|Capítulo 02|

Quando o mês acabou, já estava tudo organizado; a viagem seria feita. Os pais de Dulce haviam conseguido resolver alguns assuntos pendentes e, sem que ela soubesse, tinham economizado dinheiro para uma boa hospedagem para a filha. A mesma ficara bastante feliz e mais agitada para viajar, mas com certo receio de deixar sua família. 

Na manhã chuvosa de segunda-feira, as malas já estavam no hall principal da casa, enquanto a jovem de cabelos escuros terminava de se arrumar para a partida. Usaria uma calça preta, uma blusa simples branca, uma jaqueta de couro e tênis preto de cano alto. Finalizou a arrumação ao passar o brilho labial e apanhou seus pertences que levaria nas mãos. 

Seu pai a levaria de carro, um fusca amarelo, até o aeroporto. Na varanda da casa, enquanto abria o guarda-chuva, avistou Jason do outro lado da rua. Ele era vizinho dela, mas logo deixaria de ser, mesmo assim pôde perceber a tristeza de vê-la partindo. Ambos que cresceram juntos e se conheciam muito bem desde crianças, jamais imaginaram se decepcionar tanto.

Ela ergueu a cabeça e deixou o orgulho tomar rédea da situação e caminhou até o veículo, sabendo que era melhor assim, do que magoar-se mais ainda. Em poucos minutos estava adentrando o aeroporto, com o senhor a ajudando com as bagagens. Andava apressada em direção o portão de embarque, pois já havia se atrasado para entrar no voo. 

- Tchau, papai. - depositou um beijo em sua bochecha, e pela primeira vez, viu uma lágrima escorrer pelo seu rosto. - Oh, pensei que você não chorasse. - caçoou. 

- Eu não choro, menina. - decretou, fazendo-se de durão. 

- Ah, papai, também vou sentir sua falta. - abraçou-o apertado. 

- Ok, você tem que entrar no avião, senão o perderá. - orientou. 

- Tá bom. - revirou os olhos e acenou, enquanto caminhava até uma moça que a recepcionou. 

Sentir a eletrizante sensação de levantar voo foi algo novo para aquela moça, que se deslumbrou com a cidade de Minnesota ficando tão minúscula. A mesma colocou os fones de ouvido, que tocava Justin Bieber e vasculhou sua bolsa, que continha seu precioso diário. Ela começaria a escrever um novo, mas antes recordaria de cada coisa que havia escrito. 

Dulce se emocionou ao relembrar cada lembrança marcante e adormeceu na poltrona em meio as lágrimas. Despertou quando já havia pousado e apanhou suas coisas, deixando o avião as pressas, senão perderia sua bagagem. Buscou pelo seu passaporte para entrar na cidade, mas não o achou e ficou frustrada com tamanho desatento.

- Moça, isso pertence à você? - disse uma voz grave e a garota virou-se, esbarrando em um par de olhos âmbar. 

- Sim, obrigada. - sorriu, pegando o que havia deixado cair. 

- Belo rapaz. - elogiou sua fotografia, que continha Jason abraçado a ela. - É seu namorado? 

- Nã-Não. - negou, freneticamente, fazendo o garoto sorrir com sua vermelhidão. 

- Ok. - assentiu e afastou-se. 

Após permanecer alguns instantes em um transe, vendo a silhueta do rapaz sumir, entregou os documentos e passou pela entrada do aeroporto. Seguiu até a rua, em busca de um taxista para ir ao endereço que seus pais haviam lhe entregado. Procurou por todos os lados e não encontrou nenhum carro amarelo, então desistiu, bufando. 

- Quer uma carona? - questionou aquele mesmo homem, parado metros distante dela, com um cigarro entre os lábios. 

- Huh... Não, obrigada, vou esperar um táxi mesmo. - proferiu, agora sentindo receio de estar sendo perseguida. 

- Qual é, não vou fazer nada à você. Prometo. - decretou. - Veio para entrar em alguma faculdade? - puxou assunto. 

- Sim... - respondeu, suspirando exausta. 

- Bacana. Eu estou em uma por aqui, no segundo ano de advocacia. - ressaltou. - Você irá fazer o que? 

- Engenharia. - disse, ríspida. 

- Uau, não são muitas pessoas que fazem esse curso aqui. Até impressiona àqueles que tentam, é uma área difícil, não é mesmo? 

- Se você me levar até onde tenho que ir, ficará calado? - exclamou, impaciente. O rapaz sorriu debochado e desencostou da parede, caminhou até Dulce e estendeu a palma da mão. 

- Prazer, sou Noah. - apresentou-se, civilizadamente. 

- Sou Dulce. 

- Vamos? - prontificou-se em andar, mas antes a ajudou com as malas. 

Ele aparentava ter uns dezenove ou vinte anos, tinha seus cabelos grandes em um topete, da cor castanho escuro. Olhos amendoados e amarelados, pele parda com bronzeamento natural e barba recém feita. Exalava perfume dentro do automóvel, enquanto mantinha-se quieto. Isso era desconfortável para Dulce, mesmo ela tendo pedido aquilo. 

- Então, conhece muitas coisas por aqui? - indagou, curiosa. 

- Não foi você que pediu para ficar calado? - retrucou, ríspido, dessa vez. A mesma encolheu-se com tamanha grosseria, só tentara ser gentil. - Só para sua informação, sim, conheço. Posso mostrar-lhe, caso queira. 

A jovem permaneceu sem emitir nenhum som, apenas admirando a paisagem fora da BMW prata que Noah possuía. Ele esbanjava riqueza, e era essa a primeira impressão que se tinha dele, que era tão familiar ao Jason. Em instantes ele estacionou no endereço dito, parando em frente a um prédio cinza e não muito alto. 

- Aqui que você ficará? - questionou, analisando a estrutura. 

- Acho que sim. - disse, franzindo a testa e verificando no pequeno papel em suas mãos. - É, parece que sim. - ergueu os ombros, sutilmente. 

- Ok. - assentiu, saindo do carro e retirando as malas do porta-malas. 

- Obrigada pela carona. - agradeceu, simpática. 

- Disponha, flor. - piscou para a garota. - Caso queira conhecer as coisas, como lhe disse, aqui está meu número. - entregou um pequeno cartão para ela. 

- Tá bom. Obrigada, mais uma vez, Noah. - o rapaz beijou a bochecha dela e entrou em seu veículo, seguindo o restante da rua até virar a próxima esquina. 

Dulce andou desengonçada até a portaria, sendo parada pelo porteiro que a olhou desconfiado. Depois de explicar que era uma nova moradora, pode pegar a chave do apartamento e subir de elevador, mesmo com certa dificuldade. Tinha grandes expectativas de como seria e esperava que não se decepcionasse. 

A chave foi colocada na fechadura e girada, abrindo a porta de madeira que rangiu e o som ecoou pelo espaço quase vazio. Adentrou mais a residência e colocou as malas no chão, verificando a pintura ao redor e as instalações. Ficou tão perdida que não notou alguém se aproximando. 

- Quem é você, menina? 

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