.q.u.i.n.z.e.

    Após duas semanas quase completas de trabalho duro, tentando colocar a matéria em dia, dando conta dos processos do escritório onde estagiava, comparecendo às aulas e grupos de estudo de forma quase devota e procurando estar sempre por dentro do processo de sua mãe, Katsuki chegou à conclusão que o mais difícil naquilo tudo era fazer Kirishima perceber suas intenções para com ele.

    Como alguém podia ser tão lerdo?

    Nos últimos dias estava fazendo o possível para marcar encontros — sob pretextos de fazer trabalhos e estudar —, se manter próximo, ser o menos monossilábico possível, chamá-lo para beber após as aulas, ainda que os colegas sempre se intrometessem e acabassem por ir junto, e se aproximar de forma que ficasse claro seu interesse no ruivo, contudo, tudo aquilo não podia se mostrar menos eficaz.

    Se por um lado, ele havia decidido levar seu interesse adiante, já que não possuía nenhum impedimento, por outro, não queria deixar nada tão claro a ponto do outro supor que tinha sentimentos profundos e intenções mais sérias.

    Àquela altura, ele não podia nem queria se relacionar de forma séria com alguém.

   Porém, o que ele não sabia, era que Kirishima era mais esperto nessas questões do que esperava. O problema consistia em: como o ruivo poderia saber que os "sinais" enviados por Bakugou de fato significavam o que ele achava que significava?

— Mas ela chegou a falar alguma coisa?

— Não... Pelo menos não explicitamente. Mas, Mina, ele basicamente me chamou pra sair todos os dias, às vezes se aproxima só pra tocar em mim de propósito e... ah, esquece. Devo estar imaginando coisas, mas é que eu sinto, sabe? — Kirishima se confidenciava, exasperado, com a amiga no intervalo de uma das aulas.

— Sei! Claro que sei! É uma tensão... hmm... Como eu posso falar... uma tensão sexual no ar, não é? — o entusiasmo e naturalidade da garota, ao dizer aquilo, assustaram Kirishima. — Não precisa ficar com vergonha, seu bobo. Eu sou sensitiva, sabia?

— Sei... — ele riu, mas o que ela acabara de dizer fazia sentido: quando estavam juntos tinha uma atmosfera no ar que o instigava. Ele estaria mentindo se dissesse que não se atraía pelo loiro, mas era como jogar batalha naval: não dava pra saber qual era a real intenção do outro jogador e cada movimento deveria ser milimetricamente calculado. — Argh!! Essa dúvida 'tá me matando! Por que ele não diz o que quer de uma vez? Se for pra ser só uma vez, eu não ligo!

— É só você tomar atitude primeiro! — Denki se jogou no chão, ao lado de Mina — Aí, se ele corresponder, é porque está interessado.

— E se ele não corresponder?

— Conhecendo o Bakugou, você vai ganhar um soco.

— Quê?! — Kirishima perguntou apavorado, já que realmente pensava na possibilidade de dar o primeiro passo.

— Não liga para o que ele fala, Kiri. Quer dizer, talvez você realmente ganhe um soco, mas olha o seu tamanho! Se isso acontecer, você vai e dá outro!

— E começar uma briga por um mal entendido? Nem pensar. Prefiro que as coisas continuem do jeito que estão.

— Já sei! Olha, hoje é sexta, o tempo está bom, ninguém tem aula à noite e as faculdades sociais do Bakugou parecem estar melhores... — Denki começou a falar com um ar de quem está planejando algo.

— Continua, acho que 'tô gostando disso — Mina acrescentou se ajeitando e prestando mais atenção.

— Faz tempo que a gente não faz uma social lá na República, então podíamos marcar uma hoje, assim que a gente sair daqui.

— Adorei! Nada melhor que um ambiente descontraído entre amigos e uma boa bebida para se soltar para aproximar esses dois.

— Não sei... O Bakugou não é muito de se expor dessa maneira, muito menos na frente dos amigos.

— Fica tranquilo, cara. A gente dá um jeito de deixar vocês sozinhos uma hora. Não lembra que foi assim que o Midorya e o Shoto ficaram pela primeira vez? — Denki falava orgulhoso.

— Verdade! Se não fosse a gente aqueles dois estariam empacados até hoje! Olha, Kiri — Mina apoiou uma das mãos no ombro do amigo para reforçar —, vai dar tudo certo. Não tem como dar errado.

...


— Eu não acredito que deu tudo errado — a garota de cabelos rosa lamentava, jogada no chão da sala, segurando uma garrafa de saquê enquanto via Kirishima estirado no sofá com uma lata de cerveja na mão.

— Saaaaaabe de uma coisa?! Eu quero fazer parkur — Kirishima falou completamente bêbado, tentando se levantar.

— Cara, como ele consegue ficar assim bebendo três latas de cerveja barata?

— Duas e meia, na verdade —Bakugou observou pegando a lata, ainda na metade, das mãos do ruivo e mostrando a Sero, que ficou ainda mais indignado.

— Já está tarde e ele não tem a menor condição de ir para casa sozinho — Mina falou balançando a cabeça com ar de preocupação, tentando no último segundo, salvar a tentativa de aproximá-los.

— Eu posso dar uma carona, vim de carro.

— Está louco, Iida? Você bebeu demais! Fora de cogitação.

— Mas eu só bebi uma garrafa de saquê!

Você bebeu demais e não está em condições de dirigir, entendeu? — Mina balbuciou entre os dentes para que Iida entendesse o que ela estava planejando.

— Aaaahh! Saquei! — o rapaz afirmou com um estalo — Claro! Nossa, estou bebasso! Não sei como vou chegar em casa... Provavelmente vocês terão que me carregar e-

— 'Tá legal... A gente já entendeu — Denki deu tapinhas de leve no amigo para que ele parasse com a péssima atuação. — Acho que estamos todos muito alterados para dirigir, Bakugou é o único que está sóbrio.

— É claro. Os idiotas tinham que comprar da pior cerveja possível — o loiro esbravejou, já que tinha ficado a noite inteira à base de suco natural.

    O que ele nem desconfiava era que os amigos tinham feito aquilo de propósito: vendo que Kirishima havia ficado bêbado rápido demais e sabendo que Katsuki era fresco para bebidas, decidiram que a única maneira de deixá-lo sóbrio era comprando cerveja barata quando tiveram que ir ao mercado comprar, pois Uraraka e Tokoyami haviam a acabado com todas antes mesmo que todos chegassem.

— Então leve o Kiri para casa, oras!

— Só se for no colo, né? Esqueceu que estou sem carro?

— Ah, tenho certeza de que ele não iria achar ruim. Nem você. — Mina respondeu sorrindo de forma maliciosa.

— Dá um tempo! Se ficar de gracinha, vou deixar o Kirishima aqui, pra vomitar no seu tapete — replicou observando o avermelhado brincar com a latinha.

— Não, não. Você tem que levá-lo para casa. Tokoyami, empresta sua moto?

— Êêêê! Vamos de motoooo! Vrum vrum vrrruummm! — Kirishima levantou de súbito do sofá e caminhou até a porta trocando os pés.

— Ficou maluca?! Como eu vou levar esse idiota numa moto?! Ele não consegue nem ficar sentado sem cair pra trás. Iida, me empresta seu carro.

— Mas eu quero ir de moto... — Kirishima continuava falando, mas dessa vez, falava com a porta, profundamente magoado.

— Nem fodendo levo você de moto. Vai me emprestar o carro ou não?

— Pode pegar — Iida cedeu, jogando as chaves para o loiro.

— Eu não vou demorar, daqui a pouco já estou de volta.

— Não precisa, pode demorar o tempo que for! Fique à vontade! — todos ali disseram tentando disfarçar o máximo possível.

— O que 'tá acontecendo com vocês? Parecem um monte de babacas.

— Nada! Não está rolando nada! Mas é melhor você ir antes que o Kirishima fique pior — Midorya falou empurrando Bakugou para fora, pois sabia do "plano" de Mina e Denki.

— Quer tirar suas mãos de mim?! — Bakugou vociferou se desvencilhando do amigo. — Vem logo 'cabelo de merda' — e saiu guiando o ruivo que não tinha ideia do que estava acontecendo.

    Katsuki teve um pouco de dificuldade em colocar o amigo dentro do carro, porém, depois ter certeza de que ele estava seguro com o cinto de segurança, finalmente deu a partida. Não precisou nem se dar ao trabalho de iniciar uma conversa, uma vez que Kirishima havia pegado no sono nos primeiros minutos da viagem.

    Como a República não era muito distante, pouco tempo depois já estavam estacionados em frente à casa do ruivo.

— Ei, 'cabelo de merda', acorda. Já chegamos — Bakugou tentou acordá-lo ainda dentro do carro, mas sem sucesso. Não vendo meios de fazer com que o rapaz despertasse, teve que sair, abrir a porta do passageiro e tentar tirá-lo dali de algum jeito.

    O corpo de Eijiro era ainda mais pesado agora, que estava em sono profundo, por isso o loiro teve que se esforçar ao máximo, aproximando-se do ruivo e ajeitando seu braço para poder tirar o cinto de segurança.

— Hmmm... Que cheiro bom — Kirishima resmungou fungando o nariz à procura do perfume que sentia e encontrando-o no pescoço de Bakugou.

    A proximidade inesperada provocou uma corrente de arrepios que eriçaram os pêlos de Katsuki, levando-o a se afastar rapidamente.

— Droga! — xingou ao bater a cabeça no teto do automóvel — Anda logo 'cabelo de merda', eu ainda tenho que entregar esse carro. — Vendo que o outro não respondia, a única maneira de tirá-lo era à força, por isso passou os braços em torno do tronco de Kirishima e o trouxe para fora. Depois, transferiu um dos braços do rapaz para seus ombros, a fim de que ele pudesse se apoiar; dessa forma conseguiu estabilizar uma posição confortável que permitia que ambos se movesse até a porta.

— Você está tão cheiroso, Katsuki... — Kirishima disse apoiando a cabeça no ombro direito do amigo.

— E você está fedendo a cerveja barata — respondeu com um sorriso.

— Não estou não. Eu estou cheirando a amaciante! Sente aqui ó! — levantando a blusa, levou até o nariz de Bakugou para que ele cheirasse.

— Abaixa isso, 'cabelo de merda' — bradou, muito embora ele apreciasse bastante a vista.

    Chegaram no último degrau da escada e Bakugou se abaixou para Kirishima sentar no parapeito.

— Onde estão suas chaves?

— Ahn... Não sei, não estão com você?

— Claro que não! Por que eu estaria com suas chaves?! Devem estar no seu bolso, pega logo.

— Eu quero dormir — Kirishima falou, encostando-se na parede.

— Você pode dormir assim que entrar em casa. Vai, me dê as chaves — Mas, antes mesmo de terminar, viu que o ruivo voltara a dormir profundamente. — Como você consegue dormir tão rápido?

    Sem alternativas, agachou-se para ficar à altura de Kirishima, deparando-se com o rosto tranquilo e com cabelos grudados de suor do ruivo. Afastou, como máximo de delicadeza que pôde, algumas mechas para aliviar o suor e, mais uma vez, via-se atraído pela beleza de Kirishima.

— Ei, Eijiro, preciso das chaves — sussurrou, para não assustá-lo, contudo não recebeu resposta. Daquele jeito ficariam ali a noite toda, até amanhecer, pois ele não acordaria.
Então Bakugou decidiu procurar as chaves no bolso do amigo, porque sabia que ele sempre as colocava ali.

— Licença — pediu, mesmo sabendo que ele não ouviria, mas querendo respeitá-lo mesmo assim. Endireitou o corpo de Kirishima para que pudesse alcançar os bolsos da frente. Procurou no primeiro e nada. Apalpou o segundo e ouviu o barulho das chaves, por isso mergulhou sua mão para pegá-la.

— Desse jeito, eu vou ficar excitado — o ruivo falou ainda de olhos fechados e surpreendendo Katsuki que, rapidamente pegou as chaves. — Eu estou brincando — riu, abrindo os olhos e dando de cara com um Katsuki completamente ruborizado.

— Cala a boca e levanta daí — respondeu mudando de assunto. Mas antes que pudesse se levantar, sentiu Kirishima puxá-lo pela gola da camisa e se viu tão próximo dele que podia sentir o ar quente que saía da sua boca enquanto falava.

— Eu já disse que você está cheiroso?

— Já, várias vezes — falou tomando impulso para se levantar, porém, sendo puxado mais uma vez.

— Posso te contar um segredo? — Eijiro sussurrou, colando sua testa à dele.

— Fala.

    Mesmo tentando soar indiferente, Bakugou não parava de pensar na possibilidade de beijar Kirishima ali mesmo. Mas antes que pudesse realizar qualquer movimento, o ruivo aproximou os lábios do ouvido de Katsuki e, fazendo uma conchinha com a mão, revelou seu segredo.

— Eu vim pilotando uma moto. Bêbado. Não conte para ninguém, viu? Shiiiiiuuu — sussurrou colocando o indicador na boca.

    Bakugou não se conteve e riu do rapaz. Ele estava realmente muito bêbado. E como ele podia ser tão lindo naquele estado? Eijiro conseguia derrubar suas defesas sem ao menos ter consciência disso e isso deixava Bakugou em sinal de alerta, pois não queria ultrapassar sua linha de perigo. Decidira que queria algo casual com o amigo e estava decidido a manter as coisas assim.

    Mas o jeito do ruivo dificultava tudo.

— Você está rindo — Kirishima observou encarando os olhos do loiro. — Isso é bom?

— Não sei... Eu realmente não sei — respondeu, devolvendo o olhar.

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