Capítulo 10 | Cartas na Mesa

E eu vou me levantar
Eu vou me levantar como o nascer do dia, eu vou me levantar
Eu vou me levantar sem medo, eu vou me levantar
E eu vou fazer isso mil vezes

Rise Up | Andra Day

A minha mente estava funcionando a mil por hora. Eram muitos acontecimentos, informações, muita merda para alguém poder raciocinar de modo normal.

    Poucos meses atrás eu era apenas uma jovem do interior que não conhecia nada além de seu monótono mundinho. Eu queria viver, sair da mesmice, mas isso era de mais, esse fodido rumo que minha vida tomou ultrapassou todo o meu limite de expectativa, frustrando-me e assustando de maneira colossal. Em pouco tempo, eu fugi de um casamento forçado, abandonei minha família, fui sequestrada e quase abusada, matei um homem — isso que algo que me assombrava como o inferno —, fui vendida para um idiota e estava fadada a fazer exatamente aquilo que me incentivou a fugir e ''viver'': casar-me contra minha vontade.

    Sim, a vida é uma cadela irônica.

    Quando escutei toda aquela conversa no galpão a ficha caiu e entendi a merda em que eu estava. Saí totalmente do plano físico, eu queria apenas sumir, não existir, fugir do presente e ir para o abraço carinhoso da mamãe. Apesar de ter todas as evidências estampadas ao meu redor, eu ainda tinha uma mínima esperança de que aquele idiota, que apareceu no galpão em meio ao caos, seria minha salvação, me devolveria as rédeas de minha vida. Mas eu fui uma completa iludida e idiota por ter acreditado, mesmo que por um fio, na sua bondade. Ele era exatamente igual aqueles fodidos que me jogaram naquele quarto e maltrataram. Ele era desumano, um ser desprezível, o diabo, como se nomeava.

    E eu iria ser aquilo que o Maison queria que eu fosse, por vontade de um monstro igual a ele ou até mesmo pior. Ele, o homem à minha frente, queria que eu me tornasse sua mulher, a mãe de seu filho, provavelmente um objeto que usaria e comandaria à sua vontade. Eu queria muito lhe confrontar, lhe mandar à merda, atacá-lo com todas minhas forças, fugir desse lugar. Mas eu não podia. Não podia colocar a vida das pessoas que eu mais amava em risco por causa de minha desgraça. Não. Eu iria preferir morte a vê-los sofrer.

    Precisaria fazer o que ele queria, seria o que uma mulher nunca devia ser, mas isso não iria sair barato. Não. Eu iria infernizar sua vida, iria fazê-lo se arrepender de ter me escolhido, de ter me jogado nesse jogo sujo. Ele dizia que eu estava no inferno, mas não conhecia a força de uma mulher decidida.

    — Qual a idade de seu filho? — olhei-o de relance, contemplando toda sua postura centrada.

    Nunca imaginei que iria ser uma babá, mas aqui estava, à mercê da mente insana desse homem.

    O canto de seu lábio se erguei levemente, a sombra de um sorriso dançando em seu rosto diabolicamente belo. Como ontem, ele estava de terno, seu porte elegante o remetia a um homem de negócios. Sua beleza era inegável — cheguei à conclusão de que era um grande desperdício alguém tão sujo possuir tamanha qualidade.

    Mas foram suas palavras seguintes que me fizeram piscar em surpresa.

    — Eu ainda não o coloquei em seu ventre, Magan — a voz grave informou.

    Fiquei perdida com suas palavras, mas a confusão se dissipou rapidamente. Travei o maxilar, eu só via vermelho.

    — O quê?! — esbravejei, eu um rompante.

    Que merda é essa?

    — É exatamente isso que ouviu. Você será a progenitora de meu filho, esse foi o principal propósito por trás de sua compra e do nosso casamento que está por vim — disse calmamente, como se estivesse comentando sobre o tempo e não tomando a decisão sobre duas vidas, a minha e a dessa criança que sua mente insana desejava.

    Cacete.

    — E eu achando que isso não iria piorar. Puta merda. O inferno que eu irei ter um filho de um monstro como você! — falei. Minha perplexidade só era menor que minha raiva. — Por que simplesmente não arruma uma barriga de aluguel, paga outra mulher que esteja disposta a se submeter a isso? Aposto todas minhas fichas que malucas que aceitariam esse absurdo não faltam. — Estava lutando para que ele mudasse de ideia, que me libertasse disso.

    Mas acho que sou uma idiota por ainda ter esperanças.

    Ele me observava de forma intensa, diria até que estaria lendo a minha alma com seu olhar penetrante.

    — Sua boca suja e esperta não tem filtro — observou, seriamente, mas vi que estava se divertindo com minha explosão. Bastardo. — Eu não quero apenas uma barriga para gerar meu filho, quero alguém que o eduque, que o dê carinho e essas merdas que normalmente as pessoas precisam.

    Franzi o cenho. As pessoas? Todos precisavam disso, ora, ele não?

    — Uma coisa é você querer estragar a minha miserável vida, outra totalmente diferente é querer colocar uma criança inocente no mundo de forma tão... — Nem nomear aquilo eu conseguia. Estava tentando manter a calma e o senso. — Isso é insano. E, além disso, você não irá me tocar! — declarei com veemência. Nossos olhos travavam uma batalha árdua, e, se fosse possível, eu já o teria desfigurado toda esse seu rosto perfeitamente esculpido com minhas próprias mãos.

    — Isso acontece normalmente em meu mundo, eu estou sendo gentil com você, garota, muitos estariam te tratando de forma realmente desumana — ele disse, seu rosto sombrio, sempre mantendo o semblante imponente. — E eu não irei te tocar enquanto você não quiser, o farei apenas com sua permissão — declarou, vagarosamente, por fim, enquanto se aproximava da cama com poucos passos.

    Uma parte de mim, a parte quebrada, ficou aliviada ao ouvir aquilo, mas eu não podia acreditar em suas palavras vazias. Ele não iria me enganar apenas pagando de bom moço, não seria ingênua a esse ponto.

    — Se depender de mim, irá morrer esperando minha aceitação. Não nunca irei ser sua puta — soltei as palavras com nojo.

    Antes de tudo, um mês atrás, eu desejei, por algumas vezes, esse homem, o sujeito belo e misterioso que me tirou do sério naquela noite — mesmo que eu tentasse negar, aquela era verdade. Mas era um cenário diferente, eu não o conhecia, não havia passado por tudo aquilo. Estava às cegas. E, agora, após tirar a venda, tudo o que eu queria dele era distância.

    — Você não será minha "puta'', será minha esposa — Sua sobrancelha escura se ergueu minimamente. — Dizem que nunca se deve dizer "nunca".

    — Olha só, nunca imaginaria que você ouvia Justin Bieber — ironizei enquanto rolava os olhos, depois o vi ficar confuso.

    — Quem? — perguntou, franzindo o cenho, o que evidenciava seu desentendimento

    Em que mundo ele vivia?

    — Esquece.

    — Você precisa tomar esses medicamentos e seguir a dieta que se encontra na receita. — Seus olhos recaíram em um ponto específico, apontando para a sacola em cima de uma elegante poltrona de cor cinza no canto do quarto e um papel que estava visível sobre uma cômoda branca perto do outro móvel. — Está em um estado de desnutrição alarmante, é necessário que siga tudo que foi requerido pelo médico.

    — Médico? Que médico? — indaguei, confusa. E foi então que lembrei da agulha que estava enfiada em meu braço quando acordei.

    — Você desmaiou em meus braços ontem quando chegamos e, vendo seu estado, requeri que o médico lhe examinasse. — Não lembrava de nada daquilo.

    Nos braços dele?

    — Não espere de mim um agradecimento por ter o chamando — atirei.

    — Eu não costumo esperar nada positivo das pessoas, isso é idiotice. Esperar o pior é o mais sensato a se fazer — ele disse com a voz rouca e lenta. — Então, não, eu não me importo com isso.

    Ele não poderia ser menos estranho, cacete?

    Ouvi e senti meu estômago reclamar da fome e tentei engolir o constrangimento ao notar que ele aparentemente também ouviu.

    — Desça e se alimente, a mesa está posta no andar de baixo — informou, já se dirigindo em direção à porta, mas se voltou para mim novamente, provavelmente ao lembrar-se de algo. — Precisa comprar roupas novas, irei providenciar seguranças para acompanhá-la ao shopping. E, como eu disse ontem, não faça nada de estúpido ou suas ações serão pagas com a vida dos seus — E lá estava a ameaça que me assombrava, novamente.

    Eu estava perdida.

    — Não irei — murmurei, engolindo em seco.

    Ele me observou por um tempo, como se estivesse em algum conflito. Até que falou:

    — Pode ver seus amigos, o Austin e a Anne, pode levá-los com você.

    — O quê? — Ele sabia de tudo. — Claro que não, não vou arriscar a vida deles assim.

    Era perigoso demais.

    — Não há riscos, tudo depende de você. — O semblante dele estava sério, mas possuía pequenos resquícios de hesitação. — Eles estarão totalmente seguros enquanto você seguir na linha. Já sei tudo sobre eles, não se tem o que proteger ao tentar escondê-los mais.

    Era tentador, eu estava com saudades e também sabia que eles estavam sofrendo por meu sumiço. Fechei os olhos e pensei. Talvez eu me arrependesse eternamente, mas a saudade era tão dolorosa.

    Suspirei.

    — Que dia é hoje?

    Ele estranhou minha pergunta, mas a respondeu:

    — Quarta, 22.

    — 22? — exclamei, aturdia.

    Assentiu levemente com a cabeça.

    — Puta merda, se passou um mês. — Mês esse que, com todo sofrimento que passei, me pareceu anos.

     Notei que hoje era o dia de folga de meus amigos.

    — Irei vê-los — decidi após engolir o nó que fechava minha garganta.

    — Jacob acompanhará você à tarde.

    — Quem é Jacob?

    — Isso não é da sua conta — disse, rude. — Preciso ir, já ocupei muito meu tempo. Fique na linha, Thompson.

    Ouvi o impacto da porta após sua saída.

    Fiquei encarando por minutos o local pelo qual ele havia passado, enquanto imaginava quais seriam minhas próximas ações.

    O que eu vou fazer da minha vida agora? Era essa a indagação martelava em minha mente, que alimentava meu desespero nesse momento.

Olha eu aqui de novo, com capítulo novinho pra vocês!

Que embate foi esse? Será que a morena vai mesmo conseguir infernizar o juízo do Derek?

Deixe seu voto, serei grata por ele.

Também queria dizer que Nova Aquisição agora tem uma playlist no Spotify, pra embalar ainda mais a leitura da trama. O link está disponível em meu perfil.

Goodbye!

©K. Lacerda

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