Ilha do Tormento

Kim Taehyung

Anos atrás…

— Termine de ler seu livro Taehyung, não se distraia — sua mãe o repreendeu.

— Mas mãe… Eu queria sair para brincar — disse vendo as outras crianças brincando no campo.

— Se você terminar de ler esse livro até amanhã, deixo que brinque com elas o dia todo — ela disse com sua usual rigidez.

Taehyung bufou, mas voltou a ler o livro que sua mãe lhe deu, embora não fosse a leitura mais agradável do mundo, estava aprendendo sobre cartografia, passou algumas horas entretido com as informações contidas nas páginas. Taehyung não podia estudar junto às outras crianças na escolinha, por conta da má fama de sua mãe e dos crimes de seu pai, ele era uma criança sozinha e estudava em casa, com diversos livros. Mas aquele não era o verdadeiro motivo de ficar sempre em casa, pois sua mãe nunca ligou para o que as más línguas diziam sobre ela, o verdadeiro motivo era o que estava levando-o a deitar a cabeça na mesa. Elisa parou o que estava fazendo ao estranhar seu silêncio, virando seu pescoço para que pudesse encará-lo.

Sem dizer uma única palavra ela caminhou em sua direção, colocando as costas de sua mão sobre sua bochecha, ela ficou em silêncio por alguns segundos, antes de caminhar até o quarto que dividiam em seu casebre. Taehyung sentia-se mal, sabia que estava com febre, como acontecia em muitas luas e sóis, tinha um corpo fraco, adoecia com muita frequência, por isso sua mãe nunca o levava a escola, pois temia que algum inimigo de seu pai o pegasse enquanto estivesse enfermo, visto que não teria como se defender. Elisa voltou pouco tempo depois, colocando um casaco sobre os ombros de Taehyung antes de pegá-lo no colo e caminhar para fora do casebre.

— Aguente mais um pouco Tae — sua mãe disse deitando sua cabeça sobre o ombro esquerdo dela.

(...)

— Por favor, eu já o levei a diversos curandeiros e médicos, mas ele sempre volta a adoecer — ouviu sua mãe conversar com uma mulher e uma garota.

Taehyung estava sentindo-se mal, mas abriu os olhos, observando-a conversar com uma mulher grávida, ela tinha cabelos prateados e olhos extremamente azuis, “tão linda que parecia uma boneca” ele pensou. Já a outra era uma jovem, tinha cabelos castanhos escuros e olhos verdes, tão bonita quanto, havia algumas tatuagens espalhadas por seu corpo e estava enfeitada por diversas jóias. A mais jovem lhe encarava, parecia em transe olhando em sua direção, até que seu olhar desviou de si para a barriga da mulher de cabelos prateados, sorrindo logo em seguida. Ela chamou a atenção de sua mãe, dizendo algo que não pôde escutar devido à distância, mas que quer que tenha sido, fez sua mãe sorrir.

— Segure ele direito! — Um homem gritou à sua direita, fazendo seu olhar se direcionar a ele.

Taehyung viu dois homens puxando uma rede de pesca na orla do mar, arregalou os olhos ao ver o tamanho do peixe, até que constatou que na verdade era um tubarão, que se debatia na rede, tentando voltar para o mar. Um dos homens pegou um pedaço de madeira, batendo no focinho do tubarão, o que fez Taehyung se endireitar na cadeira que estava sentado, horrorizado com a cena que havia acabado de presenciar. O tubarão ainda se debatia, mas agora com menos intensidade que antes, sentindo pena do animal, levantou-se de sua cadeira, segurando o casaco que sua mãe lhe deu com força, caminhando para fora da varanda onde estava sentado. 

Ainda sentia-se febril, o que o deixava mais lento que o normal, mas ainda assim caminhava até a areia, indo em direção ao barco dos dois homens. Eles estavam distraídos com sua pesca, o que lhe deu uma vantagem, caminhou o mais silenciosamente possível até o barco deles, colocou suas pequenas mãos febris sobre a madeira e usou toda a sua força para empurrá-lo para o mar. Demorou um pouco, mas conseguiu fazer com que o barco entrasse na água, dando a ele um pouco de impulso, vendo-o lentamente se distanciar da praia. Taehyung olhou para o lado, vendo os homens sentados sobre o tubarão, para cessar seus movimentos, mas quando deduziu que o barco estava distante o suficiente, decidiu colocar seu plano de salvamento em prática.

— Oh não… — Disse um pouco mais alto do que precisavapara ser ouvido, chamando a atenção dos dois homens. — O barco está indo embora! — Apontou para o mar, onde o barco estava, a distância era grande, se não se apressassem a correnteza o levaria ainda mais para o fundo.

— Puta merda! — Um dos homens gritou antes dos dois correrem para dentro d'água e começarem a nadar.

Taehyung correu em direção ao tubarão, vendo-o imóvel sob a rede de pesca, por isso apressou-se em remover a rede, que enganchou em suas barbatanas. Quando terminou, o tubarão ainda permanecia imóvel, mas suas guelras ainda se moviam, então correu até o mar e juntou suas mãos em formato de concha, pegando o máximo de água salgada que conseguia e correu até o tubarão, jogando sobre ele. Ele fez isso mais algumas vezes, até se ajoelhar ao lado do animal e sendo vencido por sua curiosidade, colocou sua palma sob as escamas dele, sentindo-o frio e escorregadio. Os olhos do tubarão ainda se moviam, tinha certeza que estava encarando-o, então sorriu para ele, acariciando suas escamas.

— Está doendo muito? — Perguntou baixinho. — Vai ficar tudo bem, vou pedir para a minha mãe te colocar na água de novo, ela é uma mulher bem forte!

Quando Taehyung iria se levantar, algo no tubarão chamou sua atenção, pois ele começou a se dissolver em uma fumaça densa e cinza, sendo levado pelo vento e sumindo no céu azul. Nunca havia visto algo como aquilo, já viu alguns animais partirem, mas nunca daquela forma, imaginava que era um jeito único dos tubarões morrerem. Quando desceu seu olhar para onde o tubarão estava anteriormente, viu uma pedrinha brilhante na areia, era um cinza prateado muito bonito, havia um desenho no meio dela, que chamou sua atenção. Curioso como era, pegou a pedrinha em suas mãos, estranhamente sentiu-se melhor ao tê-la em sua palma, como se seu mal estar tivesse saído quase por completo.

— Tae? — Elisa o chamou, fazendo-o virar-se para encará-la. As duas mulheres estavam ao lado dela na varanda, observando-o. — O que está fazendo?

— Olha mãe! O tubarão se transformou em uma pedra! — Taehyung correu em direção a ela, mostrando a pedrinha.

— Nossa que bonito! — A mulher grávida de cabelos prateados disse, curvando-se em direção a ele. — Isso é um presente dado a pessoas muito especiais.

— Sério? — Ele olhou para sua mão. — Uma pedra?

— É uma pedra especial — a mulher mais jovem riu, caminhando em sua direção e pegando a pedrinha. Taehyung viu ela enrolando-a em um cordão e depois passando-a por seu pescoço. — Guarde-a com muito carinho, pois ela lhe dará muita força.

— Tudo bem — ele disse olhando para a prendinha pendurada em seu peito.

— Vamos entrar Tae, a Amélia vai lhe ajudar a não ficar mais doente — ofereceu sua mão, que Taehyung não demorou a aceitá-la com alegria.

(...)

Tempos atuais…

Taehyung acreditava que o amor verdadeiro era aquele que as mães sentem por seus bebês ao nascerem, o amor de um pai ao pegar seu filho no colo pela primeira vez, o amor de um cão por seu dono, o carinho de uma avó por um neto e todos os tipos de laços fraternais. Nunca acreditou que a paixão por uma pessoa desconhecida fosse algo sincero, não acreditava que poderia vir a amar alguém no futuro com a intensidade que as pessoas descrevem em livros, até porque, não tinha bons exemplos em casa. Seu pai era um grande babaca, engravidou sua mãe e lhe deixou, voltando de tempos em tempos apenas para tê-la na cama e desaparecia novamente.

Nunca entendeu porque sua mãe, uma mulher tão forte e decidida, se submetia a um relacionamento como aquele, sendo que ele tinha uma família com outra.

“A paixão nos deixa cego Tae” foi o que ela lhe disse uma vez. “Por isso não se apaixone, pois este será seu pior erro, o amor nos deixa idiota a ponto de aceitar migalhas achando que é um banquete”.

Sabia que aquelas palavras eram verdade, sua mãe amava seu pai, por conta das migalhas que recebia em seu relacionamento, ficava extremamente feliz quando ele fazia o mínimo, sendo que ela merecia muito mais. Decidiu que jamais deixaria alguém amarrá-lo como seu pai fez com ela, mas tudo mudou no dia que Amélia disse que era predestinado a encontrar sua felicidade em uma única pessoa, que ela seria o centro de seu universo, seu porto seguro e sua âncora quando o mar de seus pensamentos ficavam agitados demais. Passou anos fingindo que não havia ouvido o que ela lhe disse, mas depois de um tempo observando casais se formando, vendo a felicidade estampada no rosto deles pensou o porquê estava se privando de experimentar algo assim.

Até Jungkook aparecer.

De início não viu nada mais que um homem bonito, um desertor e golpista que certamente estava esperando o momento exato de apunhalá-lo pelas costas, mas com o passar do tempo começou a gostar de provocá-lo, assisti-lo perdendo a calma em sua presença, tão arisco quando um gatinho. Começou a se encantar pela forma apaixonada que ele olhava para coisas novas, como uma criança ao descobrir o mundo fora da porta de sua casa, como ele parecia prezar a família mais do que tudo, embora escondesse segredos, sua maneira de ser era extremamente sincera e genuína. Ao seus olhos, ele sempre fora o mais bonito dos homens, o mais forte e o mais encantador.

Mas nada se comparava ao que estava vendo agora.

Sabia que morreria no momento que viu os paredões de água se desfazerem, aquelas ondas imensas iria matá-los sem qualquer chance de sobrevivência, apenas abraçou o corpo do homem que lhe deu um propósito, que lhe fez experimentar o doce sabor de estar apaixonado. Estava arrependido de tê-lo trazido consigo, de tê-lo convencido a ir naquela aventura junto a ele, agora ele agonizava em dor e sangue em seus braços, morrendo por conta de sua ganância, queria que tivessem um destino diferente, queria poder sentir mais daquele sentimento que o fazia perder a linha. Estava pronto para abrir mão de tudo aquilo ao ver as imensas ondas curvando-se sobre ele.

Mas ao contrário do que imaginou, a água não os engoliu.

Jungkook chorava tremia, agarrado a sua blusa, quando abriu seus olhos viu o oceano sobre sua cabeça, fazendo-o perder o fôlego por alguns segundos, estavam em uma espécie de esfera, podia ver a correnteza do mar agitado arrastando diversos peixes e algas marinhas. A água não tocava seu corpo, ficando alguns centímetros longe, mantendo-o completamente seco e com oxigênio, isso fez com que se preocupasse ainda mais com Jungkook, pela força que ele estaria fazendo para mantê-los seguros a uma profundidade tão grande. A lembrança de vê-lo cuspindo sangue, tendo espasmos e gemendo de dor não saia de sua lembrança, por isso movido pela preocupação afastou-se, para que pudesse encará-lo.

De início ele parecia como antes, um tanto letárgico, o sangue ainda sujava seu rosto e roupas, mas o que chamou sua atenção foram seus olhos, Taehyung estava acostumado com um castanho escuro intenso, mas naquele momento, estavam em uma mistura de cinza opaco e azul. Ele parecia estar respirando fundo, ainda agarrado a sua blusa, como se estivesse se recuperando de um choque, seus cabelos de repente começaram a perder sua coloração, tornando-se brancos, desde a raiz até o comprimento, de maneira lenta, até que seus fios estivessem completamente brancos. Taehyung estava completamente sem reação, chocado com a cena que acabara de presenciar, mas algo chamou sua atenção, as lágrimas de Jungkook.

— O que houve? — Perguntou preocupado.

— A runa… — Disse mostrando sua palma, onde a runa estava em pedaços. — Ela quebrou enquanto eu tentava conter os paredões. — Após sua fala, a runa dissolveu, tornando-se poeira, assim como o tubarão que lhe presenteou anos atrás. — Ela foi um presente da minha mãe para meu pai e que foi passada a mim depois de sua morte.

Jungkook parecia estar extremamente sensível e triste por conta daquilo, o que o fez abraçá-lo novamente, ouvindo-o chorar próximo ao seu ouvido, queria poder arrancar aquela dor de seu peito, mas tudo o que podia fazer oferecer seus braços como apoio. Após alguns segundos, Jungkook se recompôs, fungando e limpando seu nariz, afastou-se um pouco e olhou em volta, vendo o oceano cercando-os, como se estivessem em uma espécie de bolha de sabão. Taehyung ainda tentava entender o que havia acontecido com ele, vendo-o estender a mão, fazendo a água seguir seus comandos.

— Por que eu consigo controlá-lo sem a runa? — Disse fazendo a bolha se expandir e diminuir, ao abrir e fechar a mão. — E porque eu não sinto absolutamente nada fazendo isso? — Como se testasse seus limites, ele expandiu a bolha até que houvesse um espaço do tamanho de um casarão dentro do oceano.

— Acho que a resposta explica o que houve com o seu cabelo também — Taehyung disse apontando para seus fios, agora, grisalhos.

— Meu cabelo? — Franziu o cenho, segurando uma mecha e assustando-se com a cor. — Meu deus o que aconteceu? O mar sugou minha juventude?! — Disse tocando o próprio rosto, fazendo Taehyung rir.

— Não, você continua jovem e bonito — tocou suas bochechas. — Muito bonito devo dizer, essa cor combinou com você, seus olhos também.

— Meus olhos? 

— Estão quase da mesma cor que seus cabelos — disse olhando-o com intensidade. — Você me lembra alguém com essa aparência…

— Devo estar parecido com minha mãe — Jungkook franziu o cenho, olhando para o chão antes de voltar a encará-lo. — O que minha mãe era? Acho que as respostas estão na Ilha do Tormento, junto ao tesouro do meu pai.

— Então vamos descobrir? — Taehyung sorriu, levantando-se e oferecendo sua mão a ele, que não demorou a aceitá-la. — Como se sente?

— As dores de cabeça sumiram, mas sinto-me fraco — Jungkook respondeu depois de respirar fundo, parecia sem muito equilíbrio, por isso o ajudou a se manter de pé. — Mas consigo caminhar.

— Melhor seguirmos adiante então — disse virando-se de costas e abaixando seu corpo, olhando-o por cima dos ombros. — Vamos.

— O que está fazendo? — Ele perguntou confuso.

— Você está com a estabilidade de um bêbado, por isso estou lhe oferecendo minhas costas, ande, suba logo.

— Eu posso caminhar sozinho! — Disse com uma expressão ultrajada, o que o fez sorrir e se levantar.

— Tudo bem, vamos indo então — deu de ombros, caminhando na frente.

— Taehyung… — O chamou após distanciar-se um pouco.

— Sim? — Virou-se para encará-lo, vendo um bico imenso em seus lábios antes de estender os braços, silenciosamente pedindo para carregá-lo. Taehyung riu e caminhou em sua direção, deixando um selar delicado sobre seus lábios. — Você é uma graça, sabia gatinho?

— Hum — bufou ao subir em suas costas, abraçando seu pescoço. — Tae…

— Sim? — Sorriu ao ouvir o apelido que não ouvia há anos ser pronunciado. 

— Eu também estou apaixonado por ti…

(...)

Jeon Jungkook

Estranho era pouco para descrever como se sentia, apesar de sentir-se fraco, conseguia manter constante a abertura no oceano, não havia mais aquela pressão em sua cabeça ou o sangue escorrendo por seu nariz, sentia que a água ainda drenava um pouco de sua energia, mas não se comparava a antes. Enquanto atravessavam os Dentes do Diabo Jungkook olhava em volta, admirando a beleza do mar, daquele ângulo podia ver através dos paredões de água a luz do sol atravessando o mar, podia ver os peixes nadando por entre os rochedos, corais e os animais marinhos escondendo-se entre as pedras.

O mar era realmente um lugar muito bonito apesar do perigo.

Quando estavam chegando à praia da Ilha do Tormento, viu os tripulantes da Aurora encarando-os com preocupação, seus olhares assustados logo se transformaram em confusos ao ver sua nova aparência. Estava tão confusos quanto eles, pois não entendia o que aconteceu, lembrava-se apenas de sentir uma dor excruciante e um medo Paralisante de deixar o Capitão morrer daquela maneira, por isso usou forçou uma força que não havia mais em seu corpo para conter o mar. Quando estavam sob a areia da praia Taehyung o colocou no chão, segurando-o pela cintura, Jungkook virou-se em direção ao mar e fez os paredões de água desaparecerem, de maneira suave voltando ao ser que era incialmente, para que não criasse uma onda como as que quase o matou. Mas ao olhar para além dos Dentes do Diabo, franziu o cenho.

— Onde está Aurora? — Jungkook perguntou após virar-se novamente para encará-los.

— Ela bateu contra os Dentes do Diabo — Namjoon disse, abraçando Jimin, que estava choroso em seus braços. Ele soltou-se do aperto de seu namorado e correu até o irmão.

— Não me assuste desse jeito Tae! — Jimin o abraçou com força, sendo retribuído por Taehyung, que sorriu, mas seu sorriso se desfez aos poucos. — Pensei que tinham morrido ao ver a passagem se fechar.

— Não morrerei tão fácil Chimmy… Aurora naufragou? — Ele perguntou, olhando para o rosto de cada um dos tripulantes, vendo-os assentir.

— Estamos presos aqui — Lisa disse se aproximando do Capitão, apertando seus ombros com um sorriso tranquilizador nos lábios. — Daremos um jeito de sairmos daqui, com o tesouro compraremos um novo navio. — Taehyung lhe ofereceu um sorriso mínimo, assentindo.

— Certo, o que houve com o JK? — Hoseok perguntou apontando em sua direção.

— Também não sei — disse tocando seus cabelos, que refletiam a luz solar, deixando-o ainda mais branco. — Mas… Acho que tem haver com isso. — Ergueu o cordão que anteriormente ficava a runa. — A runa se quebrou e desapareceu.

— Meu deus! — Jin exclamou, expressando o choque que os outros conseguiram conter. 

— Você ainda consegue controlar o mar sem ela? — Yoongi perguntou confuso, fazendo Jungkook assentir. 

— JK você é realmente o Poseidon? — Namjoon perguntou confuso, fazendo-o rir.

— Olha, acredito que não — disse rindo. — Mas que tem algo de estranho comigo, isso podemos ter certeza.

— Gente, sei que todos estão evitando essa pergunta — Jisoo chamou a atenção de todos para si. — Mas para onde iremos? Perdemos tudo junto com a Aurora, não temos provisões, roupas, armas ou até mesmo o mapa que Namjoon traçou, como sabemos para onde ir?

— Acho que posso ajudar com isso — Jungkook disse desabotoando sua blusa, diante dos olhares confusos de todos e virou-se de costas, retirando sua camisa e segurando-a em suas mãos. — Meu pai deu um jeito para que eu não me perdesse, tatuando as coordenadas em minhas costas, basta segui-las.

— Seu pai era realmente um gênio JK! — Jennie disse surpresa, aproximando-se, junto aos restantes dos olhares curiosos.

— Certo, de acordo com seu mapa — Jin traçou uma linha imaginária sob a sua pele. — Estamos perdidos.

— O que? — Jungkook perguntou confuso, vendo Taehyung e Namjoon se aproximarem.

— Não há marcação de tesouro ou de coordenadas para seguir — Taehyung disse confuso. — Como saberemos para onde ir?

— Talvez a resposta esteja aqui, bem diante de nossos olhos, apenas não estamos enxergando — Namjoon continuou traçando caminhos.

— E se a resposta não for uma marcação e sim algo para seguirmos? — Jennie perguntou, fazendo com que todos a encarassem. Ela apontou para o lugar onde o mar adentrava a ilha. — Normalmente, as águas do rio encontram o mar, mas nesta ilha, a água está correndo sentido contrário.

Jungkook franziu o cenho e virou-se para encarar o rio, a Ilha era grande, o rio era redondo e seguia caminho adentro da mata, as árvores eram grandes e davam um ar assustador ao lugar, o grande vulcão no centro dela deixava tudo ainda mais sinistro. Segurando na mão de Taehyung, caminhou pela orla do rio, vendo-o correr para dentro da mata, quando devia ser o contrário, até que tudo fez sentido em sua cabeça, sabia que tinha algo haver com a água, seu pai possuía a runa também, certamente a água era importante para encontrar o tesouro. A julgar por sua aparência atual, tinha certeza que sua mãe também estava envolvida, por isso olhou para trás, vendo os tripulantes encarando-o.

— Vamos seguir o rio e ver até onde ele nos leva, tenho certeza que a água nos mostrará o caminho — virou-se em direção a Taehyung. — Tenho quase certeza que isso é coisa da minha mãe.

— Só há um jeito de descobrir não é? — Perguntou sorrindo, entrelaçando seus dedos, fazendo-o sorrir também.

Olhou para trás, vendo que todos passaram a caminhar ao lado da orla do rio, por isso seguiu junto a Taehyung para dentro da ilha também. Apesar de terem perdido os mosquetões e munições, haviam espadas presas aos coldres de seus cintos, pois todo Pirata sempre andava pronto para a batalha, então caso os Dentes do Diabo não fossem de fato o último perigo, estavam prontos para encará-lo. Jungkook usou sua camisa suja de sangue para secar seu rosto, após usar a água do rio para lavar os resquícios do líquido vermelho de seu corpo, notando o quanto de sangue havia perdido. Taehyung o observava silenciosamente, havia uma expressão de culpa estampada em seu rosto, mas apenas sorriu, mostrando que estava bem.

A mata dentro da ilha era iluminada pela luz do sol, o que deixava o ambiente menos assustador e hostil, mas estavam atentos aos barulhos, pois certamente não eram os únicos seres vivos fora a vegetação naquela ilha. Haviam coqueiros, árvores frutíferas e os peixes pulavam vez ou outra para fora da água do rio, fazendo com que os tripulantes trocassem olhares, podiam se alimentar com as provisões que encontrassem na ilha. Haviam diversas folhas mortas, galhos e terra sob seus pés, mas também haviam insetos, o que os fez ficarem atentos a movimentações estranhas, pois era muito provável que houvessem cobras por entre a vegetação também. Caminharam por mais ou menos vinte minutos até que chegaram ao centro da ilha, vendo que a água corria para dentro de uma gruta.

— Isso definitivamente não é natural — Lisa disse ao ver a água subir uma pequena inclinação, correndo para dentro da gruta.

— A família do JK é muito foda — Hoseok disse, caminhando sem hesitação até a entrada da gruta. — Minha mãe era uma meretriz e meu pai um bêbado que foi morto por piratas por fugir da batalha, vejo que os deuses têm seus preferidos não é mesmo?

— Se tivesse passado pelo o que eu passei, não estaria invejando minha vida e sim agradecendo por não estar em minha pele — Jungkook disse caminhando atrás dele, com Taehyung ao seu lado.

A gruta era grande, ao chegarem na entrada dela viram que teriam que descer pelas pedras, seguindo em direção a água cristalina no final dela. Com a ajuda de Taehyung, Jungkook conseguiu descer pelas pedras sem perder o equilíbrio, duas pernas ainda estavam fracas e inconscientes, temia tropeçar e se machucar, pois uma queda nas pedras certamente quebraria alguns de seus ossos. Quando chegaram até onde a água começava, olharam em volta, a água do rio corria para dentro da piscina natural, desaparecendo sem deixar rastros. Haviam diversas carpas na água azul límpida, nadando tranquilamente sobre a extensão da piscina natural, que devia ter aproximadamente vinte metros quadrados.

— Certo — Hoseok bateu uma palma, colocando as mãos na cintura em seguida. — E agora?

— Procurem por uma entrada — Taehyung ordenou, soltando sua mão para procurar, mas Jungkook ficou parado, observando a água.

Enquanto todos se espalharam pela gruta, procurando por aberturas entre as erosões das rochas, Jungkook olhava para o fundo da piscina, pois se seu palpite sobre a água fosse verdadeiro, a resposta estava lá dentro. Ficou observando até que algo chamou sua atenção, fazendo-o abrir caminho por entre a água para passar, notou como era fácil controlar a água agora, pois sequer precisava mover sua mão, ela simples seguia suas ordens silenciosas. Caminhou cinco passos até parar, abaixou-se e tocou o chão, embora estivesse coberto de terra, podia ver um brilho dourado, o que o fez se levantar e mover sua mão, fazendo a água lavar o chão, revelando ladrilhos dourados, que tinha certeza que eram de ouro.

— Eu tinha medo do tesouro ser na verdade algo simbólico — Yoongi disse de repente, aparecendo ao seu lado. — Mas se somente o chão deste lugar é feito de ouro, o que nos espera no final do caminho?

— É o que estou ansioso para descobrir — Jungkook disse abrindo caminho pela água. A trilha levava ao fundo da piscina, onde tinha uma caverna, extremamente ansioso caminhou até ela, vendo escadas, que levavam a ainda mais fundo.

— É… — Jin chamou sua atenção. — Aparentemente você terá que manter a água longe da gruta, como fez no mar para que pudéssemos passar… Você consegue manter?

— Por incrível que pareça — Jungkook disse sorrindo, erguendo sua mão direita, vendo a água da gruta correr para fora da caverna. — Sinto que posso fazer isso o dia todo. — Deixou a água acumular-se na piscina atrás deles.

— Ótimo! Nada de mortes por afogamento então! — Hosoek disse com um sorriso de orelha a orelha, apressando-se pelas escadas. Fazendo todos encará-los com as sobrancelhas erguidas.

— Se eu tivesse um por cento a felicidade dele, seria a mulher mais feliz do mundo — Lisa disse rindo, segurando na mão de Jennie antes de seguir Hoseok.

Jungkook riu antes de caminhar até às escadas também, sendo seguido pelo restante dos tripulantes. Conforme iam descendo as escadas o ouro começou a se fazer ainda mais presente, junto a cristais e pedras preciosas, deixando a passagem com um brilho estranho, pois não deveria haver luz ali embaixo, até que notou que as pedras estavam refletindo a luz vindo da superfície e se espalhando por toda a passagem. Quando chegaram ao fim do que parecia um túnel, encontraram uma porta, ela era grande, alcançava o teto e suas portas duplas eram feitas de ouro maciço, pedras preciosas e engrenagens. Jungkook surpreendeu-se, seu pai era uma pirata afinal, gostava de de ostentar.

— Acho que eu nunca vi tanto ouro na minha vida — Jimin disse olhando em volta.

— E esta é apenas a entrada — Namjoon completou, olhando para a porta.

— Como abrimos? — Jin perguntou, olhando em sua direção.

— Não sei… — Jungkook caminhou até a porta, colocando sua palma sobre ela, sentindo o ouro frio contra sua palma quente. — Meu pai nunca mencionou uma chave.

— Jennie, será que você não pode…? — Lisa disse olhando para sua namorada, vendo ela encarar a porta antes de dar de ombros. 

— Não custa tentar não é? — Caminhou até a porta, ficando ao lado de Jungkook, colocando sua palma sobre a porta e fechando os olhos. Ela ficou alguns segundos quieta, deixando todos curiosos com o que ela estava vendo, até que seus olhos se abriram de repente, olhando em sua direção. — Água.

— Água? — Jungkook perguntou confuso.

— Ela é a chave para abrir a porta, seu pai fez a porta sem fechadura, pois as engrenagens só vão girar com água — afastou-se um pouco, desenhando linhas imaginárias na frente da porta. — Por dentro do ouro há caminhos que se ligam uns aos outros, como veias, a água tem que correr por elas. — Jennie segurou sua mão e a colocou sobre um ponto específico da porta. — É por aqui que ela deve entrar.

Jungkook estava confuso, mas desviou sua atenção de Jennie para encarar a porta, vendo desenhos incrustados na pedra dourada, não sabia se daria certo, mas se Jennie havia dito, não havia porque não tentar. Com sua palma sobre a porta, Jungkook fez com que a água corresse por seus pés, subindo até sua mão e adentrando pequenas aberturas feitas no desenho da porta, sentiu a água correr por toda a extensão da porta, fazendo as engrenagens se moverem. Os barulhos da engrenagens deixavam claro que a porta estava sendo destrancada, até que de repente o barulho cessou e a porta começou a se abrir sozinha. Taehyung se colocou ao seu lado, segurando sua mão até que a porta estivesse completamente aberta, mas não caminharam para dentro dela, pois estavam chocados demais para sequer se mover.

Havia ouro por todos os lados, baús repletos de moedas de ouro, jóias e toneladas de todos os livros de cálices e objetos preciosos, os castiçais na parede eram de outro, assim como a moldura de um grande quadro no centro da sala. O quadro estava bem de frente para a porta, era um quadro realmente chamativo por seu tamanho e ostentação, cada centímetro de sua moldura era feito de ouro e uma pedra que Jungkook julgou ser safiras, por conta de sua dor azulada, mas o mais bonito não eram as jóias ou o ouro, mas sim a pintura que havia nela. Haviam três pessoas na pintura, uma mulher pálida de cabelos prateados e ondulados, com olhos tão azuis quanto o céu, o homem ao seu lado tinha os cabelos castanhos e compridos, chegando ao seu ombro.

E um bebê.

Jungkook soube no exato momento que bateu seus olhos na pintura que aquele bebê era ele, de olhos castanhos e cabelos da mesma cor, muito parecido com seu pai. Os três pareciam extremamente felizes na pintura, até mesmo ele sorria alegremente, um sorriso banguelo e genuíno, que fez lágrimas surgirem ao redor de seus olhos. Jungkook foi o primeiro a caminhar para dentro da sala, sentindo uma corrente de ar bater em seus cabelos — agora — grisalhos. Nunca tinha visto uma imagem de sua mãe, ela era realmente uma mulher linda, com um sorriso encantador e uma feição jovial, estava realmente parecido com ela agora. Ao olhar em volta viu uma estante, cheia de livros e objetos valiosos, fazendo-o caminhar até ela, mas parou no caminho ao perceber o silêncio.

Todos os tripulantes estavam parados, observando-o.

— Vocês podem explorar o lugar, essa riqueza foi conquistada por todos nós — Jungkook disse sorrindo, apesar de seus olhos ainda estarem marejados.

— Não tocaremos em nada de valor sentimental — Jimin disse dando o primeiro passo, sendo acompanhado por todos os outros.

Jungkook sorriu, agradecido pela consideração deles, mas voltou ao que estava fazendo, caminhando até a estante e vendo os livros, pois lembrava de seu pai lhe dizendo que seu maior tesouro, era o conhecimento. Quando chegou até a instante, leu os títulos dos livros, surpreendendo-se ao ver que todos foram escritos por seu pai, de maneira curiosa, pegou um dos livros, folheando-o, naquele em específico, seu pai narrava uma de suas aventuras, o que o fez sorrir, colocando o livro de volta no lugar. Passou os olhos por outros títulos até que um deles chamou sua atenção, Jungkook o pegou, encarando a capa escura de maneira fixa, o título dele era “Mayim”. Assim que abriu o livro, a primeira frase que leu o fez arregalar os olhos.

— O que houve? — Taehyung perguntou ao seu lado, assustando-o. — Encontrou algo?

— Sim… Eu sei o que minha mãe é — disse ainda chocado, olhando para o conteúdo do livro.

— O que diz aí? — Ele perguntou curioso.

— “Mayim, do hebraico é traduzido como água ou mar. Apesar de sua aparência se assemelhar a de uma jovem mulher, Mayim é a personificação do próprio oceano” — Leu, olhando para Taehyung em seguida. — “Uma das quatro deusas dos Elementos.”

~🖤~

Por essa vocês não esperavam hein?

Calma, não acabou ainda, temos um pequeno epílogo, que será postado ainda hoje!

Espero que estejam gostando do desfecho, pois tem muito mais pela frente ainda!

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#dentesdodiabo

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