Bônus Três

Narrador:

Marlon sentia como se estivesse despencando em um abismo sem fim, mergulhando cada vez mais fundo em uma escuridão densa e sufocante. A sensação de queda era acompanhada por algo ainda mais aterrador: uma presença fria e implacável que se infiltrava em cada fibra de sua alma, invadindo seus pensamentos, suas memórias e até mesmo suas emoções mais íntimas. Era como se sombras vivas se enroscassem ao redor de seu ser, tentando arrastá-lo para as trevas, sussurrando promessas de desespero e dor. Marlon lutava, mas quanto mais resistia, mais a escuridão parecia se fortalecer, envolvendo-o em um abraço gelado que ameaçava consumi-lo por completo. A sensação de ser puxado para um lugar de onde não haveria retorno era avassaladora, e, no fundo, um medo primal começava a tomar conta, fazendo seu coração disparar em um ritmo frenético, como se estivesse à beira de um colapso.

Ele viu, como flashes de luz ofuscantes no meio da escuridão, as memórias de cada uma de suas vidas passadas emergirem de forma caótica, como se estivessem sendo arrancadas à força de dentro dele. Uma enxurrada de imagens, sensações e fragmentos de momentos vividos invadiram sua mente, sobrepondo-se umas às outras. Ele se viu revivendo as dores, as alegrias e os arrependimentos de cada existência, uma após a outra, como se estivesse percorrendo um caminho doloroso através de tudo o que foi e tudo o que perdeu. Em cada cena que se revelava, ele reconhecia o olhar de quem foi, as escolhas que fez e os corações que partiu ou que o partiram. Era como se as sombras ao seu redor estivessem alimentando-se dessas lembranças, tentando distorcê-las, corrompê-las, enquanto o arrastavam para mais fundo nas trevas. Era um desfile cruel de quem ele havia sido em cada vida, revelando o ciclo interminável de esperanças destruídas e amores desfeitos, deixando-o à beira da ruína enquanto tudo o que ele já foi se desenrolava diante de seus olhos como um pesadelo interminável.

— Ainda quero entender como, depois de tudo isso, você ainda deseja viver sem se render e se tornar parte de mim? — A voz de Marlun ecoou, fria e implacável, vindo de todos os cantos ao redor de Marlon, como se a própria escuridão estivesse sussurrando em seu ouvido. — Cada pequena dor, cada ferida não cicatrizada, cada mágoa que te despedaçou, e mesmo assim você insiste em seguir, em lutar para viver... Por quê? Como ainda pode ter essa esperança tola?

A voz de Marlun carregava um tom que misturava desprezo e curiosidade genuína, uma voz que conhecia os segredos mais sombrios do coração de Marlon, como se estivesse tentando arrancar até o último vestígio de resistência.

Marlon respirou fundo, seus punhos cerrados, o peito arfando com o esforço de manter-se firme diante da presença esmagadora ao seu redor. As sombras pareciam mais densas, como se quisessem se enroscar em torno dele, sufocá-lo, mas ele se recusava a ceder. Seus olhos brilharam com determinação enquanto encarava a escuridão ao redor.

— Não vou desistir — ele murmurou, a voz rouca, mas firme. Mesmo que estivesse cercado pela escuridão, mesmo que sua alma estivesse sendo dilacerada por aquelas memórias e feridas, havia uma chama em seu interior que se recusava a se apagar. Era a sua própria essência, a vontade de viver, de lutar, de não se submeter àquilo que tentava corrompê-lo.

— Vou resistir... porque a vida, apesar de toda a dor, ainda vale a pena ser vivida. E eu não sou uma simples marionete das sombras.

A resposta de Marlon cortou o silêncio como uma lâmina. As trevas ao redor dele vacilaram por um breve momento, como se Marlun tivesse sido surpreendido pela firmeza na voz de Marlon. O confronto entre luz e sombra, entre o desejo de viver e a tentação de sucumbir, continuava, mas Marlon se mantinha firme, decidido a não se render, a manter-se fiel ao que ainda o fazia humano.

— Deveria apenas desistir de tudo — Marlun sussurrou, a voz carregada de um veneno sutil, repleta de uma escuridão que parecia querer se entranhar em cada parte do ser de Marlon. Em um instante, a figura de Marlun se materializou diante dele, emergindo das sombras como um pesadelo encarnado. Seus olhos eram abismos sem fim, que refletiam nada além de desespero e escuridão.

Antes que Marlon pudesse reagir, sentiu uma dor lancinante atravessar seu peito. As mãos de Marlun, frias como gelo e pesadas como chumbo, mergulharam em seu peito astral, agarrando sua alma com uma força esmagadora. A sensação era indescritível, como se algo estivesse sendo arrancado à força de dentro dele, um rasgo profundo em sua própria essência. Marlon arquejou, sentindo cada fragmento de sua vontade sendo puxado em direção ao vazio.

— Vê? — Marlun continuou, sua voz soando doce como um veneno letal. — Não há por que continuar lutando. A dor, o cansaço, a solidão... tudo isso poderia terminar agora. Apenas deixe ir, deixe-me levar você para onde tudo se dissolve.

Marlon sentia sua alma sendo sugada, como se estivesse à beira de se partir ao meio. As sombras ao redor pulsavam, vibrando em harmonia com o domínio de Marlun. Sua visão começou a embaçar, as cores do mundo ao seu redor se desfazendo em cinzas, e a tentação de simplesmente desistir, de ceder ao alívio da escuridão, quase o envolveu.

Mas em meio àquela dor sufocante, em meio à sensação de desespero que tentava tomar conta dele, algo brilhou dentro de Marlon. Uma lembrança, um lampejo de luz. Era o eco de todas as razões pelas quais ele se recusava a desistir — as pessoas que amava, as promessas que havia feito, a fé que mantinha mesmo diante da adversidade. E era essa centelha que o fez reagir.

Com uma força que ele nem sabia que possuía, Marlon agarrou o pulso de Marlun, seus dedos tremendo, mas firmes. Sua voz saiu baixa e rouca, mas carregada de uma determinação feroz:

— Nunca... vou... desistir.

A cada palavra, ele sentia o peso da escuridão diminuindo, mesmo que apenas um pouco. Mesmo com a dor rasgando sua alma, ele ainda resistia, sua vontade sendo o único escudo contra o abismo que Marlun representava. Sabia que, enquanto mantivesse aquela chama acesa dentro de si, por mais frágil que fosse, ele ainda teria uma chance, ainda poderia lutar contra o destino sombrio que tentava se impor sobre ele.

Os olhos de Marlun se estreitaram em frustração ao sentir a resistência de Marlon. As sombras ao redor deles se contorceram, como serpentes prontas para atacar, alimentadas pela ira crescente do ser que queria dominar a alma de Marlon. A pressão nas mãos de Marlun aumentou, puxando com ainda mais força, como se quisesse esmagar a última fagulha de esperança que brilhava dentro de Marlon.

— Tolo... — Marlun rosnou, sua voz reverberando como um trovão dentro da escuridão infinita. — Você acha que essa pequena chama pode resistir à escuridão? Que essas lembranças frágeis e esses sentimentos quebrados podem te salvar? Eu sou a sombra de cada medo que você já teve, o reflexo de cada erro, o resultado de cada escolha maldita que você fez. Não há escapatória para alguém que já está afundado nas trevas.

Marlon sentia o desespero tentando se infiltrar novamente. A dor de ter sua alma puxada, como se cada pedaço de si estivesse sendo dilacerado, era quase insuportável. As vozes dentro dele começavam a sussurrar dúvidas, questionando sua capacidade de continuar lutando, sugerindo que talvez Marlun estivesse certo, que talvez tudo fosse inútil. Por que resistir, se a escuridão parecia ser o destino inevitável?

Mas, em meio a isso, algo o fez lembrar de que ainda estava ali. Uma memória suave, quase como um sussurro. Um sorriso. Uma risada distante, cheia de vida. Era uma memória de tempos mais simples, de quando ele acreditava que o amor, a amizade e a esperança eram motivos suficientes para viver. Era uma memória de alguém que ele havia perdido, mas que ainda vivia dentro dele. E foi essa lembrança que fez a luz em seu coração brilhar com mais intensidade, o suficiente para afastar a escuridão que tentava sufocá-lo.

Marlon ergueu os olhos, encarando Marlun com uma determinação renovada. Seus dedos se apertaram ao redor do pulso da criatura sombria, e uma pequena, mas inabalável chama começou a brilhar em seu peito astral, irradiando calor e luz. Era a prova de que, por mais que tivesse caído, por mais que estivesse ferido, ele ainda era capaz de escolher lutar, de escolher o que era certo.

— Pode me chamar de tolo o quanto quiser, pode me lembrar de cada erro e dor que carrego — Marlon disse, sua voz ecoando com mais força. — Mas enquanto houver um resquício de luz dentro de mim, enquanto eu puder me lembrar das pessoas que amo e das coisas pelas quais vale a pena lutar, eu nunca serei completamente seu. Nunca me renderia à escuridão que você representa.

Marlun rugiu, uma expressão de fúria pura distorcendo suas feições. As sombras ao redor deles se intensificaram, tentando esmagar a luz de Marlon. A escuridão era como um mar revolto, com ondas implacáveis de desespero e medo batendo contra a pequena ilha de resistência que Marlon representava.

Mas naquele momento, Marlon fez algo que surpreendeu até a si mesmo. Ele deixou de lutar contra a escuridão de fora e se concentrou na luz dentro de si. Canalizou cada memória boa, cada sorriso que havia guardado, e as transformou em uma força que começou a se expandir, rompendo as correntes que o prendiam. A chama dentro de seu peito se transformou em uma explosão de luz dourada, forçando Marlun a recuar, seu domínio enfraquecendo momentaneamente.

A dor que Marlon sentia começou a diminuir, e ele, agora mais consciente do poder dentro de si, usou essa luz para expulsar as mãos de Marlun de dentro de seu peito astral. As sombras ao redor se despedaçaram em rajadas de névoa negra, enquanto a figura de Marlun cambaleava, visivelmente enfraquecida, mas ainda furiosa.

— Isso... isso não é possível! — Marlun gritou, sua voz perdendo o tom dominante e soando mais como um eco desesperado. — Você deveria ter caído! Ninguém escapa das trevas quando já foi tocado por elas!

Marlon, ofegante, com o corpo ainda tremendo de exaustão e dor, apenas sorriu, embora com lágrimas escorrendo por seu rosto. Ele sentia a conexão com suas memórias, com o amor e a esperança, e sabia que, mesmo que a escuridão sempre existisse, ela nunca seria capaz de apagar a luz que ele escolheu preservar.

— Talvez... as trevas façam parte de mim, assim como a luz — ele murmurou, com uma voz mais suave. — Mas eu escolho o que quero ser, e eu escolho lutar pela vida, pelo amor, pelo que me faz continuar. Não vou ser uma marionete da escuridão... nem de você, Marlun.

Com essas palavras, Marlon concentrou toda a luz dentro de si e a liberou em uma onda brilhante, que se expandiu, afastando as sombras, diluindo a escuridão que tentava dominá-lo. Marlun foi lançado para trás, sua forma fragmentando-se em pedaços de sombras que se dissipavam no ar, até que, com um último grito de fúria, desapareceu na vastidão escura.

A escuridão ao redor de Marlon começou a clarear. Ainda havia trevas, mas agora eram mais fracas, mais distantes. A luz de sua própria alma permanecia firme, pulsando com uma calma renovada. E mesmo que soubesse que o caminho à frente ainda seria difícil, Marlon havia provado a si mesmo que, enquanto mantivesse viva aquela chama dentro dele, ele sempre teria a força para resistir — para escolher o que era certo, mesmo diante da maior escuridão.

Num ímpeto de coragem e determinação, Marlon, sentindo a luz dentro de si se intensificar, avançou contra Marlun com uma força que ele nem sabia que possuía. Em um movimento rápido e decisivo, ele atravessou o peito de Marlun com a mão, sentindo a textura gelada e densa da escuridão que compunha o ser à sua frente. Por um instante, o tempo pareceu parar. Marlun arregalou os olhos, um brilho de surpresa e confusão refletido em seu olhar vazio, como se jamais tivesse imaginado que algo assim pudesse acontecer.

— Como...? — Marlun tentou falar, mas sua voz saiu fraca, carregada de descrença.

Ele baixou os olhos para onde a mão de Marlon estava cravada em seu peito, procurando desesperadamente pela sua alma, pelo seu poder inabalável que sempre o mantinha em controle. Mas o que encontrou ali não foi o domínio frio e implacável das trevas que sempre o sustentava. No lugar disso, sentiu a presença de algo maior, algo que o oprimia e o consumia por dentro: a alma de Marlon, resplandecente e cheia de vida, sobrepondo-se à escuridão de Marlun como uma chama que consome as sombras ao seu redor.

Marlon, mesmo sentindo o peso da dor e o cansaço se espalhando por cada parte de seu ser, manteve-se firme. Ele sabia que aquele era o momento decisivo, a última cartada. Com a mão cravada no peito de Marlun, ele deixou sua própria luz se espalhar, invadir o coração sombrio do inimigo e romper as correntes de trevas que o mantinham no controle. A luz não só purificava, mas também reivindicava o espaço que as sombras ocupavam.

Marlun tentou resistir, suas mãos se erguendo para afastar Marlon, mas era como lutar contra uma força inevitável. Aos poucos, seu corpo começou a se desfazer em névoa, as sombras que o formavam sendo engolidas pela luz. A expressão de surpresa em seu rosto se transformou em algo próximo do desespero, seus olhos revelando uma mistura de medo e incredulidade. Ele não conseguia acreditar que alguém tão profundamente marcado pela escuridão pudesse encontrar a força para virar o jogo.

— Não pode ser... Eu sou a escuridão, eu sou o desespero... — Marlun murmurava, enquanto seu corpo continuava a se dissipar. — Como você ousa desafiar isso...? Eu sou um Deus!

Marlon, mantendo a voz firme, mas cheia de uma empatia inesperada, respondeu:

— A escuridão pode existir, Marlun, mas ela nunca será o todo. Sempre haverá luz, sempre haverá uma escolha. E eu escolho viver, escolho lutar por aquilo que me mantém humano. Eu escolho ser eu mesmo, eu escolho te destruír!

Com essas palavras, a luz de Marlon explodiu de uma vez, rompendo completamente o que restava de Marlun. A figura sombria se desfez em uma névoa dissipante, seus gritos se perdendo no ar, até que não restou mais nada além de um silêncio profundo e uma calmaria inesperada.

Marlon caiu de joelhos, ofegante, sentindo o peso da batalha finalmente dar lugar à paz. Ele havia enfrentado seus próprios demônios, literalmente, e saído vitorioso. E mesmo que houvesse cicatrizes em sua alma, ele sabia que a luz que carregava dentro de si era mais forte do que qualquer sombra que tentasse subjugá-lo.

O cenário ao seu redor começou a clarear, a escuridão dando lugar a um céu estrelado e tranquilo. Marlon sentiu uma leve brisa acariciar seu rosto e, por um breve momento, permitiu-se fechar os olhos e apenas respirar, sentindo a liberdade de ser ele mesmo, sem as correntes das trevas. Ele havia escolhido a vida, e agora essa escolha ressoava dentro de si como uma nova esperança.

Ao se levantar, sentiu-se mais forte, mais inteiro, pronto para enfrentar o que quer que viesse a seguir — mas desta vez, com a certeza de que, não importa quão profundas sejam as sombras, sempre há uma luz que pode emergir.

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Marlon observou atentamente o lugar onde antes Marlun se erguia, mas o que encontrou foi a figura de Damian, finalmente liberto da influência das trevas. Damian, com suas várias caudas ondulando suavemente no ar e suas orelhas se movendo de forma inquieta, parecia aliviado, mas também carregava uma expressão de preocupação. Marlon, ainda surpreso, trocou olhares com Damian antes de voltar sua atenção para o local onde o corpo físico de Marlun havia se desfeito. No chão, brilhava uma pequena chama negra, pulsando como o último vestígio de uma força sombria que se recusava a desaparecer.

— Ele não vai se desfazer como o resto? — Marlon perguntou, sua voz carregada de incerteza. Havia algo de inquietante naquela chama, como se ela ainda contivesse resquícios do poder malicioso de Marlun.

Damian balançou a cabeça lentamente, suas caudas se movendo com elegância e suas orelhas tremendo em sinal de alerta.

— Mesmo que estejam separados, o poder dele é o seu, e o seu é dele — explicou Damian, com um olhar penetrante e sério. — Vocês estão entrelaçados, ligados de uma forma que vai além dessa batalha. Essa chama é o que resta dessa conexão. Mas há algo mais urgente a tratar... Seus salvadores estão enfrentando problemas sérios, e agora os monstros que estavam sob o controle de Marlun estão soltos, sem direção. Sem o comando de seu mestre, eles vão destruir tudo em seu caminho, consumidos pelo caos.

As palavras de Damian carregavam um peso sombrio, e Marlon sentiu o frio da responsabilidade correr por sua espinha. Ele sabia que não poderia permitir que o sacrifício de tantos fosse em vão. Olhando para Damian, a determinação voltou a se firmar em seus olhos. Não havia mais espaço para hesitação.

Ele olhou uma última vez para a chama negra, sentindo a escuridão que ainda residia nela, como uma sombra sussurrando seus antigos temores. Mas Marlon não recuou. Ele sabia o que precisava ser feito, por mais arriscado que fosse. Sem desviar o olhar, ele estendeu a mão em direção à chama, sentindo seu calor frio e pulsante se aproximar de sua pele.

— Faço isso por eles... — Marlon murmurou, quase como uma prece, enquanto seus dedos atravessavam a pequena chama negra. A sensação foi imediata e intensa; um choque de frio e calor se misturou, rasgando sua alma, enquanto ele sentia a essência de Marlun tentando se fundir com a sua. Uma dor lancinante percorreu seu corpo, como se estivesse sendo partido em dois, mas Marlon permaneceu firme.

A chama negra, agora dentro de si, começou a se entrelaçar com sua alma, mas desta vez, Marlon estava no controle. Ele canalizou a escuridão, transformando-a, moldando-a para servir ao seu propósito. O poder que antes pertencia a Marlun agora estava sob sua vontade. O vínculo que existia entre eles ainda era real, mas agora Marlon tinha o domínio. Ele sentiu a força das trevas se adaptar à sua luz interior, como duas faces de uma mesma moeda, coexistindo dentro de seu coração.

Damian observava tudo com atenção, suas orelhas inclinadas para a frente enquanto as caudas balançavam em expectativa.

— Você conseguiu, Marlon — ele disse, com um tom respeitoso e, ao mesmo tempo, esperançoso. — Mas a responsabilidade só aumentou. Agora, você carrega o poder que um dia foi do inimigo. Use-o com sabedoria, ou poderá perder o controle.

Marlon assentiu, ciente dos riscos. Ele olhou para Damian, determinado.

— Não posso falhar. Não agora. Ainda há muito a ser feito, e o caos precisa ser contido. Se Marlun deixou monstros para trás, então eu os enfrentarei... com a força que tomei dele.

Damian inclinou levemente a cabeça, respeitoso, e um pequeno sorriso puxou o canto de sua boca.

— Então vamos. O mundo não vai esperar. E nem os monstros.

Com um último olhar para a chama agora fundida em sua alma, Marlon virou-se, pronto para seguir em frente. Ele sabia que o caminho à frente seria sombrio e repleto de desafios, mas estava preparado. Pela primeira vez, ele carregava tanto a luz quanto as trevas, usando ambas como ferramentas para proteger aqueles que importavam. A batalha ainda estava longe de terminar, mas Marlon havia decidido: lutaria até o fim, por aqueles que amava, por aqueles que não podiam lutar, e por um futuro onde as trevas não seriam mais um fardo, mas uma parte controlada daquilo que o fazia ser quem era.

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Do lado de fora, o cenário era um verdadeiro caos. As palavras de Otto ecoavam como um presságio sombrio enquanto as enormes criaturas de sombras avançavam sem piedade, espalhando destruição e pavor por onde passavam. A escuridão se contorcia como se tivesse vida própria, moldando-se em formas grotescas, com olhos brilhantes e bocas repletas de dentes afiados. Os gritos de pessoas em desespero se misturavam ao som dos rugidos das criaturas, criando uma sinfonia aterrorizante.

A missão era clara: atravessar aquela horda de monstros, ultrapassar as barreiras de trevas e alcançar o templo amaldiçoado onde Marlon estava. Cada segundo era crucial; o tempo se esgotava rapidamente enquanto as criaturas avançavam como uma onda implacável, engolindo tudo em seu caminho.

Otto estava na linha de frente, comandando com frieza e precisão, sua voz firme cortando o caos como uma lâmina. Ele sabia que a única chance de sucesso dependia da coordenação exata de seus movimentos e da força de vontade dos que ainda tinham coragem de lutar. Mas o caminho até Marlon não seria fácil. As criaturas não eram apenas sombras comuns; eram manifestações dos piores medos, nutridas pela magia corrompida que emanava do próprio templo.

— Concentrem-se! Não deixem que o medo domine vocês! — Otto ordenou, empunhando sua espada com determinação. Ele sabia que a moral era tão importante quanto a força física nessa batalha. — Precisamos abrir caminho até Marlon! Ele é a chave para acabar com essa escuridão!

Os guerreiros ao lado de Otto lutavam com bravura, mas a pressão era imensa. As criaturas se moviam em ondas, atacando com ferocidade, suas garras afiadas cortando o ar. Mesmo com o cansaço pesando sobre eles, os guerreiros não podiam permitir que essas monstruosidades alcançassem o coração da cidade. Mas, com cada avanço, ficava claro que o ponto de maior resistência estava justamente em torno do templo.

Otto sabia que cada segundo perdido significava que Marlon poderia já estar além da salvação. Ele apertou os dentes, forçando-se a manter o foco, e com um movimento decisivo cortou uma das criaturas ao meio, sua espada iluminando o caminho.

— Vamos, não parem! — ele gritou, liderando o avanço. Mas as criaturas de sombra pareciam infinitas, surgindo de cada canto, de cada brecha, como se fossem parte da própria escuridão que cercava o templo.

O templo, ao longe, estava envolto em uma névoa densa e pulsante. Parecia que o próprio edifício se contorcia, como se estivesse vivo, respirando a escuridão que o envolvia. A entrada, um arco gigantesco de pedra, era guardada por as criaturas mais imponentes e aterrorizantes, gigantes de pura sombra com olhos vermelhos como brasas.

Otto sabia que passar por elas seria o maior desafio. As criaturas menores eram suficientes para desgastar até os guerreiros mais habilidosos, mas os gigantes eram outra história. Cada passo em direção ao templo parecia custar o dobro do esforço, com a energia drenada pela presença sufocante das trevas ao redor. Mesmo assim, Otto não hesitou; ele sabia o que estava em jogo.

— Precisamos quebrar o cerco! — Otto exclamou, dirigindo-se a seus companheiros. — Abram caminho até a entrada, não podemos perder mais tempo! Marlon está lá, e cada momento que ele passa sozinho pode ser fatal!

Com um último olhar para as muralhas de trevas que bloqueavam o caminho, Otto e os outros avançaram com tudo o que tinham. Era uma corrida contra o tempo, contra o próprio desespero que ameaçava consumir todos eles. Para salvar Marlon, eles teriam que desafiar o próprio coração das trevas e enfrentar seus maiores medos.

E no fundo de suas mentes, todos sabiam: se falhassem, não haveria volta.

Um dos monstros de sombra, com braços retorcidos e garras afiadas como lâminas, surgiu das trevas com velocidade surpreendente. Antes que Otto pudesse reagir, a criatura o atingiu com um golpe poderoso na lateral do corpo, enviando-o voando para trás. Ele colidiu com o chão com força, sentindo o impacto reverberar por todo o corpo. A dor irradiou pelo seu lado, mas Otto cerrou os dentes, determinado a não deixar que isso o paralisasse.

Ele se levantou com dificuldade, cambaleando por um momento enquanto via o monstro avançar, sua forma disforme e horrenda se movendo com uma graça antinatural. Os olhos vermelhos da criatura brilharam com malícia, como se estivesse saboreando a antecipação de rasgar seu oponente. As sombras ao redor dela se agitaram como um manto vivo, tornando a presença do monstro ainda mais aterradora.

Otto sabia que não havia tempo para hesitação. Cada segundo de inatividade significava que Marlon estava mais próximo de perder-se para as trevas. Com um movimento rápido, ele empunhou sua espada, que brilhou com um leve tom dourado, refletindo sua determinação.

— Não vou cair aqui! — Otto gritou, a raiva e o instinto de sobrevivência alimentando sua força. Mas, antes que pudesse atacar, a criatura avançou, suas garras se estendendo para cortar profundamente.

Otto mal teve tempo de erguer sua espada para bloquear. O impacto foi brutal, o choque vibrando por seus braços, quase o derrubando novamente. A força da criatura era monstruosa, e a escuridão ao seu redor parecia ganhar vida, pressionando Otto de todos os lados. Ele lutava para manter o equilíbrio, sentindo cada vez mais o peso das trevas ao seu redor.

A criatura rugiu, abrindo sua boca deformada, como se estivesse prestes a devorá-lo. Otto sabia que não poderia apenas defender — precisava atacar com tudo que tinha. Respirando fundo, ele se concentrou, reunindo a energia que ainda lhe restava. Com um movimento rápido e preciso, desviou de um golpe, rodopiando para o lado e se esquivando das garras da criatura.

Com uma explosão de força, Otto girou a espada em um arco descendente, mirando a cabeça do monstro. A lâmina cortou o ar com um brilho intenso, atingindo o crânio da criatura e partindo-a ao meio. A sombra que a compunha se despedaçou, se dissolvendo em fumaça negra enquanto um grito agudo ecoava no ar, desaparecendo rapidamente.

Mesmo com a vitória, Otto respirava com dificuldade, sentindo o cansaço pesar em cada músculo. Ele sabia que a luta estava longe de terminar. Outros monstros ainda cercavam o caminho para o templo, e cada um deles parecia mais impiedoso que o anterior. Mas Otto não podia parar agora. Marlon dependia dele.

Ele se ergueu, firme, e com um olhar determinado, gritou para seus companheiros:

— Avancem! Não deixem que essas criaturas nos atrasem! Precisamos chegar até Marlon antes que seja tarde demais!

Com a espada erguida, Otto liderou o avanço mais uma vez, ignorando a dor que ainda latejava em seu lado. A escuridão podia ser imensa, os monstros incansáveis, mas a determinação de salvar Marlon era ainda maior. Ele estava disposto a sacrificar tudo para alcançá-lo e impedir que aquelas trevas consumissem tudo o que amavam.

E assim, a batalha continuou, com Otto e seus aliados marchando resolutos em direção ao templo, prontos para enfrentar qualquer horror que se interponha em seu caminho.

Outros monstros avançaram com ferocidade, suas sombras torcendo-se em formas grotescas, prontas para atacar sem piedade. Mas, antes que pudessem chegar perto, algo os paralisou. As criaturas congelaram no lugar, suas garras e presas à beira de despedaçar tudo à sua frente, mas incapazes de se mover. Uma luz intensa e radiante surgiu acima deles, como um sol nascendo em meio à escuridão.

— Que descansem: que haja luz — a voz de Marlon ecoou, suave e poderosa, enquanto ele flutuava no ar acima das criaturas. Seu olhar era sereno, mas carregado de uma autoridade que parecia dominar completamente as trevas. A luz ao seu redor se intensificou, pulsando com uma energia pura e imaculada. Num instante, os monstros começaram a se desfazer, suas formas sombrias se desintegrando em partículas que se espalharam no vento como poeira, até desaparecerem por completo.

Otto sentiu seu coração disparar. Ele mal conseguia acreditar no que via. Marlon, envolto naquela aura brilhante, havia se tornado a personificação da luz em meio à escuridão. O alívio e a emoção o dominaram de uma só vez. Sem pensar duas vezes, ele saiu correndo em direção a Marlon, seus passos rápidos ecoando pela terra ainda encharcada de sombras.

Quando finalmente alcançou Marlon, Otto não hesitou. Ele o envolveu em um abraço forte e desesperado, como se temesse que Marlon desaparecesse novamente. A luz ao redor de Marlon se suavizou, envolvendo os dois em um brilho acolhedor e reconfortante. Otto sentiu o calor daquela energia, um contraste absoluto com o frio das trevas que havia enfrentado momentos antes. Seu coração, que antes batia freneticamente, agora pulsava com um ritmo reconfortante, aliviado pela presença de quem tanto amava.

— Eu pensei que... — Otto tentou falar, mas as palavras ficaram presas em sua garganta. Em vez disso, ele apertou Marlon ainda mais forte, sentindo o calor de seu corpo, a certeza de que ele estava ali, vivo e bem.

Marlon, com um sorriso gentil, retribuiu o abraço, passando uma mão pelos cabelos de Otto para acalmá-lo. — Eu sei, Otto. Também senti medo, mas estou aqui agora. E não vou a lugar nenhum.

Eles ficaram ali por um momento, apenas sentindo a presença um do outro, enquanto o mundo ao redor parecia se aquietar. As trevas, que antes dominavam o horizonte, foram substituídas por uma calmaria luminosa, como se a própria natureza estivesse celebrando o reencontro deles.

Finalmente, Otto se afastou o suficiente para olhar nos olhos de Marlon, ainda mantendo as mãos em seus ombros. — Você fez isso... você realmente dominou a escuridão. Eu... nunca estive tão orgulhoso de você.

Marlon sorriu, com um brilho nos olhos que mostrava tanto força quanto ternura. — Não fiz isso sozinho. A luz dentro de mim só pôde brilhar porque sabia que tinha algo — ou alguém — pelo qual valia a pena lutar.

Otto sentiu uma lágrima solitária escapar, mas ele a ignorou. Em vez disso, puxou Marlon para mais um abraço, mais suave desta vez, mas cheio de amor e alívio. No fundo, sabia que ainda havia desafios pela frente, mas enquanto estivessem juntos, poderiam enfrentar qualquer escuridão, não importa o quão profunda.

Enquanto se abraçavam, a luz ao redor deles se espalhava, purificando os últimos resquícios das trevas e trazendo esperança para aquele mundo sombrio que, por um breve momento, havia sido envolto em desespero.

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Gostaram?

Até a próxima 😘

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