Capítulo 18


Capítulo 18

Estebán era fiel à sua palavra sobre trazer Zeca para casa. A matilha inteira estava agitada com os preparativos para a chegada dele e qualquer que fosse o grande baile que Estebán planejara para recebê-lo na comunidade. Eu o fiz prometer que seria menos intenso do que as minhas próprias boas-vindas. O outro lado disso era saber que ele também estava dizendo a verdade sobre ficar de olho em nós dois. Eu passei semanas vagando pela cidade por puro tédio, então resolvi colocar essa vigilância em teste.

Fiz minha rota habitual pela Avenida Paulista, parando no Parque do Trianon. O parque estava lotado, como geralmente ficava no domingo, então decidi despistar quem estivesse me observando de outra maneira. Entrei na estação do metrô e comprei uma passagem e segui em direção a linha Azul, depois baldeei em direção à Praça da Sé, saindo do vagão no momento do apito sonoro de fechamento das portas. Enfiei o ingresso extra no bolso e fingi não perceber o fato de que eu tinha rabo quando saí do metrô e fiz uma parada nos banheiros do lado de fora.

Ninguém entrou. Depois de rejeitar um pensamento meio esdrúxulo sobre escapar através de um respiradouro, voltei ao metrô por outra entrada e fui direto para o último vagão. Havia apenas cinco pessoas no trem quando embarquei então, sentei-me no banco de trás e esperei. Um par de minutos se passaram e eu estava começando a relaxar, pensando que eu estava apenas sendo paranoico. Se Estebán tivesse alguém me seguindo, certamente eles estavam atentos o suficiente para ficar um passo à frente de um 'simples humano sem noção'.

Assim que eu comecei a relaxar de volta ao meu assento, dois homens corpulentos embarcaram no trem, vestindo as roupas básicas, mas caras, de cor escura que imediatamente as identificaram como uma espécie de uniforme para o meu olho treinado de ansiedade. Eu podia ver a confiança derreter no meu rosto no reflexo da janela enquanto os estranhos embarcavam no trem e um deles se sentava no corredor em oposição a mim.

O trem começou a se mover e o lobo na minha frente dobrou uma perna sobre a outra, me observando com um olhar presunçoso que ele realmente ganhava o direito de fazer. — Olá de novo, Danilo. — disse com um sotaque espanholado ainda mais pronunciado do que o de Estebán. Seu cabelo era mais curto, mas era da mesma tonalidade escura que o do Alfa, e ele se pareciam e com Vítor, também, o suficiente para que eu me perguntasse se ele era um parente próximo. Agora que eu estava pensando nisso, tinha que haver muita relação entre os membros da matilha.

Claro que ele me conhecia. Eu poderia não o ter reconhecido em sua forma humana, mas ele era, sem dúvida, um dos lobos que estavam na clareira quando Estebán me pendurou na frente do bando como uma meia suja para farejarem. Ele conhecia meu cheiro, então é claro que minha pequena tentativa de desvio não o enganou.

Pelo menos eu admitia quando tinha sido superado, e decidi que não havia sentido em ser rude. — Nós nos conhecemos, eu suponho? — Perguntei.

— Na floresta. — Ele respondeu. Antes que ele e os outros rasgassem o outro humano em pedaços como um brinquedo de cachorro do pet shop.

— Não peguei o seu nome, mas eu provavelmente não me lembraria se você tivesse dito. Meu "lobês" não é muito melhor que meu espanhol.

Isso fez com que ele desse um sorriso de lado. A maioria dos membros da matilha que conheci eram tão frios e controlados como Zayas, mas era difícil dizer o que atribuir às diferenças culturais e o que atribuir a elas como sendo características de uma espécie completamente diferente.

— Pablo. — Ele respondeu, inclinando-se para oferecer sua mão. Eu balancei e notei como a largura do seu polegar para o mindinho era perfeita para o estrangulamento.

— Prazer em conhecê-lo, Pablo. Nada mal no rastreamento, hein?

— Nem um pouco. — ele disse em um tom agradável. — Eu rastreio melhor na minha outra forma, mas.... — Ele fez uma pausa, olhando incisivamente em torno do trem. — Não é tão discreto.

— Você sabe, essa é provavelmente a melhor ameaça que já me fizeram.

Um sorriso se espalhou pelo rosto dele. Ele era um garoto enorme em seus vinte e poucos anos, se tanto. Eu me perguntei se ele era um dos lobos que estaria me caçando quando a hora chegasse. Um dos homens que desafiaria Estebán até a morte por sua posição, se ele tivesse a chance. — Quando o Alfa me disse que eu estaria guardando seu humano, eu não achava que você iria se provar uma tarefa tão interessante.

'Seu humano'. A terminologia me irritou, então por que meu coração pulou uma batida? — Fico feliz em poder mantê-lo entretido.

— Vamos a algum lugar em particular?

— Na verdade não. Apenas queria matar algum tempo ocioso e conhecer as pessoas que tiveram o trabalho de me seguir durante todo o mês.

Ele riu. — Bem, agora você conhece. Esse é Ramirez — disse, apontando para o outro lobo do outro lado do trem. Ramirez lançou um olhar furioso. Ou talvez fosse assim que seu rosto parecia. — Não se importe com ele. Ele prefere lutar.

— Não posso dizer que eu o culpo. Vocês são alfas?

— Eu sou. — ele respondeu. — Ramirez é um beta.

— Então ... você estará me caçando? — Eu perguntei com cautela.

— Quando a lua cheia chegar, sim. Mas não se preocupe, eu não mordo... muito. — disse ele com uma piscadela.

Eu não acreditei nele. Ninguém com um sorriso tão encantador era capaz de fazer algo bom. Eu gostava desse cara, mas se eu o visse perto de mim num beco escuro sairia correndo e gritando. — Eu vou manter isso em mente. Então, você quer ser o Alfa?

— Dificilmente. — Bufou. — Eu prefiro ser guarda e soldado, e você não é exatamente meu tipo. Sem ofensa. Não tenho tanto interesse em humanos.

— Não me ofendi. — eu assegurei a ele.

— Agora, a esposa dele, mãe do Vítor ... — ele disse com um assobio baixo.

Eu limpei minha garganta. — Eu não fico confortável com esse assunto. — Meus Deuses, eu estava fazendo uma ceninha de ciúme?

— Minhas desculpas. — disse ele com uma risada. Sua expressão ficou sombria. — Eu sinto muito por toda essa condição que você se encontra. Serena é uma boa mulher. Forte. Ela é uma boa líder.

— Obrigado. Realmente era tudo o que eu queria escutar, como a esposa do meu amante é linda, impecável e perfeita.

Ele encolheu os ombros. — Nunca disse que ela era perfeita. Ela tem seu número de amantes, mas a maioria das lobas têm. Ela só não tomou um consorte oficial, pelo menos até agora.

— É... tanto faz. – Falar da mulher de Estebán me deixava muito desconfortável.

— Posso fazer uma pergunta pessoal? – Pablo tinha um olhar de curiosidade verdadeira.

— Você seria a primeira pessoa a perguntar sobre minha vontade em alguma coisa, então, com certeza, pode falar.

— Como é pertencer a ele sendo você um humano, quero dizer, sendo de mundos tão diferentes, abrindo mão de sua liberdade?

Fiquei surpreso com a franqueza dele, mas tinha vivido nas ruas apenas o suficiente para começar a me acostumar com isso. Foi uma boa mudança não ter que ficar preocupado em ter onde morar por não pagar o aluguel ou mesmo saber que farei as três refeições do dia sem depender de fazer negócios com seres um pouco mais 'escuros' do que lobisomens. Eu nasci com um dom (ou maldição) de ver seres sobrenaturais na forma em que eles realmente são, então, me adaptar à vida cotidiana quando eu comecei a ir para a escola tinha sido um choque, perceber que as outras crianças não viam a mesma coisa que eu. Eu aprendi rapidamente que eu não podia falar sobre esse 'truque' que eu sabia fazer e se eu quisesse ter amigos eu tinha que fingir não saber que alguns deles não eram tão humanos ou tinham outra forma além da humana.

Fingir não deu muito certo. Eu ainda era sozinho e me virava do jeito que dava. Só Maurício pareceu não ligar. Até tentamos namorar na adolescência, mas nos víamos mais como irmãos. E isso foi bom para nós dois a longo prazo.

— Não é tão mal assim, levando em conta a vida que eu tinha antes. — respondi, decidindo que era seguro. — É estranho como o inferno, mas Estebán prometeu me manter seguro e o Zeca também, e eu confio que ele manterá sua palavra.

— Ele sempre mantém sua palavra — disse Pablo em tom grave. — Isso é o que nos separa deles.

— Dos humanos? — Eu estava desenvolvendo um certo complexo de inferioridade quanto a minha própria espécie.

— Da matilha Stevenko. A matilha de origem de Serena. Você já deve saber, sendo consorte do Alfa, que o casamento entre os dois foi político.

— Então, eu posso entender que ainda há uma tensão entre as duas matilhas.

— Com certeza — disse Pablo. — A tomada de um consorte pelo Alfa Zayas garantirá nossa aliança com a matilha de Macarter. Então poderemos realmente ter uma chance de terminar essa coisa.

Eu escutei atentamente, observando o modo como o comportamento dele mudou. Ele poderia parecer jovem, mas seus olhos diziam a verdade sobre a idade de sua alma. Ele viu guerra e derramou algum sangue nisso.

— Eu admiro quem está disposto a colocar sua vida em risco por algo em que acredita, seja matilha ou país. — Eu me alistei, como todo homem é obrigado ao completar dezoito anos, mas fui dispensado. O que é comum, na verdade.

— A matilha é família — disse Pablo de uma forma que me fez pensar nessa palavra pela primeira vez em muito tempo. — Eu posso não concordar com tudo o que Estebán decide, mas ele é um homem bom e ele daria a vida por qualquer um de nós. Ele provou isso quando me tirou do território inimigo meio morto; eu levaria uma bala por ele. Qualquer um de nós daria nossas vidas por ele em qualquer momento.

— Isso significa que você vai participar da caçada? — Eu perguntei esperançosamente, desejando que eu fosse remotamente capaz de olhos de cachorrinho.

Ele sorriu. — Eu respeito ele e nossas tradições demais e claro que vou. É melhor você se preparar quando chegar a hora.

Eu tinha certeza de que ele estava certo sobre isso. O trem parou e eu decidi comprar algumas bebidas para Pablo e Ramirez num bar, com o dinheiro de Estebán, para compensar o fato de arrastá-los por toda a malha metroviária de São Paulo. Nós não éramos exatamente velhos amigos quando a noite chegou, mas Ramirez parecia ter parado de querer me matar com os olhos, então isso foi um progresso.

**

— Vou fazer xixi, a menos que isso seja um risco de segurança demais acho que posso ir sozinho — disse com uma tosse seca. Meu último gole de cerveja tinha ido pelo caminho errado.

Pablo me dispensou, o que eu estava começando a perceber era um gesto de boa vontade na linguagem masculina de lobisomem. Eu me levantei do meu banco e tropecei um pouco. Talvez eu tenha perdido minha tolerância no último mês. Cheguei ao banheiro e fiquei aliviado porque ninguém me seguiu. Mijar na frente de um cachorro era uma coisa estranha, mas para um cachorro consciente era demais para minha cabeça.

Quando fui lavar as mãos um estranho entrou no banheiro do boteco e sem que eu percebesse injetou algo com uma seringa no meu braço. — Ei, o que você acha que tá fazendo, seu filho da puta.

Fechei a torneira da pia, engasgando com a dor súbita no peito. Eu não tive um ataque em poucos dias, minha bronquite estava controlada fazia um tempo. Quando a dor virou uma vertigem e um formigamento, só então, percebi que tinha sido, provavelmente, envenenado. Por quem? Por que? Eu nunca faço nada certo.

Porra.

A falta de ar piorava a sensação de fraqueza, e eu engoli alguns punhados de água morna para acalmar o suficiente para me deixar respirar. Uma noite. Isso tudo por uma noite.

Uma noite.

Eu agarrei a borda da pia, mas isso não fez nada para me salvar do colapso, ou bater minha cabeça no caminho para baixo. Eu ouvi a porta do banheiro se abrir enquanto eu ainda estava tentando recuperar o fôlego e reconheci a voz de Pablo gritando, mas meus ouvidos estavam zunindo muito alto para entender suas palavras.

Um minuto depois, eu estava sendo arrastado para os meus pés pelos homens que tinham sido enviados para me seguir, e bem o suficiente para colocar um pé na frente do outro enquanto eles me levavam para fora do bar. Eu devia estar igual a um bêbado sendo arrastado para casa pelos amigos de boteco.

Pablo nos deixou no meio-fio para dar um telefonema e eu me vi inclinado completamente em Ramirez em busca do equilíbrio perdido. Cada tosse tinha meu peito mais perto de se abrir.

— Espere. — disse Ramirez com bondade real em sua voz enquanto ele me segurava. — Não desmaie em mim.

— Não... — Outra tosse me pegou e este enviou uma dor lancinante no meu coração. — Não planejei nada isso.

— Shh. — Ele avisou, murmurando algo que soava como um cruzamento entre a preocupação e a repreensão em espanhol.

Um carro preto parou no meio-fio e Pablo abriu a porta de trás. Fazia um minuto desde que ele tinha feito a ligação, o que só me provou que Estebán queria dizer o que ele disse sobre ter lobos por toda a cidade. Ele possuía São Paulo, disso não havia dúvida. Ramirez e Pablo me colocaram no carro antes de entrar e ouvi o alfa falar rapidamente em espanhol com alguém ao telefone. Eu não conseguia entender mais do que uma palavra aqui ou ali do que ele estava dizendo, mas eu conhecia a voz profunda do outro lado da linha bem o suficiente.

Eles estavam me levando de volta para Estebán. De alguma forma, eu sabia que ia ser punido por isso.

**

Olá lobinhes,

mais três capítulos revisados e postados com sucesso. 

clica na estrelinha. me xinga por terminar o negócio desse jeito. e até amanhã.

bjokas. (hahahahahaha)

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