Capítulo 1 - parte 2 (não revisado)

Agoniada, Sheila nota que Juan devia ter chegado há mais de uma hora. Sempre que pode, entra ali para falar com ele. Vai levantar para tomar água quando a tela mostra uma mensagem:

– "Juan: Oi Flor." – Ela escolheu esse nick e sempre usa-o. Feliz, volta a sentar-se e digita:

– "Flor: Tudo bem, Juan? Estava com saudades de você!"

– "Juan: Eu também, mas fui treinar um pouco, pois quero participar da meia maratona do Rio, mês que vem."

– "Flor: Então você estava correndo?"

– "Juan: Sim. Adoro correr. Você corre, Florzinha?"

– "Flor: Só da chuva, kkkkkk."

– "Juan: Praticar esportes faz muito bem, sabia?"

– "Flor: Tem razão. Eu sou meio preguiçosa, mas a minha irmã gosta muito de correr. Vive insistindo para eu ir treinar com ela."

– "Juan: Devia tentar, Florzinha, faça-o por mim."

– "Flor: Vou fazer, mas só porque você pediu."

– "Juan: :-) Adoro você, Flor."

– "Flor: ;-) Também adoro você, Juan. Devíamo-nos conhecer pessoalmente."

– "Juan: Devíamos sim. Afinal já nos falamos há tantos meses! Você nunca me disse como é!"

– "Flor: Eu sou normal, acho. Loira, 1.75 m, olhos verdes, magra... normal."

– "Juan: Jura? Eu adoro olhos verdes, muito mesmo. São os que mais gosto. Você deve ser bela, Flor."

– "Flor: E você, como é, Juan?"

– "Juan: Ora, acho que também sou normal. Tenho 1.80 m, olhos e cabelos castanhos. Gosto de atletismo..."

– Caraca, Sheila, de novo batendo papo com ele? – Comenta a irmã, mais do que pergunta. Ela entrou no quarto sem que Sheila visse. – Você fala com ele todo santo dia! Não cansou não?

Assustada e de olhos alegres, Sheila vira-se para a irmã.

– Puxa vida, Bia, me deu um senhor susto. Sei lá, sabe? Eu sou louca por ele. Precisava de o conhecer.

– Você sabe os riscos disso, mana. – Beatriz aproxima-se e lê a troca de mensagens. – Se ele for realmente assim, deve ser mesmo um gato e tanto.

– Se deve! – Suspira. – Acho que estou totalmente apaixonada.

– Ele gosta de correr, que legal. Assim talvez você crie vergonha na cara e vá exercitar-se um pouco. Eu vou participar da meia maratona. Será que vou conhecer esse gato por lá?

– Não seja tonta, Bia. Deve haver milhares de corredores. Além do mais, esse aí já é meu. Nem se atreva!

– "Juan: Você sumiu, Flor?"

– "Flor: Estava conversando com minha irmã. Desculpe."

– "Juan: Não precisa se desculpar. De você eu perdoo qualquer coisa. ;-/"

– "Flor: Assim, vou-me apaixonar, Juan."

– "Juan: Só vai? E eu que pensava que já estivesse, Florzinha, pois eu estou."

– "Flor: Eu também estou, Juan. Precisamos de nos co..."

O quarto fica todo escuro.

– Mas que droga – afirma, furiosa, quase gritando – com tanta hora para faltar luz, ela some justo agora!

– Acontece, mana. Olhe, se você for marcar um encontro com ele, não vá sozinha, ok?

– Tem razão. O que vai fazer agora?

– Vou correr, para treinar um pouquinho.

– Acompanho você.

– Caraca, o amor faz mesmo milagres!

― ☼ ―

Dois dias depois, Carlos e Ana estão sentados no quiosque, a sós, quando veem Sheila correndo no calçadão.

– Nossa, mas que bicho lhe mordeu? – Pergunta-se Ana, estranhando muito a atitude da amiga. – Ela nunca foi dada a isso, nem mesmo no colégio!

– Ela é maluca, Ana, totalmente maluca. Sinceramente não sei o que tem na cabeça. Só fala besteira!

– Não diga isso, Carlinhos. – Pede a namorada. – Ela é muito minha amiga e você me magoa.

– Desculpe, Aninha, mas não deixo de ter razão.

– Para sua informação, amor, ela tem as melhores notas da turna. Sempre foi assim desde o colégio e nunca a vi estudando a não ser em casos bastante raros. Isso é sinal que ela é muito inteligente, não acha?

– Tem razão. – Sheila aproxima-se e eles param de falar. Ela está muito ofegante e suada. Gozador, o rapaz pergunta. – Agora deu para correr?

– Exercício é excelente para a saúde. Você devia criar vergonha na cara e fazer o mesmo. Aposto que não faz nada desde que terminou o ensino médio!

– Sabe, Sheila, o seu problema é que você me rotula sem pensar e desconhece completamente a minha vida particular. Saiba que além de beijar também gosto muito de natação e outros esportes. Para sua informação, exercito-me regularmente. Correr não é tudo na vida, mas é bem gostoso para quem aprecia. Que bom que faz isso.

– Mais essa ainda! – Ela sorri. – Paz, Carlos. Preciso de uma água bem gelada. Que sede!

– Você fica linda demais quando ri e devia ser menos brava. Agora, se não quer ir parar no hospital ou, no mínimo, passar tremendamente mal, não tome água gelada, nada gelado. O choque térmico irá provocar câimbras terríveis no seu estômago e muita agonia.

– Pensa que vou acreditar nisso?

– Ele tem razão, Sheila. – Insiste Ana. – Já vi alguém passar mal por isso, lá no tempo da escola. Foi uma vez que você estava doente e faltou. Ele ficou muito mal mesmo, saindo de ambulância para o hospital.

– Tá bom, mas preciso beber água!

– Tome água natural, fora do gelo. E trate de tomar bastante para se reidratar. Se você corre regularmente, use aqueles sucos especiais, tipo gatorade, para repôr os sais minerais perdidos na transpiração. Se abusar demais, tome um energético.

– De onde você tirou toda essa informação?

– Sou um nerd, não sou? – Sorri debochado.

A garota faz uma careta, olha para mim e nota que os observo com a cara divertida. Enruga a testa e aproxima-se, zangada. Eu sorrio para ela, que permanece séria.

– O que você quer olhando para nós desse jeito? É algum tarado, por acaso? Olhe que eu chamo a polícia.

– Não sou tarado, minha querida. Apenas ouvia o que o rapaz disse. Se tu beberes água gelada depois de um esforço intenso, vais ter um colapso violento. Ele não estava de sacanagem e devias seguir todos os conselhos que te deu.

– Tudo bem. – Vai para o balcão e pede uma água fora do gelo.

– Gatinho – Ana sorri para Carlos, enquanto o acaricia na face e beija novamente – não esqueceu que vamos sair hoje, né?

– Não esqueci, Aninha. – Beija o seu rosto, sorrindo. – Já escolheu o filme?

– Semana passada entrou em cartaz Matrix Revolutions. Eu estou louca para ver como essa trilogia vai terminar.

– Então está decidido. – Enquanto se beijam, Sheila aparece com a garrafa de água na mão.

– Caraca! Nem posso acreditar que vocês tão namorando. Você não tem mesmo bom gosto, Ana. Vai deixar de ser nerd, Carlos?

– Eu não me considero um nerd. – Carlos sorri de forma provocadora. – Você é que fica sempre me chamando assim; a única que me rotulou. Cuidado que quem desdenha quer comprar.

– Deus me livre! Ana não podia estar mais segura, pode ter certeza.

– Não se preocupe. Do jeito que você trata as pessoas, quem vai querer alguma coisa consigo? – Sorri debochado. – Você é demasiado implicante e chata.

– Eu que sou chata, é? Voc...

– Querem parar, os dois? – Ana zanga-se. – Caramba, Sheila, você sempre o provoca toda hora, querendo arrumar uma discussão com ele. Até parece mesmo que está com ciumes do Carlos. Que droga. Tá a fim de estragar o dia? Vamos, amor.

– Eu, ciumes? – Ela ri. – Tá maluca? Já disse que...

O casal levanta e sai de mãos dadas, ignorando a colega que fica frustrada e chateada pela bronca que a amiga lhe deu. Eu observo a moça e sorrio. Ela é uma garota bela demais, com um corpo lindo e as roupas que usa para correr deixam qualquer um incapaz de não olhar duas vezes. Ao me ver sorrindo, vira-se para mim, muito zangada.

– Tá rindo de quê?

Eu olho para ela por uns segundos e digo:

– Sabes, tchê, quando tu tiveres a minha idade, certas coisas do teu passado serão apenas lembranças, umas gostosas e outras tristes. E mais algumas terão perdido totalmente o sentido. – Curiosa, senta-se na minha mesa, ouvindo o que digo. – Mas poderão haver outras muito especiais, que farão a diferença, muita diferença. Toma cuidado com o que tu fazes agora para não sofreres as consequências disso no futuro. Como te chamas?

– Sheila. Você até parece o meu pai falando, só que ele apenas não é tão profundo!

– Bem – eu fecho o computador – apesar de ser bem mais velho do que tu, talvez uns doze anos, ainda não tenho idade para ser teu pai, mas ele é sábio, se diz isso. Tu não imaginas como é fácil destruirmos o nosso futuro com apenas um pequeno deslize.

– Você é bem gaúcho ao falar e me lembra alguém, mas não sei quem!

– É mesmo? – Sorrio, descontraído. – Que interessante!

– É sim. Como se chama?

– Sou Miguel Duarte de Almeida.

Ela fica pasma e de queixo caído, olhando para mim como se eu fosse algo improvável ou uma aberração. Logo depois, abre um sorriso enorme, com os olhos brilhando muito.

– Jura? É você o meu escritor preferido? – Levanta-se de um salto e me dá um abraço. – Eu amo seus livros. Você tiraria uma foto comigo?

– Oi, amor. – Sheila olha para o lado e vê uma mulher ruiva, lindíssima, aproximar-se de mim e me beijar nos lábios. Sem jeito e com o rosto vermelho, a garota afasta-se. Eu sorrio, delicado.

– Oi, guriazinha, esta é Sheila. Sheila, a minha esposa Denise.

– Prazer, Denise. Vocês vão ter um filho? – Ela olha a barriga da minha princesa.

– Sim, em pouco mais de quatro meses, lá para Março. O nome dela será Bruna.

– Parabéns. Você vem sempre aqui, pois eu o vejo sentado com o seu computador. Amanhã, se eu trouxer um livro seu, me daria um autógrafo?

– Claro, querida. O teu celular tem câmera?

– Óbvio. Ele é bem bacana e ganhei de aniversário, do meu pai.

– Então liga a câmera dele e dá para Denise que ela tira uma foto nossa. Não é isso que tu desejas?

– Muito, Miguel. Eu tenho todos os seus livros e adoro cada um deles, mas gosto mais do primeiro.

– Todos dizem isso! – Dou um suspiro triste. – Ainda não consegui fazer um que o superasse e isso meio que me frustra.

Sheila abraça o meu pescoço, apertando-se a mim e me beijando o rosto, enquanto Denise bate a foto.

– Obrigada, Denise, Miguel. Vou agora mesmo tirar uma cópia e colar no meu livro. Jamais imaginei que fosse tão legal e simpático.

– Sheila, lembra-te do que o teu amigo disse. Se tomares água gelada após exercícios intensos, poderás passar muito mal.

– Lembrarei, obrigada.

– E tem mais, Sheila, não brigues mais com esse rapaz. Vocês amam-se, mas ainda não se deram conta. Ele é importante para ti e tu para ele.

– Duvido muito, Miguel. – Ela levanta-se e despede-se. – Nós somos piores que gato e rato. Até mais.

Sheila sai e eu sorrio. Denise senta-se ao meu lado, me abraçando, enquanto peço uma long-neck para cada um. Como sempre, eu conto tudo o que escrevi e ela escuta.

– Miguel, se não conhecesse você tão bem, o nosso casamento estaria seriamente abalado. Não tem um dia que eu não veja uma garota chegando em você!

– Nenhuma delas chega perto de ti, guriazinha.

– Essa aí não é nada desprezível. Um verdadeiro pedaço de mau caminho e não me deve nada em corpo e beleza. Acho que é até muito mais bem feita e não deve ser tão mais nova que eu! No mínimo, dezoito.

– Não te preocupes, anjo. Eu te amo e foste tu quem pedi em casamento. Ela meio que é um objeto de estudo e vai ser uma personagem do meu novo livro.

― ☼ ―


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