C A P Í T U L O • 0 3

Oh, meu Deus, eu sinto isso no ar
Os fios de telefone acima estão chiando como um tambor
Querido, estou em chamas, eu sinto isso em toda parte
Nada mais me assusta

Me beije intensamente antes de ir
Tristeza de verão

S U M M E R T I M E   S A D N E S S |

L A N A   D E L   R E Y |


• 2019, 13 de dezembro •

Não demora muito para o senhor Jean sair, deixando a promessa de que capricharia em um pedido especial para Zane e eu.

    No tempo em que estou ali percebo que minhas fobias são só isso: medos.

    A cafeteria um dia foi o nosso lugar preferido em toda a cidade e está repleta de memórias, mas ela não me faz chorar copiosamente. Pelo contrário. Depois da tensão inicial, eu sinto um pouco de Ben ali, do que éramos, como éramos. É nostálgico, não torturante como imaginei que seria.

    — O shopping é a sua próxima parada? — volto a questionar, agora em frente à entrada do mesmo.

    — A nossa próxima parada.

    — Por favor, não fale que é o dia de renovar o guarda-roupa ou fazer uma sessão de beleza, tudo menos isso. — Meu comentário vem de uma lembrança da aversão que ele antes tinha disso.

    O semblante descontraído e um tanto obscuro de seu belo rosto é tomado por um falso pesar.

    — Então você está menosprezando o meu plano? Poxa, do que adiantou eu passar a noite de ontem estudando sobre a moda atual? — Era essa a face que era dirigida a mim no passado. O idiota. O risonho. Aquele carregado com um clima leve. Por que ele mudou tanto? E por que ele está voltando a ser ele novamente agora? — Preciso que me responda algo.

    Franzo a testa, curiosa e começando a aderir resquícios de nervosismo.

    — Não prometo.

    — Não deve. — Ri de lado, não mais exalando a seriedade. — Você já perdeu o medo?

    — Eu...

    — Sua cara já diz, nem precisa responder. — Parece estar me dando uma repreensão. — Diga-me, Brooke Murphy, até quando vai largar seu medo e assistir O Exorcismo de Emily Rose de vez?

    Fico estática. Uma parte de mim cessa a confusão interna que se instalava e a outra fica inerte ao lembrar do filme citado.

    Não era novidade para nenhum dos irmãos Bennett que eu tinha medo de assistir aquele filme de terror, assim como todos os outros. E, ao citá-lo, acabo lembrando. Lembrando de que ele me prometeu, duas noites antes da tragédia, que iria assistir comigo, que iria emprestar de bom grado sua mão para que eu a "estraçalhasse" quando estivesse à beira de um colapso nas partes assustadoras do filme.

    — Você lembrou — acuso.

    Seu pomo de Adão subo e desce em uma repentina hesitação de sua parte. Aperta minha mão, fazendo com que eu sinta os vários anéis aleatórios que adornam seus dedos.

    — Nada, Brooke. Eu nunca esqueci nada relacionado a você. — Ainda olhando-me, ele continua: — E nunca vou.

    Desconcertada. É assim que fico. O coração pulsando com fúria.

    Então, nesse dia, só fecho os olhos para as sombras.

    Ao lado do moreno de olhos ônix, hoje eu experimento fazer coisas as quais me privei nesse tempo de dor. Embriago-me nas coisas simples, como a adrenalina assistindo um filme horripilante enquanto Zane ri de meus sustos e mini colapsos — nossas mãos nunca se separando —, a competição acirrada que nós dois protagonizamos no antigo e raro fliperama o qual antes frequentávamos com afinco, nas risadas trocadas quando compartilhamos relatos sobre as maiores vergonhas que passamos na vida e debatemos sobre os melhores álbuns de Kaleo, Lana Del Rey, The Neighbourhood, Arctic Monkeys e Bee Gees.

    Precisei de 10 minutos para conseguir parar de rir ao assistir a expressão de um grupo de senhoras que ficaram assustadas quando, enquanto andávamos pelo shopping, Zane murmurou um "O trabalho está feito. Eles estão mortos." em bom tom ao simular uma falsa ligação.

    Muitas outras coisas feitas nesse dia também seriam guardados na minha memória.

    O vento leve da tarde bate contra meus cabelos embaraçados, manipulando os fios rebeldes que escapam pelo capacete e dançando em sincronia com a minha energia não mais neutra.

    Por singelos minutos, horas — talvez frações de dias? —, aprecio a sensação de dar passos com olhos fechados. Queria que fosse eterno. Bennett dirige em uma velocidade baixa; talvez sem direção, talvez com destino em mente. Com meu rosto contra suas costas, elevo meus olhos até a imagem do pôr do sol. Mesclagens quentes cortam o horizonte, criando uma massa de cores, uma perfeita aquarela. De certa forma, faz-me lembrar dos girassóis de Van Gogh, e também tenho certeza que o mesmo iria se servir daquele cenário como se estivesse em um banquete.

    Antes que de fato o sol dê lugar à lua, ele para a moto em um determinado ponto. Não há mais sinal de civilização ali. Apenas a linha contínua da rodovia e árvores ao arredor.

    Deveria estar com medo ou algo assim, mas só sinto curiosidade.

    — Você confia em mim? — a voz rouca indaga.

    — Você já tem essa resposta.

    — Quero te mostrar algo. — Solta um sorriso misterioso e se inclina à uma trilha a poucos metros de ontem estamos. — Vem, vamos.

    — Para onde? — questiono, um misto de emoções em minha voz. Curiosidade, hesitação e euforia oscilando. Ao lado daquele garoto tempestuosamente enérgico, a adrenalina antes sedada agora corria em meu sangue. — Você não é um assassino e vai se livrar do meu corpo nessa floresta, não é?

    Apertando os olhos sob os cílios cheios, Zane balança a cabeça em concordância.

    — Hoje posso, sim, ser um assassino, mas apenas da sua tristeza mórbida, baby.

    É inevitável, pois. Um sorriso tímido nasce em meus lábios.

    — Nesse caso, não mais me importa ser a testemunha de tal delito.

    E, assim, ele começa a me guiar por entre aquele caminho encoberto por árvores. Nosso contato, a onda frenética de algo inominável oriundo da junção de nossas peles, se mantêm até que, ao imergir na escura floresta, meus olhos se deparam com um antigo parque.

    O que se sobressai à visão, a princípio, é uma linda fonte, onde jaz um chafariz de um enorme anjo sólido em sua constituição de pedra.

    Sob as sombras das enormes árvores, bancos contornam aquele espaço. O clima que aquele lugar sob o céu noturno traz é de paz absoluta.

    — Que lugar é esse? Como você o descobriu? — pergunto, deslumbrada.

    — Eu meio que... só achei. — Volto-me para ele. — Certa vez, estava apenas andando sem rumo nessa rodovia e meio que acabei chegando aqui.

    — Parece mágico. — Vislumbro o céu encoberto por algumas nuvens pesadas que repelem grande parte das estrelas.

    — Essa não é a melhor parte. — Só tenho a oportunidade de o ouvir antes de sentir sua mão me puxando delicadamente, os olhos presos aos meus e banhados por uma promessa obscura.

    Então depois eu entendo.

    Quando Bennett me conduz até um ponto perto de uma enorme árvore ali eu vejo o espetáculo de luzes, do alto, onde se pode assistir toda a cidade de Ashville — é de tirar o fôlego.

    — Deslumbrante... — sussurro, impressionada, uma brisa gélida beijando meu rosto.

    O moreno retira sua jaqueta de couro e a deposita sobre o chão, um convite para nos sentarmos. E assim o faço, podendo assistir com mais plenitude o cenário que se passa aos meus olhos.

    — Hoje foi... único.

    — Para mim também — confessa, como se estivesse acabando de perceber aquilo. — Senti saudades disso.

    — A saudade é principal consequência da distância.

    — A distância às vezes é o melhor remédio.

    — Dos covardes?

    — Não, dos sobreviventes — Zane Bennett finaliza em um tom tão baixo, que quase se torna inaudível.

    — Você disse que eu não precisava mais enfrentar isso sozinha — retomo, ignorando descaradamente o alarme que se ascende em minha mente. — Mas você o fez.

    Abraço meus braços para inutilmente me proteger da outra brisa que beija minha pele.

    Ele fica em silêncio, a princípio.

    — Eu não consegui enfrentar sozinho — confessa após um minuto sob o som da noite. — Só caí mais ao tentar.

    — Eu só queria entender o porquê. Repeti para mim inúmeras vezes que o motivo foi você me culpar por tudo ou, não sei, talvez não saber lidar com as lembranças dele que eu acionaria.

    — Não. — A voz era emergente, o semblante contorcido. — Você... Você nunca foi um gatilho, nunca foi culpada na história. Ninguém foi.

    — Então me fale o motivo!

    Uma lágrima escorreu.

    — Eu não podia te arrastar para meu próprio inferno, Brooke!

<<<<<<>>>>>

*Obs.: os "girassóis de Van Gogh" os quais foram citados se remetem à famosa pintura do pintor Vincent Van Gogh, nomeada como Three Sunflowers in a Vase.

<<<<<<>>>>>

oi, amores ;b

quero agradecer pelos comentários positivos que a obra vem recebendo, fiquei muito feliz em ler todos os feedbacks. meu sincero obrigado a todos vocês que estão acompanhando o conto S2.

um pequeno spoiler: no próximo capítulo teremos meio que um pov do zane. gostaram?

de sua autora, 

K. L. Lawrence

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top