Capítulo 27

18 de fevereiro de 2020.

Murilo

- Você não devia ter ligado pra mãe antes de eu conseguir falar com ela! - ralho com Renata, que está comigo no quarto do hospital desde que saí da sala de exames, onde fiz todo o tipo de check-up pra ter certeza que estava tudo bem.

- Eu não sabia o que fazer Murilo! Quando cheguei aqui no hospital, ninguém me dava notícias suas, e a polícia disse que uma arma foi disparada! Eu achei que você tinha sido atingido! - tenta se justificar minha irmã.

- Foi pura sorte, pelo menos pra mim. Os policiais disseram que eu ou Rodrigo devemos ter apertado o gatilho na queda da escada, porque quando nos encontraram eu estava desmaiado por ter batido a cabeça no chão logo após ter levado uma pancada de Rodrigo, e ele estava gritando de dor por ter sido baleado na barriga. Minha última lembrança antes de acordar dentro da ambulância é do barulho da arma.

- Aquele desgraçado! Não consigo acreditar que esse cara esteve perto da Marina por tanto tempo. Quando penso em tudo o que podia ter acontecido com ela, fico até com estômago embrulhado - lamenta Renata.

- Eu sei, eu vivia com medo de que algo acontecesse. O que importa é que agora esse homem vai preso, e não vai mais incomodar nossa família. Parece que além da tentativa de latrocínio cometida contra mim, ele já estava foragido há bastante tempo por outros crimes. Espero que ele apodreça na prisão - respondo enquanto tento mais uma vez falar com minha mãe. Desde que Renata me disse que tinha ligado pra ela, tenho tentado ligar para todos eles sem sucesso. Por que ninguém atende um celular quando precisamos? Nem Maya, que dorme grudada com o aparelho, me atendeu ou respondeu minhas mensagens. A preocupação de que algo tenha acontecido com eles é grande.

Alguns minutos depois, quando eu estava quase pedindo pra Renata ir até a casa dos meus pais, eles entram no quarto em que estou, sendo seguidos de perto por Maya e Marina.

- Meu filho, ainda bem que você está aqui! - diz Dona Cassandra me analisando a procura de ferimentos, enquanto me abraça.

- Eu tô bem mãe, só desmaiei por ter batido a cabeça - respondo mirando meu olhar em minha esposa e filha, que me olham aflitas. Quando minha mãe me larga, meu pai me dá um abraço desajeitado e logo estou nos braços de Maya, que chora em meu ombro.

- Pai, eu não sei o que faria se tivesse acontecido algo mais sério com você. Eu fiquei com tanto medo!

- Eu sei minha princesa, mas você não precisa se preocupar, eu estou bem. Só estou aqui em observação até saírem os resultados dos exames que fizeram em minha cabeça.

Depois de conseguir acalmar minha filha e de contar a todos tudo o que aconteceu, percebo que Marina ainda está próxima a porta, com olhar de culpa, então peço para que a família nos deixe a sós para que possamos conversar. Quando estamos sozinhos no quarto, faço com que ela se aproxime e a abraço fortemente, e só então ela começa a chorar.

- Me desculpa Murilo, é tudo minha culpa! - ela diz entre soluços. - Eu nunca devia ter me envolvido com aquele homem, ele só trouxe ainda mais desgraça pra nossa vida.

- Você não tem culpa Marina. O único responsável pelo que aconteceu comigo é Rodrigo, e ele vai pagar por todos os crimes que cometeu. Você não precisa mais se preocupar com ele.

- Se você quiser se afastar de mim Murilo, eu vou entender. Eu sei que você teve que abrir mão de muita coisa pra me ter por perto, e eu não quero mais atrapalhar sua vida - diz ela me soltando. - Eu prometo que vou melhorar a partir de agora, você não precisa mais tentar me proteger.

- Você acha que eu fiz tudo isso apenas pra te proteger? Você é o amor da minha vida Marina, tudo o que eu fiz foi pra te ter de volta, porque eu passei dois anos insuportáveis longe de você, e não quero ter que passar por isso nunca mais - digo a puxando de volta pra perto de mim, olhando bem nos olhos dela pra que ela acredite em toda a verdade das minhas palavras. - Eu amo você Marina, nunca deixei de te amar. Eu sei que eu errei em ter mentido pra você durante todo esse tempo, e acredito que temos muito pra conversar e resolver ainda, mas se depender de mim nós podemos reconstruir nossa vida juntos: eu, você e Maya. Só depende de você.

Marina me observa calada por algum tempo, enquanto lágrimas escorrem por seu rosto. Vê-la assim, em estado pensativo antes de tomar alguma decisão, me remete ao nosso começo, a primeira vez em que abri meu coração pra ela. Apesar de ainda ter muitas caraterísticas da jovem que conheci há tantos anos, vejo em minha frente uma mulher determinada, uma mãe, uma pessoa que já passou por tanto na vida e continua de pé, apesar dos percalços que enfrentou pelo caminho. Com a dureza desses últimos dois anos, em que ela enfrentou tanta dor, alcoolismo, e uma depressão tão profunda que a fez tentar tirar a própria vida, vê-la tentando juntar as próprias peças para se tornar inteira mais uma vez já me faz muito feliz.

Quando penso que ela finalmente vai me dar uma resposta, Marina sai do quarto sem dizer nada, me deixando aflito. Não tenho tempo porém de pensar no que isso significa, porque ela volta pouco tempo depois trazendo nossa filha, que tem no rosto uma expressão tão confusa quanto a minha. Chegando perto da cama em que estou, Marina segura minha mão e a de Maya, enquanto diz:

- Filha, eu sei que você passou por muita coisa nesses últimos anos, e grande parte disso foi culpa minha, então eu te peço perdão mais uma vez pela decepção que eu causei a você e a seu pai. Eu sei que você teve muito receio de me ter de volta em casa quando eu saí do hospital, e entendo seus motivos, por isso resolvi falar com você agora antes de tomar qualquer decisão. Como você já deve ter percebido, logo antes de eu recuperar a memória eu e seu pai estávamos nos entendendo como casal, mas não falamos nada pra ninguém porque tudo era ainda muito recente, e acredito que seu pai tinha medo do que poderia acontecer quando eu me lembrasse de tudo - ela diz esperando pela minha confirmação, e eu simplesmente anuo.

- Bom, seu pai sugeriu que fiquemos juntos novamente, e eu queria saber qual a sua opinião sobre o assunto - Marina completa com certa apreensão na voz, e reparo que a mão que segura a minha está suada, sinal de que ela está nervosa com a resposta de Maya, assim como eu.

- Mãe, eu sei que eu fui ruim com você no começo, mas é porque eu tinha medo de te deixar entrar de novo no meu coração pra em seguida ser abandonada mais uma vez, e porque eu tinha certo rancor de você por eu não poder falar do Théo na sua frente, entende? Eu achava injusto ter que agir como se ele nunca tivesse existido, e me sentia mal com isso. Mas depois de ficar com você lá na praia e presenciar você se lembrando de tudo e tentando se reerguer, eu sei que você não vai nos abandonar de novo, então nada me faria mais feliz do que ver você e meu pai juntos novamente. Mas é isso que você quer?

Essa é a pergunta de ouro, penso enquanto olho pra Marina ansioso por sua resposta. Ela então olha bem nos meus olhos, e responde ainda segurando nossas mãos:

- É tudo o que eu mais quero no mundo, estar junto de vocês, estar com o homem que eu amo desde sempre, ser mais uma vez uma família. Eu amo vocês!

Quando estamos nós três nos abraçando naquele hospital que já nos trouxe e já nos tirou tanto, parece que sinto a presença de Théo entre a gente, nos abraçando e nos fazendo sentir que a partir de agora tudo vai ficar bem.

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