Capítulo 4 - A Flor de Lótus
— Dádiva? — questionei, sentindo uma mistura de curiosidade e apreensão.
— A Chama Ancestral é nossa mais preciosa herança — falou uma voz atrás de mim.
Virei-me e deparei-me com a Rainha Zara se aproximando de nós, acompanhada por um grupo de pessoas. — Este é um momento especial para você, Lysandra. O fogo que arde no centro deste salão é uma expressão viva da magia que flui em nossas veias.
Os olhos da Rainha Zaya brilhavam com uma intensidade que denotava respeito e reverência pela Chama. Era como se estivéssemos diante de algo divino, algo que transcendia a compreensão comum.
— A Chama Ancestral é um elo direto com os dragões ancestrais, uma fonte de poder que se manifesta em habilidades extraordinárias — falou o Rei Adrian, unindo-se à explicação da Rainha.
— Há mais na origem de Drako do que os registros revelam - começou a rainha, estendendo-me sua mão num gesto de confiança. Aceitei, e juntas dirigimo-nos a uma parede adornada com uma série de desenhos que contavam uma história profunda - Nossos antepassados encontraram a necessidade de ocultar parte da história para que todo o reino pudesse desfrutar de harmonia e serenidade. Embora a tradição ensine que apenas quatro dragões elementares existiram, a verdade é que houve um quinto.
Ela apontou para um desenho retratando dois dragões, um azul e um vermelho, encarando um dragão menor de cor roxa.
— No auge de nossos conflitos com o clã do fogo, nasceu um dragão resultante da fusão da água e do fogo. Ele era uma manifestação única, algo jamais testemunhado antes. Já que com as intrigas que sempre permearam nossa história, nunca havia ocorrido essa combinação.
Fiquei boquiaberta com a revelação. A história que aprendi durante toda a minha vida estava sendo reescrita diante dos meus olhos. Era um conto de dragões muito mais complexo e intrincado do que eu jamais imaginara.
— Acreditava-se que esse dragão, chamado Nyflam, teria o poder de acalmar as tensões entre os clãs e promover a paz. No entanto, infelizmente, acabou por gerar mais intrigas entre eles. Nenhuma das famílias entrava em acordo sobre a existência desse poder elemental que não deveria existir. Era contra todas as nossas crenças, existir um elemento espírito, quando sempre acreditamos que só existiam água, fogo, terra e ar.
— A discordância causou um racha profundo entre os clãs, gerando o último conflito, aquele que é conhecido por todos, por causa da destruição de uma das cavernas mais emblemáticas da cidade, e resultante na expulsão do clã fogo do reino. O que não sabem é que Nyflam morreu naquele dia. Foram encobertos todos os traços da existência de seu elemento.
A confissão da rainha acrescentou uma nova camada de complexidade à história. Nyflam, o dragão nascido da fusão da água com o fogo, enfrentou seu destino no meio do conflito que deveria resolver. Uma criança no meio de uma briga de gigantes, não conseguia imaginar como tinha sido sua vida
— Os registros foram manipulados para proteger a frágil paz que emergiu após o conflito. Acreditava-se que manter o segredo da morte de Nyflam preservaria o equilíbrio, mas, na verdade, criou uma narrativa distorcida que perdura até hoje — acrescentou a rainha, revelando um aspecto da história que havia sido cuidadosamente guardado.
Enquanto observávamos os desenhos na parede, percebi como as escolhas de nossos antepassados moldaram não apenas o reino, mas também a percepção que tínhamos da nossa própria história. O elemento espírito, que deveria ser um símbolo de união, tornou-se uma fonte de divisão e disputa. Uma criança no meio de uma briga de gigantes, era cruel de mais imaginar.
— No entanto, antes de falecer, ele entregou para sua mãe seu bem mais precioso, sua chama ancestral. Ele lhe pediu para parar com aquela guerra sangrenta e prometeu que sua chama concederia poder adicional a todos os membros de nossa raça que tivessem o coração bom, para tornar nosso reino um lugar pacífico para se viver. Desde então, escondemos esse segredo de todas as maneiras para evitar entrarmos em guerra entre nós mesmos novamente pela ambição de poder.
— Isso começou uma tradição, que respeitamos desde então. Todo jovem da família original, ao completar dezesseis anos, é abençoado pela chama ancestral, para ajudar na proteção de Drako. Com essa benção, lhe é entregue uma dádiva. — concluiu, encerrando o relato com um olhar pensativo em direção aos desenhos que contavam a história do reino.
Após a revelação, senti-me imersa em pensamentos, absorvendo a grandiosidade e a complexidade da história que estava sendo compartilhada. Os desenhos na parede contavam uma narrativa única, revelando eventos que moldaram não apenas o destino dos dragões elementares, mas também a história do reino de Drako.
— A chama ancestral é uma dádiva preciosa, mas também uma responsabilidade. Cada geração, ao receber essa bênção, assume o compromisso de proteger nossa terra e manter a paz que tanto almejamos.
Enquanto a rainha falava, meu olhar percorreu os desenhos, cada imagem contendo fragmentos de uma história que eu mal arranhara durante toda a minha vida. Nyflam, o dragão de elemento único, agora se revelava como uma figura central, cujo sacrifício inadvertido havia moldado o curso da história.
— Mas a chama ancestral não é apenas uma fonte de poder; ela também é uma conexão entre as gerações passadas e presentes — acrescentou a rainha, tocando suavemente um dos desenhos. — É um elo que transcende o tempo, unindo nossa linhagem à sua origem e recordando-nos de que somos guardiões de uma herança única.
Senti um misto de admiração e responsabilidade, percebendo que a tradição da chama ancestral era mais do que uma simples cerimônia. Era um legado a ser honrado, uma conexão com as raízes profundas de Drako que ultrapassava as páginas dos registros e desenhos na parede.
— Lysandra, como herdeira da linhagem dos Wyrmgard, é seu dever e privilégio receber a chama ancestral agora que completou dezesseis anos — afirmou a rainha, dirigindo-se a mim com um olhar significativo.
— Aceito com humildade essa responsabilidade, Majestade. Prometo honrar e proteger a tradição da chama ancestral com todo o meu coração — respondi, consciente da importância do compromisso que estava prestes a assumir.
A rainha Zaya assentiu com aprovação, e juntas nos aproximamos da Chama. Diante do brilho do fogo central, senti uma combinação de emoções - respeito, fascínio e um leve toque de apreensão. O fogo pulsava em uma dança etérea, como se estivesse ciente da importância do momento.
— Como procedemos? — perguntei.
— Você deve tocar na Chama e abrir seu coração para a essência dos dragões. Deixe que a energia ancestral flua através de você. — instruiu.
Com passos hesitantes, me aproximei do fogo central, onde a Chama crepita em tons azuis e dourados. À medida que chegava mais perto, sentia a intensidade do calor, mas não era um calor comum. Era uma energia viva, pulsante, como se o próprio fogo fosse uma entidade consciente.
Ao toca-la, fechei os olhos e respirei fundo. Senti uma onda de calor envolver-me, uma sensação reconfortante e ao mesmo tempo avassaladora. Abri meu coração, buscando conectar-me com a essência ancestral que residia ali.
Em meio a esse processo, imagens começaram a se desdobrar em minha mente. Visões de dragões majestosos, cidades antigas e eventos que transcendiam a compreensão humana. Era como se eu estivesse testemunhando a história viva dos dragões, absorvendo sua sabedoria e poder.
— Aceite a dádiva, Lysandra. — A voz da Rainha Zara ressoou suavemente
Com determinação, aceitei a responsabilidade que estava diante de mim e senti a Chama Ancestral responder à minha aceitação, envolvendo-me em sua luz radiante.
Em seguida, uma flor mágica apareceu, uma que nunca tinha visto antes e que deveria ser impossível eu não conhecer. A flor cai delicadamente em minhas mãos que se estendem em automático para pega-la. Sinto sua energia, pulsando em sincronia com meu coração.
— A Davida da Flor de Lótus - ouvi alguém arfar próximo a mim.
Diante da revelação, meu olhar se fixou na flor com genuína admiração. Suas pétalas brilhavam em tons etéreos, como se carregassem os próprios segredos da natureza. Era uma flor que transcendia a magia comum, uma manifestação única de poder e beleza.
— A Flor de Lótus é um presente raro, nunca antes concedido a ninguém. — explicou Isabella, a amiga de meu pai, que agora se aproximava com um sorriso gentil.
Enquanto segurava a flor delicada em minhas mãos, senti-me sendo fortalecida pela dádiva. Minha conexão com a natureza atingiu novas profundidades. Podia sentir as plantas ao meu redor, compreender a linguagem da terra e até mesmo discernir os sentimentos que pulsavam através da natureza.
A Flor de Lótus tornou-se uma extensão de mim mesma, uma fonte de sabedoria e energia que fluía em harmonia com o mundo ao meu redor. Cada pétala brilhava como um reflexo de possibilidades, revelando um caminho de descoberta e responsabilidade.
— Lysandra, agora você é a guardiã da Flor de Lótus. Este é um fardo sagrado, mas também uma bênção para nossa linhagem. Use esses dons com sabedoria e compaixão — a Rainha Zara aconselhou-me com seriedade, mas seus olhos revelavam confiança em minha capacidade.
Assenti, ciente da magnitude do que acabara de acontecer. A responsabilidade de proteger Drako e sua harmonia recaía sobre meus ombros, e eu aceitava esse encargo com gratidão e determinação.
Ao retornar ao salão central, percebi a presença das demais pessoas que observavam de uma certa distância. Theron, Lucius, Gael e Dante estavam ali, lançando olhares de curiosidade misturada com respeito. Theron, com seus cabelos prateados, exibia um sorriso que denotava nossa antiga familiaridade, enquanto Dante me fitava com um brilho de reconhecimento em seus olhos claros.
— Parabéns, Lysandra. — Theron Skylark cumprimentou-me, sua voz carregada de respeito.
Agradeci a todos com um gesto discreto e, acompanhada por meu pai, afastei-me na penumbra do salão.
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