Capítulo 9 3275

Durante a madrugada, com as ruas desertas, Lucca dirigia tranquilo, batucando no volante ao som da música altaecoando pelo carro. Ele se sentia o dono do mundo, gabando-se do seu sucesso fajuto. O importante era que seu plano estava funcionando perfeitamente. Quem se importa com as regras quando tudo parece estar sob controle? Ele não se preocupava com nada que pudesse aparecer no caminho. Afinal, Taehyung não seria problema, então por que se preocupar?

Comemorando, bebendo direto do gargalo uma garrafa de refrigerante alcoólico de limão, Lucca seguia para o hospital. Um prédio imponente - um prédio que se destacava na cidade; conhecido por ser um lugar onde o amor e a dor se enfrentam diariamente. Era o destino final para muitos e o local onde milagres, ou a falta deles, decidiam o destino das pessoas. Quando chegou ao estacionamento, ele desligou o motor e saiu do carro. Ajeitou seu sobretudo marrom caramelo e passou a mão pelos cabelos pretos e ondulados, adotando uma expressão séria e preocupada. Tudo parte do teatro que ele sabia encenar muito bem.

Caminhou até a recepção do hospital, onde uma atendente — uma médica, pelo que parecia — o recebeu com um sorriso profissional.

— Boa noite. Como posso ajudar? — perguntou a mulher, morena, com os cabelos soltos que balançavam suavemente. Seu crachá e jaleco branco deixavam claro que estava de plantão.

— Boa noite… — Lucca respondeu, hesitante, tentando parecer nervoso. — Vim visitar meu melhor amigo. Ele foi trazido às pressas. Sabe se já saiu da UTI?

Ele apoiou as mãos no balcão, seu semblante mostrava uma preocupação quase real. Seus olhos refletiam uma mistura calculada de desespero e apreensão e abalo, como se realmente estivesse ali por alguém importante. Mas, no fundo, o que antes era querido no coração, agora era apenas parte do jogo em sua mente. A médica o analisou brevemente, talvez tentando adivinhar sua idade, avaliando o jovem, que aparentava ter uns 26 ou 27 anos, e suspirou, como se já esperasse ouvir uma história de um mais caso de imprudência juvenil.

— É uma visita? — perguntou ela, desconfiada.

— Sim! — Lucca confirmou, engolindo seco, tentando não exagerar.

— Qual o nome completo? — a médica pediu, já digitando no sistema à procurar.

— Ah! Min Yoongi! — respondeu imediatamente, controlando-se para não parecer muito ansioso.

Enquanto ela verificava as informações, ele manteve a pose. Ele foi diminuindo a intensidade da atuação. Não podia se empolgar demais, precisava parecer genuíno, mas sem levantar suspeitas. Afinal, na maioria das vezes, enganar as pessoas era mais fácil do que parecia, especialmente quando se sabe como jogar o jogo da manipulação.

Depois de alguns minutos, A médica pegou alguns papéis, e uma caneta, assinou algo e, sem dar muitas explicações, pediu que ele a acompanhas  Passou pelo balcão sem responder, deixando Lucca intrigado. Ele ergueu uma sobrancelha, ainda esperando uma resposta, até que ela entregou uma prancheta para ele assinar. Preencheu rapidamente e a entregou de volta. Ela sinalizou para que a seguisse pelos corredores silenciosos e frios do hospital.

Lucca, agora mais calmo, caminhava atrás dela. O ambiente o incomodava. Pensava no quanto aquele lugar era deprimente, apesar de estar cheio de médicos com corações bons. Mas também sabia que alguns fingiam compaixão enquanto, na verdade, eram frios e céticos. Ele não conseguia entender como alguém escolhia uma profissão assim, que drenava o emocional até a última gota. Achava deprimente estar cercado de tantas histórias de dor e despedidas. Para ele, trabalhar ali exigia mais do que ele poderia suportar. Não entendia como aquelas pessoas lidavam com tanto sofrimento diariamente. Talvez fossem realmente altruístas ou apenas bons em fingir compaixão.

Enquanto andava, perdido em seus pensamentos que foram interrompidos, e foi trazido de volta pela voz da médica:

— Ele já saiu da UTI. Está no quarto, medicado.

Lucca sentiu alívio, deu graças a Deus internamente, mas não deixou de pensar que ela poderia ser mais clara, pois estava prestes a perguntar se precisava pagar pela resposta. Detestava quando as pessoas não explicavam as coisas direito. Cruzou os braços e, com um leve tom de irritação, respondeu:

— Certo. Que bom? — disse, meio incerto. Afinal, não sabia se aquilo era uma boa notícia ou não. "Isso quer dizer o quê? Que ele tá acordado? Vou ter que adivinhar agora?" Pensou, irritado, de qualquer forma, seguiu em frente, ouvindo apenas o som dos passos dela no chão frio e esterilizado do hospital, incomodado pelo clima pesado e mórbido daquele lugar.

— Ele está no quarto 3275. Só vou pedir que use luvas, por favor — disse a médica, pegando um par de luvas descartáveis de um carrinho de enfermagem no corredor e entregando para Lucca.

— Luvas? Por quê? Se me permite perguntar? — Lucca arqueou uma sobrancelha, intrigado, segurando as luvas pequenas tentando entender a necessidade delas, visivelmente curioso sobre o motivo.

— Porque você veio da rua. É uma questão de cuidado, especialmente pela imunidade do seu amigo, que está baixa nesta situação — explicou ela, abrindo a porta do quarto. — No caminho até aqui, ele sofreu um choque dentro da ambulância. A princípio, foi diagnosticado como um ataque cardíaco, mas no meio do trajeto, as coisas complicaram.

— Tipo... um choque anafilático? — Lucca perguntou, tentando se situar fazendo uma conexão.

— Exatamente — confirmou a médica, com um sorriso profissional.

— Nossa... foi tão sério assim? — Ele perguntou, absorvendo a gravidade da situação. Por um instante, algo dentro dele pareceu se afetar. Não era só um acidente bobo, afinal. O susto havia se transformado em algo muito pior. Abalado por um momento, ele engoliu seco e se recompôs rapidamente. — Hrm, certo. Obrigado. A receita e os laudos médicos estão naquela prancheta ali na cama, né? — apontou para a cama, tentando manter o controle.

A verdade é que Lucca, mesmo sem querer, sentiu-se um pouco abalado suficiente para temer o crime que cometeu. A situação parecia muito pior do que ele imaginava. O que  Ele engoliu em seco, tentando voltar a si e manter o foco, pois ou se arrepender afundaria e estragaria tudo nessa altura da situação atual.

Enquanto fazia a pergunta, seus olhos já vasculhavam o quarto através da porta entreaberta, notando a iluminação baixa e o ambiente silencioso típico de um hospital.

— Seu amigo teve sorte. Sim, está tudo ali. Pode dar uma olhada. Com licença — respondeu a médica, lançando um sorriso discreto antes de se afastar, sendo chamada para atender outro paciente em um andar próximo.

Sabendo que restava apenas um lugar, sorriu para si mesmo de maneira confiante ao pegar com as duas mãos as contingências, separando-as por completo. Com passos firmes, aproximou-se do leito onde Yoongi, acamado, permanecia. O corpo do rapaz estava conectado a diversos aparelhos médicos: sensores no peito, tubos nos dedos, e um inalador fornecendo oxigênio. Era bem pior do que, a médica havia descrito.

O ambiente estava cheio de equipamentos: o soro pingava lentamente, enquanto o sangue do rapaz subia por um dos tubos translúcidos.

Lucca lançou um olhar atento para o monitor que registrava os batimentos cardíacos e o nível de oxigênio no sangue. Os números eram lentos, quase vagarosos, mas isso não trouxe o alívio esperado. Pelo contrário, uma ponta de insatisfação misturada a algo sombrio o dominou.

Calçando as luvas, como fora instruído pela médica, ele se aproximou do rosto pálido e frio de Min. Com um movimento cuidadoso, mas carregado de intenção, retirou o pequeno inalador de plástico que cobria o nariz e a boca de Yoongi. Um sorriso vitorioso curvou seus lábios ao inclinar-se para murmurar em seu ouvido:

— Não era minha intenção te colocar em um leito de hospital, mas, vendo agora, isso me trouxe uma satisfação parcial. Eu te admirava, sabia? Adorava você. E, mesmo assim, preferiu agir como um ignorante.

O monitor cardíaco começou a registrar um leve aumento nos batimentos, sinalizando que Yoongi estava ouvindo. Um sorriso perverso e instintivo alargou os lábios de Lucca.

— Ah, então você está ouvindo? Vou repetir! — Sua voz carregava um tom debochado e cruel. — Fui eu quem te colocou nesta cama. Espero que você demore para sair... ou, quem sabe, nem saia. Talvez fosse melhor morrer de uma vez e deixar o Taehyung livre de você. Ou, melhor ainda, me deixar fazer isso por você. Que tal?

Enquanto falava, ele segurou um dos tubos conectados à veia principal do braço de Yoongi, apertando-o levemente, como se lutasse contra o desejo de puxá-lo e ver o sangue jorrar.

— Isso me deixou tão feliz... Que pena, não é? Taehyung deve estar tão... abalado! — Ele riu baixinho, afastando-se do leito, resistindo à tentação de levar sua crueldade ao limite. — Tome cuidado. Agora, tem a mim observando cada passo seu. Quando você menos esperar, estarei lá.

Com um olhar final para o monitor, que agora apitava incessantemente, denunciando a emergência iminente, Lucca recolocou o inalador no rosto de Yoongi. Ele sabia que o tempo estava se esgotando. Pegou suas coisas rapidamente e saiu da sala antes que alguém chegasse.

Jogou as luvas no lixo às pressas, o suor escorrendo pelo rosto, enquanto deixava o hospital. Dentro do carro, cantarolava vitorioso, com um sorriso malicioso nos lábios. Ria ao se lembrar da expressão de Taehyung ao receber a notícia, ao reviver aquele momento fatídico. E agora, imaginava a reação dele ao encontrar Yoongi naquela cama de hospital, completamente vulnerável, sem sequer suspeitar de quem o havia colocado naquele estado ou dos motivos por trás disso.

Enquanto isso, os bens de Min, roubados sem piedade, logo seriam leiloados. Algumas peças iriam parar em mãos estranhas, trocadas por drogas ou até mesmo por armas na Deep Web.

Lucca saiu do hospital sem deixar rastro, ignorando a lista de visitantes. Poucos minutos após entrar em seu carro e dar partida, o caos tomou conta do hospital. Médicos passaram correndo pelo corredor, indo em direção ao quarto de Yoongi, tentando controlar os batimentos cardíacos que disparavam descontrolados, mesmo com ele ainda em coma.

Quando Taehyung chegou ao hospital, sua reação instintiva foi de puro choque. Médicos passavam por ele às pressas pelo corredor, deixando-o com o coração disparado. Apreensivo, correu atrás deles, torcendo, em um conflito interno, para que aquele não fosse o quarto de Yoongi — mas, ao mesmo tempo, desejando que fosse, para acabar com a angústia da dúvida.

Com os olhos marejados, entrou no quarto em passos hesitantes. Já chorava antes mesmo de cruzar a porta, mas, ao ver Min naquela cama, seu coração despedaçou.

O mundo de Taehyung desmoronou.

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