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***

A minha vida estava de cabeça para baixo, os meus sentimentos estavam confusos e tudo o que passava pela minha cabeça era a necessidade de desistir. Não queria estar presa nesses momentos, mas estava e isso não era bom. Passei a minha vida seguindo valores impostos pela sociedade, procurando não magoar os sentimentos alheios e no fim, eu sempre era magoada. A minha saúde mental não estava boa e eu sentia isso, então, só havia uma saída, eu precisava acabar com a minha vida o mais rápido possível. As lágrimas que desciam do meu rosto arrancavam um pouco de mim e eu me questionava se isso teria fim.

Namjoon entrou no carro e respirou fundo, ele não disse, mas eu sabia o que ele pensava. Ignorei as suas tentativas de conversa e sempre que ele conseguia a minha atenção, as lágrimas tomavam conta de mim. Ele calmamente pousou a sua mão em meus ombros e esperou, limpei as lágrimas do meu rosto e olhei para ele.

— Ei. – sussurrou. — Comprei os seus medicamentos e algumas vitaminas pré-natais, também comprei uma pasta de dentes e alguns cremes novos. – concluiu me entregando o pacote. — Você está bem?

— Há três meses, eu recebi uma encomenda da minha mãe. – murmurei. — Uma bebida rica em vitaminas que só a minha avó sabe fazer, todas as noites eu tomo um pouco para me sentir bem. – segurei as lágrimas. — É a única coisa que tomo todos os dias, estou sendo envenenada por minha própria mãe.

— Alice, eu sinto muito. – sussurrou tentando segurar a minha mão. — Porém, pode ser que ela não saiba de nada. Vamos lá para casa, eu cuido de você e juntos conseguiremos um jeito de punir esse infeliz. – tudo soava tão fácil.

— A pior parte não é estar grávida, mas sim não querer essa criança crescendo dentro de mim. – a dor que isso causava era enorme. — Não quero ser mãe, nunca quis.

— Vamos manter a sua gravidez em segredo. – pediu. — Se você continuar com a ideia de retirar o bebê, não precisamos contar para ninguém. Podemos evitar o sofrimento de Taehyung e dos meninos que ficariam radiantes com a notícia, eles não precisam sentir essa dor já que você claramente não sente. – ele estava chateado e entendia o seu lado, mas ainda falávamos do meu corpo.

— Está bem. – aceitei sem remorsos.

— Se James não souber desse bebê, ele não poderá te magoar. – continuou.

Em seus olhos havia sinais de pena e esse sentimento seria constante se as pessoas soubessem do meu estado atual.

— Me sinto sem chão. – murmurei. — Metade de mim está implorando para sumir desse mundo.

— Não sei quais serão os seus próximos passos, mas acabar com a vida do bebê e a sua, é um ato de crueldade maior do que qualquer coisa. – ele desviou o seu olhar. — Principalmente para aqueles que te amam.

— Você fala como se me amasse. – sussurrei ironicamente.

— Eu amei. – desviei o meu olhar para ele. — Alguém muito parecido com você. – ele estava sofrendo. — Você me lembra ela e eu sinto que preciso te proteger assim como não fiz com ela.

— O que aconteceu com ela? – indaguei.

— Ela deixou esse mundo. – Namjoon estava triste.

Não respondi, não havia nada para ser dito. Eu não era a pessoa que ele havia perdido e nem me deixaria levar por uma culpa que eu não tinha. Em silêncio ele ligou o carro e nos levou em direção ao meu prédio, enquanto isso eu mentalizava tudo o que precisava fazer quando chegasse em casa. Estar grávida não significava nada para mim, mesmo a criança sendo de Taehyung, ele tinha o direito de me odiar e eu tinha o direito de decidir sobre as ações feitas em meu corpo.

— Taehyung viajou. – comentou quebrando o silêncio. — Ele volta amanhã e se mudar de ideias, podemos conversar com ele juntos.

— E o que acha que ele fará ao descobrir? – retruquei. — Que aceitará tudo e esquecerá as dores que sentimos no momento? Dores causadas por mim, não se esqueça disso. – ele parecia não compreender isso. — Não vivemos em um filme, isso é a realidade agora.

— Não me importa o que Taehyung dirá. – respondeu parando o carro em frente ao meu prédio. — Se ele não quiser, eu quero. – tremi ao ouvir. — Eu cuido da criança e de você, mas não faça uma besteira que acabe com a vida de algo tão precioso.

Respirei fundo.

— Obrigada por tudo. – disse abrindo a porta do carro.

— Alice? – retrucou chamando a minha atenção.

O olhei e encontrei um pedido de carinho em seus olhos, eu não tinha isso para oferecer.

— Vamos comigo, me deixa cuidar de você? – pediu apertando a minha mão.

Engoli as lágrimas e me soltei, saindo do carro. Fechei a porta sem olhar para trás, eu não podia ponderar ou aceitar o seu pedido. Tudo isso era o começo de algo bem pior, entrei no meu prédio e enxuguei as minhas lágrimas. Não podia fraquejar e precisava ser forte para o que ainda estava por vir. Entrei no elevador e mentalizei que tudo ficaria bem, em questões de minutos tudo ficaria bem e eu não sentiria mais dor. O fim do mundo que eu não encontrei ao lado de James, era presenciado agora ao lado de Taehyung. E por isso, o alívio precisava ser rápido, usaria as pílulas de Taehyung para conseguir isso.

A porta do elevador se abriu e eu engoli os meus sentimentos, não podia deixar que o meu pai sentisse a minha dor. O espelho do elevador demonstrava um semblante sofrido, o meu rosto estava inchado e era notório que eu estava sofrendo. Respirei fundo e saí do elevador, caminhando em direção ao meu apartamento. Coloquei a senha na porta e abri, para a minha felicidade eu parecia estar sozinha.

Caminhei até a cozinha e peguei o bilhete, o jogando fora. Ninguém viu, então ele não precisava existir. Voltei para a sala e olhei em volta, eu precisava me despedir de tudo, podia ser os meus últimos minutos ali. O meu coração doía, tudo havia sido conquistado com tanto carinho e sufoco. Passei dias, meses e anos trabalhando para conquistar um pouco de liberdade e conforto, agora, deixaria tudo para os abutres que tinha em minha vida. Afastei os meus pensamentos e limpei as lágrimas, não era o momento para ser fraca.

Caminhei em direção ao meu quarto com muito medo de mim mesma, os meus pensamentos estavam contra de mim e me iludiam com a ideia de estar fazendo a coisa certa. Acabar com a minha vida seria a melhor decisão a ser feita e eu deveria ter feito quando James abusou de mim, naquela noite eu precisei morrer. Entrei no meu quarto com cuidado, coloquei o pacote que Namjoon me entregou em cima da cômoda e respirei fundo, me sentando na cama.

Senti um arrepio percorrer o meu corpo e olhei para o canto do meu quarto, senti a minha respiração pesar ao ver que alguém estava sentado ali. Era o semblante de alguém que eu conhecia bem, mas não estava acostumada com a ideia de perder. Em silêncio ele se levantou e veio em minha direção, sem jeito ele parou em minha frente e me olhou com os olhos cheios de água.

— Taehyung. – sussurrei.

— Alice. – sussurrou de volta.

— O que está fazendo aqui? - indaguei evitando me aproximar dele. — Como entrou aqui?

Ele respirou fundo e se afastou.

— Encontrei o seu pai no corredor e ele me deixou entrar. – respondeu baixinho. — Ele voltou para buscar algo que havia esquecido e disse que você não demoraria.

Então o meu pai viu o meu bilhete, logo se morresse ninguém procuraria por mim por acreditar que ainda estava fora.

— Sei que não deveria estar aqui. – continuou. — Mas preciso ouvir dos seus lábios, eu preciso ouvir você dizer que tudo acabou e que não gosta de mim.

— Tudo isso não passou de um mal-entendido. – murmurei. — Mas não importa e eu estou sem forças para explicar, então vamos deixar assim. – segurei as minhas lágrimas, eu precisava ser forte.

— Como assim? – indagou. — Mal-entendido?

— James jamais aceitaria a minha partida. – sussurrei. — Ele não mede esforços para me ter e eu sempre soube disso, mas optei por ignorar e acreditar que podia ser livre. Hoje, eu sei que estava errada, sinto muito por tudo. – ele não entendia o que eu falava.

— Do que você está falando? – retrucou.

— Nada faz sentido. – respondi. — A minha memória ainda está aos pedaços, mas me lembro de algumas coisas. Hoje eu descobri os motivos de estar e me sentir assim, aceito toda a culpa do seu sofrimento. – ele não entendia. — Por favor, me perdoe. – eu contive as minhas lágrimas.

— Ainda se sente mal por causa da comida? – indagou se sentando ao meu lado. — Alice, o que você colocou naquele refogado? Veneno? – seria cômico se não fosse trágico.

— Não sei se passei mal por causa do refogado. – respondi me levantando. — No dia seguinte eu acordei sem saber o que tinha acontecido. O meu pai me contou por alto o que havia acontecido. Pensei que estava delirando por estar fraca, cheguei a pensar que podia ser um sonho. – ele me olhava com seriedade. — O meu telefone sumiu e eu não consegui falar com você, eu esperei, mas você não veio. Hoje, eu decidi que ia tentar ir até a sua casa, mas Namjoon apareceu antes.

O seu rosto continha muita confusão, mas eu precisava continuar. Não queria morrer com este peso em minha consciência.

— Namjoon? – questionou se levantando.

— Namjoon me contou os motivos de você não ter voltado. – continuei. — Ele me acusou de ter transado com James e com você no mesmo dia. As acusações de Namjoon caíram como uma bomba sobre os meus ombros e eu as engoli. Afinal de contas, James é um problema meu. – o meu peito doía.

— Você não dormiu com James? – indagou. — É isso?

— Não por vontade própria. – murmurei. — Mas de acordo com a médica, ele tem dormido comigo.

Taehyung perdeu o equilíbrio do seu corpo e voltou a se sentar, ele parecia mais confuso do que nunca e as lágrimas inundaram o seu rosto.

— Médica? – questionou. — Você está doente? – era muito mais do que isso.

— Namjoon tem um jeito peculiar para convencer alguém a fazer algo. – respondi. — Por livre e espontânea pressão, ele me levou ao ginecologista. Ele ponderou a ideia de eu estar sendo envenenada. – os seus olhos dobraram de tamanho. — E ele estava correto, estou sendo envenenada com um medicamento e James tem abusado de mim todas as noites. – senti pontadas no peito ao contar.

Taehyung fechou os seus olhos e deixou as lágrimas descerem por seu rosto, ele sabia dos meus sentimentos e eu não precisaria comentar isso. Passei por isso uma vez, o pesadelo era o mesmo, somente o tempo passado era outro. O passado e o presente nunca foram tão presentes como agora. Assim que ele abriu os seus olhos, o sentimento mudou. Ele estava em fúria e eu não conhecia as reações que passavam em seu rosto.

— Alice, eu sinto muito. – disse limpando as lágrimas. — Tenho culpado você por coisas que não fez.

— Tudo bem. – respondi com alguma frieza. — A culpa disso é minha, sempre é. As minhas escolhas erradas me trouxeram até aqui, fui burra o suficiente para não ver isso. – isso era verdade.

— Não fala assim. – pediu.

— Tudo bem, Taehyung. – murmurei.

— Eu vou acabar com a vida desse infeliz! – gritou me assustando.

Dei um passo para trás e me afastei dele, tudo o que não precisava era de alguém violento neste momento. Ele notou a minha reação e se levantou, vindo em minha direção.

— Me perdoa. – pediu.

— Não me toque. – pedi me afastando mais. — Está tudo bem.

— Me sinto um lixo sem você. – disse se afastando. — Estou sofrendo mais do que queria e agora ouvindo a verdade, estou com ódio de mim. – a sua voz transmitia isso.

— É, eu me sinto assim também. – murmurei. — Mas é o momento certo para acabarmos com isso, não faz sentido continuar assim.

Se acabasse com tudo, ele não teria motivos para senti a minha falta e assim o seu luto seria menor.

— Por favor, me dá um abraço. – pediu chorando.

Me aproximei com algum receio e o deixei me envolver. Os seus braços me puxaram para si e os nossos corpos se encontraram, em pequenos passos ele nos guiou até a cama. Ele se sentou e agarrou a minha cintura, colocando a sua boca sobre a minha barriga. Não podia ceder e nem imaginar como seria se ele soubesse de toda a verdade, ele não precisava sofrer assim.

— Eu te amo tanto. – sussurrou com a sua voz rouca.

Passei a minha mão por seus cabelos e lhe dei um pouco de carinho, esse seria o nosso último momento juntos. Também seria o primeiro e o último contato que ele teria com o bebê em minha barriga, depois disso, tudo o que ele teria seria uma mera memória da minha vida. A lembrança de uma história que nunca vivemos e antes mesmo de desejar, James colocou um limite. 

***

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