adolescente de dezesseis anos que normalmente se encarregava de cuidar das mais novas na ausência de um responsável, apresentava um comportamento estranho naquele dia. Ela, que geralmente estava sempre sorrindo e animando os outros, estava agora visivelmente abatida. Percebendo a diferença, Elizabeth decidiu chamá-la para uma conversa, enquanto as outras crianças brincavam alegremente na sala.

— Aconteceu alguma coisa, Chloe? — perguntou.

— Ah... não, é bobeira minha, não dá bola — respondeu Chloe, claramente chateada.

— Você sempre se abriu para mim, querida. Sabe que sou sua amiga. Pode ser franca comigo — Elizabeth pegou nas mãos de Chloe, que tremiam.

— Eu jurei não contar! PARA! PARA! Eu não quero, não, não, não, por que eu? POR QUE TEM QUE SER EU? — Chloe gritou, colocando as mãos nos ouvidos. Aquilo não era normal, ainda mais vindo dela.

Sem entender, Elizabeth temia o que podia estar envolvido. "Será que isso tinha alguma relação com as fitas? Será que isso tem haver comigo?" — Pensava ela.

Chloe se contorceu, seus olhos se viraram para trás, revelando apenas as esferas esbranquiçadas. A voz dela saiu como um eco distorcido e cavernoso, carregada de um tom grave e rouco, que fez o ar ao redor gelar mais ainda do que já estava.

— VOU MATAR UM A UM QUE ENTRAR NO MEU CAMINHO! — A atmosfera ao redor parecia se comprimir sob o peso da tensão crescente, enquanto o olhar de Chloe, imbuído de um ódio indescritível, atravessava quem estava diante dela. Ela nunca tinha visto a menina assim, sua feição parecia completamente transformada, como se fosse possuída por uma força demoníaca. O ambiente ficou carregado de uma sensação opressiva, e o ar parecia denso e sufocante, fazendo com que Elizabeth se sentisse completamente paralisada diante daquela situação.

Após terminar suas palavras, Chloe desmaia nos braços dela, que estava visivelmente aterrorizada e trêmula. Em seus pensamentos, ela desejava que tudo o que havia descoberto simplesmente desaparecesse e que sua vida voltasse ao normal. No entanto, as verdades reveladas naquele dia começaram a exigir as suas consequências. Agora, a pergunta que restava era se tudo isso estava realmente ligado ou se seria apenas uma mera coincidência. Neste momento, tudo o que ela queria era que fosse mentira.

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