Capítulo 18 | Tempestade

Você anda no vale dos reis?

Você anda na sombra dos homens

Quem vendeu suas vidas para um sonho?

Você pondera o modo das coisas

No escuro

Glitter & Gold | Barns Courtney

O carro parou, anunciando que havíamos chegado ao destino. Pelo vidro fumê, observei o lugar deserto para onde viemos, e logo avistei alguns homens com feições asiáticas em frente à construção rústica, acompanhados dos meus. Desci do SUV e segui em direção ao galpão Beta, onde ocorria todo o processo de fabricação de armas. Ao adentrar, vi Wang Hu e seus homens me aguardando.

    — Estou curioso para saber o motivo de me fazer vir aqui, Hu — falei, fazendo minha presença ser notada, enquanto o encarava de forma impassível. Foda-se que ele era um dos maiores líderes da Tríade. Após um longo dia de reuniões desgastantes, eu deveria estar indo para casa descansar e tomar um martini, não vir fazer negociações com um velho que se achava sábio.

    — Paciência nunca foi seu forte, Mitchell — debochou com um mínimo divertimento, o seu sotaque carregado se fazendo presente.

    Tínhamos uma união de negócios há algum tempo. Ele comprava minhas armas por um bom preço e me dava regalias dentro de seu território. Uma troca justa.

    — O que você quer? — Fui direto ao ponto.

    — Estou no prenuncio de um grande conflito e preciso de armamento. — O velho também era precavido.

    Eu havia recebido detalhes por alto de um atrito entre líderes. Era um inimigo à altura, mas não chegava a ser mais poderoso que o homem que estava diante de mim.

    — Não é necessária minha presença aqui para você fazer uma aquisição, meus homens estão aqui para isso — discorri, estava irritado por estar ali.

    — Eu sei que sim, mas, apesar de sua mercadoria ser a melhor, eu preciso das armas mais potentes que você tem a oferecer. Isso me faz querer negociar com o próprio Diabo. — Seu rosto, já marcado por marcas do tempo, sustentava um ar de superioridade.

    Ainda com desagrado, acenei. Ele era um dos meus maiores clientes, nossas negociações me rendiam fortunas. Olhei de relance para Sebastian, que era responsável por aquele lugar, e ele assentiu imediatamente.

    Uma das coisas que mais trazia lucro para máfia era a fabricação de armas. Todos sabiam que eu tinha as melhores e mais eficientes do mercado, e isso fazia com que a demanda por armamento fosse extensa. Hu também sabia que encontraria aqui o que procurava.

    Sebastian nos levou a um recinto onde encontramos duas mesas encobertas com mantos. Aproximei-me e os puxei, revelando uma vasta diversidade de armas em cima das mesas. Todas extremamente mortíferas. Se usadas por mãos erradas, fariam um demasiado estrago. Peguei a mais próxima a mim, já montada, e apreciei o poder que ela me dava ao estar sobre minha posse.

    — Um rifle sniper SVLK-14S. É capaz de atingir um alvo a mais de 4km de distância, dispara balas .408 CheyTac de calibre 10.36x77mm, elas podem perfurar um trilho de três centímetros de espessura. Nenhum colete de balas seria páreo para ele — apresentei-o, com um riso, mesmo tendo em mente que eles já sabiam disso tudo. Hu e os seus ouviam atentamente cada palavra dita, apreciando-as. Coloquei o objeto novamente em cima da mesa e, logo a frente, vi a melhor e também minha preferida. Aproxime-me dela e passei a mão por seu cano. — Você pediu as melhores. Essa é a metralhadora XM307, um lançador de granadas automático. Pode matar seus inimigos a dois quilômetros de distância e destruir facilmente veículos blindados, helicópteros e embarcações a 1000m. Disfere 260 tiros por minuto, com balas de calibre 25x59mm, e tem alcance efetivo de até dois quilômetros, além de possuir fogo supressivo. — Claro que ela obteve maior melhorias em seu desemprenho após os ajustes que meus engenheiros fizeram. — O que você quer, Hu? — repeti a indagação.

    O homem riu e, colocando as mãos nos bolsos, disse:

    — Você nunca me decepciona, Mitchell — afirmou com convicção. — Será uma ótima compra.

Deixei o galpão após concluir a venda milionária.

    Enquanto olhava o movimento do trânsito pelo pela janela, lembrei da noite do noivado, daquela atuação. Do beijo.

    Eu não deveria ficar pensado naquilo, porque foi apenas a porra de um beijo, mas... foi com ela. Ela, que me atormentava desde o dia em que pus meus olhos sobre os seus, que faz minha imaginação pecaminosa fluir. Com necessidades. Vontades. Desejos. E ver aqueles homens cobiçando-a durante a festa me fez ficar possesso. Eles não inibiam o desejo que tinham pelo seu corpo, por aquelas curvas perfeitamente desenhas, por seus lindos e perfeitos seios, e ela estar com aquele vestido sexy para cacete só fodeu mais as coisas. Para fechar a série de irritações da noite, Jacob me informou que Emmy a encurralou no determinado momento em que a deixei sozinha e fui resolver alguns assuntos com Dante. Foi um erro não ter instruído que barrassem sua entrada. De forma orgulhosa, Sullivan ainda afirmou que Magan não se rebaixou à afronta de Emmy, mas isso já era algo esperado por mim. Ela não perdia uma oportunidade para me desafiar, sempre deixando promessas mortais com seus lindos olhos azul cobalto, então por que também não iria fazer o mesmo com a Clarck?

    Senti meu celular vibrar dentro do meu bolso. Ao visualizar a tela, vi o nome de Dante na chamada. Franzi o cenho. Dificilmente o mesmo me ligava. Porém, hoje ele estava com Magan, já que Jacob havia ido para Las Vegas supervisionar os cassinos, então supus que algo de errado havia acontecido. Curioso, debloqueei a chamada e levei o aparelho ao ouvido.

    — O que aconteceu? — pedi, direto.

    — Problemas — Eu sabia o que isso significava. Algo realmente aconteceu com Magan, assim como imaginei.

    Ao fundo da chamada, ouvi vozes frenéticas e alguns barulhos.

    — O que ouve com ela? — indaguei rápido.

    — Não sei como ou porquê, mas ela desmaiou no salão. Eu estava fora do estabelecimento, aguardando que terminassem toda baboseira de mulheres que ela e seus amigos estavam fazendo, mas a amiga dela saiu desesperada de lá, afirmando que a Magan estava inconsciente. — Sua voz, que sempre era controlada, está com um resquício de... Preocupação? Não, provavelmente eu estava enganado.

    Controlei a raiva que crescia em mim ao saber que eles saíram da rota traçada, mas sabia que aquela garota sabia ser persuasiva quando queria. Maldita.

    — Qual o endereço? — Após ele me passar as coordenadas e eu perceber onde eu estava, o respondi rapidamente antes de desligar: — ETA 14 minutos. Esvazie todo o local enquanto não chego.

    Meu olhar cruzou com o de Marco pelo retrovisor e repassei o endereço. Não precisou que informasse a urgência, automaticamente a velocidade do Audi aumentou.

    Dentro do tempo estipulado, ou talvez antes, chegamos no endereço, era um salão de beleza como Dante havia informado. O outro segurança, que também os acompanhava, veio ao nosso encontro e nos levou até onde Magan estava sentada em uma poltrona. A primeira coisa que percebi foi que seu cabelo havia mudado. Suas madeixas que eram longas agora estavam em um tamanho menor e em outra tonalidade.

    Cheguei mais perto e vi que ela estava com os olhos abertos, murmurando coisas sem sentido, enquanto balança a cabeça de um lado para o outro, os lábios tremendo pelo o choro.

    — Ela não. Ela não. Não pode ser — choramingava, angustiada.

    Seu amigo, Austin, tentava acordá-la do transe, mas era em vão.

    — O que diabos aconteceu aqui? — O homem se assustou com meu tom de voz. Ele se afastou dela e se voltou para mim, os olhos assustados e angustiados.

    — Eu não sei, ela entrou no banheiro e depois apenas ouvimos sua queda — relatou o ocorrido, enquanto apontava para uma porta entreaberta, de forma nervosa.

    Passei meus olhos pelo local, logo avistei um objeto no chão, abaixo da pia. Adentrei no banheiro e recolhi o celular que jazia no chão com a tela completamente trincada. Ao ligá-lo e o desbloquear, vi inúmeras ligações não atendidas de um número desconhecido e, ao encarar as duas pessoas assustadas não muito distantes de mim, tive a confirmação de que essas ligações eram para Megan.

    — De quem é isso? — O momento não deveria exigir minha calma, mas busquei mantê-la para não fazer um estrago com todos que estavam aqui.

    — Me-meu, s-senhor — a garota loira gaguejou. Ela estava apavorada.

    Para quem aquela pirralha estava ligando?

    Voltei minha atenção à Mag ao ouvir um soluço rasgar de sua garganta.

    Não sabia o porquê, a sensação de vê-la naquele estado não era boa. Era estranho, mas, de certa forma, eu preferia seu costumeiro jeito irritante.

    Tentando me concentrar na situação que ali se desenrolava, abandonei esses pensamentos sem fundamento e irrelevantes. Cheguei perto de dela e, sem ter a certeza do que se fazer ao certo, coloquei seu pequeno corpo em meus braços.

    — Vamos embora — murmurei para ela, que se aconchegou em meu pescoço, suas lágrimas sôfregas molhando meu terno. — Deixe-os em casa — instruí a Dante. Se eu pudesse ler sua mente, teria a confirmação de que ele estava planejando minha morte de forma lenta e dolorosa por mandá-lo fazer isto.

    Deixei o recinto, ignorando todas os funcionários que assistiam a tudo, preocupados e assustados com tantos seguranças — os mesmos que só agora percebi a presença — e toda minha explosão. Foda-se.

    Entrei no carro, que já estava com a porta aberta, ainda com a garota chorando e agarrada a mim. Essa situação de proximidade e cuidado parecia certa em meu subconsciente, mas eu sabia que era errado. Seu cheiro doce me atormentava a cada segundo. Era único, de forma embriagante e afrodisíaca, viciante. Ouvi-a fungar e lembrei de sua angustia.

    Foi inevitável, a ira me consumiu ao pensar no que ou quem havia feito isso com ela, a deixando assim. Aquelas ligações, quem diabos seria?

    Família?

    Amigos?

    O ex-noivo?

    Apertei o punho quando cogitei a possibilidade. Não, caralho, ela não seria capaz.

    Senti suas pequenas mãos tocarem meu ombro com força e, com uma delicadeza que nunca tive, subi minha mão até seu cabelo macio, acariciando-o. Ainda estava confuso diante disso, principalmente da necessidade que se expandia dentro de mim. O cuidado.

    — O que aconteceu? — Minha voz saiu baixa.

    Esse maricas não é você, Mitchell, me repreendi.

    — El-ela se foi — sussurrou. — A culp-pa é minha qu-que a deixei.

    O quê?

    — Quem se foi? — Deduzi a resposta antes que ela me falasse.

    — A ma-mamãe. Ela morreu — lamentou, como se cada palavra fosse um tiro em seu peito.

    Ela não abaixaria a guarda por qualquer coisa, nem por uma pessoa qualquer. Agora eu conseguia compreender o porquê de seu estado sofrido.

    — Apenas descanse. — E, após alguns minutos ainda chorando, ela o fez, dormindo em meu colo. Suspirei, frustrado por não saber o que fazer. E isso nunca aconteceu antes; sempre conseguia criar uma alternativa em meio ao caos, conflitos, guerras, mas não sabia me portar diante de uma simples mulher chorando.

    Simples mulher?  Repensei.

    A cada dia que convivia com ela percebia que Magan Thompson não era uma simples mulher, e talvez nunca viesse a ser. E isso me fodia como um inferno, pois era totalmente contra o que eu acreditava, contra quem eu era e, principalmente, contra o que apenas queria dela. A garota testava meus limites e barreiras, e, apesar de tentar ignorar, algo me dizia que essa mulher que insistia em me desafiar seria minha ruína.

— Precisa de ajuda, senhor? — sempre profissional e prestativo, Marco indagou após eu descer do carro com Magan ainda em meus braços.

    — Não preciso de ajuda para cuidar da minha mulher — foi tudo o que disse ao seguir em direção à mansão.

    Ele tentou disfarçar, mas vi um lampejo de surpresa em seu rosto. Todavia, não foi apenas ele; eu me surpreendia constantemente com tudo relacionado a Magan, isso era inegável.

    Após entrar em seu quarto, a deixei na cama e me permiti observar seu semblante abatido. Era perceptível que seu corpo ganhou mais peso e sua pele, antes pálida, agora estava mais corada e viva desde que ela chegou. Mas agora o que lhe afligia não era nada biológico, e, sim, uma situação de merda.

    Não seria fácil, eu sabia muito bem daquilo.

    Peguei a pequena mão gelada e senti a energia transmitida pela fricção do toque. Ri de lado ao notar a falta da aliança em seu anelar. Sempre me desafiando.

    — O que será de você, morena?

NOTAS

SVLK-14S: rifle russo de precisão e de longo alcance. É considerado uma das armas mais letais do mundo.

XM307: lançador de granadas americano. É praticamente o M-2, mas com a capacidade de disparar munições de 25mm. O projeto da metralhadora foi cancelado em 2007 devido à baixa taxa de incêndio dos protótipos. Dentro da ficção do livro, Derek retoma o projeto e obtêm êxito no desempenho do mesmo após ajustes em sua fórmula inicial.

ETA: algo como "tempo estimado para chegada".

Eu tô mal pela Mag :(

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Bye!

©K. Lacerda

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