Capítulo 05

O demônio não esperou para que Lucas pudesse contar o seu plano a Douglas. Ele correu na direção dos meninos, berrando, exibindo seus dentes afiados e com os braços esticados, revelando grandes unhas negras nas pontas dos pequenos dedos de Sophia.

Lucas e Douglas rolaram para lados opostos, deixando o demônio passar direto e logo se puseram sob os pés. A criatura rosnou com raiva e deu meia volta, indo na direção de Douglas que começou a correr pelo salão.

--- Esta é uma boa hora para você contar o plano, Lucas! - gritou o menino loiro. --- Seja ele qual for, eu aceito!

--- Tudo bem - Lucas correu até uma das vidraças --- Distraia ele, ela, sei lá! Preciso de tempo!

--- O tempo está escasso, estou a beira da morte! Vamos, conte-me logo qual é o seu plano!

Lucas parou e enguliu em seco. Respirou fundo e chutou a vidraça uma, duas, três, quatro, cinco vezes, até que ela estilhaçasse. Ele se abaixou para pegar um pedaço de vidro grande e pontudo o suficiente para que o seu plano pudesse dar certo.

O garoto encarou o caco e engoliu em seco novamente. Seus pensamentos lhe atormentavam. Por um momento tentou pensar em algo melhor, mas nada lhe veio em mente. Só havia uma maneira de escapar dali, e ele teria que seguir em frente se quisesse salvar a vida do amigo e a própria vida.

Então, ele se levantou e observou Douglas correr e o demônio correndo atrás dele. A coisa parecia se divertir. Era como se ela não quisesse matar os meninos de imediato, mas brincar um pouco antes, aumentando o sentimento sofrido de angústia e aflição.

Com um longo suspiro, Lucas seguiu adiante. Com passos lentos, ele caminhou até um ponto onde Douglas provavelmente passaria. Escondeu a mão com o vidro atrás das costas e esperou. O coração estava demasiadamente acelerado, assim como a respiração estava desregulada.

É o único jeito.

Ele tentava a todo o tempo se consolar. Tentava convencer a si mesmo que não tinha outra alternativa. Ao mesmo tempo em que se culpava; condenando-se por ter sido dele a ideia de entrar naquela casa. Sophia alertou que aquela era uma ideia idiota, mas ele com sua babaquice, zombou da menina, que acabou aceitando o desafio.

E no fim, ela estava certa. E infelizmente, estava passando por uma situação horrível e teria um destino ainda pior. Por culpa dele.

"Acho uma péssima ideia. Vamos ficar juntos"

Lucas lembrou-se das palavras da garota e de ele ter mais uma vez zombando dela logo depois. Como era idiota; como era burro.

Agora, estava prestes a fazer a pior coisa que já fez na vida, e sabia que se condenaria pelo resto de sua existência.  Mas era o único jeito.

E lá vinha Douglas, correndo aos tropeços, suando e ofegando como se tivesse participando de uma maratona. Ele já estava quase caindo, devido as dores nas pernas e nos pés, mas viu Lucas a sua espera e se forçou a correr mais um pouco. O demônio estava logo atrás dele, dessa vez, correndo como uma pessoa normal.

--- E então, Lucas, o que pretende fazer?! - Douglas questionou, já chegando perto.

O negro não respondeu. Ele firmou os pés no chão e tomou cuidado para não apertar muito o caco de vidro e acabar se cortando. Calculou mentalmente a velocidade que seu amigo estava correndo, da mesma forma da criatura. E também calculou o tempo em que os dois passariam por ele. Se os seus cálculos malucos estivessem errados, o plano cairia por água a baixo.

E então, ele esperou só mais alguns segundos. Quando Douglas passou como um foguete, e logo atrás o demônio, Lucas não perdeu tempo e colocou o seu plano em ação; com uma velocidade descomunal, ele acertou o pescoço do corpo frágil de sua amiga com o pedaço de vidro.

O demônio gritou, rosnou e parou de correr. Lucas não esperou ele se recompor e logo se aproximou e derrubou o corpo frágil com um chute. O espírito gritava em agonia, e o menino pôs o pé em cima do vidro e forçou para que entrasse ainda mais na carne da garota, fazendo jorrar uma mistura de sangue e líquido negro.

--- Luuuuucas! - Douglas gritou desesperado, ao ver o que tinha acontecido --- Meu Deus, o que você fez, Lucas?!

Lucas ainda empurrava o resto de vidro, que projetava-se para fora do pescoço de Sophia. Sua mente estava vazia. Ele não conseguia pensar em nada, como se o seu corpo tivesse sido programado para fazer aquilo.

A criatura esperniava, e Douglas podia jurar que ouviu um resquício da voz de sua amiga, quase inaudível.

--- Não. - ele sussurrou, aproximando-se do corpo que estava perdendo a cor. Perdendo a vida.

Sophia estava indo embora, juntamente com o espírito que tomou o seu corpo.

--- Era o único jeito. - disse Lucas, friamente.

--- Não, não era. - Douglas balançou a cabeça em negação --- Sempre tem um outro jeito.

--- Então por quê você não sugeriu nada melhor?

--- Por que eu... Eu... Caramba, Lucas. Tinha que ter outro jeito.

Lucas suspirou.

--- Agora é tarde.

Percebendo que o corpo estava inerte, ele tirou o pé do pescoço da menina e deu um passo para trás.

--- Então acabou? Vamos embora?

--- Não, ainda não acabou.

Douglas levantou o olhar, confuso.

--- Como assim?

Lucas ergueu a cabeça e olhou para o seu amigo. Os olhos dele que eram castanhos, agora estavam completamente azuis.

--- Você é o próximo.

--- Ai, meu Deus. - choramingou.

O menino, agora possuído, sorriu com malícia.

--- Nem tente escapar. - falou com uma voz assustadoramente grossa --- E não olhe para trás.

Teimoso e curioso, Douglas olhou. Deparando-se com um muro de cortinas brancas, desenhadas por muitos rostos que se mexiam, ele gritou. Deu um passo para trás e tropeçou no corpo morto de Sophia, caindo no chão, sob os pés de seu amigo endemoniado.

Os olhos de Lucas o encaravam com diversão. E ele lambeu os lábios, como se Douglas fosse um prato de comida muito apetitoso.

Os rostos emitiam sons assustadores, como gritos de dor e desespero. Douglas não aguentou mais e urinou nas próprias calças, causando risos no demônio.

--- Renda-se, garoto. Não tem mais para onde ir. As almas de seus amigos agora pertencem a mim. E logo, a sua também pertencerá.

Douglas não sabia identificar se o seu coração estava batendo rápido demais, ou se tinha parado de vez. Ele não conseguia mais sentir o oxigênio entrar por suas narinas. Os barulhos lhe causavam tremores incontroláveis, o fedor forte de carne podre lhe dava ânsia, porém ele não conseguia vomitar; parecia que a sua garganta havia se fechado.

E a sua visão... Sua visão tornou-se turva. Ele sentiu a cabeça girar, ele sentiu tontura. E por fim, sentiu todo o seu corpo desligar e uma densa escuridão lhe engolir.





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