Capítulo seis; Só a gente nessa conexão
Já se fazia um mês desde que Miguel e eu nos conhecemos e, com a ajuda de Julia, começamos a fingir tem um "relacionamento". E tudo estava ocorrendo bem. Como combinado, todas as Sextas Miguel e eu saíamos juntos depois da faculdade e tínhamos várias fotos e snaps juntos — pode parecer clichê mas até lomotif tínhamos —. Erick, desde então vivia me mandando mensagem e conversando todos os dias comigo; ele chegou até a me chamar para sair algumas vezes mas eu neguei porque tinha que sair com Miguel e, também, porque Julia disse que eu não podia estar disponível para ele.
Nosso plano estava indo perfeitamente bem, diga-se de passagem. E nós dois estávamos nos dando muito bem. Era fato que estávamos passando mais tempo juntos do que o combinado mas foram tempos bons para que nos conhecêssemos o suficiente.
Agora, estávamos aqui, num Sábado a noite, no sofá da sala de Miguel vendo um filme qualquer. Na verdade, nosso plano era assistir a um filme mas ele estava tão chato que agora eu mexia no meu celular e o garoto estava deitado no meu colo fazendo o mesmo.
— Aí, tu já viu o trailer do novo filme do Homem-Aranha? — Miguel olhou para cima e eu deixei meu celular de lado, negando com a cabeça. — Podíamos ver. O que tu acha? Nunca fomos no cinema juntos... — ele se ajeitou no sofá e me cutucou para que eu fizesse carinho no cabelo dele.
— Acho que é porque eu estudo e trabalho e não tenho muito tempo. Não acha? — sorri debochadamente, levando uma de minhas mãos para seu cabelo. — E outra, eu não curto muito filme de super herói...
— A Rebecca, para! — ele me olhou feio. — Eu até chamaria o Nike e o Orelha pra ir comigo mas eles, ultimamente, não estão podendo sair do morro...
Olhei para ele novamente.
Eu já sabia toda a história dos meninos e, aquelas conversas não eram mais novas pra mim mas, eu ainda não estava acostumada. Matheus e João Pedro não tinham cara de serem traficantes e, quando eu descobri, fiquei bastante chocada. Eles, no tempo, tentaram mentir para mim para que eu ficasse tranquila mas não dava, estava muito na cara já. Assim, que eu soube deles, descobri também um pouco da história do pai de Miguel e a fixação dele em ser igual ao pai dele.
Lembro que esse assunto havia sido nossa segunda e, até então, última discussão. Porém, eu decidi abrir mão daquilo quando Nathaly conversou comigo. Eu ainda não aceitava a ideia dele querer ser traficante mas nada podia fazer. Miguel não ia desistir e eu não podia impedir; mesmo que ele fosse apenas meu amigo, aquilo me incomodava porque eu sabia que aquela vida não tinha futuro. Você só se tem dois destinos: morrer ou ser preso.
— Obrigada por me fazer ser sua segunda opção, seu otário. — apertei fortemente suas bochechas com a minha mão e ele riu, se soltando de mim.
— Ô seus lindos! — olhamos para a escada e vimos Nathaly descendo. — A Julia acabou de me mandar mensagem. Ela não quis incomodar os lindinhos aí mas perguntou se vocês estão a fim de ir numa festa que ela tá dando.
— Festa? A Julia é louca, só pode. — levantei as pernas para que Miguel saísse de cima de mim. — O nosso apartamento é pequeno, não dá pra fazer uma festa lá.
— Ih, tu é 'mó mata baile, hein? — Miguel cruzou os braços. Apenas ignorei ele.
— Mas a festa não é na casa de vocês. — Nathaly riu. — Ela teve que ir na casa dos pais dela resolver umas coisas, só que eles tiveram que ir não sei onde e não vão voltar hoje. Resumindo: ela tá dando uma festa lá.
— O que acha de ir? — bati na perna do garoto que estava coberta pelo edredom.
— Eu acho uma boa. Bom que eu não preciso gastar a grana que eu não tenho comprando algo pra tu comer no morrão. — deu de ombros.
— Ei! Eu ia fazer comida hoje, lembra?
— Bom, mais um motivo pra gente piar na festa da Julia. — se levantou num pulo e eu chutei sua perna direita.
— Então nós vamos? — Nathaly sorriu animada. Assenti com a cabeça. — Ai finalmente! 'Tava cansada de ficar trancada no meu quarto já.
— Ué amiga, era só ficar vendo filme com a gente. — sorri me levantando do sofá.
— E segurar vela? Obrigada mas eu passo. — riu. — Falando em festa, vai com que roupa Becca?
— Ah, eu trouxe uma roupa caso fosse sair com o Miguel. Posso sair com ela. — sorri. — Mas vou precisar da sua ajuda pra fazer minha maquiagem. — dei uma piscadela.
— Pode deixar cunha. Vou tomar meu banho. — a morena riu, logo subindo as escadas.
— Já 'to ligado que o Erick estará lá. Eu não 'tava muito a fim de ver ele não... — Miguel chamou minha atenção e eu ri anasalado.
— Lorenzo, você quase nunca fica muito tempo no mesmo lugar que ele. Aguente só por hoje, sim? — me aproximei dele e ele permaneceu sério.
Da primeira vez que havíamos discutido, foi porque havia entrado em seu quarto sem permissão e porque havia o chamado pelo sobrenome — que era algo que ele odiava —. Porém, o chamar pelo sobrenome foi algo inevitável e ele acabou relevando, mas só eu podia chamá-lo assim. Era bom que agora tivéssemos mais liberdade um com outro. Mesmo sabendo o que Miguel queria se tornar, eu não tinha medo dele, afinal, eu sabia que ele não seria capaz de fazer nada comigo de verdade.
— Becca, eu não suporto olhar pra cara dele. Só vejo ele quando te busco na faculdade e nem olho direito porque fico ocupado demais beijando você. Mas, ele te fez de trouxa e você ainda corre atrás dele, o que me deixa mais puto. Juro que se ele fizer algo nessa festa, eu soco a cara dele. — ele contraiu a mandíbula e eu suspirei.
— Miguel, não faça nada, por favor. Só vai comigo e vamos curtir a festa. Se o Erick for, a gente faz o que sempre faz: ciúmes.
— Não prometo nada. — olhou para o lado e fez cara feia. Ri.
— Olha pelo lado bom. Não vou dormir aqui hoje, você não vai precisar acordar cedo pra fazer meu café da manhã. — dei um soco leve em um de seus ombros.
Contando com hoje, essa seria a quarta vez que eu dormia na casa do Miguel. Eu não dormia no quarto dele, claro, dormia com a Nathaly no quarto dela. Ela nem estranhava, sabia que seu irmão não deixava ninguém entrar no seu quarto; chegou até a dizer que suas ex namoradas nunca entraram mas o obrigavam a dormir na sala com elas e pediu para que eu me acalmasse. Nathaly também havia me dito que Miguel não confiava muito nas pessoas desde que seu pai morreu e que, se ele não deixou ninguém entrar no seu quarto, é porque ele não sentia aquelas pessoas totalmente confiáveis para ele.
— Já é... — mordeu os lábios e voltou a olhar para mim. — Onde é a casa dos pais da Julia?
— Grajaú. — respondi indo em direção ao banheiro.
— Porra! 'To vendo que vou ter que incomodar minha coroa pra pedir dinheiro pra ela... — coçou a nuca e eu ri, logo entrando no banheiro.
Depois de algumas horas se arrumando e mais alguns minutos de um pequeno trânsito. Finalmente havíamos chegado a festa de Julia.
No quintal mesmo já pude dar de cara com várias pessoas. Já haviam muitas bêbadas e, ao fundo, se tocava Mc Lucy e Mc Rogê. As pessoas dançavam e, novamente, eu me senti no baile funk. Eu só conseguia pensar no que os vizinhos diriam no dia seguinte para os pais da Julia.
— REBECCAAAA! — Marina berrou, me abraçando.
— Marina, não sabia que estaria aqui. — sorri olhando para ela que estava com um copão na mão.
— Eu não ia vir mas o Thiago me tonteou. Até que não está ruim aqui, só a Julia que começou com essas músicas dela. — rimos. — Ah, você deve ser o famoso Miguel. — sorriu assim que olhou para o garoto que estava ao meu lado.
— Oi. — ele riu envergonhado.
— Eu adoraria conversar com vocês mas preciso dar essa bebida pro Thiago, ele deve tá me procurando por aí já.
— Vai lá. — ri, encostando em seu braço, antes que ela saísse dali.
— Gente, eu vou falar ali com o povo da minha sala. — Nathaly apontou para um povinho que estava perto da janela da sala. — Se comportem.
— Então... Você quer beber algo? — me virei para o menino que puxava sua camisa da Lacoste, a fim de que desamarrotasse ela um pouco.
— Vamos entrar e dançar um pouco lá. — ele sorriu ladino.
Assenti com a cabeça e entramos, dando de cara com mais pessoas dançando na sala e Julia, logo ali perto da TV. A luz de led verde tomava conta de todo o local e, logo perto da escada que dava para o segundo andar, pude ver Erick e seus amigos bebendo.
— Miguel, Rebecca! Vocês vieram! — Julia correu em minha direção. — Olha, recomendo vocês ficarem um pouco perto da escada, o Erick tá lá. — foi direto ao ponto, entregando o copo que segurava para Miguel.
— Julia, acho que vamos ficar um pouco aqui ainda. Acabamos de chegar e o Miguel precisa se enturmar um pouco. — sorri amarelo e senti o garoto segurar em minha mão.
— Bom, vocês que sabem. Se quiserem pegar algo pra beber, a cozinha é logo ali. — deu de ombros e apontou para trás de mim. Assentimos e ela logo foi embora.
Já fazia um bom tempo que estávamos na festa da Julia. Miguel já havia se enturmado com praticamente todas as pessoas dali e, agora estávamos conversando, um pouco afastados das pessoas. O moreno já havia bebido um pouco mas não o suficiente para estar bêbado, Nathaly dançava com suas amigas da faculdade e Marina dançava com Thiago mais a nossa frente.
— Sabe, ver essas festas de faculdade me fazem ter vontade de ir pra uma. — ele comentou, dando um gole em sua vodka.
— E por que não frequenta uma? É simples.
— Você sabe porquê. — ele apenas me encarou, seriamente.
— Miguel, você sabe o que acho dessa sua ideia ridícula e... — fui interrompida por uma pessoa que empurrou fortemente Miguel para longe de mim, fazendo com que ele derrubasse sua bebida no chão.
— Qual foi porra? Tá com o olho onde, caralho? Olha por onde anda! — Miguel empurrou o cara, irritado.
— Foi mal aí, é que eu não vejo favelados como você. — era Erick, pelo jeito bastante bêbado.
— Como é? Repete o que tu disse que eu te meto a porrada. — meu "namorado" se aproximou de Erick, ficando cara a cara com ele.
— Acha que eu tenho medo de você? — o moreno riu debochado. — Quem fala demais, não faz nada. — mordeu os lábios e empurrou Miguel para trás.
— Cê tá fodido! — foi a última coisa que Miguel disse antes de cair em cima de Erick.
— Miguel! — tentei segurá-lo mas não consegui me aproximar.
As pessoas começaram a se aproximar da cena e eu só queria tirar ele dali. Os dois estavam bêbados e aquilo não daria bom. Os dois se empurravam, tentando acertar um ao outro mas não conseguiam. Até que Erick conseguiu acertar um soco bem no rosto de Miguel.
Miguel tampou o rosto por um segundo, mas logo segurou Erick fortemente pela camisa, com fúria nos olhos.
— Miguel! Chega! — consegui puxar ele para longe de Erick, assim que Guilherme chegou para afastar Erick também.
— Qual foi da tua cara? — ele virou bruscamente Erick para ele.
— Eu acho que ganhei dessa vez. Quem é o cuzão agora, Miguelzinho? — Erick implicou rindo. Miguel tentou se soltar de mim, porém Thiago me ajudava a segurá-lo.
— Qual é o seu problema Erick? Você é um imbecil! — franzi o cenho.
— Eu? Eu só quis te mostrar que você tá com o cara errado. Você é minha Rebecca, o que tá fazendo com esse canalha? — cobri meu rosto, me negando a aceitar aquilo.
— Erick, eu nunca fui sua. Você perdeu o limite fazendo isso, seu otário! Por acaso acha que vai me ganhar batendo no meu namorado? Qual é, garoto, se liga. — me aproximei de Erick para empurrá-lo, enquanto ele ficou estático ali mesmo.
— Já chega! — Julia me tirou de perto dele. — Gui, leva ele lá pra fora e, pessoal, a festa continua. — a morena fez um sinal para que colocassem a música novamente. — Becca, leva ele lá pra cima no meu quarto. Vê se no meu banheiro tem algo pra limpar o sangue dele e fique o tempo que precisar lá.
Assenti e segurei no braço de Miguel, levando-o para o quarto de Julia.
Miguel Lorenzo
Puto. Eu estava puto por ter deixado Erick me acertar e ficar por aquilo mesmo. Eu queria matar aquele filha da puta, acabar com ele.
— Eu vou matar ele Becca, você vai ver. Vou bater tanto nele que minhas mãos vão cansar, mas vou continuar batendo até o sangue dele sujar minhas mãos. — comecei a falar enquanto Becca limpava o sangue da minha boca.
— Miguel, quanto mais você falar vai ser pior. — contraí a mandíbula ao sentir a dor que aquele lenço estava fazendo na minha boca ao tocar. — Eu não vou poder fazer muita coisa. Esse seu olho, infelizmente, vai ficar roxo. A Julia não tem remédio aqui no quarto dela. — colocou o lenço sujo ao meu lado na cama.
Rebecca ficou me encarando por alguns segundos enquanto eu fazia o mesmo. A música que tocava agora na festa era uma do Mãolee com o Cabelinho e o Orochi e, enquanto isso, eu olhava para os olhos de Becca, intercalando para sua boca vermelha que, diferente da minha, só estava daquela cor por conta do batom.
— Desculpa Miguel, eu não queria que isso acontecesse. A culpa foi minha. — abaixou a cabeça.
— Ei, ei, tá tranquilo cara. Relaxa, a culpa não foi sua. — levantei seu queixo para que ela me olhasse. — Todos sabemos que o Erick é um cuzão, mas ninguém ia adivinhar que aquele riquinho de merda não soubesse beber. E outra, eu poderia muito bem ter enchido ele de porrada mas ele me pegou desprevenido. — dei de ombros a fazendo rir.
Os risos foram cessando e um silêncio se formou entre nós. Quando eu pensei em dizer algo para quebrá-lo, Rebecca se aproximou de mim e me beijou.
— Ei, por que tá me beijando? O Erick não tá aqui. — me afastei, segurando em seu ombro.
— Eu não estou te beijando por causa dele. Estou te beijando porque quero. — novamente ela se aproximou e me beijou de novo.
Dessa vez não neguei. Coloquei minha destra sobre sua nuca e continuei a beijá-la, me aprofundando mais ao beijo. E não deu outra, deitei a morena na cama e comecei a intensificar mais.
Foda-se o Erick. Ele me deu um olho roxo mas eu ganhei o que ele mais queria: a Rebecca.
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