Cap. 13 - A Fúria do Príncipe de Gelo
Ivy sentia que havia algo de muito errado acontecendo, mas estava presa ali. Sempre que tentava sair da tenda alguns dos ladrões apareciam com flechas e tocos de madeira para ameaça-la.
Não fazia ideia se isto tinha sido ideia de Cassian ou não, mas estava irritando-a profundamente e teria uma bela discussão com ele quando voltasse.
Se voltasse.
Não queria pensar na possibilidade de Cassian fracassar e não lhe trazer de volta Marilyn e Jefferson, mas era inevitável. Alguma parte de sua consciência tentava convencê-la de que ele era um ladrão experiente, embora também fosse um príncipe arrogante e metido.
Se ele enganava o pai, os guardas e todos os ladrões há tanto tempo quanto dizia, talvez, só talvez, realmente fosse capaz de entrar no castelo hoje e resgatar as duas pessoas que ela mais amava.
E embora Ivy gostaria de ser ela a pessoa a estar lá se arriscando, sabia que as chances de sucesso do príncipe seriam bem maiores agora que ela era uma das procuradas do rei. Pelo menos Cassian conseguiria entrar sem que desconfiassem de nada.
...
Até agora Antony estava muito orgulhoso de si mesmo. Seu plano estava correndo melhor do que imaginava e já tinha o completo controle sobre Aron. Em breve teria poder suficiente para dominar os reinos vizinhos, mesmo que ninguém soubesse de sua existência.
A era do governo supremo de Antony estava muito próxima de começar e logo até Scarlet e Gordon sucumbiriam ao seu enorme e devastador poder. Poder esse que era fruto dos filhos dos outros dois líderes, os quais Antony havia roubado secretamente assim que nasceram.
Adrian, filho de Scarlet, sua meia irmã vampira. E Kadi, filho de Gordon, seu meio irmão metamorfo. Antony nunca chegou a ter filhos de verdade, arrumou uma esposa apenas para encobrir o sequestro dos príncipes e a matou poucos anos depois deles "nascerem".
Gostava de se imaginar como o rei mais cruel de todos os reinos. E por que só de todos os reinos? Assim que conseguisse controlar o poder de Adrian e Kadi, passaria a trabalhar no controle do poder de Lady Ivy Delevigne, que de acordo com as pesquisas realizadas por Argus recentemente nos entediantes livros de sua biblioteca particular, era uma mediadora.
E mesmo que a ignorância de Antony não permitisse que entendesse o significado do termo "Mediador" já havia ouvido falar que eram criaturas extremamente poderosas. Ele almejava o poder. Queria mais e mais poder. E manipularia, torturaria e mataria quem fosse preciso para alcançar o que desejava. Já havia matado até mesmo sua própria família.
...
Cassian havia conseguido entrar na festa sem qualquer problema. O maior empecilho para sua missão tinha sido fazer com que os ladrões se banhassem e se vestissem como pessoas da nobreza.
Cada um deles ganhou uma máscara bonita e refinada, mas é claro que trocaram entre si para que os guardas não os reconhecessem tão facilmente. Cassian, inclusive, possuía duas máscaras: uma prateada e outra dourada.
A essa hora seu irmão já estaria sobre o domínio da magia de Argus, pois infelizmente o plano de Cassian não havia dado certo. Ele não esperava que o rei fosse mandar matar os quatro guardas que assistiram o ritual, muito menos que fosse mandar matar o próprio Argus.
Argus era um homem de sorte. Um traidor, de fato, mas um jogador muito hábil. De alguma forma, mesmo com a ordem do rei para matá-lo, havia conseguido se livrar da morte mais uma vez.
O Príncipe de Fogo sabia que precisaria tomar cuidado com esse novo aliado do pai, mas mesmo assim tinha confiança em seus próprios seguidores e, é claro, em seus poderes.
A única coisa com a qual o príncipe não contava é que teria que lutar contra seu irmão. Mesmo que não fossem irmãos de sangue haviam crescido juntos sob as mesmas condições. Apesar de todas as brigas e desentendimentos os dois príncipes tinham algum tipo de amor fraterno um pelo outro.
Só que esse amor seria esquecido por Aron quando Antony mandasse ele atacar os invasores.
...
Quando Aron foi submetido ao ritual sabia que perderia tudo o que tinha até aquele momento. Na verdade, perderia tudo mesmo, incluindo sua própria força de vontade, sua liberdade.
A raiva que queimava seu peito só piorava tudo, pois ajudava o feitiço a se tornar mais forte. Aron tinha medo do que se tornaria nas mãos do pai e o desespero que o sufocava era cada vez maior ao perceber que o plano de Cassian não havia dado certo.
Ele se tornaria um monstro de verdade, não apenas se veria como um, mas realmente faria coisas monstruosas. E quantas vidas levaria naquela noite? Quantas famílias seriam destruídas através de seu poder?
A pior parte de ser vítima desse tipo de feitiço é que a pessoa estava sempre consciente do que fazia, mas era como se seu corpo fosse apenas uma marionete. Ele sentia, via e ouvia tudo, mas as ordens dadas pelo "mestre" que o controlava eram executadas imediatamente, sem pestanejar.
Ele era capaz de ver cada rosto desesperado, era possível ouvir cada grito assustado, conseguia sentir o sangue sendo congelado. E seu coração se tornava cada vez mais frio.
...
Ivy estava se sentindo péssima. Seu estômago revirava sem parar e não era por causa da comida, pois não havia se alimentado muito desde que Cassian saiu. Não confiava nos ladrões, poderiam envenená-la.
Ainda estava andando de um lado para o outro na cabana de Cassian quando a "porta" da tenda se abriu sozinha, mas não revelou ninguém. Um arrepio correu sua coluna.
— Quem está aí? – A voz de Ivy saiu trêmula, mas logo seu coração parou de bater tão rapidamente.
— Não se preocupe, menina. – Lisandra entrou na cabana caminhando bem devagar e o mais estranho é que não usava nenhum tipo de bengala para auxiliá-la. — Não vim aqui para te machucar.
— Eu sei.
— E como estão seus pés? – A mulher sentou-se na cama sem grandes dificuldades, seu rosto virado para onde Ivy estava.
— Estão melhores, eu acho.
— Devem estar. Já está usando-os mais que o necessário. – Um sorriso ganhou o rosto de Lisandra.
— E-Eu...! – Ivy estava envergonhada. Como ela sabia que esteve esse tempo todo andando de um lado para o outro, impaciente?
— Não precisa se explicar. Chegue mais perto, por favor.
Ivy se aproximou um pouco relutante. Não sabia o que essa mulher faria e apesar de admirar suas habilidades como mediadora, não conseguia deixar de desconfiar um pouco dessa figura.
— Você gostaria de ir atrás do príncipe?
As palavras dela chocaram tanto a garota que não conseguiu responder de imediato. Piscou algumas vezes, aturdida. Será que tinha escutado direito ou seus ouvidos estariam pregando peças?
— Não vai responder?
— Sim! – Disse um pouco alto demais e se encolheu com receio dos guardas que a vigiavam. — Mas... como?
Lisandra puxou de seu pescoço um colar dourado com um pingente em forma de ampulheta. Dentro dessa pequena ampulheta havia uma areia brilhante e muito fina. Ivy sabia o que era.
— Pó de fada. – E prendeu a respiração enquanto a mulher pendurava o colar em seu pescoço.
— Esse colar tem um poder especial. Faz com que as outras pessoas te vejam de uma maneira diferente. — E sorriu ao ajeitar o cabelo da jovem, que agora se parecia com uma mulher bem mais velha.
— E isso vai funcionar em qualquer criatura? – Ivy tocou o colar com relutância.
— Só não funciona com criaturas como nós duas. Se você encontrar uma mediadora terá problemas, mas são tão raras que provavelmente não terá nenhuma em seu caminho.
— E por que está me ajudando?
— Por que você terá que salvar o príncipe de fogo.
— Eu... Espera! O quê?!?
— Eu tive uma visão, menina. Kadi, ou Cassian como o conhece, está correndo perigo. Você precisa salvá-lo. Ele confia demais em si mesmo, mas dessa vez só os poderes dele não serão suficientes para barrar a fúria do príncipe de gelo.
— Mas eu não tenho poderes úteis como os deles! Eu não solto chamas nem sou super-rápida ou forte! Eu mal sei usar uma espada! — Ivy começou a entrar em desespero.
Já havia sido obrigada a evitar mortes antes, mas não dessa maneira. Nunca teve que lutar diretamente. Com exceção de quando esteve em Ariem, mas isso era outra história completamente diferente.
— Lady Ivy, você é como eu. Somos mediadoras. Somos criaturas extremamente poderosas. – Lisandra estava segurando o rosto dela entre as mãos. – Confie em seus dons. Na hora certa eles sempre irão ajudá-la.
— Mas...!
— Shhhh! Eu até iria chutar o traseiro de alguns guardas e dar uma boa lição naqueles que trabalham para o mal, mas infelizmente minha coluna não é mais a mesma depois das torturas do maldito Rei Porco. – E com isso soltou o rosto da jovem e a obrigou a levantar. — Você é jovem. É corajosa. É poderosa. E você é a única criatura capaz de deter o príncipe de gelo.
...
Quando toda a confusão começou Kadi já possuía homens seguindo para a masmorra em busca dos prisioneiros, só não contava que nesse mesmo instante os prisioneiros estavam sendo trazidos para o salão de bailes para serem executados pelo príncipe de gelo.
Assim que percebeu o que estava prestes a acontecer inventou uma desculpa para o pai, dizendo que iria ajudar os guardas a conter a multidão de invasores que estava entrando no castelo através das masmorras. Com isso pôde voltar ao salão depois, já com seu disfarce de ladrão.
O plano estava correndo um pouco fora do planejado, mas Kadi estava acostumado com improvisos. Assim que o primeiro invasor entrou no salão do castelo fazendo alarde, a multidão de nobres começou um tumulto maior que o esperado.
Infelizmente o Rei Porco se aproveitou disso e ordenou ao príncipe de gelo que iniciasse a matança. Libertou os prisioneiros apenas para que tivesse o gosto de assistir sua tentativa de fuga desesperada... e sua morte rápida pelas mãos de Adrian.
Kadi, que estava bem no meio da confusão, disfarçado, pôde ver no olhar do irmão que sofria por estar fazendo aquilo, mas que não tinha mais escolha.
O príncipe de fogo havia derrubado diversos guardas, dando escape para a primeira leva de ladrões, que estava ali apenas para fazer bagunça e roubar utensílios valiosos. Poderia ter acabado com tudo muito mais rápido, mas não podia usar seus poderes abertamente.
Foi quando notou uma coisa, mas já era tarde demais. Ele não seria capaz de cumprir a promessa que fez a Lady Ivy. Havia falhado mais uma vez, mas por que dessa vez sentia-se tão mal? Por que dessa vez sentia como se tivesse cometido uma falha consigo mesmo?
O príncipe de fogo estava tão entretido com seus pensamentos e preocupações que não percebeu quando o príncipe de gelo passou a fitá-lo e seguiu em sua direção.
O primeiro golpe quase o atingiu, mas Adrian não estava usando plenamente seus poderes. O Rei Porco estava brincando com suas vítimas. Já no segundo golpe, Kadi conseguiu sair do estado de choque e se preparou para revidar.
Ele conjurou com seu poder uma espada de fogo e o outro imitou a estratégia, só que com uma espada de gelo. O Príncipe de fogo riu. Tinha plena certeza de que seu fogo seria capaz de derreter o gelo de seu irmão.
Só que a espada de Adrian era apenas uma distração.
Enquanto lutavam entre si, os demais ladrões enfrentavam os guardas do rei. Era uma batalha difícil, mas estavam vencendo e a primeira leva de ladrões, que carregava o saque, já havia conseguido escapar.
Entretanto, Kadi não fazia ideia de quais prisioneiros haviam conseguido fugir também. Sabia apenas de um dos dois mais importantes, aquele que, conforme o que havia visto, não voltaria para casa jamais.
Adrian havia conseguido encurralar Kadi em uma pilastra, e de alguma forma ele conseguiu ver nos olhos do irmão que podia enxergar além do seu disfarce. Por sorte havia conseguido enganar o rei, Argus e os guardas, mas com o irmão era diferente, pois eles eram criaturas diferentes.
O príncipe de fogo começou a se desesperar. Não havia mais para onde recuar e a espada de gelo, por mais que derretesse, não mostrava sinais de que iria se acabar. Diferentemente das chamas da espada de fogo, que já começavam a minguar.
Finalmente o fogo se apagou. Os sons dos gritos da batalha, das armas colidindo e dos móveis sendo quebrados pareceu sumir aos ouvidos de Kadi quando o irmão estendeu o braço em direção ao seu coração.
Não havia como escapar.
Seu coração de fogo seria congelado.
E seria esse o fim dos ladrões?
...
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