Capítulo 23

     Um mês se passou a uma velocidade assombrosa, e ainda custo a acreditar que apenas esse pouco tempo se passou pois tanto já foi feito! Um verdadeiro batalhão foi contratado por Ian. No início achei um exagero tantos empregados, mas quando tudo começou de verdade compreendi que não era. Um punhado foi designado para a colheita e para nutrir a terra para o próximo plantio. Uma equipe foi designada para reformar o interior da casa, cômodo a cômodo, enquanto outra faria o mesmo no exterior. Ian trabalhava a maior parte do tempo lá fora, onde o galpão precisou ser reconstruído do zero, e os estábulos também - por insistência dele, que teimou que os cavalos precisavam de mais espaço.

     Enquanto Mackenzie supervisionava tudo isso, o que eu fiz? Escolhi as cores da decoração da casa junto de Agnes nas primeiras duas semanas, enquanto precisava de repouso para me recuperar. Agora que já sinto-me plenamente saudável e forte, tudo está encaminhado e Ian não me deixa ser útil, teimando que uma construção não é lugar para uma dama, e blá blá blá. Uma grande tolice masculina, porém admito que se ele não estivesse aqui eu estaria perdida. Ian foi fundamental para mim esses dias, e quase sinto remorso pelo tanto que o tenho provocado.

Quase.

     Será que aquele homem tem sequer a mínima noção do que faz comigo? Do que me faz sentir? Ian Mackenzie ascendeu em mim alguém que até então nunca conheci. Uma mulher fogosa, atrevida, que sente borbulhar sob a pele um desejo carnal, quase visceral, que espanta da mente os pensamentos mais coerentes quando permito me entregar a isso. A pergunta que me faço diariamente é: porque diabos ele não se entregou ainda?

     Está mais do que claro de que eu o quero,
e o quanto. E não sou idiota de não perceber a forma como Ian me devora com os olhos. Então porque ele ainda não o fez com o restante do corpo?  Toda vez que eu me aproximo ele da um jeito de suavemente declinar, depois de ambos perdermos o fôlego em beijos ardentes, claro. Suspiro, desanimada, enquanto tento acertar o ponto desse maldito tricô que estou tentando fazer há dias e dias. Isso está sendo tão produtivo quanto tentar seduzir o meu querido senhor Mackenzie.

     Ah Ian... quando soube que ele ficaria aqui até o final de toda a reforma e das obras, imaginei que nossos dias seriam trabalhosos e que aproveitaríamos as noites sob os lençóis, nos deliciando no corpo um do outro. Mas, não. Apesar da sua reputação de devasso ele tem se mostrado muito recatado ultimamente enquanto eu… Espere, há uma mudança de comportamento aqui que não havia notado. Ian foge de mim, que tenho sido uma depravada fazendo de tudo para levá-lo para a cama. Papai deve estar se revirando no túmulo com minha audácia, percebo sorrindo, sentindo uma grande alegria nisso.

-- Oh, deuses! -- ouço Madalena sussurrar da janela da sala de visitas, onde ela acabou de depositar uma bandeja com chá e biscoitos sobre uma mesinha próxima.

     Sua exclamação me afasta de meus pensamentos e desisto de uma vez desse ridículo tricô, seguindo até ela na intenção de descobrir o que a afetou desta maneira.

-- O que houve Mada… ora, sua safada! -- exclamo espantada, porém sem conseguir conter o sorriso que se abre em meu rosto.

-- O que vocês duas estão fazendo aí? -- Agnes pergunta, deixando sua leitura de lado e vindo até nós -- Ah, é isso... -- ela diz, com pouco entusiasmo ao ver a razão de nossa empolgação.

     Ian estava ajudando os homens a carregar a madeira do telhado do galpão, sem camisa. Mesmo ao longe, eu via cada músculo de seu corpo, todos tensionados pela força e iluminados pelo suor que lhe escorria. Manchas de poeira e terra imaculavam a pele clara, porém levemente bronzeada, de seu tronco, dando à ele um ar sujo, mas aquele sujo bom, que prometia uma noite inteira de gritos de prazer. Eu quase podia sentir o cheiro dele, seu sabor, e…

-- Já chega, vamos parar com isso! Venha, Madalena. -- tento tirar aquela velha sem vergonha dali.

-- Vejam só aquele ali, não é tão agradável às vistas quanto o senhor bonitão Mackenzie, mas ainda dá um caldo. -- ela aponta na janela.

-- Pare de apontar, Madalena, pelos deuses! Eles irão perceber. -- exclamo, porém não contenho a curiosidade -- De quem você está falando?

-- Daquele ali, senhorita, que acabou de depositar uma madeira no chão, junto daquele gordo de camisa acizentada.

     De fato, havia mais um homem seminu em meu quintal. Observei detalhadamente o homem que Madalena apontou e fui obrigada a admitir que sim, ele era belo, apenas não tanto quanto o alvo de meus mais profundos desejos, claro. Porém, aquela pele pelo menos dois tons mais escura, costas musculosas, e peitoral com pelos negros tinham seu charme.

-- É, esse rapaz não é de se jogar fora, não é, Madalena? -- assumo, baixinho -- Mas agora, ande! O jantar precisa estar servido às oito em ponto, vamos, vamos, deixe de ficar aí babando na janela.

     Sorrindo como uma jovenzinha assanhada Madalena finalmente se retira seguindo para as cozinhas para preparar a refeição favorita de Ian, à meu pedido. E falando nele… permaneço ali por mais um tempo, saboreando detalhadamente cada movimento daquele corpo.

-- A senhorita o olha como se fosse sua próxima refeição. -- Agnes comenta, parando ao meu lado em meu posto de observação na janela.

-- Ah, querida amiga, eu é que gostaria de ser a refeição daquele homem.

     Agnes permanece em silêncio e estranhando isso viro meu rosto para ela, que tem as sobrancelhas franzidas sobre um olhar um tanto perdido, confuso e irritado.

-- Há algum problema? Alguma coisa que queira me contar? -- pergunto dando-lhe um leve empurrão no ombro, em forma de brincadeira -- Por acaso está secretamente interessada em Ian Mackenzie, Agnes? Eu poderia dividi-lo com você, caso queira. Talvez tenha mais sucesso que eu em seduzi-lo.

-- Missy, se eu estivesse secretamente interessada em alguém aqui, seria na senhorita.

     A mulher ao meu lado me olha incisivamente enquanto tento dar sentido às suas palavras, que logo compreendo. Bem, por essa eu não esperava, mas… no silêncio que se segue, percebo que Agnes aguarda minha reação e talvez até um julgamento. Porém, quem sou eu para julgá-la? Sorrio sedutoramente.

-- Então quer se enroscar comigo nos lençóis?

     Finalmente aquela expressão tensa deixa seu rosto, que agora torna-se feliz, acompanhado de um suspiro de alívio.

-- Não seja tola, Missy. -- ela diz, sorrindo -- Além do mais você não faz o meu tipo, é magra demais.

-- Olha, eu não sei bem se isso me deixa aliviada ou ofendida. -- ela apenas ri -- Mas eu agradeço que tenha confiado em mim para me contar isso.

-- Queria tê-lo feito à tempos mas eu tinha medo. Se relacionar com alguém do mesmo sexo não é bem visto, uma conhecida já foi morta acusada de bruxaria por isso.

-- Eu entendo seu receio, querida. -- aperto sua mão, para passar segurança -- Sinta-se livre para ser quem é nessa casa, Agnes, aqui e em qualquer lugar onde eu estiver. Eu a protegerei.

-- Obrigada, senhorita. -- ela agradece, emocionada -- Agora que já falamos de mim, vamos mudar de assunto.

-- E qual será o tópico, agora?

-- Aquele homem musculoso e ridiculamente sensual lá fora. -- ela aponta a janela, e ao longe o vejo parado bebendo água direto de uma jarra, olhando diretamente para nós.

-- Para de apontar, mulher! -- grito com ela, a puxando dali.

     Retornamos ao nosso lugar no sofá enquanto Agnes ri descaradamente do meu desespero ao sermos pegas em flagrante.

-- Missy, diga-me o que está acontecendo? O que os impede de engatar logo nesse romance?

-- Ian parece não me desejar tanto quanto eu o desejo, é isso que está acontecendo! -- assumo frustada, levantando as mãos para o ar.

-- Isso não pode ser verdade.

-- Mas é! Senhor Mackenzie quer apenas trocar alguns beijos comigo, nada mais.

-- Deixe-me ver se entendi. Está dizendo que o homem que enfrentou a própria família em favor da senhorita, abandonou seu lar para ficar aqui por tempo indeterminado trabalhando exaustivamente de sol à sol para reerguer sua propriedade, que quase enlouqueceu quando a viu "doente", e que sempre a olha como se fosse a coisa mais preciosa desse mundo, está interessando em apenas trocar beijos?

-- Ele me olha assim? -- inclino-me para frente, surpresa.

-- Missy! Não seja estúpida! Ele está apaixonado por você!

-- Não, ele não está. -- digo, surpresa com aquela idéia, repudiando aquela possibilidade.

-- Você não quer ver, é isso que está acontecendo realmente. Não percebe que essa é a sua chance de ser plenamente feliz? Pode negar o quanto quiser, isso não vai fazê-lo deixar de amá-la.

-- Ele não sente isso por mim. Ele não pode!

-- E por que não?

     Levanto-me agora realmente irritada com esse assunto.

-- Você sabe o porquê! -- acaricio minha barriga, ainda reta, prestes a entrar no quarto mês de gravidez.

-- Você deveria contar, sabe? Pode se surpreender com a reação dele.

-- Quantos homens conhece que aceitariam a criança de outro, Agnes? Que a amariam? -- ela não responde  -- E, além do mais, não seria justo esperar que ele o fizesse.

-- Não é justo isso que você está fazendo agora, Missy, nem com ele e nem consigo mesma!

-- Já chega desse assunto! Ian Mackenzie não está apaixonado coisa nenhuma, ele é um sedutor que só está prolongando isso por estar achando divertido me torturar, agora vamos, preciso me banhar e me preparar para lhe devolver o favor.

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