7.

"Drugs, give me drugs, give me drugs!"


Fabrízio e Raquel


Fabrízio acordou em êxtase. Havia passado uma tarde maravilhosa ao lado da ex-namorada e conseguiu se focar na tarefa de não agarrá-la. Havia sido difícil, só ele sabia o quanto, mas o garoto se sentia um vencedor.

Eu consegui! Fui forte!

A conquista nem era tão merecedora de comemoração, afinal, ele nunca seria capaz de trair Luíza, mesmo se Raquel pedisse.

Bom, é, talvez se Raquel implorasse...

Mas aquilo não vinha ao caso. Fabrízio não era do tipo de homem que traía, e nunca seria. Luíza era uma ótima namorada e ele seria bom para ela enquanto durasse. Traição era imperdoável!

A única coisa ruim naquilo tudo era que agora ele tinha uma decisão importante nas mãos: Raquel ou Luíza? E, quanto antes ele decidisse, menos magoaria as pessoas a sua volta.

Analisou-se no espelho. O cabelo escuro com mechas roxas - resultado de uma aposta perdida - estava em pé, os olhos azuis com bordas vermelhas da noite mal dormida e o piercing no lábio torto para a direita. Olhando para o piercing, Fabrízio lembrou-se do dia anterior. Honestamente, passar a tarde olhando para o céu e falando merda era o tipo de diversão da qual os seus amigos passariam longe, mas, para o jovem baixista, era um deleite. Principalmente se uma pequena ruiva estivesse envolvida.

A pior parte daquele dia, na sua humilde opinião, havia sido a despedida; ele não sabia se abraçava Raquel, se a beijava, chacoalhava a sua mão... decidiu-se por um breve aceno de cabeça, o qual foi respondido com um sorriso radiante.

Virou-se para o lado, ainda pensando em Raquel, e contemplou o seu laptop aberto. Mexeu no mouse e a foto do plano de fundo acabou com todos aquela felicidade que ele estava sentindo. Na foto, ele e Luíza sorriam, deitados na cama. Ela com as pernas em seus joelhos, ele fazendo uma careta. A morena usava um shorts jeans e uma camiseta rasgada. Era verão, e Fabrízio parecia sinceramente feliz ao lado da namorada. Luíza havia sido a única garota capaz de apagar todas as lembranças dolorosas de Raquel de uma só vez.

O que diabos ele faria agora?


XXX


Raquel chegou atrasada para a segunda aula. Dormiu no máximo duas horas antes do estúpido despertador tocar Whistle For The Choir, anunciando o início da tão sonhada sexta-feira. Sentia-se exausta, mas perder a aula estava fora dos seus planos e dos planos de sua mãe, que esmurrou a porta naquela manhã, berrando "você não está ouvindo a criança?".

Enquanto a ruiva corria pelo corredor e contra o tempo, agradecia a Deus por não ter nenhum período com Luíza aquele dia. Sinceramente, não saberia o que fazer quando a encontrasse. Que tipo de amiga passava a tarde inteira com o namorado da outra?

Aproveitando que o professor estava de costas para a lousa, Raquel correu para dentro da sala e sentou-se ao lado de Bruno, que babava na carteira.

- O que eu perdi? - ela perguntou num sussurro, abrindo o fichário.

- Sei lá... se vira - ele deu de ombros e virou-se para o outro lado.

Raquel ficou observando o amigo atônita. Passado o choque, puxou-o pelo manga da camiseta. Bruno virou o rosto meio a contragosto, irritado; os seus olhos estavam vermelhos e o seu rosto corado.

- Você andou chorando, Bru? - a ruiva perguntou, esquecendo-se da bronca que acabara de formular na cabeça ao encontrá-lo naquele estado.

Ela encostou a bochecha na carteira, os olhos verdes ficando em paralelo com os olhos castanhos de Bruno. O guitarrista fungou e sorriu.

- Claro que não. Eu estou doente - ele respondeu, o que não deixava de ser verdade; ele não "andou chorando", mas sim "segurando o choro".

- Bruno, eu sou sua amiga, você pode conversar comigo. É alguma coisa com a Carolina? - ela lançou um olhar rápido para a garota, que fazia as unhas embaixo da carteira do outro lado da sala.

O fiel cãozinho Bianca, sempre ao seu lado, copiava a matéria da lousa para as duas.

Bruno soltou um suspiro anasalado e revirou os olhos.

- Eu não estava chorando, Quel, deixa de ser neurótica...

- Sr. Borges e Srta. Ludo, por favor - a voz estridente do professor de filosofia ricocheteou pela sala.

Raquel ajeitou-se na carteira e Bruno enfiou o rosto entre os braços. Os seus olhos se encheram de lágrimas novamente, mas ele respirou fundo e elas foram embora.


XXX


Sexta-feira era um ótimo dia para todos. Daniel tinha duas aulas de educação física, Ana tinha metade do primeiro período livre - em que podia ficar observando Daniel na educação física -, Fabrízio e Eduardo podiam dormir tranquilamente nas aulas de teatro, Rebecca e Bruno não tinham nenhuma aula juntos - e, devido as circunstâncias, aquilo era uma benção -, Luíza adorava o professor de filosofia e Raquel tinha aula com todos os novos amigos - menos com Luíza e Fabrízio, bom e ruim ao mesmo tempo.

O dia passou como um cometa, e, quando se deram conta, o sinal da última aula tocou.

Mais um final de semana regado a coisas que eles mais amavam: sexo, drogas e rock 'n roll!


XXX


O que Fabrízio mais gostava nas sextas-feiras não eram as aulas inúteis de teatro, e sim o clima de despedida. Mesmo sabendo que encontraria a todos na segunda-feira seguinte, divertia-se dando tchau para os porteiros e zeladores do colégio.

Era isso que estava fazendo quando os braços suados de Daniel molharam os seus ombros.

- E aí, Fabs.

- Caralho, cara, eu já falei pra você não encostar em mim depois da educação física! - ele exclamou, enojado.

Fabrízio tirou o cabelo do rosto e o braço de Daniel dos seus ombros.

- Eu só queria um pouco de amor, um pouco de carinho - Daniel brincou, enfiou as duas mãos no bolso e caminhou ao seu lado. - Falando sério agora. Sabe aquele filho da puta daquele...

- Garotos, por favor, nada de palavrões na minha portaria - Simas, o porteiro, advertiu-os. - Só porra e merda. Caralho e filho da puta estão banidos.

- Você deveria proibir a bosta do Palmeiras também, Simas - Fabrízio sugeriu, apontando com a cabeça para a bandeira que ficava dentro do escritório do homem.

- Saiam daqui, seus merdinhas, antes que eu seja obrigado a usar a força - o porteiro virou o rosto e segurou o cabo do seu cassetete.

- Isso não assusta a ninguém, Simas - Daniel provocou, fazendo-o gargalhar.

- Vocês querem experimentar? É isso? - ele tirou o bastão do coldre e os dois saíram correndo em disparada, deixando o bom e velho Simas morrendo de rir para trás; ele estava acostumado com as provocações dos garotos e fazê-los correr daquele jeito era a hora mais divertida do seu dia.

Os amigos só pararam de correr quando trombaram com Eduardo e Bruno na calçada da rua do outro lado do colégio. Daniel, aproveitando que era a primeira vez que encontrava Eduardo no dia, chegou perto dele e colocou duas notas de cinco reais na sua mão.

- Toma aí, seu filho da puta, um souvenir do que sobrou do nosso encontro.

- Cara, você não recebeu as minhas mensagens? - Eduardo perguntou, inocente. - Eu avisei que não poderia mais ir! E com o que diabos você gastou todo o meu dinheiro?

Eduardo e Ana com certeza haviam frequentado a mesma escola de teatro.

- Encontrei com a Ana - ele respondeu, dando de ombros.

- O que tem eu? - a garota pareceu brotar do chão, e todos se viraram para olhá-la.

Ela estudava com eles havia muito tempo, e era amiga de Bruno há mais tempo ainda, mas Fabrízio, Daniel e Eduardo não sabiam muito a seu respeito.

Talvez Eduardo soubesse um pouquinho mais do que os outros agora que ela o estava ameaçando.

Era esquisito que só agora, depois de todo aquele tempo juntos, ela resolvesse ser legal e agir como um ser humano normal.

- Daniel estava contando sobre o encontro romântico de vocês dois ontem à noite - Bruno respondeu, lançando um olhar significativo para a amiga.

Ela o ignorou e cruzou os braços na frente do corpo. Eduardo apoiou o peso do corpo na perna oposta, incomodado com a presença de Ana.

- Não teve nada de romântico. Foi uma coisa mais profissional - Daniel rebateu, o que fez a loira retrair uma careta. - Vocês sabiam que tá rolando um concurso para assinar com o Universal?

Todos ficaram mudos e estáticos, olhando para Daniel e para Ana sem nenhuma expressão. Só depois do baque ter passado que Eduardo resolveu abrir a boca.

- E você só nos conta isso agora?


XXX


Raquel passou o dia inteiro procurando por Fabrízio, fazendo vistorias completas dos corredores entre uma aula e outra. Encontrou com todos, Rebecca, Ana, Daniel, Bruno, Luíza - bom, ela avistou Luíza de longe e saiu correndo, mas isso ainda contava como um "encontro" - e até Eduardo, mas Fabrízio parecia ter desaparecido do mapa.

Ela só gostaria de vê-lo e conversar com ele, principalmente depois do que havia acontecido, mas aparentemente ele havia evaporado.

Só de pensar no dia anterior uma sensação gostosa de felicidade invadia todos os poros da sua pele, e ela queria muito continuar sentindo aquilo. Passar a tarde conversando, encontrando figuras engraçadas nas nuvens... e quando foram embora, Fabrízio, totalmente cavalheiro, a acompanhou até em casa! Chegando na porta, ele acenou com a cabeça e murmurou um "até amanhã". Ela pensou em contar-lhe a verdade, mas desistiu no último segundo, despedindo-se rapidamente.

- Ei, Quel, está a fim de assistir ao ensaio dos meninos? - Luíza chamou a sua atenção. De onde ela havia surgido? - O Fabrízio acabou de me mandar uma mensagem nos convidando. Quer ir?

- Ah, claro, pode ser - ela respondeu, sorrindo amarelo.

A morena então pegou a mão da amiga e a arrastou corredor afora.

Ah, se Luíza pudesse ler os seus pensamentos...

Mas, enquanto a sua mente ainda estava devidamente protegida, assistir ao ensaio dos meninos não era nenhum pecado.


XXX


Rebecca encontrou com Luíza e Raquel no estacionamento.

- Fala, Lu. Fala, Ruiva - ela mandou dois beijos no ar.

- Raquel. Eu... hm... eu me chamo Raquel.

- Eu sei. Mas combina mais com Ruiva - Rebecca piscou para a garota; Raquel sentia-se um pouco intimidada perto dela. - E aí, aonde estamos indo?

- Para a casa do Fabrízio. Vamos assistir ao ensaio - Luíza explicou, enquanto Rebecca destravava o seu pequeno Ford K.

Luíza sentou-se no banco da frente, ao lado da motorista, e Raquel enfiou-se silenciosamente no banco detrás.

- Ah, é? - Rebecca deu uma risadinha nervosa. Ficar no mesmo lugar que Bruno e Daniel por umas boas horas não estava em seus planos para o dia, mas ela também não poderia recusar. Estava sempre querendo assistir aos ensaios, e se negasse, Luíza ia querer saber o porquê, e explicar aquilo para a sua melhor amiga seria pior do que ter de passar algumas horas com o homem que partiu o seu coração. Quer dizer, Luíza ia querer matá-la por não ter contado antes. - O que deu neles? Nós nunca podemos assistir aos ensaios.

- Sei lá. O Fabrízio está todo misterioso! Nós vamos nos encontrar lá na Bela Cintra - Luíza comentou e Rebecca deu partida no carro.

- Quel, respira fundo - a morena avisou.

Raquel fez menção de perguntar porque, mas não foi preciso, ela logo se deu conta: Rebecca era uma louca psicopata no trânsito, costurando a tudo e a todos e correndo como se tivesse de tirar a mãe da forca. Luíza, ao seu lado, conversava com a amiga tranquilamente, agindo como se não estivesse prestes a morrer, uma morte lenta e dolorosa.

A ruiva sentia-se enjoada e pensou que fosse vomitar. Quase o fez, mas Rebecca parou o carro bem a tempo e exclamou, animadinha.

- Chegamos!


XXX


Quando Eduardo avistou Luíza, Raquel e Rebecca se aproximando, não soube para quem olhar primeiro. Decidiu-se por Luíza, embora o sorriso de Raquel e os olhos azuis de Rebecca fossem um tanto quanto tentadores.

- O que estamos fazendo aqui, amor? - Luíza perguntou, abraçando e beijando Fabrízio na boca. Raquel olhava para o chão, evitando dar qualquer bandeira de que a tarde passada com Fabrízio acontecera. - Os ensaios não são na sua casa?

- São - Eduardo respondeu por Fabrízio, contrariado. Por que ela tinha que beijá-lo na boca na sua frente? - Leia o cartaz.

As recém-chegadas levantaram o rosto para um pequeno cartaz rosa pregado na parede do charmoso prédio de tijolos que destoava do resto da arquitetura moderna daquela região de São Paulo.



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Assim que Rebecca terminou de ler, abaixou o rosto e seus olhos cruzaram-se com os de Bruno. Ele sorriu fraquinho, tentando uma aproximação, mas ela o ignorou. Foi até a calçada e acendeu outro cigarro com o seu Zippo dourado.

Daniel observava a cena maravilhado, com esperanças de que a bizarra relação Bruno-Rebecca tivesse chegado ao fim, ao contrário de Ana, que estava bem próxima de um ataque de ciúmes. Ou do assassinato de Eduardo e Luíza.

- Uau! Meninos, isso é ótimo! - Raquel exclamou. Ela fez sinal de "joinha" para Fabrízio, que riu. - Essa é a chance de vocês!

- Dã. É por isso que a gente está aqui - Bruno bagunçou o cabelo da amiga, agindo normalmente; ele não daria aquele gostinho de vitória para Rebecca, não mesmo.

- Tá, mas e aí, nós vamos ficar parados no meio da rua ou o quê? Onde fica essa Hands? - Luíza perguntou, impaciente.

- Aqui mesmo - Eduardo apontou para a pequena porta de madeira do prédio de tijolos e Luíza acompanhou todo o contorno do seu braço musculoso até a ponta do dedo.

Ela respirou fundo, determinada a não cair em tentação. Nem reparou que Raquel fez exatamente a mesma coisa.

- Vocês esperam aqui e nós vamos lá, ok? Depois vamos para a minha casa ensaiar - Fabrízio determinou, indo com os amigos realizar um sonho.


XXX


Os meninos já estavam lá dentro havia muito tempo. Rebecca estava entediada, Luíza lançava olhares ameaçadores para Ana e Raquel estava louca de ansiedade. Rebecca, Luíza e Raquel conversavam sobre qualquer coisa, ignorando completamente Ana. Raquel sentia-se mal por isso e tentou puxar assunto com a loira algumas vezes, sem muito sucesso, já que ela só respondia com monossílabas.

Daquele jeito ficava difícil...

- Vamos fazer o que depois do ensaio? - Rebecca perguntou, enquanto colocava tabaco na seda, despreocupada.

- Não sei, mas a minha mãe já mandou avisar que não quer vocês na minha casa por um bom tempo depois do que aconteceu da última vez - Luíza respondeu, e as duas caíram na risada.

- O que aconteceu na sua casa? - Raquel intrometeu-se, curiosa.

- O meu pai acordou no meio da noite e encontrou a seguinte cena: o Bruno pelado do lado de fora, mijando na piscina, eu e o Fabrízio trancados na dispensa e Rebecca dormindo bêbada no próprio vômito. Vômito esse localizado na camiseta do Eduardo! - as duas riram mais uma vez. - Eu falei para a gente não tomar aquelas balas...

- Que balas? - Ana finalmente se interessou pela conversa.

- Ecstasy - Rebecca deu de ombros. - Por quê, loirinha, interessou?

- Bastante - ela sorriu, mostrando os lindos dentes alinhados. - Estou com algumas dessas aqui comigo - ela abriu a bolsa e mostrou um saquinho com algumas "balas" dentro. - Podemos tomar. Pode tornar o ensaio mais... interessante.

As três se entreolharam, surpresas com a declaração da mudinha.

Nem pensar..., Luíza pensou, amarga.

- Ana, acho que eu te amo! - Rebecca sorriu, fazendo com que Luíza revirasse os olhos e Raquel ficasse apreensiva.


XXX


- É isso aí, The Corleones, estão inscritos - o jovem atrás da mesa anunciou, recolhendo o papel que os meninos haviam acabado de assinar e guardando-o em uma pasta no arquivo. - Tragam a música no último domingo do mês. Nós temos todos os instrumentos aqui, menos os pratos da bateria, mas vocês podem trazer os seus próprios se quiserem.

Claro que eu vou recusar um Fender Jazz Bass para trazer o meu baixo fuleira, Fabrízio pensou, apertando a mão do garoto.

Os quatro saíram da Hands muito orgulhosos de si mesmos. Na porta, avistaram as quatro amigas rindo juntas. Eduardo estranhou o fato de que Luíza ria com Ana, mas resolveu deixar para lá; Luíza sabia ser bem falsa quando queria.

- Pronto - Bruno avisou. - Vamos?

- Finalmente! - Ana exclamou.

Ela parecia outra menina, corada, feliz. Sobre o que diabos elas estavam conversando?

Raquel, Ana e Luíza foram no carro de Rebecca. Bruno, Fabrízio e Daniel no carro de Eduardo. Eles pararam na rua da casa de Fabrízio e a garagem estava vazia, sinal de que os seus pais haviam saído. Fabrízio guiou os amigos até o que a banda gostava de chamar de "casinha do cachorro", uma edícula no quintal da casa principal com três cômodos, sala, cozinha e banheiro. Uns 70 metros quadrados de pura diversão.

A bateria de Eduardo estava montada no fundo da sala. Uma Mapex vermelha e completa, com exceção dos pratos, que estavam em sua bag verde musgo. Ao lado da bateria, um Squier todo riscado, preto com escudo branco, estava repousado em um tripé; ele não era o melhor baixo do mundo, com certeza não, mas Fabrízio o adorava. Principalmente com o conjunto de cordas profissionais Ernie Ball.

Daniel trazia a sua Fender Strato no case, e a Les Paul de Bruno estava no case de couro dentro do "estúdio".

Eduardo sentou-se no banco da bateria e começou a rosquear os pratos, um por um. Daniel, Fabrízio e Bruno afinavam os instrumentos, completamente alheios ao fato de que as meninas estavam ali.

Drogadas.

Cada uma havia engolido uma bala inteira, o famoso ecstasy. A sensação de bem estar e euforia era geral. As quatro estavam grudadas no grande sofá do estúdio.

Precisavam de contato físico...

- Sou só eu ou eles estão mais gostosos do que o normal? - Raquel cochichou, e as quatro caíram na risada.

Eduardo lançou um olhar curioso para as meninas depois da terceira sessão seguida de gargalhadas. Logo a banda inteira olhava para as quatro lunáticas no sofá. Elas riam feito idiotas e estavam muito perto umas das outras. Rebecca estava até com o rosto colado ao de Ana!

Bruno apertou os olhos. Elas estavam...

- Vocês estão drogadas? - ele perguntou, surpreso.

É claro que estavam!

- A gente? Não! - Luíza mal conseguia falar de tanto que ria.

Ela estava vendo tudo verde, roxo, azul...

- Alá a sua namorada, Fabrízio! Tá muito louca! - Daniel exclamou.

- O que vocês tomaram? - Eduardo se interessou, saindo da bateria.

Os quatro foram até elas e Ana tirou o pacotinho com mais seis balas da bolsa. Os músicos se entreolharam.

Por que não?


XXX


A noite veio, trazendo toda a loucura à tona. O ensaio foi esquecido, assim como a porta aberta. Quando a mãe de Fabrízio chegou e foi dar uma espiada no filho, encontrou-o dançando feito louco no meio da edícula, só de cueca. Duas garotas, uma ruiva e uma morena, o acompanhavam. Outros jovens - alguns ela reconheceu como sendo da bandinha de garagem de Fabrízio - estavam sentados no chão, bebendo muita água.

A Sra. Pontes arregalou os olhos e tratou de sair logo dali, convencendo-se de que aquilo era só uma reunião normal de jovens normais.

Pobre e iludida Sra. Pontes.

Os oito estavam alucinados!

- Cara, cara, olha só esse bíceps! - Ana exclamou, passando a mão pelo braço de Daniel, que gargalhava. Os seus olhos estavam fixos em Rebecca, mas o toque de Ana o arrepiava. - Olha só... é tão... lisinho!

- Lisinho, Ana? - Rebecca exclamou, gargalhando. - Eles são é gostosos!

- Olha, eu estou aberto para negócios - Daniel brincou, deitando-se no chão.

Observou, de ponta cabeça, Eduardo esmurrar a bateria com as baquetas e Fabrízio, Luíza e Raquel dançarem ao ritmo da batida. Antes que Ana pudesse atacá-lo, levantou-se e juntou-se aos amigos. O guitarrista segurou Raquel pela nuca, e ela não se importou, jogando os cabelos cor de fogo de um lado para o outro.

Rebecca, incendiada pela droga e pelo ritmo, esqueceu um pouco Bruno, indo se juntar ao grupo.

Ana queria dançar também, mas, quando foi tentar se levantar, levou um tombo e rolou para perto de Bruno. O guitarrista pareceu acordar de um pequeno transe e caiu na risada.

- Ana! Você perdeu a sua cara! - ele falava e ria ao mesmo tempo.

Nunca vamos saber se Ana agiu pelo efeito da droga, da rejeição ou da vontade. Só sabemos que ela agiu. E que Bruno gostou.

A loira ficou de quatro em cima dele, o rosto bem próximo ao seu. A risadinha divertida do guitarrista murchou, dando lugar a uma expressão bem mais... sóbria.

- O que você está fazendo? - ele perguntou.

Bruno nunca havia visto Ana daquele jeito, mas não podia negar que a amiga era mesmo linda. E estava em cima dele!

- Bruno! Você perdeu a sua cara! - ela exclamou, antes de beijá-lo.

Bruno não costumava ir com tanta sede ao pódio, mas o ecstasy falou mais alto. Ele enfiou as duas mãos no cabelo da nuca da loira e a empurrou para o lado, envolvendo as suas pernas em seu quadril. Ana cravou as unhas nas costas de Bruno e os dois ficaram se agarrando no chão.

O gosto de Bruno era doce, quase enjoativo. Ana sentiu o corpo inteiro esquentar, o coração acelerar, as mãos tremerem. O corpo dele colado ao seu era gostoso demais!

Bruno sentia o cabelo macio da amiga entre os seus dedos e a sua boca movia-se com destreza, sua língua era áspera, rápida, sensual. Não queria pensar no que estava fazendo, porque provavelmente iria se arrepender depois, então ia só curtir o momento.

Rebecca, que dançava ali ao lado, parou de dançar e observou a cena, horrorizada. Bruno com Ana, a loirinha simpática das drogas. Ela então olhou para o outro lado, observando Daniel dançar bem animadinho com Raquel.

O seu mundo estava girando, girando, girando...

Ela precisava de ar. Ar, ar, ar!

A morena saiu correndo da edícula com a mão na boca, vomitando todo o almoço de mais cedo no jardim da Sra. Pontes.

Ninguém percebeu a sua fuga; estavam loucos demais para perceber qualquer coisa.


XXX


As mãos fortes de Daniel passeavam pelo corpo de Raquel, mas ela não estava nem aí. Em condições normais, estaria constrangida com alguém apalpando as suas coxas, nádegas, barriga, seios... mas aquela não era uma condição normal. Os seus olhos estavam fechados, a sua cabeça no ritmo da bateria de Eduardo.

Não havia melodia, só a batida.

- Senti a sua falta, Quel - Daniel suspirava, quase gemendo em seu ouvido -, senti mesmo.

- Percebi - ela gritou por cima do barulho, em resposta. - Eu também senti.

- Você já contou para eles como nos conhecemos?

Raquel estancou e virou de frente para o amigo.

- Porque, convenhamos, acho que eles já perceberam que você foi embora de São Paulo quando eu cheguei. Como poderíamos ser amigos? - ele perguntou, piscando para ela.

Raquel empurrou o amigo para longe e enfiou o dedo indicador em seu rosto.

- Se você abrir essa sua boca eu juro que eu te mato! - ela ameaçou, apertando os olhos em sua direção. - Eu não estou brincando, Azevedo!

- Opa! Calma aí, leoa! Não vou contar nada para ninguém - o moreno abriu os braços em sinal de rendição. - Mas quando eles descobrirem, não vão mais achar a fofa da Raquel tão fofa assim...

- Seu escroto - ela xingou e saiu pela porta.

A ruiva passou por Rebecca, que fumava um cigarro ao lado do próprio vômito, e foi até a frente da casa. Sentou-se na calçada e começou a chorar.

Daniel deu de ombros, procurando por Rebecca. Não a encontrou, mas viu o amasso que Bruno dava com Ana no tapete. Não sentiu-se exatamente entusiasmado com aquilo... pensou que Ana fosse diferente. Mas, afinal de contas, elas eram todas iguais...

Ele se sentou no sofá e adormeceu logo em seguida.


XXX


Fabrízio e Luíza ainda dançavam, mesmo Eduardo tendo parado de tocar. O baterista sentou-se no chão e acendeu um cigarro ali mesmo na edícula. Observou a sua garota dançar com Fabrízio, Daniel adormecido no sofá e Bruno rolando com Ana pelo chão. Procurou por Rebecca e Raquel, dando-se conta de que nenhuma das duas estava ali.

Entediado, passou a ouvir a conversa de Fabrízio com Luíza, pegando-a no final.

- Eu vou lá fora um pouco - Fabrízio avisou. - Preciso de um pouco de ar.

- Tudo bem - Luíza mordeu o lábio inferior, lançando um olhar rápido, mas cheio de segundas intenções para Eduardo.

Fabrízio deu um beijo na testa da namorada e saiu. Não percebeu a ausência de Raquel e Rebecca nem o amasso de Bruno e Ana no chão.

Assim que ele saiu, deu de cara com Rebecca sentada no chão, apagando o cigarro com uma cara de poucos amigos. Resolveu não falar nada, pois sabia como a amiga se irritava fácil. Foi então até a entrada da casa, encontrando Raquel chorando.

- Ei, Quel, o que foi? - ele perguntou, preocupado, sentando-se ao lado da ex-namorada. Passou o braço pelo o seu ombro. - Bateu a bad trip?

- N-não... - ela engasgou, chorosa.

Ela apoiou a cabeça no ombro de Fabrízio e ele beijou o topo da sua cabeça.

- Você não quer falar sobre isso? - ele quis saber, e ela negou com a cabeça. - Então podemos conversar sobre...

- Podemos só ficar aqui? Assim? - ela pediu, apertando mais ainda o baixista contra o seu corpo.

Fabrízio sorriu.

- Claro que sim. Deixa só eu pegar uma blusa para você lá dentro, está começando a esfriar! - Fabrízio levantou-se num pulo, correndo até a edícula.


XXX


Eduardo e Luíza beijavam-se com vontade. Daniel estava adormecido e o casal Borges-Anderson estava no maior amasso do século, não se importando nem um pouco com o que acontecia em sua volta.

Eduardo estava com a mão dentro da blusa de Luíza e ela tentava abrir o zíper da calça do baterista.

Aconteceu tudo muito rápido. A porta se abriu, os dois se separaram e Fabrízio abriu a boca, incrédulo.

- O que está acontecendo aqui?

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