X - Dez

Ian

Sabe quando dizem que nada é perfeito? Ou o tão famoso "estava bom demais para ser verdade?" Bom, devo dizer que agora sei perfeitamente o significado disso, e eu, de verdade, não queria saber.

Eu realmente pensei que Vitor iria desaparecer e que nunca mais iriamos ouvir falar dele. Porém, ele apareceu, e decidiu aparecer em um dos lugares realmente mais importantes para mim.

Agora, Angie e eu estamos na metade do caminho de volta para casa, e o tempo todo foi em completo silêncio, e para piorar, um silêncio desconfortável.

Com Angie, eu não queria ficar em silêncio, porque depois do que aconteceu na parte externa da Lótus Paradise vai parecer que eu estou bravo, e eu não estou, não totalmente, e com certeza não com ela.

— Você ficou chateado pelo que aconteceu? — ela pergunta, em um tom baixo, quebrando o silêncio.

— O quê? — pergunto assim que saio de meus devaneios. — Não! Quero dizer, não com você.

E é isso, esse era meu medo, de que ela achasse que eu fiquei chateado com ela.

— Você não precisa se preocupar com isso, certo? — eu disse, tentando tranquilizá-la, o que parece que surtiu efeito, julgando pela leveza de sua expressão e seu sorriso. — O que quer fazer quando chegarmos em casa?

— Sexo! — ela exclamou, parecendo ainda excitada, mesmo com a desventura que tivemos a alguns minutos.

— Você sabe que sua punição ainda não acabou, não é? — eu disse, deixando escapar um sorriso.

— Poxa, Ian. Você é mal — ela disse, fazendo um biquinho, que eu consegui ver quando desviei os olhos da estrada por alguns segundos.

No restante do caminho, o assunto passado foi esquecido. O novo assunto se resume em Angie tentando me convencer de que já foi punida o bastante e que precisa de minha atenção.

Claro, Angie tem a opção de se aliviar sozinha, e eu não impediria, porém, como uma boa submissa, ela prefere que seja eu, seu dominador, a aliviar seu corpo. E com certeza, fico feliz por sua atitude. Mas além disso, sei que ela precisa de mais que apenas prazer, o que acaba tornando as coisas mais interessantes entre nós.

No caso, eu não estou mais incomodado pela forma em que ela falou do exibicionismo, agora, eu também estou sedento por ela, e talvez cedesse se ela insistisse um pouco mais, até porque, como eu já disse para Angie a um tempo: eu não consigo negar sexo para ela.

— Ian, eu posso te fazer uma pergunta? — ela perguntou, assim que entramos em meu apartamento.

— Claro! — respondo, já ciente de que provavelmente seria algo sobre a Lótus.

— Quando estávamos esperando para entrar na sala de exibicionismo, eu vi que algumas mulheres e homens usavam um acessório diferente, e na cena em que assistimos a submissa estava com o mesmo acessório. Eu queria saber mais sobre ele, se não for problema — e com sua declaração sobre o assunto, eu soube sobre o que ela se referia, e talvez tenha sentido medo de errar no nome do tal acessório, por isso não o disse.

— Acho que sei sobre o que você está falando — eu disse, seguindo até meu quarto, já começando a soltar o harness que eu estava usando, deixando Angie um tanto confusa.

Quando entrei no cômodo, ainda sem terminar de tirar o acessório que visto por cima da camisa branca, eu vou direto ao armário que tenho ali, que é dedicado aos meus "brinquedos" de prática BDSM.

De dentro do armário, eu tiro uma coleira, e como obviamente teria que explicar sobre, tiro a guia junto.

— Isso aqui? — eu pergunto, lhe mostrando o que tenho em mãos.

— Sim... o que é? — ela pergunta, se aproximando, até estar bem próxima. Aparentemente, o assunto a deixa interessada.

— Isso é uma coleira, que é uma das simbologias mais importantes no BDSM, e é uma coisa que só deve ser usada se ambas as partes aceitarem se entregar uma à outra, e por isso não te contei sobre ela antes, mas acho que enfim chegou a hora.

— Os dois usam? O submisso e o dominador? — ela pergunta, ainda mais curiosa sobre o assunto.

— Não — eu nego lentamente com a cabeça. — Somente o submisso usa — expliquei, tentando manter a calma, já que esse é um assunto importante e delicado. — Uma coleira significa a entrega mútua, a entrega de ambas as partes. É uma forma de o dominador mostrar que se dedicará inteira e verdadeiramente ao seu submisso, e também uma forma de o submisso se entregar inteiramente ao seu dominador — ela permaneceu com os olhos no objeto em minha mão durante a explicação.

— Parece muito com uma aliança — ela sorriu fraco, desviando o olhar para meus olhos.

— É quase isso. O que uma aliança significa? — eu perguntei, apenas para que ela possa entender mais minha explicação.

— É uma forma de mostrar que uma pessoa é comprometida, certo?

— Exatamente. Porém, no BDSM vai mais além que um simples anel — ela continuou me olhando. — Quando o dominador e o submisso tem uma relação forte um com o outro, acontece de o dominador oferecer uma coleira ao sub. E ele aceita a coleira apenas se aceitar ser também do seu dominador. Somente dele — eu chego mais perto dela, colocando minhas mãos em seu pescoço, sem fazer pressão. — E às vezes são feitas cerimônias para o encoleiramento, que é como é chamado quando o dom decide dar uma coleira ao seu sub.

— Cerimônias?

— Sim, alguns fazem com muitas pessoas assistindo e uma festa enorme, às vezes só com os mais íntimos, outros fazem sozinhos, mas também não é necessário fazer, se as pessoas não quiserem.

— Isso tudo é tão profundo — ela diz, ainda olhando em meus olhos.

— É sim — eu respondi.

Porra, não era isso que eu queria dizer. Eu queria lhe oferecer uma coleira, queria mesmo. Mas... e se ela não quiser? Ou até mesmo não conseguir se acostumar? Isso é possível de acontecer, certo?

Nós continuamos envoltos nessa atmosfera na qual criamos. Os dois de pé, no meio do quarto. Eu com uma mão na lateral de seu pescoço, enquanto a outra ainda segurava a coleira e a guia. Angie estava com as duas mãos em minha cintura, me tocando com cuidado, assim como eu a estou tocando. Os dois olhando no fundo dos olhos um do outro, entregues um ao outro, ao momento.

E nesse momento, eu percebi que minhas dúvidas são infundadas, sem lógica, porque Angie com certeza aceitaria uma coleira dada por mim, ela aceitaria se entregar somente a mim assim como eu aceitaria me entregar somente a ela, inteira e verdadeiramente, de corpo e alma. Ela aceitaria, porque nós já somos assim, já vivemos uma relação assim, e oficializar isso seria apenas mais um gesto para que demonstremos o que sentimos; nossa paixão, nossa entrega, nosso amor...

Sim, nosso amor, porque eu a amo, e ela me ama. É recíproco, é intenso, e é verdadeiro. De verdade, não imaginei que um dia eu poderia estar afirmando isso com tanta veracidade.

E mesmo com essa percepção tão importante, eu não a verbalizo, pelo menos não por agora. Mas a vontade de dizer o que quero continua enquanto nos preparamos para dormir, continua enquanto comemos alguma coisa para não dormimos de barriga vazia, e continua também quando deitamos juntos, já prontos para dormir. E com toda certeza, essa vontade continuará até o momento em que eu disser o que tanto quero, até o momento em que eu reafirmar que a amo e que quero ela comigo para sempre. E com essa afirmação, uma coleira será entregue, sem sombra de dúvidas.

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