Amizade

Já fazem duas semanas que eu e o Geovani estamos namorando, e a Ana ainda não sabe de nada. Sustentar essa mentira, está cada vez mais difícil. Mas eu sei que é pelo nosso bem, nós já arriscamos muito, e por mais que eu ame a Ana, quanto mais gente souber o que está acontecendo, mais chance de algo dar errado.

Claro que saber que é o certo a se fazer, não torna as coisas mais fáceis. Ainda mais quando todo mundo está aqui em casa numa noite das meninas. Meu celular não para de vibrar e minhas desculpas já se esgotaram.

Minha relação com o Geovani está ótima, claro, estamos no começo ainda, e temos nossas dificuldades, ter que ficar distante nas aulas, tomar cuidado pra que as pessoas não descubram, e principalmente, não contar pra ninguém tem sido as maiores delas.

A verdade, é que eu nunca estive tão feliz, estar com o Geovani é diferente de qualquer outra coisa, eu sinto que ele me entende e ele realmente está sempre disposto a me ajudar e me apoiar, seja com o que for. E pra alguém como eu, que toda minha experiência se baseia em um relacionamento abusivo, isso é muito importante.

Mas isso não torna as dificuldades menores. Hoje, quase abri o jogo, uma, duas, três, várias vezes! Minhas amigas estão todas em casa, fizemos mojitos, e estamos comendo besteira, vendo filmes e conversando. É louco pensar que a tão pouco tempo, eu achava que não tinha ninguém. Agora, me sinto rodeada de amigas, com a Ana, a Michelle irmã da Ana, Bel e Patrícia, todas aqui, fazendo a maior farra.

- Ei ei ei, terra chamando Mel!!

- Ah, oi, desculpa Michelle, acabei me distraindo um pouquinho.

- É, a gente percebeu que você se distraiu, haha. E se a gente jogasse o jogo da verdade? - sugere Michelle, após um tempo decidindo o que poderíamos fazer.

- E como se joga isso?

- É simples, a gente gira a garrafa e quem a garrafa apontar tem que responder a pergunta que a pessoa que rodou a garrafa fizer. Mas só pode dizer a verdade.

- E se eu não quiser responder? - Pergunta Patrícia.

- Aí, tem que beber uma dose!!

Acabamos todas concordando com a brincadeira, estou muito feliz vendo todas se dando tão bem, eu tinha um pressentimento que todas gostariam muito umas das outras, mas ver que eu estava certa, me deixa realmente muito feliz.

Começamos a brincadeira com a Michelle que rodado a garrafa, já que ela tinha dado a ideia. E ela acabou apontando pra Ana.

- Qual foi a maior mentira que você já contou pra mim? - Perguntou Michelle.

Ana por sua vez, preferiu beber do que contar, dizendo apenas que algumas verdades que devem ficar guardadas. Nós enchemos um pouco o saco da Ana por isso, mas logo seguimos adiante. Ana gira a garrafa, que acaba parando logo em mim.

- Quem está mandando tanta mensagem que seu celular não para de vibrar?

- O Geovani. - Eu respondi. E esse foi meu erro.

Talvez eu não devesse ter respondido, porque claro que todas começaram a fazer um monte de perguntas sobre o Geovani, e apesar de eu ter dito que só respondo na minha vez, com a sorte que eu tenho vou acabar tendo que realmente responder cada uma dessas perguntas. E esse é o problema de você guardar um segredo desses, alguma hora, você deixa escapar alguma coisa, especialmente se você já bebeu mais mojitos do que devia.

Eu giro a garrafa, que para na Patrícia.

- Qual foi a coisa mais vergonhosa que você já fez pra um cara?

- Acho, que implorar pra ele ficar comigo quando ele quis terminar. Se uma pessoa quer terminar com você, você devia deixar ela ir, ter que implorar só mostra o quanto ele não merece você. E mesmo que vocês voltassem, que futuro teria essa relação? Se o cara só está com você por pena ou sei lá o que.... Infelizmente, na época eu não sabia disso e fiz o maior papelão.

Todas acabamos concordando com o que Patrícia disse, e claro que quase todas nós já tínhamos passado por uma situação parecida, algumas mais do que outras. Eu mal consigo acreditar que eu fiz exatamente isso pelo Bernardo, implorei, várias vezes. A Patrícia tem razão, é claro, mas quando se trata do Bernardo, o buraco é mais embaixo. Nós nunca teríamos dado certo, de um jeito ou de outro, pois ele é incapaz de amar alguém que não seja ele próprio.

O jogo foi seguindo, felizmente, a garrafa não parava virada pra mim nenhuma vez, aparentemente, era o meu dia de sorte, e eu estava me divertindo muito ouvindo as histórias delas.

Michelle contou do seu primeiro namoradinho, quando a Bel perguntou pra ela da sua primeira vez, e de como eles foram desajeitados e como foi desastroso e dolorido, e que depois disso ela acabou terminando o namoro, pois ela não conseguia ver ele com os mesmos olhos.

Bel por sua vez contou de quando saiu com um cara que conheceu na internet e que usava uma foto fake, quando Patrícia perguntou sobre a coisa mais maluca que ela já fez, o maluco da história foi que ela deu o maior esporro no carinha por usar uma foto que não era dele, e foi atrás de descobrir de quem realmente era a foto, e acabou descobrindo que era de um primo do garoto, eles namoraram por quase um ano.

Ana contou como seu primeiro beijo foi nojento e babado, quando Patrícia lhe perguntou sobre isso, e contou que foi quando ainda era criança com um garoto da sua rua enquanto eles brincavam de esconde-esconde, depois do beijo ele tentou apalpar ela, que deu um soco nele que fez com que o coitado entrasse correndo em casa.

Claro que também tiveram perguntas que elas não quiseram responder, como a Ana quando perguntaram sobre o pior término de namoro dela, ou a Patrícia quando pediram sua experiência mais traumática. O mais legal, foi que apesar de tudo, ninguém ficou insistindo ou forçando a barra pra alguém contar algo que não queria, todas nós entendíamos que tinham coisas que não tínhamos interesse em partilhar, não por falta de confiança, mas por se tratarem de assuntos difíceis de lidar.

Depois de quase uma hora de brincadeira, a garrafa acabou parando em mim de novo. Eu já estava esperando ser bombardeada de perguntas, e tinha certeza que seria sobre o Geovani, já que já tinham me perguntado dele várias vezes durante aquela noite.

- Conta uma coisa sobre você e o Geovani que ninguém aqui saiba. - falou Michelle.

Eu precisei pensar muito, tinha sido uma ótima pergunta, afinal, tinham pouquíssimas coisas que a Ana não sabia, o que me impedia de fugir muito do que elas queriam saber de fato.

- Quando o Geovani estava internado ele não me atendeu por que tinha deixado o celular aqui. - eu finalmente respondi. - Apesar dele ter dito que não atenderia de uma forma ou de outra.

Eu consegui fugir de mais perguntas por um bom tempo ainda, mas no fim, foi a Bel que apontou a garrafa pra mim pra fazer a última pergunta. E fez, a pergunta de milhões.

- Você e o Geovani tem que tipo de relacionamento hoje? Além de professores e aluna.

Num primeiro momento eu não respondi, eu fiquei quieta e pensei em pegar a dose e fugir da pergunta. E eu realmente pensei em fazer isso, eu não queria contar pra Ana que era minha melhor amiga, eu não ia contar pra 4 pessoas, os riscos aumentavam muito, e mesmo que a Patrícia não fosse da faculdade e não conhecesse o Geovani, as outras 3 conheciam, e isso definitivamente não era uma boa coisa.

Eu pensei e pensei, indecisa sobre o que fazer, eu sabia que mesmo que eu tomasse a dose, elas também não ficariam chateadas, elas entenderiam. Eu tinha certeza que elas iam acabar entendendo.

Depois de mais alguns momentos, eu tomei minha decisão. Já estavam todas aflitas olhando pra mim com curiosidade, quando eu peguei a dose de bebida na mão, e levei o copo a boca, virando todo o conteúdo de uma vez.

E antes que o "aaaaaaaaaah" geral que começou quando eu engoli a bebida terminasse, eu comecei a falar.

- Como eu disse. Ele tinha deixado o celular aqui. Quando ele saiu do hospital, acabou passando aqui pra pegar. Ele estava tão bravo, tão decepcionado sabe, e eu estava desesperada. Eu tinha finalmente caído a ficha de que eu estava apaixonada por ele, e não podia deixar que as coisas acabassem daquela forma. Ele não queria nem entrar aqui em casa, eu precisei praticamente obrigá-lo, a entrar, a me ouvir. E eu contei tudo, como eu me sentia, como tudo isso tinha me afetado. E fiz todo o possível pra convencê-lo de que o Bernardo era passado pra mim, e que eu realmente queria ele na minha vida.

Todas me olhavam atentamente, não se ouvia nem um pio além da minha voz.

-Deu muito trabalho, mas consegui convencer ele a me dar mais uma chance. Passamos todo aquele final de semana juntos, e no fim, ele me pediu em namoro.

Eu parei de falar por um momento e olhei ao meu redor para o rosto delas, o rosto de cada uma das minhas melhores amigas. Todas tinham expressões surpresas e felizes, mas a Ana, a Ana chorava, com um sorriso no rosto e as lágrimas descendo por sua bochecha.

- Eu devia ter contado a vocês a muito tempo, eu queria contar, de verdade, esconder isso de vocês tem sido a coisa mais difícil que eu já fiz, principalmente de você. - disse virada pra Ana. - Mas, é uma situação difícil essa, não que eu não confie em vocês, mas tem muita coisa em risco, o emprego dele está em risco. E por mais que eu realmente confie em vocês, quanto mais gente souber, mais fácil é de algo dar errado. Eu espero que vocês entendam.

Quando eu termino de falar, Ana chega perto de mim e me abraça forte. Ninguém está triste ou chateada de eu não ter contado. Muito pelo contrário. Eu vejo no rosto de cada uma delas o quanto estão felizes por mim. Felizes por eu ter contado, e confiado nelas, mas principalmente felizes por mim, por eu estar feliz. No fim, a verdadeira amizade é isso.

O resto da noite usamos pra comemorar meu namoro com o Geovani. Colocamos música e dançamos até cair no chão. Esse, é um dia que vai ser inesquecível pra mim. É o dia que eu descobri de verdade, o significado da verdadeira amizade.

Já é muito tarde quando finalmente estamos exaustas demais pra fazer algo além de dormir. Cada uma acaba arranjando um cantinho em casa, já que não tenho cama pra todo mundo. Eu divido a cama com a Ana, que logo pega no sono, eu estou cochichando quando acordo abruptamente, com uma sensação estranha no peito, tento dormir de novo, mas, algo me tira o sono, tenho medo de acordar a Ana que está na cama comigo e acabo levantando. Minha casa está silenciosa, o único barulho sendo meus passos e a respiração das meninas dormindo.

Eu ando pela casa, e em meu coração eu ainda sinto como se tivesse algo errado. Antes de dormir eu mandei mensagem pro Geovani falando que eu tinha contado sobre o nosso namoro e ele me garantiu que estava tudo bem. E realmente parecia estar tudo bem pra ele, que disse que também ia contar pra Camila, agora que a Ana já sabia.

Eu fiquei um bom tempo acordada, na cozinha sentada, tentando entender o que tem de errado, olhando pra janela aberta na minha frente. Depois de um tempo, me pergunto quem abriu a janela, pois eu não tenho o costume de deixar a janela aberta quando estou dormindo. Tenho certeza que deve ter sido uma das meninas, mas de todo jeito fecho a janela antes de voltar pra cama, ainda sem saber o que me fez sentir assim e acabo pegando no sono.

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