Capítulo 1

A primeira ligação do dia entra em meu ramal e eu a atendo com desânimo. Estou aqui, sentada nessa cadeira infernal atendendo os clientes que eu carinhosamente gosto de chamar de demônios, quando queria estar mesmo é surfando no Havaí.

Tá, eu não sei surfar, mas queria estar lá mesmo assim.

— Power, boa tarde, meu nome é Beatriz. Com quem eu falo? — Quase perco o fôlego ao falar o script inicial de atendimento. Mentalmente, eu torço para que este cliente não esteja incorporado porque eu não quero que estraguem meu humor tão cedo. Sei que isso é difícil, pois, pelo menos, dois ou três dias da semana eu me estresso com alguns dos capetas que ligam para a central de relacionamento da minha querida empresa.

Enquanto o cliente que está na minha linha, conta toda a sua trajetória de vida desde o dia em que nasceu só para relatar o seu problema com a empresa, eu me desligo. Ao meu lado, ouço Jorge, meu melhor amigo, xingar o cliente enquanto a sua ligação está no mute.

Coloco meu cliente no mute também, já que ele não para de falar. Eu sei exatamente o que ele vai me pedir, mas não lhe corto porque não quero que a monitoria me pegue. Tem dias que eu estou pouco me lixando para isso aqui, mas ter boas notas de monitoria me livra de ter a bruxa da supervisora Tatiana no meu pé.

— Tá com um demônio na linha, Jorge? — pergunto para meu amigo, que dá o dedo do meio para a avaya (que é um tipo de telefone que recebe as ligações dos clientes). Sua pele negra está suando frio de tanta raiva.

— Acho que nem preciso responder, né? Já falei para esse demônio que tem que aguardar, mas ele quer que eu resolva sendo que não tenho a droga da autonomia pra resolver essa bosta. Já estou quase falando que ainda não usamos magia para restabelecer a energia dele!

Não foi bem "bosta" a palavra que Jorge usou.

— Ninguém merece. — Me volto para o meu cliente quando ele termina de falar. Sua ligação não demora porque apesar de tagarela, ele só queria saber algumas informações simples.

Trabalho em uma empresa terceirizada de telemarketing que presta serviços para uma empresa de energia elétrica. Os clientes desse produto são difíceis de lidar, mas ainda existem exceções. Acho que se não existissem, eu já teria pirado. Trabalhar com o público é muito difícil.

Reparo que Jorge continua argumentando incansavelmente com o seu cliente, que permanece irredutível. Ele está quase surtando quando o seu cliente xinga e Jorge transfere a ligação para que a mesma seja encerrada, não sem antes realizar o script de finalização que fazemos quando a ligação está muda ou o cliente nos falta com o respeito.

Ao contrário do que muitos pensam, nós não podemos desligar a ligação por conta própria. Quando ocorre algum problema de comunicação como ligação muda ou algo assim, temos que transferir para o ramal da supervisão para que eles possam encerrar o contato.

Como o atendimento está sem fila, o que quer dizer que não tem muitos clientes ligando, eu me viro para Jorge, que está com a cabeça apoiada em sua PA (que nada mais é do que a nossa mesa de trabalho).

— Coloca uma pausa particular e vai beber uma água — eu digo, colocando a mão em seu ombro. Ele levanta a cabeça para mim e percebo que está mais irritado do que o habitual.

— Já coloquei, não sou nem besta. — Jorge sai de seu lugar com a sua garrafa de água em mãos. Cai outra ligação no meu ramal e eu me viro para atender. Conforme vou atendendo os clientes, uma espécie de tristeza vai se apossando pelo meu peito. A hora demora tanto a passar aqui dentro que eu começo a ficar agoniada em atender tanta gente complicada.

Percebo que a primeira pausa do dia se aproxima, o que me deixa um pouco animada, pois é assim que eu conto o quão longe estou de finalizar o expediente e ir embora desse hospício.

Quem nunca trabalhou em telemarketing, acha que é mole trabalhar sentado no ar condicionado por seis horas e vinte, mas só quem está aqui dentro sabe o inferno que é. Essas seis horas passam tão devagar que chega a ser torturante.

Programo a minha pausa no fim do atendimento e o finalizo na hora que chega a minha pausa.

Me levanto da minha PA e ando pela central tentando não ser notada pela minha supervisora. Ciente de que já se passaram dois minutos só para eu sair de dentro da central de atendimento, apresso o passo para poder aproveitar o que resta da minha pausa.

Acontece que só temos direito a duas pausas de 10 minutos e uma pausa lanche de 20 minutos não cumulativas durante o expediente todo, além de 10 minutos de pausa particular por dia, para ir ao banheiro e esse tipo de coisa. Essas pausas passam sempre voando, de modo que o tempo que levamos para sair da central em direção ao banheiro ou ao refeitório, já nos fazem perder alguns preciosos minutos.

Encontro Jorge voltando de seu descanso também. Acho que é a segunda pausa particular que coloca no dia. Ele parece mais relaxado.

— Fiquei sabendo que cabeças vão rolar hoje. — Seus olhos se arregalam ao meu contar a bomba.

— Vai ter barca? — indago, morrendo de medo do meu nome estar no meio.

Eu mais do que ninguém sei que não devo reclamar do meu emprego, pois a situação de desemprego no Brasil está muito complicada e porque preciso do salário. Pode até ser pouco, mas é o que eu tenho no momento. Além do mais, eu complemento a minha renda com uns bicos de freelancer que eu faço de vez em quando. Sou formada em jornalismo, mas infelizmente, apesar de procurar, ainda não consegui nada na minha área, o que significa que tenho que ficar aqui aguentando xingamentos dos clientes enquanto não consigo nada melhor.

— É o que estão dizendo. — Ele dá de ombros e pelo canto do olho vejo que nossa supervisora se aproxima.

— Jorge, você já está há oito minutos de pausa particular. Aqui não é zona não, para de fofocar e vá atender! — ela ordena, seus olhos parecem duas esferas do dragão.

— Para a sua informação, estou de pausa porque me irritei com um cliente. Para de ficar tomando conta da nossa vida e vai colocar o skill da Adriana que já passou da hora de ela voltar para o atendimento. — Com esse pisão, Jorge volta para a central deixando a Tatiana com um bico do tamanho do mundo. Jorge está certo, Tatiana tira o skill dos seus operadores favoritos para que não caia ligação em seus ramais e eles fiquem sem atender.

Na linguagem do call center, o skill é composto por numerações que indicam tudo o que o cliente escolhe na URA. Se ele quer pedir segunda via, por exemplo, e eu tenho o skill com prioridade nisso, é o que mais vai cair para mim.

Nós, operadores de telemarketing, podemos ter diversos skills, até porque os atendimentos são diferenciados. Porém, existem os chamados alecrins dourados, que nada mais são do que os operadores que ficam puxando o saco dos supervisores, que pedem para o planejamento retirar o skill desses abençoados. Enquanto esses alecrins ficam zanzando pela operação numa tentativa frustrada de fingir que estão auxiliando seus respectivos supervisores, nós tomamos no rabo atendendo a fila enorme de clientes que parecem ter vindo direto do inferno.

Todo o mundo acha isso uma injustiça, mas mesmo com as nossas reclamações, nada se resolve.

Suspiro ao olhar a hora em meu celular, pois a minha pausa está quase acabando. Respondo algumas mensagens no WhatsApp às pressas antes de voltar para a central.

Percebo um burburinho e uma agitação anormal entre os atendentes e noto que Tatiana, minha supervisora, pega sua bolsa e sai de cara amarrada sem falar com ninguém.

Me aproximo do meu lugar e Jorge me encara de um jeito eufórico.

— Por que ela tá indo embora agora? — Se eu bem me lembro, Tatiana só vai embora depois da gente. Jorge não consegue conter a felicidade quando se levanta e se debruça sob minha PA com um sorriso gigantesco no rosto.

— Ela foi mandada embora! Adriana e outros operadores que eu não conheço também foram. — Meu queixo praticamente vai ao chão com essa notícia bombástica. Isso explica o alvoroço entre os atendentes, já que Tatiana nunca foi uma supervisora muito agradável.

— Vamos soltar fogos e fazer uma festa! — exclamo, fazendo quem está próximo a mim gargalhar com vontade.

— Silêncio, pessoal! — grita outro supervisor ao notar que as nossas reações já estão impactando os outros atendimentos.

Jorge e eu voltamos a nos sentar para atender nossos respectivos clientes. Enquanto outra ligação cai em meu ramal, me dou conta de uma coisa:

— Estamos sem supervisor! — Jorge dá de ombros para a minha exclamação desesperada.

— Ou eles já contrataram alguém para nos substituir ou ficaremos com algum outro supervisor enquanto não rola a substituição. — Ele retira a ligação do mute. — Não entendi, senhora. Pode repetir, por favor?

Os supervisores da manhã, no geral, não são muito agradáveis. Tatiana encabeçava a lista. Com ela fora daqui, as chances de cair com um supervisor novo e carrasco são grandes, mas eu ainda prefiro correr o risco de cair nas garras da Suzana que é uma Tatiana 1.0 do que com um ainda pior que as duas juntas.

Na central existem supervisores legais também, porém a maioria finge que é legal só pra falar mal de você pelas costas. Aqui dentro temos que tomar cuidado com o que falamos e para quem falamos as coisas, porque qualquer coisa pode ser motivo para fofoca.

Atendo meus clientes pensando com preocupação em quem cuidará da nossa equipe agora que a Tatiana foi demitida.

[...]

Ás duas e vinte em ponto já estou me deslogando, pronta para pegar as minhas coisas no armário e ir embora. Como todos os outros dias, este também demorou para passar.

Eu sempre coloco uma pausa particular pelo menos cinco minutos antes de ir embora para não correr o risco de ficar presa com algum cliente depois do meu expediente. Jorge e eu caminhamos para fora da empresa mais felizes do que quando chegamos. É sempre assim na hora de ir embora. Sempre ficamos aliviados por mais um dia de trabalho ter chegado ao fim, independente das coisas que ocorreram dentro da empresa durante o dia.

— Vamos na Show de Bola hoje? — pergunto a Jorge, me referindo ao pub que fica no centro da cidade. Eu e ele moramos em bairros vizinhos e o pub fica no meio do caminho para ambos. Eu preciso sair para dançar um pouco. Espairecer a mente é essencial.

Minha mãe diz que eu gosto de dançar por causa dela, já que enquanto eu estava em sua barriga, mamãe fazia jazz sem saber que estava grávida. Já fiz jazz e dança contemporânea, mas tive que sair por conta de problemas financeiros. Mamãe perdeu seu emprego e agora trabalha como doméstica em algumas casas de família, e as mensalidades da escola de dança eram muito caras, de modo que eu tive que sair. Na época eu fiquei triste, mas apoiei a minha mãe porque eu sempre entendia quando não podia ter algo por causa da ausência de dinheiro. Nunca fui o tipo de criança escandalosa que sai gritando ou chorando porque recebeu um não.

Jorge me lança um olhar hesitante.

— Sabe o que é?... Hoje tenho um encontro com aquele gato do Tinder que eu falei.

— Acho que você encontrou um jeito melhor do que o meu de espairecer a mente — brinco, lhe dando uma leve cotovelada no braço. Jorge é um namorador nato. Ele é cem por cento gay — palavras dele — e gostoso. Sua pele negra é tão bonita que eu fico babando toda a vez que o vejo.

— Você devia ficar com alguém para relaxar. Já faz algum tempo desde o idiota do Rômulo. — Toda a vez que meu ex-namorado é mencionado em alguma conversa, eu já sinto um incômodo aparecer na boca do estômago. Não posso dizer que não o superei, mas com certeza guardei sequelas de nosso relacionamento fracassado.

Rômulo foi um dos poucos caras com quem eu mantive um compromisso sério. No início, ele parecia ser um cara maravilhoso, do tipo que abre a porta do carro para você, que cede seu casaco quando tá frio e que te dá presentinhos inesperados. Porém, do nada, ele começou a me tratar com frieza e eu descobri que ele estava me traindo. Desde então, estou um pouco traumatizada, porque nenhum cara até hoje pareceu gostar de mim de verdade.

— Eu relaxo melhor dançando. — Jorge me olha de forma cautelosa enquanto me analisa em sua cabeça. Sei que está me analisando porque ele é muito expressivo. Jorge tem um jeito espalhafatoso de ser, e é difícil para ele esconder o que pensa ou o que sente com facilidade. Mesmo não querendo, meu melhor amigo é um livro aberto.

Apesar de eu dizer a verdade, admitir que não quero me envolver com alguém por medo me deixa receosa.

Por sorte, sou salva de seu olhar especulador quando entramos no terminal. Como sempre, o terminal rodoviário está cheio e é quase impossível não querer chutar algumas bundas para ver se isso ajudaria as pessoas a andarem mais rápido.

— Depois te conto como foi o encontro, gata. — Ele me dá um beijo no rosto e entra na sua baia, enquanto eu ainda caminho um pouco mais para chegar até a minha.

Tenho que correr para pegar o ônibus quando noto que ele já está prestes a sair. Pretendo chegar em meu apartamento o mais rápido possível para espalhar meus serviços de freelancer pela internet e enviar mais alguns currículos para jornais, revistas, editoras e outras empresas.

Entro no ônibus e agradeço ao motorista por ter me esperado e me acomodo em um lugar vazio no canto direito. Coloco algumas músicas para tocar e sinto meu estômago roncar de fome. A pausa lanche de 20 minutos passa tão rápido que eu mal consigo comer durante o expediente. Eu nunca tive a habilidade de comer rápido, então sempre saio de lá com fome.

O que me consola no momento é que minha mãe passou uns dias lá em casa comigo e deixou comida pronta ontem à noite antes de ir embora. Ela é demais mesmo.

A viagem até em casa demora cerca de quarenta minutos, nos quais aproveito para ouvir música e conversar com a minha mãe e alguns amigos. O motorista dirige rápido, então acho que não devo demorar muito para chegar em casa.

Eu moro num apartamento pequeno e simples. Quando chego, sou recebida com alegria por Loki, meu cachorro. Afago a sua cabeça com carinho e o pego no colo. Coloco minha mochila em cima da cadeira e encho sua vasilha de água ao perceber que já está quase vazia. Ele ainda tem um pouco de comida, então eu só irei reabastecer seu pote de comida mais tarde.

— Sentiu minha falta, meu amor? — Acaricio seu pelo macio enquanto ele lambe meu rosto. O coloco no chão novamente e vou para o banheiro tomar um banho. Quando saio, Loki está deitado em minha cama.

Esquento o almoço preparado por minha mãe enquanto assisto Anne With Na E na Netflix.

Descanso o almoço anunciando meus serviços de freelancer, mas ninguém se manifesta. Se eu não conseguir nenhum serviço, vai ser difícil pagar as contas da casa. Me jogo na cama e abraço Loki. Ao encarar o teto, me pego pensando no cansaço físico e mental em que eu me encontro. Eu não aguento mais viver com essa preocupação constante, de não saber se vou conseguir pagar todas as contas do mês ou se vou ter que vender um rim para poder estar em dia com todas as minhas despesas.

Preciso muito mudar de vida.

Não recebi nenhum contato das empresas nas quais me candidatei, e olha que meu currículo não é tão ruim assim. Eu só preciso de sorte e força de vontade, mas esse primeiro parece estar em falta em minha vida.

[...]

Meu cabelo cacheado está grande e cheio do jeito que eu gosto. Estou um pouco mais maquiada do que o habitual e mais arrumada também. Meu único desejo no momento é dançar até esquecer um pouco os meus problemas.

Dou um beijo em Loki e me certifico de encher sua vasilha de comida e água.

— Prometo não demorar. — Ele abana o rabinho para mim como se tivesse entendido o que eu disse.

Chamo um Uber para me levar até o pub e mando minha localização para Jorge. Eu sempre tive medo de andar sozinha a noite, e entrar num carro com um desconhecido sempre me deixa muito aflita. Sei que meu amigo está num encontro, ainda assim, sempre combinamos de mandar a nossa localização um para o outro em nossas saídas para que saibamos onde o outro está.

O pub já está cheio quando o motorista para o carro para eu descer. Claramente me sinto aliviada ao chegar em segurança e peço silenciosamente a Deus que na volta eu tenha a mesma sorte.

Uma música da Lady Gaga irrompe pelos altos falantes e me jogo na pista de dança assim que chego ao pub. Outras pessoas também dançam ao meu redor, mas eu fecho meus olhos e relaxo, pensando só em mim e em minha própria companhia.

Movo meus quadris no ritmo da música, deixando o ritmo me levar. Começo a sentir sede e saio da pista de dança para pedir uma água ao barman. Nunca fui muito fã de bebida alcoólica.

— Cansou? — Ouço uma voz ao meu lado e olho de forma confusa para o cara que se senta no banco ao lado. Dou um gole generoso em minha água assim que o barman a entrega para mim. — De dançar — ele explica. — Você estava arrebentando na pista de dança. As garotas já estavam com inveja. — O homem misterioso me encara e eu fico parada como se fosse uma estátua humana. É tão inédito um cara reparar em mim que eu fico sem reação por um bom tempo.

Eu nunca tive muito jeito com os rapazes, então é natural que esteja surpresa por um cara tão bonito como ele estar me olhando daquela forma. E sim, ele deve ser um dos caras mais bonitos desse lugar, porque só o seu jeito de olhar já me deixa arrepiada.

Seus cabelos lisos e negros caem por cima de sua testa. Ele usa óculos, então não consigo ver bem de que cor eles são, mas as luzes do local também atrapalham um pouco a minha análise.

Ele parece ser alto pelo modo como suas pernas esguias se esticam por baixo do balcão, e tem umas tatuagens que parecem iradas nos dois braços. Além de ter ombros largos, noto que o cara observador tem um corpo muito bonito por baixo da roupa social que ele está usando. As mangas da camisa social estão dobradas até acima dos cotovelos.

— Só parei para beber água e descansar um pouco — respondo e dou outro gole em minha água. Minha pulsação acelera à medida em que sinto seus olhos sobre mim e bebo mais água para disfarçar o nervosismo.

— Como você se chama? — Fico desconfiada de dar meu nome para desconhecidos, mas ele parece ser um cara amigável... Quero dizer, a maioria dos psicopatas antes de se revelarem psicopatas parecem amigáveis, então não sei se essa pose dele é fachada ou se ele realmente é desse jeito.

— Me chamo Beatriz, mas pode me chamar de Bia.

Bom, se ele for um psicopata, já sabe meu primeiro nome. Droga. Tenho que parar de confiar em rapazes bonitos porque: A) eles nunca me notam então se esse cara lindo tá me notando é porque tem alguma coisa errada, ou b) ele realmente pode ser um Ted Bundy da vida. Já pensou nisso, Beatriz? Já?

Ele dá um gole no seu drink colorido e abre um sorriso charmoso.

Espero que ele não seja um Ted Bundy da vida porque o sorriso dele é devastador.

— Eu sou Julio. Você é bailarina profissional ou algo assim?

— Eu já fiz jazz e dança contemporânea, mas sou jornalista. Trabalho na Editora e Jornal Hausfman. E você? — Eu não sei o que deu em mim para mentir desse jeito, mas naquela noite, conhecendo aquele cara, era como se eu fosse uma outra Beatriz. Uma Beatriz que não trabalha em um lugar que suga a sua saúde mental, uma Beatriz bem sucedida que é paquerada por rapazes bonitos e que é totalmente feliz.

Ou, eu talvez esteja mentindo porque estou com medo real de ele ser um psicopata. Se Jorge estivesse aqui, ele diria que é a minha mente tentando me sabotar. Desde que meu relacionamento com Rômulo fracassou, eu tenho acabado com qualquer oportunidade de ter alguém em minha vida, no entanto, as estatísticas estão aí para provar que meus medos não são só autodefesa, e eu não quero entrar para as estatísticas do feminicídio.

— Trabalho na administração de uma empresa, mas estou em treinamento para um outro setor.

— E você gosta do que faz? — Ele faz que sim com a cabeça sem titubear.

— Na maioria das vezes, sim.

Encaro a minha garrafa de água já quase vazia quando sinto minhas bochechas esquentarem. Julio me encara de um jeito intenso demais e eu não sei como lidar com isso.

Eu nunca fui o tipo de garota que chama a atenção por onde passa, então é como se eu estivesse tentando descobrir como lidar com a atenção que estou recebendo desse rapaz tão bonito e intrigante.

O dj troca de música subitamente e eu sinto meu coração acelerar com a sua escolha. Uma das minhas músicas favoritas preenche os alto falantes potentes do lugar.

— Eu amo demais essa música. — Balanço meu corpo de um lado para o outro de forma tímida.

— Além de linda, dança bem e tem um ótimo gosto musical. — Vejo que Julio ainda me observa com um sorriso no canto dos lábios. Não sei se é a atmosfera da música, porém eu sinto meu corpo inteiro formigar.

Quando eu menos percebo, estamos nos beijando loucamente.

Suas mãos estão por toda a extensão da minha coluna trazendo um rastro de calor e uma onda de arrepios que circulam por todo o meu corpo. Ele me encosta na parede lateral do pub enquanto me beija com voracidade. Solto um gemido baixo quando ele suga com vontade meu lábio inferior e quando sua boca vai para o meu pescoço, eu sinto que estou no céu.

Me perco em seu toque e em seus beijos de uma forma quase irreversível, mas eu me afasto quando me lembro que ainda estamos em um lugar público.

— Me desculpe, eu tenho que ir. Amanhã eu tenho que acordar cedo para ir trabalhar. — Ele ainda permanece perdido por alguns instantes e eu aproveito esse momento de choque para poder sair correndo. Fujo dali como a covarde que eu sou, mas ainda o ouço gritar.

— Me dê seu telefone, por favor! — eu não volto atrás. Sinto que vou me arrepender disso mais tarde, mas saio do pub como se eu fosse o próprio Barry Allen em The Flash. Tento me convencer de que posso ter livrado meu pescoço de um serial killer em potencial, mas a parte menos racional da minha mente me diz que eu sou a garota mais idiota desse planeta.

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