foi o que ocorreu
ocorreu-me numa solitária noite, assim como as outras, que eu não precisava de nada senão eu mesmo. podia encarar o céu por minutos a esmo, a lua parecia irredutível acerca da minha proposta para que aparecesse. deixou-me sozinho, porém continha eu mesmo. o céu estava claro, mas não eram as estrelas mortas ou as vivas ou as que lutavam pela sua vida e estavam morrendo aos poucos (assim como eu). quisera eu ser uma estrela, morrer e ainda brilhar por mais um punhado de anos. quisera eu virar poesia dos poetas, para que eu me sinta importante para algo de interessante neste universo. mas não sou estrela, sou polímero. eu morro, mas não sei se faço bem. se faço bem aos outros.
ocorreu-me numa solitária noite, assim como as outras, que o vento aos 27° beija mais quente do que os que disseram me amar. e estirado na cama, meus olhos pesam de terror, se deveria eu amar mais alguém, ou se deveria amar mais eu mesmo. porque o vizinho ligou a luz, o carro estacionou, sujando as casas com teu farol de ondas de baixa frequência. e as roupas sacodiam no varal, quietinhas, não querendo se expor demais. quisera eu estar vendo a lua, para que eu não me sentisse tão só. quisera eu ser a lua, ser poesia de poeta mal resolvido às duas da matina, com seus cigarros, seus cafés amargos e masturbação demorada. porque se viro poesia, eu não sei bem. não sei bem quão profundo pode ser.
ocorreu-me numa solitária noite, assim como as outras, que eu não estava a desejar alguém para aquecer a cama comigo. podia escutar canções o tempo todo, ler o que quisesse, assistir e sentir aquilo [o amor]. mas seria só isso. quisera eu ser o vento, enfiar nos abraços alheios para ser abraçado também e me sentir amado. quisera eu ser o vento, chacoalhar os panos, as tapeçarias, derrubar os potes, roubar calor dos alimentos, dos humanos, dos beijos, dos toques, ser motivo de abraço, ser motivo de aconchego, carinho, cuidado, zelo, amor. porque não sei, entende? não sei se ando fazendo coisas boas a quem eu toco, a quem me acolhe, a quem se recolhe a dormir após falar a mim.
ocorreu-me numa solitária noite, assim como as outras, que estou promovendo a extinção de mim, da minha áurea, da minha felicidade. e nesta solitária noite, quisera eu ser estrela, quisera eu ser lua, quisera eu ser o vento, quisera eu ser eu mesmo. então respirei fundo, fechei os olhos e espalmei as mãos... porque era a primeira vez que eu sentia isso. sentir o desejo de ser eu mesmo. chorei. foi uma solitária noite.
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