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***

••• quatro dias depois •••

Sentia o meu coração pesar a cada passo dado em direção à sala de Park Chin Hwa. A sua tristeza me consumiu por dentro, vê-lo no velório do seu pai, foi doloroso. Não pensei ver alguém sofrer tanto como o vi nos últimos dias. Os boatos na empresa eram cruéis e eu sabia que ele já sabia de tudo o que estava acontecendo assim que a morte do seu pai foi anunciada. Ele estava de luto, mas poucos todos pareciam respeitar isso. Poucos queriam aceitar que a morte do seu pai foi algo ruim, alguns até comemoraram a situação sem pensar na família que ficou para trás. Park Chin Hwa estava jogado aos lobos e precisava crescer e aprender a lidar com isso, antes de ser devorado por todos que queriam assumir a liderança da sua empresa.

Parei em frente do seu escritório e respirei fundo, não sabia como começar a falar que eu sentia muito por tudo o que estava acontecendo. Por respeito ao seu luto, usava preto por alguns dias seguidos e era a única que fazia este gesto. Ninguém parou as suas vidas ou mudaram os seus estilos para acolher a dor de Chin Hwa, porém, não consegui fazer igual. Todos os meus sentimentos e o meu coração estavam direcionados para ele, ele precisava de carinho. Afastei os meus pensamentos e bati na porta, provavelmente ele não estaria ali. Todavia, precisava saber se estava tudo bem com ele, já que ele não respondia às minhas chamadas e mensagens. No fundo, pude ouvir passos e isso fez com que o meu coração acelerasse.

— Entre. – soou a sua voz abafada do outro lado da porta.

Respirei fundo novamente, levei a mão a maçaneta e a girei. Abri a porta e vi o semblante de Park Chin Hwa. Ele estava sentado em sua cadeira, no escuro, olhando para mim. Os seus pequenos olhos estavam inchados e em seu rosto havia sinais das suas lágrimas. Engoli a seco e entrei, fechando a porta atrás de mim. Não sabia o que fazer e nem por onde começar, mas precisava saber se ele estava bem. Ele ligou as luzes ambientes do seu escritório e respirou fundo, voltando os seus olhares para mim. Por dentro, queria tomá-lo em meus braços e confortar o seu coração, ele precisava tanto. Porém, não podia. Ele não era meu amigo e sim, meu chefe. Todos precisamos de um tempo para digerir o luto que sentimos dentro dos nossos corações.

— Em que posso ajudá-la? – perguntou depois de alguns minutos me olhando.

— Em nada. – respondi baixinho. — Você não deveria estar aqui oferecendo ajuda. – ele respirou fundo novamente. — Eu só quero saber como você está e se precisa de algo.

Park Chin Hwa desviou o seu olhar para a janela e deixou as suas lágrimas caírem, no entanto, segurei as minhas. O dia estava chuvoso e isso deixava tudo mais triste ainda. Ele ergueu o seu corpo e continuou olhando para o lado de fora. Me aproximei devagar e esperei por ele, que ainda não havia voltado o seu olhar para mim.

— Passei a vida amando a mulher que me trouxe ao mundo. – começou ele. — Então, a vida veio e roubou o homem que eu tanto julguei por maltratar a minha mãe. – sentia a dor em sua voz. — Sinto que estou errado em todos os sentidos.

Senti um arrepio ruim, mas optei pelo silêncio.

— O meu pai nunca foi bom para mim, sempre me puxando ao limite. – continuou. — Nada era suficiente, tudo precisava ser melhor. Lembro-me de quando era criança, eu adorava desenhar, mas aos seus olhos eu não era bom o suficiente. Desisti e nunca mais desenhei de novo. – engoli a seco. — Segui a carreira que ele queria para mim e não aquilo que o meu coração ansiava.

Respirei fundo enquanto ele continuou.

— Quando me casei, ele disse que não significava nada. – que crueldade. — Ter uma família requer muito, inclusive ser um homem. Algo que, segundo ele, eu nunca fui. – a sua dor era tão nítida. — Quando a minha mulher me traiu pela primeira vez, ele disse que não era novidade. Jamais daria conta de manter uma mulher bela ao meu lado por amor, eu não tinha nada que uma mulher precisasse. – o seu pai era muito cruel com ele. — Quando a nossa filha nasceu e o exame de DNA deu positivo, eu pensei que ele mudaria comigo, mas continuou achando que a minha esposa era uma meretriz. Então, optei por perdoar a minha esposa pela traição e esquecer que havia acontecido.

Ao ouvi-lo, o meu coração batia mais forte.

— Sabe, Alice. – comentou olhando para mim. — Mesmo após tudo isso, eu amava o meu pai e o aceitava do jeito que ele era. Ele me ensinou a ser homem da forma mais cruel possível e graças a ele, sou quem sou. Algo completamente diferente daquilo que ele era. Ao contrário do meu pai, eu vejo as pessoas como elas são e dou a elas o amor que elas merecem.

— Eu. – não consegui continuar.

— Não sinta! – exclamou. — Não sinta muito por essa história. Sentir muito por mim, significa que você se importa e eu não posso permitir que isso aconteça. Não podemos nos importar um com o outro. – engoli a seco. — A minha carência pode transformar esse momento e eu não quero isso. Não percorreremos caminhos sem volta.

Desviei os nossos olhares, não queria falar nada que o magoasse. Ele sofria tanto e as suas palavras eram desconexas, porém, ele não veria isso. Não queria fazer parte da sua dor e do seu sofrimento, na verdade, eu só queria ajudar. Todavia, se a minha presença fosse algo ruim, eu me afastaria com certeza.

— Aprecio e agradeço a sua lealdade. – disse baixinho. — Mesmo sabendo que assim como eu, você não quer se envolver nos meus dramas familiares. – sim, era verdade.

— O importante é saber que o seu pai te ensinou algo. – tentei. — Mesmo que os seus ensinamentos sejam cruéis e cheios de dores.

Park Chin Hwa se aproximou de mim e fitou os meus olhos, esperando alguma reação da minha parte. Ele observava cada detalhe do meu rosto e eu procurava não fazer o mesmo para não deixar o momento estranho. Sem pedir a minha autorização, ele envolveu os seus braços em meu corpo e me puxou para um abraço apertado. Tremi ao sentir os seus movimentos, mas não lutei para sair dos seus braços. Desde que soube da morte do seu pai, eu quis dar um abraço apertado e, ao mesmo tempo, lhe passar um pouco de confiança para que ele se lembrasse que ainda tinha pessoas que se importavam com ele. Queria lhe dizer que ele podia confiar em mim e que a minha lealdade permaneceria a mesma independente das circunstâncias.

— Você cheira tão bem. – sussurrou em meu ouvido, me fazendo arrepiar.

Não consegui responder, pois, alguém bateu na porta e em seguida entrou. Ele me soltou e ambos olhamos para o semblante confuso de Oh Reum. Os seus olhos percorreram os nossos rostos procurando por respostas, mas ela não as encontraria ali. Ela tinha uma bandeja com bebidas em suas mãos e pude ver que ela também trazia alguns sanduíches. Não consegui reagir, pois, ainda me sentia em choque com a intensidade do seu abraço.

— Quem te deu permissão para entrar na minha sala? – indagou ele arrogantemente.

— Eu. – tentou limpando a garganta.

— Eu pedi que ela nos trouxesse algo para beber. – defendi.

— Sinto muito. – disse ela. — Não queria atrapalhar nada, me desculpem. – ela deixou a bandeja em cima da mesa de centro e rapidamente saiu da sala.

— Obrigada, Oh Reum. – tentei, mas ela se apressou e não ouviu.

Assim que ela saiu, Chin Hwa se afastou de mim e colocou as mãos nos bolsos. Os seus olhos ainda estavam distantes e toda a sua frieza me deixava com dor de barriga. Estava diante de uma pessoa quebrada e com muitas dores, algumas que somente uma pessoa qualificada teria o poder de curar. No entanto, como amiga, eu gostaria de estar ao seu lado, assim como ele esteve ao meu lado quando precisei de ajuda e compreensão. Além de confortar o meu coração, ele fez questão de esclarecer os erros que eu, na verdade, nem havia cometido.

— Você precisa procurar uma secretária nova. – comentou quebrando o silêncio.

— Tenho razões para isso? – retruquei com certa confusão, mas ciente que possuía.

— Estamos mudando a lista de funcionários. – disse indo até a sua cadeira, onde se sentou. — Oh Reum não será mais parte do nosso pessoal. – gelei ao ouvir.

— Perdão em questionar, mas quais os são os motivos? – precisava saber.

— Você não entenderá agora. – disse me olhando. — Mas estou fazendo isso para proteger os nossos interesses e os seus. – continuou desviando o seu olhar.

— Ela não me fez nada. – pelo menos ainda. — Por qual motivo você quer me proteger? – afirmei me aproximando da sua mesa.

— Ela fará. – respondeu voltando o seu olhar para mim.

— Sabe de algo que eu não sei? – questionei.

— Não. – ele ficou frio.

— Não seja como o homem que tanto odeia. – pedi. — Não seja o homem que todos amam, mas ninguém comparece ao enterro. – os seus olhos continham muita tristeza.

O velório foi a coisa mais triste do mundo e eu nunca pensei ver algo assim antes. Nenhum dos seus funcionários prestigiaram o seu enterro, apenas os chefes dos diferentes departamentos. Dos funcionários normais, eu fui a única que representou todos. Nem mesmo Oh Reum quis ir ao enterro comigo, segundo ela, ele não merecia a sua presença. Lembrar do semblante triste de Chin Hwa partia o meu coração em vários pedaços, ele não merecia passar por isso sozinho. E agora, eu não sabia como os seus pensamentos estavam. Pois, se ele estava zangado com todos, significa que ele poderia se vingar dos seus funcionários por causa do seu pai.

— Ser odiado é melhor do que ser amado. – comentou chamando a minha atenção.

— Ninguém te odeia, Chin Hwa. – murmurei. — Não procure ódio, você é melhor do que isso. – disse indo em direção à porta.

— Ei, Alice? – tremi ao ouvir, somente Taehyung me chamava assim.

— Obrigado. – disse desviando o seu olhar novamente.

Não respondi, apenas saí da sala. Parei no corredor e respirei fundo antes de continuar. Estar neste ambiente não me fazia bem e eu não gostava da sensação ruim que pairava pelo ar. Saber de todos os segredos da família Park não era algo bom e isso estava acabando comigo. A sua dúvida sobre Oh Reum despertou mais ainda a desconfiança que tinha sobre ela. Afastei os meus pensamentos e caminhei em direção a minha sala, precisava fazer algo para me distrair ou ficaria louca. Ao me aproximar, pude ver Oh Reum esperando por mim em sua mesa. Não podia contar detalhes, mas queria saber o que ela pensava sobre tudo o que estava acontecendo no momento.

— Como ele está? – indagou assim que parei.

— Não sei. – murmurei. — Ele precisa de tempo, tudo é muito recente. – respondi sorrindo de canto.

— Acho legal você ficar ao lado dele, já que ninguém está. – disse sorrindo de canto.

— Por qual motivo os outros não foram ao velório? – precisava ler a sua expressão facial.

— Não temos nenhuma ligação com a família Park. – disse rispidamente. — Não tenho boas lembranças do chefe e Park Chin Hwa nunca olhou para a ralé. – respirei fundo. — No entanto, algumas coisas mudaram desde que você chegou. Ele até se mudou para o nosso andar, somente para trabalhar ao seu lado. – senti amargura em suas palavras.

— Cuidado com as coisas que você diz ou que insinua. – pedi. — Park Chin Hwa nunca se mudou para este andar por minha causa e sim por motivos pessoais. – ela me olhou, mas não se importou com as minhas palavras.

— Pode ser. – respondeu com desdenho. — Todavia, é inegável que após começar a conviver com você, ele mudou. Está vendo aquela máquina de doces ali? – indagou apontando para a máquina.

— Bom, isso é novo. – comentei procurando lembrar desde quando ela estava ali.

— Sim. – respondeu. — Chegou ontem e contém todos os doces, e frutas em compotas que você ama. – o seu olhar era óbvio.

— Está insinuando que Chin Hwa comprou essa máquina para mim? – eu começava a perder a paciência com ela.

— Não, Alice. – respondeu me olhando nos olhos. — Estou dizendo que você possa ter uma boa influência sobre ele e talvez possa ajudar a mudar algumas coisas por aqui. – eu jamais faria isso. — Comece pelo salário, onde os homens recebem um absurdo e nós recebemos quase nada. – isso não era novo para mim.

— Se está insatisfeita, por qual motivo não foi até ele e reclamou? – indaguei.

— Eu fui até ao seu pai. – respondeu desviando o seu olhar. — Ele disse que lugar de mulher é atrás do fogão, cuidando da casa e das crianças. E não em uma empresa fingindo ser algo que não é. – agora começava a compreender o seu ódio. — Não me admira alguém ter acabado com ele. – tremi ao ouvir, como ela sabia disso?

— De novo. – disse. — Cuidado com as coisas que você fala ou insinua por aqui. Eu sou casada, respeito o meu marido e respeito o meu chefe que também é casado. – ela respirou fundo. — As suas ideias podem induzir comentários maldosos e falsos, por favor, pare. – pedi firmemente.

— Não se preocupe. – respondeu voltando a sua atenção para o computador. — Tenho certeza de que Kim Taehyung compreenderá a sua luta por algo justo. Eu o conheço e ele sempre foi muito justo. – senti a raiva tomar conta de mim.

— Ouvi dizer que o conhece. – comentei controlando a minha calma. — Mas não pense que possuí direitos sobre ele. Essa época já passou e ao contrário do que parece, eu sei ser bem ciumenta.

— Alice! – exclamou me olhando. — Não foi o que eu quis dizer!

— Acho bom. – não conseguia conter a raiva. — Sei distinguir o presente do passado, mas não me teste. Pode não gostar do resultado. – a ira em mim era notório.

— Ele te contou o que aconteceu entre nós? – murmurou voltando o seu olhar para mim.

— Sim, e ao contrário do que você disse, a história foi bem diferente. – respondi com certa frieza.

— Depende do ponto de vista. – provocou. — E eu não falava de Kim Taehyung, mas sim de um outro namorado. – não acreditava nela. — Porém, o sofrimento foi tão intenso quanto ao que tive ao lado de Kim Taehyung.

— Pois, bem. – comentei com desdenho indo em direção ao elevador.

— Alice? – chamou, me fazendo parar.

— Eu sinto muito. – disse. — Eu já o esqueci e o perdoei. – que ironia. — Estou em outra, não se preocupe comigo. – não estava.

— Não sou eu que tenho motivos para se preocupar. – respondi piscando.

Entrei no elevador sem olhar para trás, não queria ver a sua reação. Talvez Chin Hwa estivesse certo, provavelmente, seria bom nos livramos de Oh Reum. Não sentia nada por esse momento, mas começava a acreditar que seria melhor assim. Seria melhor para mim se ela não estivesse ali comigo, assim eu não teria a sensação de que alguém está procurando meios para me sabotar. Os comentários de Oh Reum podem causar danos, especialmente se olhar pelo lado onde Chin Hwa é casado. A sua esposa esteve presente no enterro do seu pai, trocamos alguns olhares, mas não houve interação entre nós. Pelo seu semblante, ela não sofria, mas respeitava o sofrimento do seu marido. Será que ela sentia o mesmo que Chin Hwa e, por isso, não se importava mais?

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