Capítulo 1 | Sentença
Eu tive um sonho, eu tinha sete anos
Escalava meu caminho em uma árvore
Eu vi um pedaço do céu
Esperando, impaciente, por mim
Runaway | Aurora
A M A R I L L O , T E X A S
P R E S E N T E
Tédio.
Essa era a definição para minha vida ridiculamente monótona.
Virei-me na cama, para ficar frente a frente com o teto. Sinceramente, eu não me via morando naquele fim de mundo pelo o resto de minha vida, a única razão para não ter indo embora de Amarillo, uma pequena cidade no interior do Texas a qual morávamos próximo, era minha família. Família essa que, com exceção de meu irmão Jack, sonhava em me ver casada com o bastardo do Maison Reagan. Não que eu fosse contra me casar um dia, por Deus, não. O problema era me casar com ele. Balancei a cabeça para evitar pensar nesse absurdo. Patético.
Decidi me levantar, já de saco cheio de ficar refletindo sobre a vida. Observei meu quarto, franzindo o cenho ao observar as cortinas com uma cor azul de aspecto infantil. Precisava trocar aquilo urgentemente.
Meu quarto não era um ambiente consideravelmente grande, ficava no sótão, mas, em compensação, era muito organizado e aconchegante para uma garota de 23 anos. Marchei em direção à porta, seguindo para cozinha. Nossa casa era uma construção com poucos cômodos, um lar aconchegante para família simples do interior.
Ao chegar na cozinha encontrei mamãe. Dona de um amável e doce coração, Margareth Thompson era uma mulher linda no auge dos 47 anos, tinha olhos azuis que ambos os filhos gêmeos herdaram, um rosto delicado e com poucas marcas de idade, sua pele era levemente bronzeada, detalhe que a deixava ainda mais bela. Constantemente me falavam que eu era sua cópia da juventude. Quem eu era para discordar?
— Precisa de ajuda, mamãe? — indaguei, desejando participar do preparo do jantar. Era algo que eu gostava muito de fazer, sempre foi um momento de conversas e risadas. Amava estar em sua presença.
— Não, querida, já está quase tudo pronto — respondeu-me com a voz doce.
— Onde Jack e papai estão? — indaguei. — Não os vi durante toda a tarde.
— Acredito que estejam no armazém checando o novo estoque para a entrega — explicou, para depois me encarar com uma expressão receosa. — O Reagan veio aqui hoje para falar com seu pai.
Soltei um gemido de insatisfação. Eu sentia que o teor daquela conversa não me agradaria em nada. Droga, o Reagan, não.
— A senhora sabe sobre o que eles conversaram? — murmurei, tentando não transparecer minha preocupação eminente.
— Não, seu pai não falou comigo sobre isso — disse, já virando as costas para mim. Continuou a cortar alguns legumes na bancada. — No entanto, suspeito que seja algo relacionado a você.
Nesse momento eu engoli em seco. O que poderia ser, afinal? Nada de bom, pensei. Maison Reagan era um homem que poderia ser considerado desprezível. O belo rosto e corpo serviam apenas como máscara para encobrir seu verdadeiro "eu": um interior podre que o fazia um verdadeiro mau caráter. Ele era dono de uma fazenda bem-sucedida próxima à nossa e era alvo das piores especulações possíveis, todavia, não o odiava apenas por isso. Sentia asco sempre que tinha seu olhar nojento sobre meu corpo, as palavras grosseiras carregadas de maldade sempre me enojavam. Maison sempre teve uma implicância comigo, sempre insistira em termos um relacionamento, ato que só aumentou após minhas constantes negativas.
— Torço para que aquele idiota não tenha vindo falar sobre nada relacionado à sua obsessão doentia — falei, em cansaço, enquanto me recostava na parede próxima a mim.
— Não é uma obsessão doentia e você não deveria falar assim de seu noivo — ouvi a voz grave e autoritária do meu pai, próxima a mim, e pisquei repetidas vezes para processar o que acabava de ouvir.
Juntei minhas forças, me preparando para mais uma discussão com meu pai, e o encarei perplexa. Dizer que eu estava chocada naquele momento seria o eufemismo do século.
— O que?! — indaguei, ainda sem acreditar no que tinha ouvido. — O senhor só pode estar de brincadeira comigo, essa é a única explicação plausível para o que acaba de dizer. — Ri com nervosismo.
— Não é uma brincadeira, e, como prova disso, amanhã vocês iram discutir sobre a data do casamento. Iremos marcá-lo para o próximo mês — disse, apenas, como se estivesse comentando que o dia está ensolarado em pleno verão.
Ri, amarga.
Não, não. Eu não vou me submeter à essa merda. Não, mesmo.
— Eu nunca irei me casar com aquele verme — avisei, tentando manter a calma diante daquela situação absurda. — Prefiro a morte a viver uma vida de "esposa feliz" ao lado do mal caráter do Reagan.
Encarei o homem à minha frente. James Thompson, meu pai, eraum senhor conservado para sua idade,estava na casa dos 53 anos. Dono de mechas castanhas já com fios grisalhos,olhos escuros, porte grande e forte, e uma carranca que sempre o acompanhava. O homem que deveria querer minha felicidade, que deveria desejar o melhor para mim.
Como ele pode ser assim? Como ele pode fazer isso?
— Isso não é algo que está em discussão. Eu já tomei minha decisão e dei minha palavra ao Maison. Espero que amanhã receba bem seu futuro marido.
— Por que está fazendo isso?
Por Deus, aquilo era um pesadelo. Um fodido pesadelo.
— Estou pensando no melhor para seu futuro. Apenas aceite, Magan.
— O melhor? — desdenhei, soltando uma risada desprovida de humor. — Claro, deve ser maravilhoso viver para sempre nesse fim de mundo casada com um verme controlador e nojento — ironizei, com o tom de voz ácido.
— Eu e sua mãe sempre vivemos aqui e somos felizes — retrucou, mostrando uma impaciência crescente com a conversa. — E, além disso, o Maison deu sua palavra, ele cuidará bem de você.
— Você e a mamãe se amam, é um cenário completamente diferente! E, além disso, não é como se a palavra dele tivesse algum valor. Eu não vou me submeter a isso, o senhor sabe que sempre sonhei em ir para Nova Iorque, entrar em uma faculdade, ter minha independência. Seu eu me casar um dia será por amor e não porque o senhor quer ou acha conveniente — pontuei o óbvio. — Em que século estamos, afinal?
Antes de me dar as costas, ele me encarou e disse, dando seu veredito final:
— Não quero ouvir mais nada, já disse que minha decisão está tomada e no próximo mês você será a senhora Reagan.
Só por cima do meu cadáver.
Rolei mais uma vez na cama.
Não conseguia dormir, estava sendo impossível pregar o olho enquanto minha mente era bombardeada por uma enchorrada de pensamentos. E nenhum deles eram bons. Eu não poderia simplesmente aceitar o fato de que minha vida iria tomar um rumo tão lixo, precisava fazer alguma coisa, urgentemente. O difícil era pensar no que fazer, mas eu tinha que tentar.
Tinha que encontrar uma saída para essa merda em que me meti.
Acordei com uma enorme esperança de que tudo não tivesse passado apenas de um pesadelo. Mas, como minha pessoa era um poço de sorte, as memórias de ontem à noite confirmaram meu pesadelo real.
Suspirei frustrada, enquanto cobria o rosto com as mãos.
Após uma noite horrível de sono, levantei-me do emaranhado de cobertores quase aos tropeços, me arrastando. Parei diante do espelho, vendo meu estado deplorável. Meu cabelo era a representação de um ninho de pássaros: as madeixas longas e negras estavam totalmente embaraçadas. Já em meu rosto a situação era pior, abaixo de meus olhos haviam bolsas escuras, evidenciando as poucas horas de sono. Bufei, tentando me preparar para mais um dia. Para uma batalha.
Alguns minutos depois eu já tinha amenizado minha aparência sofrida — se antes eu estava parecendo um monstro digno de filmes de terror, agora chegava perto de um zumbi recém saído de um dia de beleza. Era um progresso, mínimo, mas era. Por portar um monstro faminto em meu estômago, desci contra minha vontade para tomar café da manhã. Poderia suportar muitas coisas, mas não a fome.
Quando cheguei na mesa para tomar café da manhã, encontrei meu pai, mamãe e Jack.
Jack, como irmão gêmeo que era, carregava traços semelhantes aos meus. . Se eu não fosse sua irmã diria que ele era atraente.
Credo.
Ele sempre foi um irmão carinhoso e amável. Era um amante de leitura, vivia enfurnando em livros durante seu tempo vago. Durante toda vida se colocou à frente do meu pai ou de qualquer outra pessoa para me defender. Chegava a ser ciumento comigo, principalmente durante nossa adolescência. Nesse tempo ele tentava manter qualquer indivíduo humano que tivesse um pau entre as pernas afastado de mim. Isso resultou em relacionamentos fracassados e minha quase desistência em tentar me envolver com alguém, mas, depois de discussões e conversas sinceras, eu contornei a situação e dei um basta em seus surtos ridículos. Ele não opinava mais em meus relacionamentos, mas ainda era possível ver uma faísca de irritação em seus olhos ao tocar no assunto.
Poderia ser cômico se não fosse trágico.
Aproximei-me da mesa repleta de guloseimas e me sentei ao lado de mamãe.
— Bom dia, família — desejei, já colocando um waffle aparentemente delicioso no prato que estava à minha frente.
— Bom dia, maninha — Jack respondeu com um sorriso de lado, seu rosto era portador de uma expressão carinhosa.
— Bom dia, meu amor — minha mãe disse, amável.
Encarei meu pai que estava concentrado em sua refeição e busquei ignorá-lo.
— Como passou a noite, pirralha? — Rolei os olhos ao ouvir o apelido ridículo.
— Você sabe que não pode me chamar de pirralha, temos a mesma idade. — Eu já tinha falado aquela frase um milhão de vezes, mas ele sempre rebatia, dizendo que nasceu 4 minutos antes de mim. — E, respondendo sua pergunta, essa foi a pior noite da minha vida. — As palavras saíram ácidas por meus lábios enquanto eu olhava de relance para meu pai.
Meu querido irmão franziu o cenho e me encarou com um misto de confusão e preocupação em seu rosto que antes carregava diversão.
— O que aconteceu? — Seus olhos cerraram enquanto me analisavam de forma ansiosa.
Eu não queria iniciar uma discussão logo cedo, muito menos na frente da mamãe, mas já era tarde demais.
— Estava pensando em meu casamento. — Dei de ombros enquanto falava, para depois colocar um pedaço de waffle na boca. Estava realmente delicioso.
— Casamento?! — disparou, as palavras incrédulas. Ele estava perplexo. — Mas... como? Você nem tem namorado. O que está acontecendo? — Percebi que ele estava tentando se controlar.
Meu pai finalmente me encarou, mantendo o contato com meus olhos enquanto respondia a indagação de Jack.
— Ela irá se casar no próximo mês com Maison Reagan — retrucou, o rosto impassível.
Jack o encarou com descrença, como eu tinha feito ontem, e, em seguida, seu rosto tomou uma tonalidade vermelha que evidenciava sua fúria. Isso não vai resultar em algo bom.
— Ao inferno que ela irá se casar com aquele pedaço de merda. Eu não vou permitir isso! — Sua fala não me surpreendeu, Jack sempre zelava por meu bem.
— Jack, calma... — Tentei, em vão, apaziguar a situação, mas a bomba já tinha estourado.
— Calma?! Você também está compactuando com este absurdo?!
Paciência, de fato, nunca foi seu forte.
— Não! — neguei. — Eu não estou de acordo com isso e você melhor do que ninguém deveria saber. Apenas não quero mais uma discussão.
Ignorando-me totalmente, meu irmão se voltou para meu pai, a raiva ainda presente em sua face.
— Por que ela vai se casar com o fodido do Maison? — indagou. — Que palhaçada é essa?
— É o melhor para ela, Jack. Maison a ama e ela será feliz ao seu lado — papai disse, decidido e convicto de sua decisão.
Grande engano, pai, grande engano.
— Ela nunca será feliz ao lado daquele lixo de homem. O senhor por acaso sabe as coisas que ele já fez e faz? Sabe que ele é um maldito que abusa de mulheres?! Acha que um homem desse fará a Mag feliz?!
Percebi que o sr. Thompson se abalou com as palavras de Jack, sua imposição vacilou por segundos, mas ele buscou camuflar suas feições.
— Essas coisas são apenas especulações inverídicas de pessoas que não gostam dele, Maison não é esse tipo de homem. E não há mais o que se discutir, está decidido! — reafirmou.
Não havia mais volta, eu sabia.
— James... — Eu via dor nos olhos de mamãe quando ela o chamou.
— Se aquele verme puser as mãos em cima de minha irmã, ele será a porra de um homem morto. Morto! — disferiu enquanto se levantava da cadeira de forma abrupta. — O senhor, James Thompson, deveria sentir vergonha por ser um pai tão ruim — ele disse, para depois marchar em passos duros na direção de seu quarto.
— Tarde demais. Eu já sinto vergonha de ser sua filha — murmurei de modo quase inaudível.
Como prometido, voltei com o primeiro capítulo.
Será que a Mag irá simplesmente aceitar esse casamento maluco? O que será que o maninho irá fazer em relação a isso?
Espero que tenham gostado.
Bye!
©K. Lacerda
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