Capítulo Único
Lembro-me de como o Natal era algo tão especial para mim, de como eu ficava todo empolgado esperando que papai Noel descesse pela chaminé para deixar meu presente embaixo da árvore que todo ano era muito bem decorada, fazia questão de enche-la de pisca pisca na minha mais pura inocência de acreditar que quanto mais acesa e chamativa papai Noel pudesse primeiramente vê-la la do céu enquanto passasse com seu trenó sendo puxado pelas renas na qual entre as nove gostava mais da Rudolph com seu nariz vermelho.
Ficava sentado no tapete da sala com as pernas cruzadas comendo uns biscoitos em formato de coração que minha mãe fazia para comermos na ceia mas como sempre dava um jeito de comer alguns antes, eram muito saborosos. Assistia a filmes de Natal e durante o filme sempre me perdia nos meus pensamentos ao me imaginar andando na neve, acredito que toda criança sonha ou já sonhou em ver a neve de perto e toca-la, recriar as famosas cenas onde se deitam no chão coberto por aquele tapete branco enquanto mexem as pernas e braços.
E hoje ao meu ver era pura futilidade, crianças sonham demais e quando a gente cresce não sabe ao menos o que quer fazer da vida apenas sabe que não está vegetando. Coisas mágicas e fantásticas como o Natal para mim se tornaram completamente irrelevantes, tudo começou a se desmoronar quando em meio a ceia meu pai entrou em casa tão bêbado que não se quer conseguia se manter de pé sem cabalear, foi em direção a mesa e puxou o pano dela que minha mãe juntamente com a minha irmã a arrumaram perfeitamente.
Tudo se foi ao chão, toda aquela comida que demorou para ser preparada e foi feita com muito amor, por um instante tudo ficou em silêncio e todos se olhavam com medo e sem entender o que havia acontecido. O silêncio foi quebrado quando meu pai tropeçou em uma vasilha e caiu por cima de toda a comida no chão e por ali ficou desmaiado. Cenas como essa ainda não era algo comum já que meu pai nos visitava uma vez por ano ele nem sequer nos telefonava para saber como iam as coisas, não era algo que eu queria que ele fizesse eu não me importava com isso, não se importava dele ter sumido de nossas vidas de não ser presente.
Minha irmã Valentina era a mais nova, ainda tinha seus pensamentos inocentes como toda criança e eu tentava a todo custo fazer com que ninguém os estragassem, certa vez quando tiverem a ousadia de lhe dizer que a fada do dente não existia, fui até a escola tirar satisfação com o coleguinha de classe dela, sei que ele era apenas uma criança também e se a vida do garoto foi destruida e tiraram ele da inocência de acreditar na fada do dente não é por isso que vou deixar que digam o contrário e estraguem a criatividade da minha irmã. Ela sempre perguntava de nosso pai principalmente quando fazia os presentinhos na escola no dia dos pais e como aquele inútil não estava presente ela me entregava. Apesar de serem uns bonequinhos horríveis desenhados parecidos com ETs eu os guardava com muito carinho.
Faltavam apenas um dia para o Natal e todos estavam empolgados ja começando a montar a mesa da ceia, eu estava a tanto tempo sentado no sofá mantendo minha boa postura enquanto via a alegria que irradiava de todos ao meu redor isso me irritava de uma maneira que não sei explicar. Quando estava quase virando parte da mobília finalmente criei coragem e me levantei dali, fui em direção a porta e a abri sem nem me dar ao trabalho de fecha-la novamente.
Saí perdido em pensamentos em meio aos meus devaneios a andar pela calçada olhando para o céu com a palma das mãos massageando minha testa numa tentativa de fazer com que a dor de cabeça latejante sumisse. Fazia um calor infernal era um sol de meio-dia e meia eu suava como nunca minhas roupas estavam quase encharcadas e minha pressão arterial cada vez mais baixa indicava que eu deveria sair daquele sol pleno e ir procurar uma sombra antes que eu desmaiasse.
Quando desviei de uma lixeira que estava colocada de forma errada na calçada acidentalmente me esbarrei em uma moça que vinha logo atrás de mim e tentava me ultrapassar, ela caminhava rapidamente como se estivesse atrasada ou fugindo de algo, caminhava estranho e em passos longos.
"Oh! Me desculpe!"
Ela nem sequer me respondeu e continuou seu caminho andando depressa, fiquei parado a olha-la cada vez mais se distanciando até sumir de minhas vistas ao virar a esquina. Fui tirado de meu transe quando uma idosa tocou em meu braço e apontou o dedo para o chão onde havia um bloquinho de notas de um neon laranja que parecia brilhar no sol escaldante, me abaixei para pega-lo.
Tentei chamar pela moça mas ela não me respondeu, esperei alguns segundos acreditando que ela ao menos olhasse para trás mas nem isso ela fez. Voltei para casa, quando adentrei todos me olharam mas logo voltaram a fazer seus afazeres como formigas, me sentei na cama e disquei o número.
"Alô?"
"Gostaria de passar o Natal comigo?"
Aquele pedido vindo de uma desconhecida me pareceu muito estranho, insistente em querer saber o que eu iria responder ela permaneceu na linha por 3 minutos. Por diversas ceias enquanto eu tentava dormir eu pensava que qualquer outra família estava tendo um dia perfeito, um Natal digno de um sorriso sincero em uma fotografia de frente a uma bela árvore de Natal brilhante como as estrelas ! Mas, eu não tinha aquilo há anos, pensava que se eu passasse com algum desconhecido eu seria mais bem acolhido que na minha própria família. Aquele convite me fez despertar essa ideia maluca que me cercava.
"Aceito"
"Te encontro no mesmo lugar em que nos esbarramos"
Ela desligou.
Se fosse uma sequestradora? Ah, qualquer lugar fora da minha casa seria melhor, até mesmo um cela silenciosa longe de qualquer barulho. Dentro de mim eu sentia uma ansiedade avassaladora, sentia que seria algo bom, algo que eu não saberia explicar. Eu me vesti bem, comi uns pedaços de batata assada e saí para a rua as sete em ponto, estava um pouco escuro as luzes dos postes não iluminavam muito bem e estavam prestes a se apagar de vez. Eu fiquei ao lado da lixeira e esperei até que a moça aparecesse, foi quando a vi chegar sorridente e me cumprimentar como se nos conhecêssemos há anos. Eu não a conhecia mas de alguma forma me sentia bem ao seu lado, mas ela por outro lado parecia ja me conhecer.
Sentamos no banco da praça. O vento gelado na minha pele me fazia arrepiar, ficamos em silêncio por alguns minutos e eu escutava os risos vindos das pessoas que passeavam por la tranquilamente.
"Por 3 anos eu te observava pela janela. Eu via a sua tristeza, eu vi aquela briga. Sinto muito Caleb"
"Que?"
"Se lembra de que você pedia para ter um Natal feliz? Sou uma fada Caleb ! "
"Ah deixe de besteira. É Natal ! Fadas não existem muito menos no Natal."
Vislumbrei seus pés brilharem, ela sorriu para mim e num piscar de olhos desapareceu. Levantei assustado e girei meu corpo procurando por ela em algum canto da praça, eu só podia estar sonhando ! Estava virado de costas para o banco, senti um pé dar um pequeno chute em meu traseiro, a moça havia reaparecido, estático e de olhos arregalados eu observei ela que ria como uma criança encapetada. Todos passavam por mim e olhavam como se eu fosse um maluco, um doido fugido do hospício, era possível que ninguém mais a visse e eu estivesse falando sozinho. Um idoso se apoiando em uma bengala me chamou de levado a bréca.
"Não seja tolo, só você está me vendo. Sente-se aqui quero te mostrar algo"
Um impulso maluco estremeceu meu corpo e tudo ficou dourado, assustado e com os olhos fechados passei a mão pelo lugar que estava sentado e abri ao escutar a voz de meus familiares confirmando de que havia surgido em meu quarto, a fada segurava uma cenoura dourada. E pediu que eu fizesse um pedido, aquele pedido que eu não havia feito mas ela sentia que eu queria fazer, porém tinha medo de não ser como eu esperava e sonhava.
"Vamos, tenho outros Caleb's me esperando por esse mundo a fora loucos para fazererem um pedido enfiado"
"Enfiado?"
"Sim, aqueles pedidos que estão enfiados no fundo de suas mentes"
"Ora, mas eu não tenho"
"Você tem, não quer admitir. Vamos faço o pedido ! "
Pensei em todos os ocorridos nesse tempo curto em que eu ja havia vivido, a fada esperava impaciente comendo suas unhas, sua dica era "Natal". Pensei, pensei e pensei. Foi então que eu olhei para uma foto antiga em cima da minha cômoda, meu pai, minha mãe, eu e Valentina sorriamos.
Do fundo de minha alma fiz o pedido. A fada sumiu, tudo ficou dourado e quando abri meus olhos meu pai entrou pela porta do quarto, me deu um abraço e me chamou para ceia. E foi assim que o desastre do Natal havia se desfeito da mente de todos e uma última vez vi a fada sair pela janela da cozinha.
" Feliz Natal Caleb !"
-Fim-
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