Capítulo XXXVI - A voz no corredor

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     No alto da escada, imagem de Margareth estava parada, olhando para Elizabeth em um desafio silencioso. Elizabeth a olhou com os olhos levementes arregalados, em uma surpresa explícita, e também desagradável.

     Sem nenhuma palavra, Margareth desceu o primeiro degrau que pareceu reverberar no local tão alto quanto os próprios trovões furiosos lá fora deixando os pés deslizarem com igual peso os demais degraus abaixo. A cada novo passo, Elizabeth parecia perder um pouco de sua respiração e depois soltava-a de forma pesada. Já no meio da escada uma onda de magia prata correu de encontro ao corpo da senhora envolvendo o seu pequeno corpo como um lençol, logo lhe despindo de seu disfarce. Aos poucos, onde a magia passava a imagem da senhora ia sendo mudada. A roupa negra sempre bem alinhada fora substituída por uma longo vestido branco resplandecente que flutuava acima do chão como se estivesse dentro de água, sua pele ganhou uma negritude bela e seus cabelos um tom branco como o próprio vestido que também flutuava em sua cabeça como se estivessem mergulhados em um lago invisível. Seu rosto já não era mais de uma senhora de longos verões e invernos, mas jovial e belo e seus olhos sempre castanhos acenderam em luz como se carregassem o próprio brilho da lua cheia em uma noite sem nuvens. A mulher ali não era mais Margareth, uma senhora forte e dócil, mas Alninaram, uma bruxa ainda desconhecida.

      Quando os pés descalços daquela nova imagem tocou o piso de mármore branco, o silêncio recaiu sobre eles como uma parede de pedras. As luzes dos relâmpagos acendem a mansão, deixando tudo ainda mais tenso do que estava.

     Kristen tossiu desenfreadamente sentindo-se estranhamente sufocada, como se estivesse a tempos sem respirar. O ar entrava em seus pulmões queimando-os como se ela tivesse passado anos sem o fazê-lo, e logo ela estava recobrando sua percepção da realidade. Lentamente ela olhou ao redor cheia de um receio que não sabia explicar, até que seus olhos recaíram sobre uma imagem de uma mulher estranha e de Elizabeth.

     Seu coração saltou em seu peito, e seus ouvidos chiaram com o silêncio gritante que estourava seus tímpanos, mas ainda assim, mesmo com aquela mulher ali, mesmo estando com Elizabeth ali, ela sabia que havia algo a mais. Confusa, ela olhou ao redor, e a poucos centímetros de si viu fios escarlates, cabelos jogados ao chão como um tapete, e logo sentiu um frio bater em seu corpo como uma parede de gelo ao constatar que eram, na verdade, seus próprios cabelos. Ela franziu o cenho confusa e como instinto passou a mão pelo próprio cabelo sentindo em sua palma a falta de algo. Ela respirou pesado passando ainda mais rápido a mãos pelos cabelos cortados, sem entender nada. O que havia sido feito consigo? Mas desta vez ela não esperou resposta, pois em uma fração de segundos  os flashes inundaram sua cabeça e ela lembrou dos instantes que havia sido tomada por algo. Elizabeth, Elizabeth era a resposta para seus cabelos cortados, ela soube ali.

    Alninaram olhava fulminante para Elizabeth que correspondia ainda surpresa, mas ainda mais incomodada.

— Tu — Elizabeth afirmou seca, tensa como se visse em sua frente um verdadeiro fantasma.

— Esperei ardentemente por este momento, Elizabeth — Alninaram respondeu tão seca quanto a outra. A voz dela não era mais como a de uma senhora, não, agora parecia como o som de muitas vozes em apenas uma.

— Achei que estivesse morta — manteve seu tom ríspido e um tanto amargo, como se estivesse decepcionada por aquela mulher está ali em sua frente, viva.

— Tu falhaste, Elizabeth, e eu voltei para assegurar que tu pagues por tua falha.

— Como conseguiu voltar? — perguntou com a respiração pesada presa no peito.

— Eu nunca fui embora. Sempre estive aqui, esperando ansiosa pelo nosso reencontro — ela fez uma breve pausa antes de continuar sua sentença — E ele chegou.

— O que irá fazer, Alninaram? — disse irônica despindo-se rapidamente de sua imagem tensa — Irá tomar minha magia?

— Não ousarei envenenar-me com tua magia suja, Elizabeth — ela disse desdenhosa em um repúdio explícito em seu rosto — Tu corrompeste a beleza da magia que tolamente confiei a ti. Tranformaste-a em um poço negro cheio da imundícia de tua alma corrompida de inveja.

— Tua magia era fraca, inútil, pequena demais — disse sádica — Eu a aprimorei, querida, tornei-a tão forte quanto nem sequer você conhece. Conhecendo-me como tu conheces, deveria saber que o pouco não me contenta.

— Eu nunca a conheci, Elizabeth, e o meu erro fora confiar em uma desconhecida — disse azeda, realmente decepcionada.

    O vento entrou na mansão em uma onda fria oscilando a luz nas velas e dançou entre eles parecendo se  intensificar a cada mínimo instante. Folhas já eram trazidas com ele, e elas dançavam entre eles como um ritual. Kristen podia sentir o toque frio em sua pele, em uma carícia estranhamente desconfortável. A chuva caía pesada, os trovões tomavam os ouvidos de todos a todo instante.

     Viktor sentia cada parte de seu corpo queimar dentro de seu próprio veneno letal consumindo cada tecido de si como fogo sobre o papel. Ele contorcia-se e encolhia-se dentro de sua própria sujeira sem forças para resistir aos espasmos de seu corpo agora tão vulnerável. Ele podia sentir cada veia se apossar de seu corpo como lâminas afiadas a rasgar sua pele por dentro. Sem forças para lutar, novamente expelia seu sangue negro, que escorria  pelo  seu queixo  e novamente ele estava  dentro de sua própria sujeira, inerte, sofrendo, sem sequer conseguir emitir qualquer som que não fosse gemidos sôfregos e baixos. Dentro de si seus órgãos pareciam explodir, e ele sentia cada centímetro de si ser tomado sem que pudesse fazer nada. Novamente a ânsia tomou sua boca e o líquido negro saltou de seus lábios sem sua permissão. Sua boca estava seca, sua fala havia sido tomada como se uma espada houvesse cortado sua garganta e calado sua voz para sempre. Seu corpo contorcia-se sem sua permissão, consequência de uma morte tão próxima. Finalmente a morte que tanto ansiou. Infelizmente ela havia de fato vindo, no entanto no momento em que tudo que desejava era viver. Era tarde para si.

    Kristen novamente dona de seu corpo contemplou seus cabelos ao chão em uma melancolia dolorosa, mas ainda assim havia algo a lhe incomodar e ela sentia que quando soubesse o que haveria de ser, ela imploraria para ser novamente retirada de seu corpo. A dor incomoda em seu braço forçou seu olhar sobre ele e ela sentiu o corpo gelar ao contemplar o corte fundo e escuro no seu próprio sangue seco sobre a ferida fétida. Ela deslizou seus dedos sobre o corte, sentido toda a aflição de contemplar a maldade de Elizabeth além de seus fios escarlates, mas ainda assim, seu coração gritava em seu íntimo que ainda não era aquilo que a aflingia de fato. E ela lamentou ao ver que estava certa.

     Como por instinto, ela ergueu sua cabeça, e a alguns metros, o corpo de Viktor contorcia-se dentro de um líquido negro que escorria de seu queixo e saltava de sua boca como ondas do mar a baterem nas rochas. O seu peito despencou. Naquele instante seu peito fora atravessado por uma lâmina  afiada, rasgando seu coração em dois, o matando para sempre. Tudo pareceu aquietar-se ali, a chuva, os trovões, as vozes... Tudo havia calado-se, esvaíado-se no ar como uma simples fumaça. O ar saiu de seus pulmões em uma lufada tão pesada quanto uma parede de pedras escapando entre seus lábios em um lamento silencioso e pesaroso. Seus olhos ficaram turvos, como se um véu houvesse sido postos sobre eles e logo um mar quis os banhar no seu lamento doloroso. Ela quase podia sentir a lâmina passando por seu peito, quase podia sentir o seu sangue banhando sua roupa enquanto sofria e morria lentamente. O corpo dele estava sobre o solo manchado de negro, e mesmo nas luzes verdes das chamas dos candelabros e do lustre, ela viu as veias negras em seu corpo, as veias mortais que a tempos houvera provado do seu amargo veneno da morte, mas que agora estavam sobre Viktor, transformando-o desta vez não em uma aberração temida, mas na vítima de sua própria maldição. Deuses, o que haveria de estar acontecendo com ele? Ela não poderia permitir aquele martírio nem mais um instante, ela tinha de ajudá-lo!

    Sem delongas, ela se pôs sobre os joelhos, e levantou em seguida pronta para correr de encontro a ele, mas nesse mesmo momento o vento se intensificou como um redemoinho, entrando no local rodeando a todos como um cerco, e logo o vento começou a carregar consigo sombras negras e velozes, que passavam tão rápidas quanto o próprio vento. A porta fechada escancarou batendo contra a parede anunciando a entrada de algo muito ruim.

     Alninaram entrou em alerta e viu os olhos de Elizabeth serem tomados de trevas enquanto lentamente veias negras subiram de seus dedos e se estenderam por suas mãos, indo até o seu braço os desenhando como uma luva. Mas eram veias diferentes das que tomavam Viktor, pois estas não pareciam machuca-la, pelo contrário, ali fora o desenho que desencadeou sua força e a negritude de sua alma perversa fora liberada.

     As sombras passavam por eles a medida que o vento ficava mais forte e os trovões mais barulhentos. A chuva era tão barulhenta quanto um exército em marcha e logo suas gotas foram sendo trazidas para dentro da mansão pela força do vento. As velas oscilaram, mas não apagaram e a adrenalina tomava o corpo de Kristen como se entrasse em um lago. Ela sentia as sombras passando tão próximas de si a ponto de fazerem seu vestido movimentar-se como se estivesse no alto de um penhasco prestes a pular.

     Aos poucos o céu se escureceu tanto que Kristen teve a impressão que um demônio havia os cobrido embaixo de seu manto negro da morte. Ali ela soube que todos estavam em perigo.

— Eu os setencio a morte — Elizabeth sentenciou com a voz destorcida, tão grossa quanto de um homem robusto e tão sombria quanto uma noite sem lua.  Logo em seguida abriu suas mãos e uma onda de escuridão escapou dali e atingiu a todos como uma parede. Uma escuridão profunda rodeoou a todos e sua força fora tamanha que Kristen caiu ao chão cobrindo seus olhos como se uma tempestade de areia estivesse sobre si naquele mesmo instante. Elena fora derrubada e logo estava deitada no chão sentido a costela doer tanto a ponto de fazer o sangue novamente escapar de seus lábios. Da escuridão, um portal em chama verde se abriu onde a porta estava agora escancarada e demônios grotescos saíram de dentro e adentraram o local os trancafiando ali.

— Deuses — Kristen disse atemorizada ao ver demônios terríveis de couraças grossas, bocas que mais pareciam terem sido rasgadas por uma faca, olhos vermelhos como sangue cercarem todos famintos por seus sangue, na ânsia insaciável por suas vidas. O ar ficou pesado como uma nuvem negra a cobri-los, as chamas nos candelabros e no lustre se ergueram em uma dança sombria, deixando suas sombras dançarem nas paredes. Se olhassem direito, a sombras dançantes nas paredes pareciam servos da escuridão, dançando em um ritual para a morte.

— Kristen — Alninaram disse dura — CORRA!!! — gritou a medida que sua própria energia adentrou o local, uma luz intensa que fez seres de luz surgirem em meio a ela  e logo os seres se espalharam ao redor de Alninaram como um exército pronto para defendê-la. Os seres não tinham rostos, eram pura luz, assim como as armas que portavam. Era como um exército pequeno, mas que portava consigo a grandeza de um milhão de outros mais. Na mão de Alninaram, uma espada de dois gumes flamejante em chamas pratas de materializou, surgindo de sua pele em fogo, parecendo logo se fundir as mãos negras da bruxa.

      Os demônios estavam por toda parte, grunhindo e os encarando com seus olhos em brasa, ansiosos por sangue, e a cada vez mais o portal aberto em chama verdes trazia consigo mais demônios, uns mais horrendos que outros, que grunhiam raivosos com seus olhares em sangue voltado para todos. Elizabeth fez surgir de suas mãos uma espada longa como uma lança, flamejante em uma chama verde, encarando Alninaram pronta para ataca-la.

       Novamente Kristen tapou seus olhos diante da energia, mas levantou-se tão rápido quanto pôde. Naquele instante o trovão soou tão alto que fez os ouvidos de Kristen doerem. Kristen sentiu o ar em seus pulmões pesarem, o coração pulsava tão forte em si que ela sentia que a qualquer momento o seu peito seria rasgado e seu órgão saltaria para fora.

    No entanto, ela não podia ceder. Os seres de luz estavam prontos para uma batalha, os demônios pesavam o ar com suas presenças grotescas, e Kristen sabia que dali por diante ela e todos ali estavam em perigo.

     No instante seguinte, o que até ali estava o mais calmo possível, tudo mudou, quando um grosso galho bateu nas paredes da mansão, rompendo-a como se rasgasse um simples papel, e adentrou o local sendo lançado ao chão. O galho veio velozmente na direção de Elena que estava inerte ao chão, sofrendo segurando a costela sem poder se defender. Kristen então sentiu seu corpo ser lançado para ali, para salvar sua irmã no mais puro instito de amor. Ela correu, e naquele mesmo momento o grito de Elizabeth anunciou o ataque a Alninaram. Quando as espadas delas se chocaram, uma onda de energia saiu dali tão forte que lançou o galho prestes a despencar sobre Elena para longe, o chocando com outra parede que rachou de pronto. Kristen que também fora lançada ao chão pela magia ergueu novamente sua cabeça, temerosa por ver um possível desastre, mas ao constatar que o galho não havia encostado em sua irmã, ela levantou-se como um flash, correndo de encontro ao corpo de Elena.

     Os demônios subiram pelas paredes, enquanto Alninaram e Elizabeth se erguerem do chão ardendo ambas em magias distintas, luz contra as trevas, esperança contra morte. A cada bater de duas espadas, o som emitido por elas era como vários trovões, faíscas em luz escapavam dali recaindo sobre todos abaixo. Os serem de luz entraram em conflito com os demônios, e naquele mesmo instante o terror tomou o local como nunca antes.

     Kristen se atirou sobre o corpo de sua irmã, desesperada para retirá-la dali.

— Elena — disse arfante com pressa enquanto o barulho das armas tomavam seus ouvidos em um grito de perigo — Pode levantar-se?

Elena gemeu, fazendo uma careta ao virar-se, ainda segurando a costela, e com voz vascilante, deixou suas palavras saírem juntamente com o sangue em seus lábios.

— Tem de ajudar... — ela tossiu deixando gotas de sangue respingar em sobre o rosto de Kristen — Viktor — completou com dificuldade.

    Elena contorceu-se no chão, e Kristen sentiu o peito doer com a cena. Ao fitar as gotículas vermelhas em sua roupa, quase sentiu o peito abrir-se em angústia, logo em seguida batendo tão forte a ponto de quase explodir. Ela tinha de ajudá-la de qualquer modo, tinha de ajudar todos ali. O vento entrava pelo buraco da parede rompida trazendo consigo folhas e pequenos galhos para dentro da mansão, assim como deixou que a chuva que até aquele momento estava somente lá fora, adentrasse a mansão e os banhassem nas lágrimas do céu negro lá fora.

     O som das espadas chocando-se só deixavam tudo ainda mais tenso, os demônios saltavam por todos os lugares, os seres de luz batalhavam e morriam rapidamente. O ar saiu dos pulmões de Kristen em uma lufada rápida, sendo seguida por várias outras a medida de que o desespero a tomava lentamente. Ela não podia ficar ali, ninguém poderia, nas para o de iria afinal? Rapidamente ela fitou o ambiente em busca de uma saída. Os demônios estavam por toda parte e cada vez mais novos surgiam. Ela tinha de fazer algo para tirar Elena e Viktor dali o mais rápido possível. Então em um flash a memória de Elliot veio a sua mente, novamente preocupando-lhe ao não avista-lo. Novamente seus olhos rodaram pelo lugar, um estrondo fez seu coração saltar ao que um golpe de magia cairá sobre o mármore, deixando-o sujo de negro. Kristen sentiu o apito do perigo novamente gritar em seus ouvidos em ondas sonoras alucinantes. Mas onde diabos estava Elliot? Ela olhou novamente ao redor, e ao encontrar o corpo inerte de seu irmão desacordado tão próximo de onde a magia havia sido lançada a pouco ela sentiu o peito novamente gelar.

— Elliot! — ela gritou seu nome em meio ao caos, em uma tentativa de acorda-lo, mas ele sequer deu sinais de que havia a ouvido — ELLIOT! — gritou com mais força, novamente sem êxito. O desesperou tomou o seu corpo ao recordar que Elena o havia feito adormecer, mas Deuses, o que faria sem a ajuda dele agora?

    Kristen estava desesperada, sentia o peso da situação e da segurança de Elliot, Elena e Viktor recaíram sobre suas costas, mas o que ela poderia fazer afinal? A cada minuto instante ela estava ficando sem tempo, mas sequer sabia como proceder.

       A voz de Elena soou baixa e falha, tossindo logo em seguida, mas chamando a atenção de Kristen para si. Elena se pôs sobre um de seus braços claramente depositando muito esforço em seu ato, mas Kristen a tomou em seus braços rapidamente, sentindo seu próprio corte protestar com o toque de suas peles.

    — Kristen  —  a voz de Elena oscilou, um tanto sufocada — Tem de ajudar Viktor — continuou com dificuldade, ainda com a mão sobre a costela quebrada — Só ele poderá deter Elizabeth.

— Mas como? — ela olhou para onde Viktor estava agonizando, cada vez mais consumido pelas veias negras. Logo em seguida uma chama de magia caiu ao chão próximo a eles com um estrondo alto que fez faíscas em brasa saltarem por todos lados. Kristen acolheu Elena em seu abraço na intenção de protegê-la enquanto seu coração saltou em temor por todos. A respiração dela novamente estava ofegante, pois a cada mínimo instante a situação só piorava e o caos se alastrava rapidamente. A chuva entrava pela parede rompida molhando todos com seu toque frio.

    Novamente a voz de Elena soou vascilante, mas fora o suficiente para Kristen olha-la novamente.

— Escute — disse em um sussurro vascilante — Elizabeth o odiou quando ele a deixou por Marie, mas ainda assim o amava o bastante para não mata-lo realmente. De fato pôs uma maldição terrível, mas ainda assim o manteve vivo por séculos. Há de haver algo por trás disso — ela novamente tossiu, os lábios pálidos, o sangue que a pouco escapara dali escorria por sua roupa lavado pela chuva, sua voz edava fraca, sua pele tão fria quanto um morto, mas via-de que Elena ainda era Elena — Toda maldição há uma brecha, até mesmo de magia negra, nós só temos de achar onde está essa brecha e usá-la ao nosso favor.

— Como saberei, minha irmã? — Kristen perguntou realmente angustiada, perdida na mais pura ignorância de não saber nada — Até pouco tempo eu sequer sabia da existência de qualquer magia.

— Preste atenção — disse baixo puxando o ar de modo dificultoso para os seus pulmões — O livro de magia há de deixar algo as claras. Há de haver alguma mensagem nele que nos ajude a encontrar esta brecha. Mas estamos ficando sem tempo, Viktor não pode morrer ou Elizabeth não poderá ser parada sequer por Alninaram. Tem de ajudá-lo de algum modo, ou estaremos todos setenciados a morte.

— O que devo fazer com o livro? — ela perguntou nervosa — ele é um livro de magia afinal, talvez somente uma bruxa possa decifra-lo.

— O livro de magia foi revelado quando você o encontrou. Você é a duplicata de Marie, ela é a chave da maldição.

— Ele foi revelado porque Elizabeth me guiou até ele. E se não funcionar desta vez? — disse realmente preocupada.

— É a nossa única chance de ajudar Viktor. Tem de funcionar. Ou pelo menos temos de tentar.

     Kristen recebeu as palavras de Elena como uma sentença. Querendo ou não ela estava sozinha e era seu dever proteger a todos mesmo que isso lhe custasse a sua vida. Kristen se viu encurralada, em um labirinto sem saída, uma sala de espelhos onde somente ela mesmo poderia ser vista.

     Kristen fitou Elena, fraca, pálida, totalmente dependente de si. Então deixou seus olhos recaíram sobre Elliot, adormecido, longe de todo o caos e por último Viktor, a chave do fim de tudo aquilo, mas tão indefeso quanto Elena, e ela tinha de ajudá-lo a qualquer custo.

— Minha irmã — a voz soou baixa — seja rápida, ou estará tudo perdido para todos nós.

— Tenho de tirá-la daqui — disse olhando ao redor procurando um lugar seguro.

— Não há tempo. Tem de me deixar se quiser ter alguma chance. Eu ficarei. Mas não preocupa-te, ferida ou não eu ainda sou uma bruxa.

      Novamente Kristen se viu encurralada. Embora discordasse e tentasse negar para si mesma, de fato ela estava cada vez mais sem tempo. Ela tinha de agir, e rápido.

— Eu voltarei, minha irmã, e lhe prometo que Viktor estará ao meu lado quando isso acontecer.

    Dito isto, Kristen deitou o corpo de Elena sobre o mármore branco, e depositou um beijo na testa molhada de Elena selando ali sua promessa. Ela não sabia se de fato voltaria, afinal Elizabeth ainda a queria morta, mas mesmo se perdesse sua vida, Viktor estaria de volta, a qualquer custo.

    Ela então levantou-se e de pronto sentiu um galho passar velozmente por si. A chuva havia banhando-a por inteiro, as gotas escorriam por seus olhos embaçando sua visão. Então Kristen decidiu sair dali o quanto antes. Ela então ousou correr como pôde em meio a todo o caos, os demônios lutavam com os seres de luz, a espada de Elizabeth e Alninaram sooavam como trovões e a todo instante as faíscas da luta descia sobre todos como uma chuva perigosa. Kristen sentia os pés baterem firmes contra o chão, mas suas pernas vascilavam a cada novo passo em direção a escadaria deixando explícito o medo que a corroía lentamente.

    Os demônios estavam por toda a parte e ligeiramente ela estava no meio da luta. A magia passava por si em grandes bolas de fogo, fatais se a tocassem, ela sabia. Ela correu desesperada, e neste mesmo instante o zunido de algo cortando o ar velozmente a fez entrar em alerta de pronto. Ela não teve muito tempo para pensar quando viu uma espada ardente em luz vir em sua direção, em uma velocidade alarmante pronta para cravar-se em seu corpo.

— Ahh — ela gritou, sendo guiada pelo impulso e defesa logo atirando-se ao chão como pôde. Quando seu corpo bateu contra o mármore, ela sentiu a energia da espada eriçar seus pêlos, tamanha fora a proximidade. Logo em seguida, um estrondo anunciou o pouso fatal da lâmina, que ficou fincada no chão a apenas alguns pouco centímetros de seu corpo. O ar saiu pesado como uma pedra. O seu peito estava dolorido, seu coração gritava em angústia e novamente ela estava atormentada pelo peso depositado em suas costas. Mesmo temendo e tremendo, ela pôs-se sobre os joelhos e começou a engatinhar sentindo o corte profundo em seu braço protestar com o peso depositado sobre ele.

     Ela sabia que perderia tempo movimentando-se daquela maneira, mas sabia que em pé chamaria muita atenção, e afinal Elizabeth ainda a queria morta, ela tinha de ser o mais invisível possível naquele momento. A chuva caía sobre a sua pele, os demônios lutavam e grunhiam, criando uma verdadeira atmosfera de terror.

    Ela sentia os pequenos galhos batendo contra sua pele, trazidos pelo forte vendo ali. Embora todos estivesse banhados, as velas não apagavam-se, como se a aura de luz em torno de suas chamas impedissem que a chuva as tocassem.

    Kristen engatinhava o mais rápido que podia, sentia os joelhos passarem sobre os ganhos e folhas no chão, e escorregava algumas vezes na água da chuva.

    Finalmente Kristen viu a poucos centímetros de si o primeiro degrau dos muitos que lhe levariam ao seu destino. Ela suspirou em alívio, e juntando o pouco de coragem que sentia aumentou como pôde sua velocidade, sempre olhando ao redor na cautela de não ser vista. Mas então, quando finalmente sentiu o tecido do tapete que cobria a escadaria na palma de sua mão, o seu coração congelou em seu peito e um longo arrepio passou por sua espinha como a ponta do dedo da própria morte a lhe acariciar. O ar saiu em uma nebulosa nuvem entre seus lábios quando a alguns metros os olhos reluzentes em sangue de um demônio encontraram com os seus. Ele estava parado, olhando-a com toda sua monstruosidade como se visse sua presa final.

    Kristen sentia o olhar dele penetrar sua alma, cobrindo-a de medo em toda sua negritude sombria. Seu peito pesou, ela se sentiu coberta por um peso invisível, enquanto apertava o tecido em suas mãos.

    Aos poucos, Kristen teve a impressão de que o demônio havia movimentado-se. Ela ficou em alerta, talvez fosse apenas uma impressão, mas quando ele deu um passou a frente ela soube ali que na verdade não era apenas uma impressão, para seu azar. Dali em diante ela soube que tudo só iria piorar. E piorou.

    Quando as patas negras e monstruosas do demônios aumentaram o passo, tornando-se logo em seguida em uma corrida, Kristen ergueu-se tão rápido quanto nunca antes, e correu escadaria acima sabendo que seu disfarce havia acabado.

      O demônio pulou sobre a parede, subindo por ela como uma aranha grande e negra, mantendo seus olhos sobre Kristen como um verdadeiro predador.

    Kristen subia os degraus tão rápido quanto podia, sabia que poderia cair, mas sabia que não podia cair. Ela correu, cada degrau a deixava mais perto, mas ainda assim parecia tão longe. No instante seguinte, os pés do demônio bateram forte contra a escada, anunciando seu pouso. Kristen parou de pronto, e soltou o ar em seus pulmões em uma lufada rápida vende-se diante do grande demônio.

— Deuses — ela soltou, quando o demônio alto lhe olhou devagar, logo cravando seus olhos sobre ela. Ela se sentiu pequena, tendo de erguer sua cabeça para fitar a imagem demoníaca em sua frente. Como impulso, ela recuou dois passos para trás, enquanto o demônio permaneceu parado, lhe olhando de forma diabólica com seus olhos escarlates. Logo um grunhido baixo vibrou na garganta do monstro, e aos poucos inúmeras presas pontiagudas e longas começaram a surgir em sua boca. Uma baba espessa passava por sua boca como cordas verdes, e logo o monstro soltou um rugido tão tenebroso que os trovões pareceram ficar em silêncio perto dele. Kristen sentiu o líquido espesso saltar em sua pele, e logo contorceu-se ao sentir sua pele queimar onde o líquido havia repousado.

    Ela respirou variadas vezes, soltando lufadas tão rápidas que não podia contar. Ela encarou o monstro atemorizada, totalmente temerosa de seu destino dali em diante. Ela continuou a recuar, quando o ser desceu um degrau, causando tanto barulho quanto seu próprio pouso a pouso.

— Viktor — disse baixo para si mesma, sentindo os olhos lacrimejar em seguida — me perdoe — continuou sentido a voz de perder em sua garganta — eu falhei.

    No instante seguinte o demônio saltou em sua direção, tão voraz quanto o demônio que era. Kristen jogou-se ao chão, do outro lado da escada, logo sentindo o corpo despencar sobre outros degraus abaixo, rolando pela escadaria. Quando parou, sentia seus braços doerem, e o corte novamente estava aberto, deixando seu sangue brotar dali novamente. Ao ver o líquido escarlate em seu braço, Kristen olhou rapidamente para o monstro na escada, que encarava seu sangue como um verdadeiro banquete. Ela estava perdida. Novamente o demônio saltou de onde estava, e novamente Kristen se pôs em pé o mais rápido que pôde, mas logo sentiu seu corpo ser atingido por grandes patas asquerosas, e seu corpo fora lançado, batendo contra o corrimão da escadaria.

— Ah  — ela gemeu, sentido seu corpo protestar aos seus movimentos. Sem tempo, ela olhou novamente em direção ao demônio que vinha lentamente em sua direção — Deuses, é o fim.

     Ela quis levantar-se rapidamente, mas não havia tempo e quando notou o demônio estava bem a alguns poucos passos de si, com longas presas e olhos sangrentos, deixando o líquido verde escapar de sua boca e queimar o tapete vinho abaixo.

     Como um predador que cerca sua presa, o demônio ia em sua direção devagar, como se admirasse o cardápio antes de devora-lo. Ela sentia o coração bater a ponto de querer falhar, sua respiração tão descompassada quanto seus próprios batimentos, e o sangue fresco descendo de seu braço, logo escorrendo entre seus dedos.

    Aos poucos ele chegava mais perto trazendo consigo sua atmosfera de terror. As lágrimas nos olhos de Kristen já não podiam ser contidas, a aceitação de seu fim já estava em processo, mas o que mais lhe doía era o peso de sua falha para com todos.

     Finalmente o demônio estava em sua frente, grunhindo em sua direção setenciando sua morte. Ela respirou fundo sentindo pela última vez o ar em seus pulmões e fechou os olhos em seguida, deixando a lágrima escorrer por sua face. Em sua mente ela viu Elliot, sorridente com os olhos de mel voltados para si. Ao lado dele lá estava Elena, tão bela e delicada sorrindo enquanto lhe ameaçava com uma caneca de café inclinada em sua direção. E por último Viktor, a figura negra na taverna, o olhar amarelo sem vida, e a aberração mais doce que já vira. A valsa materializava-se em sua frente, seus pés flutuando, o sorriso no rosto, o olhar de Viktor sobre si enquanto ambos dançavam sobre as nuvens sob os olhos lacrimosos do anjo na fonte. Ela quis sorrir, e talvez tenha até o feito, quando sentiu algo adentrar seu corpo como uma lâmina, atravessando-a como um papel.

    Mas não fora seu fim. Mesmo tendo a sensação de ter sido atravessada por algo, ela abriu os olhos instantaneamente, e encarou o demônio a sua frente, tão feroz quanto antes, com os mesmos olhos em chamas vermelhas, as mesmas presas grandes em uma boca aberta em sua direção, mas ele estava imóvel. Kristen sentiu o peito desenfrear-se, a mente estava tão confusa quanto nunca antes, então ela viu na barriga do ser sombrio uma longa espada flamejante em prata o atravessar, e também a atravessa-la.

    Ela fitou em si a lâmina dentro de sua pele, atravessada em si mas...

— Como é possível? — indagou a si mesma ao constatar que a lâmina que atravessava seu corpo não havia feriado-a de qualquer modo. Mas logo o demônio em sua frente se desfez em uma fumaça negra, dissipando-se no ar como fumaça. Ela franziu o cenho,e sentiu quando o ser ardente em luz puxou a lâmina que cortava seu corpo até retirá-la por inteiro, e mesmo assim, tanto o corpo quanto a roupa de Kristen estavam intactos.

    Ela fitou o ser de luz sem entender. O ser em sua frente ergueu uma mão em sua direção, e por instinto ela o temeu, mas logo sentiu o toque suave sobre o corte aberto no braço e logo, lentamente, o ferimento ia fechando-se sem qualquer dor. Kristen fitou o ser sem rosto sem saber o porquê ele estava lhe ajudando, e logo quando a mão em luz daquela criatura afastou-se novamente de si, uma voz doce veio em sua direção.

— Vá menina, e cumpra o seu destino. 

    Dito isso, o ser saiu dali, voou voltando para o caos, logo encontrando sua espada contra um demônio, reiniciando sua luta contra o mal. Naquele momento, Kristen sentiu que não havia mais tempo a perder, e o medo teria de ser posto a escabelo se quisesse ter alguma chance. Novamente erguendo-se, ela correu novamente os degraus, e finalmente estava no topo da escada.

     Ela não perdeu tempo, e correu em direção ao corredor que lhe guiaria a seu destino. Ao chegar lá, sentia as paredes vibrarem a cada estrondo vindo do grande salão, o chão sob seus pés pareciam estremecer. Ela então correu no corredor, temorosa e apressada, mas a alguns pouco metros um barulho chamou sua atenção.

     Ela parou, olhou alarmada ao redor temendo por mais um demônio a sua espreita. Novamente o barulho soou, como se algo ou alguém mexesse em algo, mas desta vez o barulho havia vindo de outra direção.

— Alguém está aqui — constatou consigo mesma, novamente sentindo a respiração perder o compasso. 

    Então um arrepio passou por sua espinha, e com uma lufada de ar próxima a seu ouvido, ela ouviu aquela voz, a mesma que a visitara em seus aposentos, a mesma da mulher mágica que a tempos havia lhe visitado. Ela estava lá novamente, a sua procura.

— Você — Kristen disse reconhecendo-a de pronto, sentindo espanto.

— Necessito de tua ajuda.

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5569 palavras.

Olá, Olá Jubinhas do meu ❤❤
Aceitam um calmante? Ksks

Finalmente temos mais um capítulo de MI, e ele é todo de vocês ❤❤ Agradeço o apoio de todas que lêem, votam e comentam, é por causa de vocês que temos esse capítulo e todos os outros que virão ❤ Muito obrigada, de coração. Também agradeço a todos os novos leitores que estão fazendo as visualizações de MI crescerem tão rápido, sério, vocês são demais ❤❤

Mas voltando ao capítulo, me contem tudo! Quem é de fato Alninaram? Como ela conhece nossa vilã? O que será de Viktor? E Elena? Deuses, surtem comigo ou não aguentarei sozinha. E a mulher mágica, por que há de ter voltado? Por que precisa da ajuda de Kristen?

Quero as suas teorias de vocês, contem, contem, contem!!

Será que mereço uma estrelinha sua? ⭐

Aguardo manifestações 🎉🎉

Até logo ❤❤
    

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