Quando vejo a diretora da faculdade nos olhando eu não sei aonde enfiar a minha cara. Sinto como se minha alma tivesse saído do corpo e voltado, o Geovani está branco feito papel. Eu só queria desaparecer dali, mas infelizmente não é possível, eu tenho que enfrentar isso como a mulher adulta que eu sou. Não dizemos nada, eu mal respiro, estou petrificada, esperando qual vai ser a reação dela.

- Vocês dois podem me acompanhar por gentileza. - São as palavras que saem da boca dela, antes dela se virar e sair andando, sem nem ao menos olhar para ver se a estamos acompanhando.

Não é uma pergunta, ela não nos da brecha pra discussão, ou pra dizer não. Não temos escolha além de segui-la até a sua sala.

O som dos seus saltos reverbera pela faculdade quase deserta. Minha mão esta gelada, e a cada passo que eu dou minhas pernas parecem mais com gelatina, eu sinto como se fosse cair a qualqier momento, de forma que só o fato de estar em pé e me manter caminhando já é um esforço tremendo.

Chegamos na sua sala, ela entra e com um gesto nos convida a entrar atrás dela, antes que ela feche a porta.

A diretora é uma mulher pequena, jovem, e de aparência delicada. Longos cabelos cor de mel em formato de caracol, que combinam com os olhos da mesma cor e emolduram seu belo rosto, ela é magra, pequena e muito bonita. Quase como uma bonequinha de porcelana. Mas de alguma forma sua aparência doce não a torna menos intimidante. Sua cara está fechada em uma carranca e ela parece ameaçadora.

- Sentem-se.

Novamente ela profere as palavras como ordens, ela não pede, ela exige, claramente nada do que ela diz está aberto a discussão. Eu me sento, e abro a boca pra falar na mesma hora em que ela fala, me fazendo calar.

- Isso, é uma situação vergonhosa. Eu esperava muito mais de vocês dois.

- Diretora eu...

- Senhorita Mellanie, você vai ficar quieta enquanto eu estou falando, ou vai piorar as coisas pro seu lado, e devo dizer que as coisas já não estão nada boas pra você.

Não foi uma pergunta, mas mesmo assim ela fica em silêncio aguardando a minha resposta.

- Sim senhora. - eu digo, Geovani está alguns passos atrás de mim, seus olhos exibem uma expressão gelada que nunca vi, apesar do semblante calmo.

- Por onde eu devo começar? O comportamento de vocês dois é inadmissível. Senhorita Mellanie, você deveria se dar ao valor, eu me sentiria envergonhada no seu lugar, de deixar um homem ter a possibilidade de destruir meus sonhos. Você deveria estar aqui para aprender, e não pra ficar aos beijos com seu professor.

- Geovani, você é pago pra estar aqui, e pra fazer seu trabalho. Seu trabalho não é ficar agarrando alunas, seu trabalho é ensinar. E se você não se sente capaz de fazer o seu trabalho, é melhor que a gente resolva isso de uma vez.

- Eu estou profundamente decepcionada, com ambos. Mellanie, você é jovem ainda, eu já tive sua idade e sei que um homem como o Geovani pode abalar nossas estruturas, ainda mais um professor. Uma figura de autoridade, um amor proibido, tudo isso é muito excitante. A possibilidade de ser pega, só aumenta a adrenalina de toda a situação não é mesmo? Eu já estive do seu lado, e eu te digo que no fim. Isso não vale a pena. Não importa o que um homem como o Geovani, um professor, possa ter te oferecido. Isso é algo que esta fadado a acabar com o fim do ano letivo. Ele está te usando, e eu achei que você seria esperta o suficiente pra notar isso, vocês nunca vão ter um relacionamento, nunca.

Eu sei que ela está errada, mas não tenho forças pra dizer nada, nem mesmo pra levantar a cabeça e olhar em seus olhos, muito menos pra defender o Geovani das acusações totalmente infundadas dela.

- O que ele prometeu pra você criança? Que quando você se formasse ele te procuraria? Que por enquanto vocês não podem namorar pois estão numa situação complicada, mas que logo, assim que acabasse suas aulas ele ficaria com você? Eu nunca achei que poderia existir alguém tão ingênua, acreditar em algo claramente sem futuro, desperdiçar o próprio futuro por algo que não existe. Eu estou profundamente desapontada.

Estou cansada de ficar calada ouvindo ela dizer absurdos. E retiro forças do mais profundo do meu ser, pra respondê-la, minha voz, sai quase como um susurro, praticamente inaudível.

- Não fizemos nada de errado, não cometemos nenhum crime. Somos ambos maiores de idade e temos consciência do que estamos fazendo.

Levanto a cabeça e olho nos olhos da diretora, seus olhos estão ainda mais duros e sua expressão é quase de ódio. Provavelmente revoltada por eu não estar aceitando cada palavra do que ela diz.

- Isso é totalmente antiético senhorita, e tenho certeza que você sabe muito bem disso. A menos que você seja muito mais burra do que eu achei. Vamos fazer o seguinte uma semana de suspensão pra você. Agora você Geovani vamos ver o que acontece com você.

Eu não consigo segurar minha língua, eu estou muito brava, eu sei que estamos errados, mas não é contra nenhuma lei nada do que fizemos. Não é possível que ela não esteja tentando nem entender a situação.

- Isso está errado, você não pode fazer isso só porque estamos namorando.

Quando eu termino de falar vejo o rosto da diretora praticamente mudar de cor, ela fica branca igual um papel, e logo em seguida vermelha como pimenta. Quando ela fala sua voz é baixa e grave.

- Saia da minha sala.

- Mas... eu...

- SAIA DA MINHA SALA AGORA.

Eu tomo um susto com o grito. Eu olho pro Geovani que até agora se mostrou impassível, e ele só acena com a cabeça. Estou indignada, eu saio da sala, fecho a porta e começo a chorar. O que vai ser da gente agora? Eu nunca quis causar prejuizo pra ninguém muito menos pro Geovani, se tem una coisa que eu sei é que ela está completamente errada, mas será que o Geovani sabe que eu sei? Eu ouço os gritos vindo da sala dela, e tento prestar atenção em quão ruim está a situação do Geovani.

- UMA ALUNA GEOVANI? VOCÊ TÁ MALUCO? A PORRA DE UMA ALUNA OFERECIDA?

- FOI POR CAUSA DELA QUE VOCÊ FICOU INVENTANDO DESCULPAS PRA NÃO SAIR COMIGO DE NOVO?

- VOCÊ DISSE PRA MIM QUE NÃO ERA DO TIPO QUE NAMORAVA E NÃO QUERIA COMPLICAR AS COISAS, MAS TA NAMORANDO A PORRA DE UMA ALUNA SEU DESGRAÇADO NOJENTO. EU VOU ACABAR COM A PORRA DA SUA CARREIRA.

Eu estou abismada com o que eu acabei de ouvir, chocada, mas ao mesmo tempo, tudo faz sentido. Mas isso não é coisa boa, se ela quiser vingança, ela pode atrapalhar toda minha vida e a do Geovani. Eu estou tremendo quando ouço a voz do Geovani pela primeira vez.

- Você não vai fazer nada, você vai retirar a suspensão que deu pra Mellanie, e ficar bem longe dela. O que eu faço com minha vida particular não te diz respeito. E se você sequer tentar se meter na minha vida ou na da Mellanie, você vai aguentar as consequências. E eu não tô falando de vingançinha não, porque eu não sou imaturo igual você. Eu estou falando de consequências legais, eu trabalho aqui e sei os seus podres, todo mundo sabe. E eu quero minha demissão.

Depois disso eu não ouço mais nada vindo da sala. Tudo fica silencioso, alguns minutos depois o Geovani sai. Olha nos meus olhos e segura minha mão bem forte, eu vejo um punhado de papéis na outra mão.

- O que aconteceu? - eu pergunto.

- Eu pedi demissão, agora, não precisamos nos esconder mais. Eu não queria que as coisas fossem desse jeito, mas eu já tô a um tempo procurando outro emprego, e eu consegui. Faz alguns dias que eu pedi minha demissão aqui, e ela não me deu, disse que era pra eu ficar até as férias. Mas depois de hoje, só não dá mais. Eu estou cansado de me esconder, e de que pareça errado a gente estar junto. Sendo que não tem nada de errado nisso. Eu te amo Mellanie, e quero poder demonstrar meu amor por você o tempo todo, e não só quando estamos sozinhos.

- Eu também te amo Geovani, e tudo que eu mais quero é poder mostrar pro mundo todo o quanto eu sou feliz com você.

~ ♡ ~

Os dias se passaram na maior felicidade, nada como um relacionamento passar ser assumido pra deixar a energia lá no alto, depois que chegamos em casa Geovani me explicou que ele e a diretora tiveram uma coisa, que pra ele não significou nada foi só um caso de uma noite só; mas que ela ficou apegada demais, chamando ele para jantares e reuniões que não eram bem reuniões, ele precisou deixar bem claro por diversas vezes que não queria nada com ela, e que depois de muita insistência ela pareceu desistir e seguir a vida. Mas quando ele pediu demissão, ela começou a ficar estranha novamente, insistiu pra que ficasse até as férias e a chamar ele pra reuniões que não existiam, ele não comparecia em nenhuma dessas reuniões dando sempre alguma desculpa, mas acabou concordando de ficar até as férias.

Alguns dias depois a diretora foi afastada da faculdade por tempo indeterminado, um outro professor, com quem eu nunca tive contato a denunciou por assédio, e pelo que o Geovani falou, o buraco era muito mais em baixo, ele próprio sabia de vários casos de assédio que ela cometia, e também de situações de desvio de verba.

Claro que eu fiquei horrorizada, mas a verdade é que existem pessoas ruins em todo lugar, independente de gênero, classe, status; e claro que o que mais tem é gente se aproveitando de cargo de poder pra ser um tremendo filho da puta, acho que eu só não esperava isso de uma mulher.

No fim de semana aconteceu o que mais estava me deixando ansiosa, Geovani e minha mãe se conheceram, como o ranço dela com o Bernardo foi imediato, confesso que estava com um pouco de medo desse encontro, mas correu tudo perfeitamente bem. Minha mãe se encantou pelo Geovani e foi só amores o tempo todo, isso me deixou tão, mas tão feliz que nem tenho palavras pra descrever. Na hora que, um pouco antes de vir embora ela virou pra mim e disse "filha, esse é o cara. É o melhor cara que você poderia arrumar." Meu coração praticamente deu piruetas dentro do meu peito.

Agora estou prestes a dar o passo final pra um relacionamento assumido no século 21, mudar o status de relacionamento no Facebook. Eu não mexo nas redes sociais com tanta frequência assim, mas de qualquer modo, isso parecia o passo que faltava.

Logo que eu mudo o status de relacionamento para "em um relacionamento sério com Geovani Santos" começou a chover curtidas e felicitações, várias pessoas que eu nem conversava a muito tempo vieram me felicitar.

Depois de um tempo, o meu status de relacionamento bombando, algo acontece. E isso nem deveria ser motivo para alarde, mas é, meu coração parou de bater por um momento ao ver a notificação, e por mais que algo me diga que isso ainda vai dar ruim eu quero acreditar que esse pensamento é só algo da minha cabeça e que estou exagerando.

Eu ligo pra Ana, que é sinceramente, a primeira pessoa que eu penso nessa hora. O telefone toca algumas vezes, mas ela logo atende, com uma voz animada, contrapondo meu tom de voz sombrio.

- Melzinha, eu estou tão feliz por você! Eu sei que já disse isso um milhão de vezes, mas eu tô muito feliz, muito mesmo. Eu acabei de ver no facebook que você colocou em um relacionamento, sério, você merece ser feliz mais do que ninguém.

- Ana.

- Que foi Mel? Que voz é essa? Tá tudo bem? Aconteceu alguma coisa?

- O Bernardo curtiu meu status de relacionamento.