Capítulo XXXV - O retorno de Elizabeth (parte II)
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No capítulo anterior...
"Viktor sentiu o corpo ser arremessado por um impulso que mais parecia uma parede de pedras batendo contra seu corpo".
[...]
"No momento seguinte, acompanhado de um trovão furioso que sugou a atenção de todos ali, uma fumaça verde começou a invadir o local pela porta negra e todas as vidraças quebradas".
[...]
"Ele arregalou os olhos e virou-se atordoado com a ação dela, entretanto, recuou diversos passos a encontrar Elizabeth a sorrir sombriamente iluminada pelas chamas verdes oscilantes".
[...]
" — Sentiu minha falta, Vik? — ao pronunciar seu apelido, ela usou um tom irônico e um sorriso no canto dos lábios. — E você, minha irmã?"
[...]
"— Eu a repudio, Elizabeth — Viktor falou de repente, seu tom era seco — Eu sinto nojo de você e se eu soubesse o monstro que tornaria-se, jamais haveria olhado para você".
[...]
"— Tão inocente — riu novamente — Tão cego! — seu semblante tornou-se sério outra vez — Acredita mesmo que Marie o amava? Estava tão bêbado com o doce veneno dela que não viu sua verdadeira face?"
[...]
"— Marie o traía. Ela tinha uma família, filho, esposo, casa. Ela era casada, Viktor, você era só amante dela.
— Está mentindo! — vociferou.
— Não — ela o fitou — Nunca menti para você".
[...]
"— Conte para eles, Lena. Diga quem é o filho de Marie (...)
— Conheça agora o filho de Marie. Elliot Nicolae".
***
O vento lá fora pareceu chicotear mais forte. A chuva caía contínua, os trovões eram tambores tocados pela noite sombria que havia se formando lá fora. O céu estava tomado de trevas, os raios rasgavam o céu como um açoite rasgando a pele de um escravo. Mas, ao fim da frase de Elizabeth, o estrondo daquelas palavras foram mais ensurdecedoras que qualquer trovão.
O baque fora geral. Parecia que um castelo inteiro havia caído sobre suas cabeças e a sua queda havia sido ensurdecedora. Kristen arregalou os olhos, Elena abaixou a cabeça totalmente em silêncio, Viktor deixou a boca entreabrir atônito e Elliot fitou o rosto de todos totalmente perdido e atordoado.
— O que está acontecendo Elena? — ele perguntou inquieto — Do que esta mulher está falando? — Elena lhe fitou sentindo-se tensa.
— Elliot, eu...
— Do que ela está falando Elena?! — repetiu mais inquieto.
Elena deixou um suspiro pesado escapar entre seus lábios. Ela engoliu em seco olhando para Elliot e logo em seguida para Viktor, que estava mudo, os lábios entreabertos e os olhos a marejarem lentamente. Ela suspirou pesado abaixando a cabeça sentindo o peso do fardo que acabara de recair sobre Elliot, e principalmente Viktor. Ela então sentiu-se vencida e obrigada a falar toda a verdade. Ela hesitou, algumas vezes abriu a boca, mas não emitia qualquer som. Por fim, com o peso do olhar de Elliot sobre si, se sentiu obrigada a falar ou sufocaria diante daquele olhar.
— Meu irmão tu... — ela sentiu as palavras se perderem na garganta. Ela entreabriu a boca algumas vezes, sentia a boca seca, mas engolindo em seco, buscou coragem para continuar — Quando Marie e Nicolae morreram, tu fostes dado em adoção — começou a dizer tensa — Pouco tempo depois, quando retornei a cidade, resolvi visitar o orfanato para saber o que havia acontecido contigo — um sorriso saudoso pintou o canto de seus lábios — Tu eras encantador. Tão pequeno, doce e inocente em meus braços com aqueles olhos em mel a me olhar... Acabei por visitá-lo mais vezes e, por consequência, apeguei-me a ti. Então resolvi adota-lo. Cuidei de você ainda bebê e quando completaste um ano de vida, usei de magia para atrasar o teu crescimento e assim não causar desconfianças quanto a minha natureza uma vez que eu nunca envelhecia. Muitos anos depois, quando encontrei Marina sozinha, viúva e estéril, entreguei-te para ela o criasse e o assumisse como mãe adotiva, sempre sob meu olhar, claro. Pouco tempo depois, quando soube da duplicata, fiz o mesmo e então retirei a magia para atrasar teu crescimento deixando que crescesse junto a Kristen como irmãos.
Kristen estava boquiaberta. Elliot era o filho de Marie? Elliot fitou Kristen tão perdido quanto antes. O que estava acontecendo? Somente naquele olhar que lhe fora lançado, Kristen soube o quanto ele precisava de um abraço seu, como sempre fizera desde crianças.
Viktor estava mudo. Era como se sua voz fosse tomada si pelo golpe de uma espada a rasgar sua garganta. Tudo em sua frente era como uma miragem, irreal demais para acreditar, doloroso demais para aceitar. O filho de Marie estava em sua frente. O filho da mulher que fora a dona de sua alma e que o enganara e esmagara seu peito como um inseto. Fita-lo lhe causava um desconforto, quase uma raiva por ser quem era. O filho de Marie. A junção das características dela junto a de seu esposo do qual nada soubera até então. Ele sentiu-se fadigado. Os olhos ardiam, mas ele se sentia tão vazio que era como não ter mais lágrimas para chorar. Elas estavam presas na prisão dolorosa em seu peito. Ele sentia que se as deixasse cair elas queimariam sua pele como ácido puro rasgando-o, queimando suas entranhas, dilacerando sua alma. Ele fitou um ponto qualquer tentando fugir da dor angustiante em seu peito, mas sentia, infelizmente, que nem uma vida inteira a arrancaria. Ela sempre estaria ali, presente, acesa, e todas as vezes que olhasse para Kristen ou para aquele homem lembraria da dor e as brasas quietas arderiam em uma fogueira mortal o queimando novamente. Novamente sentiu-se vazio, sem poupa, como no começo quando seu maior vazio era a ausência de Marie. Mas desta vez era pior, o motivo continuava sendo Marie, mas agora ela parecia sombria, falsa, irreal como uma fachada vazia igual seu amor por ele. Estava destruído.
Elliot, ainda perdido, procurou o olhar de Kristen como sempre fazia quando pensava e então, como se um clarão o atingisse, ele voltou seu olhar para Elizabeth que fitava as próprias unhas totalmente neutra e seu rosto foi tomado por uma raiva logo explícita em sua voz.
— Você matou a minha mãe — sua voz cortou o ambiente como uma faca. Elizabeth o olhou totalmente neutra.
— Viktor a matou, querido — disse olhando novamente para Viktor que tinha os olhos pesados, o semblante destruído. Ela então sorriu olhando novamente para Elliot.
— Eu não a matei — Viktor disse com a voz carregada, não gritava pois se sentia demasiado abalado como se carregasse um castelo em suas costas — Eu não a matei — reafirmou por fim sentindo os olhos arderem novamente enquanto a doce imagem que conservara com tanto afinco de sua amada esvaia-se lentamente como papel ao fogo.
Elliot olhou para Elizabeth e então sentiu o maxilar travar enquanto seu punho fechava-se com força.
— Tu arrancaste de mim a chance de ter uma família, um pai e uma mãe... Tu roubaste minha vida de mim! Tu a mataste! — gritou por fim apontando acusador para ela arfando em raiva.
Elizabeth que sorria, deixou o sorriso murchar lentamente em seus lábios enquanto erguia a cabeça com o olhar intenso. Elena entrou em alerta, ficando logo em seguida aflita com o que pudesse acontecer.
— Sua vadia — ele disse desdenhoso fazendo movimentos negativos com a cabeça em reprovação — É, você é uma vadia invejosa que não suporta ser rejeitada — disse em tom desdenhoso logo em seguida cuspindo no chão.
— Lena — a voz de Elizabeth soou sombria — sugiro que controle sua criança ou ela pode se machucar. Você sabe, nunca tive paciência para infantilidades.
— Elliot, por favor, pare — Elena interveio apaziguadora e temerosa. Elliot estava saindo do controle, ela não poderia permitir que Elizabeth fizesse nada com ele, não podia — Mantenha o controle, meu querido, eu lhe peço.
— É uma puta desgraçada que terei prazer em matar! — disse com o peito subindo e descendo freneticamente de punhos fechados. Antes que Elena pudesse fazer qualquer coisa Elliot correu e agarrou de forma rápida a espada que havia sido arrancada de si arfando de raiva partindo para um ataque certamente fracassado. Ele investiu contra Elizabeth, que desviou como se não fizesse nada. Não se deixando frustar, novamente ele investiu contra ela que não recuou. A espada dele fora de encontro a ela, que ergueu a mão parando a arma entre sua palma. Elliot puxou a espada, na tentativa de feri-la, no entanto sequer conseguiu mover a arma dali. Ele a olhou prevendo um desastre e então Elizabeth sorriu e puxou a arma com força, fazendo com que o cabo da espada machucasse a palma de Elliot, que soltou diante da dor. Invertendo a situação, Elizabeth segurou o cabo, empunhando a espada agora em seu poder. Elliot deu dois passos para trás, segurando a mão que doía, e olhou em alerta para Elizabeth, que olhava a espada como uma peça de ouro. Elena correu de onde estava tomando a frente de Elliot totalmente aflita, sentindo o coração machucar o seu peito diante de seus batimentos fortes e descompassados.
— Não irá machuca-lo, Elizabeth — disse com o peito a subir freneticamente temendo pelo que sua irmã poderia fazer com Elliot.
— Me dê um bom motivo, Lena — ela disse passando os dedos na lâmina, com um sorriso maldoso em seus lábios — Por favor, não me diga que é porque tu estás em minha frente.
— Elena, saia — Elliot disse tentando afasta-la com a mão em sua barriga, mas ela agarrou a mão dele impedido o seu gesto.
— Fique fora disto, Elliot — falou firme — Eu sei que está doído por Marie, mas já causou problemas demais por hoje.
Elliot recebeu as palavras dela como um soco, se sentiu uma criança a levar uma bronca, mas ele não era criança. Ele sabia que Elena queria protegê-lo, mas aquilo não era um assunto dela, mas sim dele, pois jamais conheceria sua verdadeira mãe por causa daquela mulher. Travando a mandíbula ele resolveu tomar seu lugar de homem, e disse firme.
— Então EU irei resolvê-los, Elena — novamente ele colocou a mão na barriga de Elena, afastando-a e retomando a frente que era sua por direito e ações. No entanto Elena segurou o pulso dele, falando entre os dentes.
— O que pensa que está fazendo? — ele olhou firme — Está agindo como uma criança!
— Pelo contrário, estou agindo como o homem que sou.
— Elliot — Kristen o chamou, na tentativa que ele lhe ouvisse e parasse com aquilo. Não poderia jamais aceitar que seu irmão se machucasse por um ato de imprudência. — Elliot, escute-me.
Ele ergueu a cabeça fitando-a, todavia não sentia vontade de ouvi-la pois sabia que ela tentaria para-lo, assim como Elena. Ainda assim, resolveu ouvi-la, por respeita-la e ama-la demais.
— Eu sei como é perder os pais — a voz dela vacilou, diante de uma memória vazia, de uma morte armada por aquela mulher — fomos vítimas da mesma dor e acredite, eu também sinto ânsia de vingança — ela olhou para Elizabeth, que ouvia tudo revirando os olhos, como se ouvisse uma série de palavras tolas — E a vingança será nossa um dia. Mas não hoje — disse realmente frustradas com suas próprias palavras principalmente por todas elas serem verdadeiras — Não faça nenhuma besteira, olhos de mel, Elena e eu ainda precisamos de você.
Ao fim das palavras de Kristen, Elliot ponderou as palavras dela logo deixando os olhos recairem sobre o largo e fundo corte no braço de Kristen ainda com o sangue fresco. Ele então engoliu em seco, desviando os olhos dali sentindo o punho fechar. De certo modo ela tinha razão, elas precisavam dele e ele não negaria ajuda a elas, mesmo sabendo que Kristen jamais o amaria como ele a amava.
Diante da situação, Viktor sentia-se cada vez mais cansado. A situação em sua frente era como uma pintura vazia, algo destorcido e distante. Os trovões e a chuva estavam longe, em uma realidade dolorosa que ele não queria mais visitar. Ele mesmo sentia-se vazio, não tinha ações, estava inerte na sua dor. Tudo que se passava por sua cabeça era a traição de Marie, a mulher que passara anos amando, mas que sequer existira. Ele sentia que não importava a pintura que o quadro distorcido a sua frente lhe mostrasse, ele estava morto e inútil para pintar outra imagem. Finalmente Elizabeth tinha conseguido mata-lo da forma mais cruel e dolorosa possível.
Encarando Elizabeth, Elliot travou o maxilar e tomou sua própria decisão.
— Eu as amo — disse por fim. De forma veloz ele virou-se empurrando Elena com força, forçando a queda dela ao chão. Kristen gritou o nome dele, mas ele não cedeu, e de forma rápida avançou em direção a Elizabeth.
Kristen viu tudo ficar lento depois que seu chamado se perdeu no ar. O seu coração saltou no peito, acompanhando o ato de seu braço que entrou entre as grades sendo impedido de continuar pelas grades de magia ao seu redor. Elena levantou-se de forma ágil para dete-lo. Viktor, que estava totalmente fora de seu corpo recobrou consciência, vendo um desastre se materializar em sua frente. Elena correu em direção a Elliot para dete-lo. Elizabeth empunhou sua espada pronta para ataca-lo, então, quando a lâmina da espada cortou o ar, Elena parou paralisada deixando o grito desesperado escapar de sua garganta, Kristen gritou com igual desespero, deixando uma lágrima descer por sua face, e Viktor sentiu a lâmina atravessar seu ombro logo ficando fincada ali quando Elizabeth a soltou.
— Viktor — Kristen gritou vendo-o ferido, enquanto Elizabeth o olhava dura e Elena puxava Elliot para trás.
Viktor fitou a espada em seu ombro, logo posicionado seus dedos no cabo, puxando lentamente a lâmina de dentro de si. Kristen tapou a boca, sentindo-se aliviada por Elliot, mas ainda assim aflita por Viktor. Quando a lâmina saiu de dentro de si, ele fitou a arma com desgosto de repúdio de si mesmo ao ver o seu sangue negro pintar a lâmina.
— Como consegue ser tão estraga prazeres? — Elizabeth disse frustrada revirando os olhos para o ato de Viktor ao tomar a frente de Elliot dando as costas para eles parecendo realmente frustrada.
Viktor fitou a arma em sua mão, largando-a ao chão em seguida. Elena correu ao encontro dele, logo pondo a mão sobre o ombro aberto de Viktor.
— Viktor — ela disse olhando para o corte.
— Não se preocupe, — ele disse retirando devagar a mão dela dali — eu já estou morto — finalizou com tom fúnebre.
Elena recebeu aquelas palavras com uma fisgada em seu coração e abaixou o rosto constatando que Viktor estava de fato destruído.
Elliot, no entanto, estava fora de si, e aproveitando-se daquele momento, agarrou rapidamente a espada no chão em uma nova tentativa de ataque a Elizabeth, mas desta vez Elena fora mais rápida, e ao entrar na frente dele agarrou a mão que empunhava a espada e soprou em seu rosto fazendo com que sua magia saísse em forma de uma poeira brilhante que adentrou suas narinas como um calmante. Logo ela sentiu o corpo dele perder a sustentação, caindo lentamente em um sono tranquilo. Ele largou a espada ao chão, despencando sobre as pernas em seguida. Elena ajoelhou-se a tempo recebendo o corpo mole dele em seu peito, enquanto os olhos dele fechavam-se em um sono tranquilo.
— É melhor assim, meu querido — ela respondeu por fim quando o rosto dele já estava sereno em um sono profundo e sem sonhos.
— Bem, agora que as apresentações formais já foram feitas, Viktor já conheceu o passado de amor falso de Marie, conhece seu entiado, e minha querida irmã finalmente contou a verdade para todos, que tal nossa querida duplicata juntar-se a nós? — Elizabeth olhou para cima sorrindo cínica — Não quer juntar-se a nós, Kristen? — ela voltou a olhar para Viktor — Tenho certeza que Viktor ficará muito feliz com sua presença uma vez que parece tão cansado — completou em sarcasmo.
— Deixe-a em paz. Tu não cansas de destruir todos ao seu redor? — Viktor disse sentido o repúdio e raiva toma-lo.
— Todos não querido — sorriu cínica — apenas você — em seguida ela olhou para cima onde Kristen encontrava-se — Chegou a hora de juntar-se a festa, querida duplicata.
Kristen afastou-se lentamente das grades de magia enquanto sua respiração acelerava perigosamente. Seu braço carregava um corte novo com um aspecto nada saudável, o sangue começava a secar e ela tentou ignorar as fisgadas.
Elizabeth sorriu de lado em um tom sombrio e debochado, Viktor ficou alarmado assim como Elena. Ela então ergueu sua mão posicionando seus dedos como um prenúncio de um estalo de dedos. Viktor deu um passo a frente sentindo a aflição causada por aquele pequeno gesto, mas ainda assim, desastroso se finalizado.
— Elizabeth, por favor, não faça isso — a mão de Viktor estava espalmada em um sinal apaziguador tentando evitar um possível desastre — Pelo pouco de consideração que ainda há por mim, eu lhe peço que não a machuque.
O sorriso de Elizabeth se tornou amargo assim como o tom que usou para responde-lo.
— Aí é que está, Viktor — seu olhar amargava — Não restou nada que eu sinta por você se não a sede de vingança por tudo que me fez. Não há nada em meu peito se não a ânsia de vê-lo sofrer como um inseto em chamas.
— Beth — ela fez uma careta com o apelido de outrora — tu já vigaste-se de Marie e de mim, matando ambos, mas ela não tem nada com o que vivemos ou com o que aconteceu. Ela não é a Marie, não a machuque tão injustamente.
— Tens razão — ela disse — ela não é Marie — Viktor quis sentir alívio, todavia, sabia quem era Elizabeth — Mas sabe o que vejo quando olho para ela? — ela ergueu o rosto para onde Kristen estava, trêmula, ansiosa, temerosa — Eu vejo Marie sorrindo, Marie chorando, Marie o atraindo, Marie o beijando, Marie, Marie, Marie! — terminou com um grito olhando para ele. A luz verde das chamas refletia em seus olhos outrora caramelo, agora, tão negros quanto um poço fundo cujo fundo ninguém jamais vira.
— É aquela vagabunda traidora que eu vejo todas as vezes que olho para ela — gritou apontando para o lado embora Kristen não estivesse ali — Era Marie que vi quando os vi ceiando outrora, quando você a presenteou com um colar de brilhantes! — ela respirou algumas vezes deixando um sorrisinho no canto dos lábios surgir — Espero que meu presentinho tenha deixado marcas.
— O corvo... — ele disse recordando-se do desenho de magia negra formado pelo sangue do animal que encontrara naquela ocasião.
— Sim, fora eu. Assim como também fora eu que a levara a biblioteca, ao meu livro preferido, especificamente.
— Livro? — Elena perguntou perdida.
— Viktor não contou? — Elizabeth perguntou fingindo falsa inocência. Deuses, quantas faces aquela mulher possuía? — Ora, sim, um livro. Um livro que dei de presente para meu amado contando nossa linda história romântica para que nunca esquecesse o quanto o amor doce e inocente, pode se tornar amargo e perigoso.
— Viktor, eu... — Elena disse penosa com a situação. Ela bem sabia o mal que Elizabeth poderia causar a alguém, ela mesma fora vítima de uma de suas maldades. Todavia, Viktor erguera a mão espalmada em um claro sinal que ela parasse. Ele estava rígido, sua mandíbula travada e olhava para aquela mulher de forma vazia. Já não lhe restara nada, a irmã de outrora estava morta e sua lembrança manchada de sangue. Ele continuou frio.
— E o que ganhara com isso? O que pretendia a levando para lá?
— Imaginei que fosse fazer essa pergunta. Pois bem, acredites ou não, ainda restou um pinguinho de bondade em mim. Quando a vi no jantar, tratei de lhe dar um aviso. Mas ela é muito teimosa, ou burra, ainda não sei bem, e não afastou-se de ti como imaginei que faria. Benevolente, pensei que levando ela ao livro e sabendo o que fizeste com Marie ela fugiria, se sentiria acuada e sequer o ouviria, mas novamente ela se mostrou insistente — ela respirou fundo — Enfim, bondade também se esgota e já que meus avisos não foram o bastante, resolvi vir pessoalmente para deixar mais claro. Mas infelizmente não serei tão sútil desta vez.
De repente, flashes rápidos inundaram a cabeça de Kristen, uma memória vaga da primeira vez que pisara na biblioteca e depois, quando Viktor lhe chamou, uma grande escuridão como um sono, um apagão em sua mente. Ela piscou os olhos algumas vezes com o cenho franzido e uma mão na têmpora. Fora aquela mulher, agora estava claro por quê não recordava-se. Fora tudo um plano para afasta-la de Viktor. Deuses, a quanto tempo ela os espreitava? Todavia, embora confusa, a voz de Viktor lhe chamara de volta para a terrível realidade que havia se materializado em sua frente.
— Eu não fiz nada com Marie — disse ele amargo — Tu forçaste-me a mata-la! — terminou exaltando-se — Obrigaste-me a vê-la morrer em meus braços, a vê-la padecer sob meu toque! — os olhos deles ardiam novamente cheios, mas nenhuma lágrima ousara sair. No peito, o coração comprimia-se com as lembranças dolorosas que invadiam sua mente pincelando em sua memória as piores cenas de sua existência — Tu matas-te-a e me matou junto a ela — terminou amargo.
Elizabeth lhe fitava com o rosto contorcido em uma careta enquanto fazia movimentos negativos com a cabeça.
— Mesmo sabendo de toda a verdade sobre ela, mesmo sabendo de tudo que ela fez, tu ainda a defendes! — terminou amarga — Mesmo sabendo de tudo, ainda abres a boca para culpar-me por ter te livrado de uma vagabunda!
— Marie me enganou sim — ele começou, voz amarga, olhos cheios e olhar duro — me usou, mentiu, fingiu me amar. Ela me traiu, de fato, mas a pior traição fora a tua! Marie pode ter me enganado, me despedaçado, mas eu a conheci em um baile, já era um homem, e tu, que conheci desde minha infância, a considerava uma irmã, traiste-me, amaldiçoas-te como se não me conhecesse, como se não fóssemos nada!
— Tudo que fiz foi por ama-lo demais — disse deixando uma lágrima descer em seu rosto — Fiz por ter sido rejeitada quando tanto amor transbordava de mim! Tu não me vias, não me enxergava, não via o quanto eu o amava, e todas as vezes em que eu a via com ela tu me dilacerava, arrancava de mim qualquer resquício de humanidade que pudesse existir — ela fungou passando o dorso de sua mão no nariz — Mas agora não importa mais. É tarde para lamentar o passado. Agora, só me resta traçar um novo futuro para nós dois, meu amado — ela limpou rapidamente a lágrima aquele descia fungando pela última vez antes de sorrir macabra — Me desculpe por faze-la esperar, querida duplicata. Agora sim, pode juntar-se a nós.
— Elizabeth, por favor, deixe-a fora disto — Elena intercedeu aflita sentindo que algo ruim aconteceria. Ela colocou o corpo adormecido de Elliot em um lugar seguro antes de juntar-se a Viktor sentindo algo ruim por vir.
— Um estalo de meus dedos e ela morre — Elizabeth disse erguendo a mão em um ensaio de um estalo que fora seguido de uma risada. Viktor e Elena entraram em alarme — Mas não sou tão ruim assim, meus queridos, é claro que a ajudarei a descer — um sorriso maligno pintou seus lábios.
Ela então revirou os olhos fazendo com que uma negritude sombria tomasse conta dali enquanto proferia palavras de feitiço e uma fumaça verde começou a emanar de sua pele.
Viktor avançou em sua direção, pronto para para-la, mas uma onda forte o afastou dali, fazendo com que pusesse o braço na altura dos olhos.
Kristen sentiu o peito se comprimir e a adrenalina tomar seu corpo como sangue em suas veias. Viktor estava preparado para interceder novamente, Elena sentia a magia se agitar em sinal de defesa. Mas então, com um suspiro profundo, uma fumaça verde ainda mais densa saiu da boca de Elizabeth e logo tomou novamente o ambiente e os sussurros sombrios de outrora voltaram com ele.
Mas desta vez era mais que uma fumaça sem forma, era mais como um ser invisível que se escondia entre ela, sussurrando, sobrevoando e falando palavras estranhas com uma voz macabra.
— Conheçam os meus filhos — Elizabeth disse com voz sombria e sorriso orgulhoso.
As sombras verdes sobrevoaram todos, por onde passavam a luz nas velas oscilavam, os sussurros saíam de todos os locais, palavras incompreensíveis, tom macabro, e então, subitamente, a porta de carvalho negro ainda aberta bateu com toda força fechando-se e encurralando-os ali dentro. Kristen pulou de susto e caiu sobre o chão de sua prisão, Viktor olhou alarmado para o local e Elena ofegou com o barulho súbito.
Aqueles seres sombrios subiram, aproximando-se rapidamente de onde Kristen estava e logo ela viu-se cercada. Ela arrastou-se no chão de sua jaula assustada recuando dali, todavia, novos sussurros apareceram atrás de si, em sua frente, nos lados, eles estavam por toda parte rindo, falando e a arrepiando. Novamente ela recuou, ficou no meio de sua jaula vendo-se sem saída. O coração estava disparado, sua respiração ofegante e seu peito subia freneticamente. Ela estava apavorada.
— Teneat eam* — a voz de Elizabeth fez eco no local. Todos olharam para cima, e logo, em um rápido instante, a jaula se desfez e Kristen sentiu os pés perderem, literalmente, o chão. Ela gritou prevendo sua queda, todavia, as sombras lhe seguraram pelos braços. O toque era frio como um morto, próximo a seus ouvidos ela ouvia grunhidos que eriçavam seus pêlos dando a impressão que até seus cabelos se erguiam e por um instante ela ponderou que talvez fosse melhor sua queda.
— A magia negra carrega muitos dons que nenhuma bruxa branca jamais saberá como exerce-las. Esses belos seres são um deles. Tão belos, não acham? Não imaginam o poder que possuem.
— Elizabeth, não — Elena interveio — Poupe-a de algo que ela não tem culpa, por favor.
— Tendo culpa ou não, Elena, ela é quem é. Não importa se é Marie ou não, sendo duplicata ela deve morrer.
Novamente uma ventania ainda mais forte adentrou o local, mesmo com a porta principal fechada, enquanto Elizabeth falava palavras estranhas em uma língua que sequer Elena saberia dizer qual era.
— Impeça-a Elena — Viktor pediu realmente preocupado.
— Eu não posso, há uma parede de energia a protegendo, eu precisaria da magia de mais uma bruxa para rompe-la.
Logo, uma nova fumaça negra emanou do corpo de Elizabeth subindo até as outras sombras. Todavia, ela não estavam indo de fato para as sombras, mas sim para Kristen.
Ao constatar a aproximação, Kristen agitou-se, seus pés mexiam-se inquietos, o seu braço doía com as puxadas que dava até que novamente o corte abriu deixando o sangue descer por ele e precipitar-se no ar. Ela continuou lutando, tentando em vão soltar-se enquanto o ser negro chegava cada vez mais perto. A sombra dançou no ar como se fizesse alguma forma de cerimônia, e então, subitamente subiu e tomou seu corpo. Ela sentiu algo frio como se entrasse em um rio gelado, e então não sentiu mais nada. Seu corpo adormeceu e ficou totalmente sob o controle daquele ser.
Viktor, inquieto, deu um passo para frente chamando Kristen em seguida, todavia, não obteve qualquer resposta.
Quando o corpo dela estava novamente desperto, ela sentiu como se estivesse em algum lugar, apertada contra uma parede enquanto algo tomava seu lugar. Seu corpo agora não era seu, ela não tinha controle, havia algo ou alguém em seu lugar e ela estava em uma masmorra escura, pressionada contra a parede gelada algemada na mesma. Era frio, úmido e sombrio, sem brechas, sem ar. Ela estava sufocada, queria gritar, sequer sua voz pertencia-lhe mais. Seu corpo estava tomado.
Elizabeth maneou rapidamente sua cabeça em uma ordem silenciosa dirigida às sombras que de pronto obedeceram levando o corpo imóvel de Kristen de volta ao chão, ao lado de Elizabeth.
Uma vez novamente em solo, Viktor sentiu o apito agudo do perigo gritar em seus ouvidos, Elena estava ofegante de olhos atentos e Elizabeth sorria cínica.
— Quando mataste Marie, meu amor, — ela fez questão de frisar que ele a havia matado olhando diretamente para Viktor que travou a mandíbula de pronto — eu pensei que jamais veria aquele rosto novamente.
Ela saiu de onde estava cercando Kristen lentamente, mão pra trás enquanto seus olhos percorriam todo o corpo dela como se observasse uma mercadoria.
— Achei que havia me livrado daqueles cabelos ruivos, — ela deslizou os dedos nos fios de Kristen que estava totalmente imóvel, sem emoções, totalmente vazia — daquele sorriso, daquele rosto — ela parou frente a Kristen erguendo uma de suas mãos tocando a pele da mais nova maneando sua cabeça algumas vezes como se apreciasse alguma pintura. Ela deslizou seus dedos por sobre a pele pérola da outra — Ela não é linda, Viktor?
A pergunta dela deixou Viktor ainda mais rígido. Ela estava jogando, estava o maltratando e embora ele quisesse ir para cima dela, acabar com sua vida de uma vez por todas, qualquer movimento seu poderia acarretar em um desastre, ela poderia machucar Kristen e tudo que ele mais queria era tirá-la dali, do domínio daquela mulher.
Elizabeth riu consigo mesmo.
— Mas é claro que acha ela linda, — ela virou-se para ele com o rosto neutro, olhar intenso — ou não teria apaixonado-se por ela também — ela sorriu de lábios celados — Pele macia, — novamente acariciou a pele de Kristen. Então, rapidamente deslizou sua unha de forma abrupta abrindo um pequeno corte na bochecha da outra onde logo um filhete vermelho escorreu. Kristen não reagiu, sequer esboçou sentir dor, parecia uma boneca totalmente a mercê de Elizabeth. Viktor fechou os punhos — pena que logo desaparecerá.
— Elizabeth, você está fora de si, está maltrando uma criança que nada tem a ver com nada disso. Não torne-se tão monstruosa assim. Liberte-a — Elena disse calma ainda na esperança de fazer com que sua irmã, ou aquela mulher que um dia havia sido, voltasse a razão e libertasse Kristen. Não poderia ser possível que sequer uma gota de humanidade existisse nela, ela não poderia aceitar. Haveria de ter um modo de convencê-la, tinha de haver, ela só precisava ir com calma e jamais perder a razão. Ela só esperava que Viktor não perdesse a sua.
— Nunca estive tão sã, minha irmã — disse sorridente — E quanto ao seu pedido, desculpe, fora negado.
— Por favor, Liz, não faça nada contra ela, leve-me se necessário, mas por favor, liberte-a. Ela é apenas uma criança, você não tem que fazer isso.
— Poupe as palavras emocionais, Lena, é tarde para tentar apelar para meu lado humano.
Elena sentiu uma aguda pontada em seu peito. Ela havia perdido sua irmã a muito tempo, quando a própria matara seus pais e sequer olhara para trás, por quê ainda insistia em acreditar que ela ainda estava ali? Tolice.
Elizabeth continuou.
— Agora vamos ao que interessa — ela ergueu sua mão projetando uma chama de luz verde e após alguns rápidos instantes, uma adaga surgiu entre as chamas que apagaram-se em seguida. Ela contemplou o objeto em suas mãos. A adaga tinha em seu cabo uma raiz que subia por todo ele e entre elas uma pedra vermelha em formato de olho — Usei essa adaga no meu primeiro sacrifício para as sombras quando finalmente recebi o dom da magia. Desde então a guardei para uma ocasião especial. E olha só, esse momento chegou.
As chamas verdes nas velas, no lustre e nos candelabros oscilaram com uma fria ventania que entrara pelas vidraças destruídas. O ambiente estava tenso, Viktor sentia-se sufocado e a angustia de ver Kristen tão próxima e tão submissa a Elizabeth, só piorava tudo.
Elizabeth contemplou rapidamente a adaga em mãos, e então, olhando diretamente para Viktor ela entregou o objeto a Kristen que a tomou em mãos de pronto, novamente sem expressar qualquer sentimento.
— Ora, que cabelos bonitos você tem, Kristen — disse em uma falsa doçura deslizando seus dedos pelos frio encarando Viktor — Não quer dividir a receita? — dito isto Elizabeth sorriu rapidamente antes de agarrar uma mecha larga do cabelo da outra levando a mecha em direção a Kristen.
— Marie sempre teve orgulho do cabelo longo — Elizabeth disse fitando a mecha em brasa em suas mãos — Corte-a — ordenou. Kristen de pronto segurou a mecha em mãos, totalmente a mercê da ordem de Elizabeth, e sem esboçar qualquer reação, deslizou de forma abrupta a lâmina da adaga em mãos logo cortando seu cabelo como uma planta indesejada, em seguida deixando os fios escorrerem por sua mãos e pressipitar-se no chão.
— Por que faz isso? — Viktor perguntou indignado com a frieza daquela maldita mulher. Ela olhou para ele e sorriu falando de forma cínica em seguida.
— Apenas sua reação já é um ótimo motivo, meu amor.
Segurando outra mecha, ela repetiu o processo, e quando Kristen a tomou em mãos, cortou-a sem demora, novamente sem qualquer esboço de sentimentos em seu rosto.
— O que ganha com isso, Elizabeth? — Viktor disse realmente inojado — Acha mesmo que a amarei agindo de tal maneira? Maltratando uma criança?
— Eu não espero que me ame. Eu não quero o seu amor, sua pena ou seu afeto. Não, isso já passou — ela dizia o encarando — Eu só quero que ela morra, meu amor. Eu só quero que você viva por longos séculos sendo a aberração que merece ser! — exaltou-se em um grito.
— E quanto a você? — ele retrucou no mesmo tom — passará toda a eternidade sendo essa maldita bruxa que tem prazer em ver todos que a cercam sofrendo?! Será que não vê que passará a eternidade sozinha?!
— Eu não preciso da companhia de ninguém em minha vida.
— Então se sente bem ao ser odiada por todos? Se sente melhor quando alguém diz que a odeia, que a despreza? Gosta quando está triste e ninguém a consola? — ele avançou um passo a frente vendo Elizabeth erguer a cabeça em um desafio a suas palavras — E quanto ao amor que tanto buscou, Elizabeth? Não faz mais sentido para você?
— Eu busquei amor e achei ódio — ela respondeu fria.
— E eu busquei uma irmã e encontrei uma inimiga — retrucou sentindo o peso de suas palavras. Seu peito ainda doía ao lembrar da doce garota alegre que um dia Elizabeth havia sido. Ele lembrava-se de cada momento, mas ao contrário do sorriso saudoso que outrora pintaria seus lábios, agora somente o fechar agressivo de seus punhos existia.
— Onde quer chegar com essa conversa? — ela cortou abrupta — Espero que não esteja procurando aquela menina boba que amou você, pois ela morreu a muito tempo.
— Está enganada — ele afirmou dando mais um passo a frente — Ela está dormindo, apenas — mais um passo.
— Mais um passo e a duplicata pagará — ela ameaçou notando a aproximação suspeita de Viktor.
— Minha conversa é com você, Elizabeth — ele disse calmo — Deixe-a de fora.
— O que planeja? — perguntou desconfiada.
— Um acordo.
— Que tipo de acordo? Pense bem no que está fazendo, Viktor. Se estiver armando algo eu sug...
— Eu sei que diz me odiar com todas as suas forças, Beth — ele interrompeu novamente avançando um passo.
Elena estava totalmente perdida e alerta com a aproximação de Viktor também. O que ele estava fazendo? Um passo em falso e Elizabeth mataria Kristen sem trabalho algum. Com aquela aproximação, a chance de Elizabeth se sentir intimidada era grande demais para ser ignorada. Fosse o que fosse que ele estava fazendo, Elena estaria disposta a interceder.
— Eu sei que realmente acredita nisso — ele continuou — e talvez seja verdade, metade de você me odeia muito. Mas só metade.
— Onde quer chegar? — ela cortou ríspida totalmente desconfiada mantendo Kristen próxima a si, na garantia.
— Você não tentaria me atingir se não me amasse um pouco que seja. Mas tu fazes questão que eu a note, que eu saiba do que pode fazer para me ter — ele avançou mais um passo ficando a apenas quatro passos de Elizabeth — Mas não precisa mais lutar para me ter a qualquer custo, Beth — ele engoliu em seco antes de prosseguir, sentindo sua língua relutar a cada palavra — Eu estou aqui para você, Elizabeth. Estou disposto a partir com você para onde quiser, servindo-a como desejar, por toda a eternidade.
Ela riu rapidamente, totalmente incrédula e desconfiada.
— Acha que escorregarei em suas palavras de mel? — perguntou irônica — Deve me achar um tola para acreditar que cairei nisso. Não está de fato acreditando que isso dará certo não é?
— Não são apenas palavras — ele avançou novamente colocando-a em alerta — Eu sei que aquela menina divertida ainda sente minha falta. Eu sei que ela ainda está aí, quieta, escondida embaixo dessa máscara, mas que quer muito ser liberta dessa prisão de vestes negras em que a colocaste.
— Estou avisando para recuar! — disse entre dentes. Viktor pouco se importou, não poderia ceder ao medo novamente. Mesmo que aquela abordagem não desse certo, ele lutaria até o fim para libertar Kristen. Não importava o risco, ele tentaria, mesmo que para isso ele mesmo fosse o sacrifício.
— Liberte Kristen e me leve para onde quiser
— Viktor — Elena soou confusa e nervosa — o que está fazendo?
Ele, no entanto, sequer a olhou. Manteve seus olhos sobre os de Elizabeth, em uma tentativa de passar confiança em suas palavras.
— Tudo isso para libertar a duplicata — constatou amarga.
— O que importa? — mais um passo — eu estou aqui, disposto as suas vontades, a finalmente ser seu como sempre quis — dado mais um passo, ele estava frente a frente a Elizabeth. Estava tão próximo que podia ver todo o negro que ocupava os olhos dela como um poço sem fundo, vazio e sombrio.
— Quando me amaldiçoas-te, tu me condenaste a nunca amar ninguém novamente. Tu sabias que não poderia tocar ninguém, e que ninguém ousaria amar uma aberração. Mas você poderia — ele ergueu a mão tocando os fios dourados do cabelo dela. Ela acompanhou o gesto totalmente desconfiada.
— Se a libertar, estou disposto a finalmente ceder — a cada mínima palavra ele sentia o quanto sua língua relutava em fala-las. Nada do que dizia era verdade, estava lutando contra si mesmo para tentar continuar com aquilo, ser o mais convincente que poderia um dia ter sido, mas era de fato difícil. Seu peito o golpeava a cada vez que abria sua boca, em uma tentativa de fazê-lo parar, mas ele não podia. Não quando já havia ido tão longe. Ele continuaria até o fim, até não haver qualquer chance de erro ou acerto, apenas o fim de tudo. E ele esperava que desse tudo certo, ou jamais olharia-se ao espelho novamente.
— Tu nunca me amarás verdadeiramente, Viktor — ela disse amarga, em uma constatação dolorosa.
— Mas tu sim, Elizabeth, e eu estarei ali para receber o amor que quiser me dar.
— A pouco disseste e reafirmasse me odiar com todas as tuas forças, eu sentia o repúdio em tua voz, em tuas feições, e agora queres que eu acredite que cederá tão facilmente assim? Que provas tenho para saber que realmente cumprirá com seu acordo?
Viktor, embora já esperasse por aquilo, sentiu o peito o golpear mais forte. Mesmo sabendo que ela pediria uma prova, ele ainda tinha esperanças de que houvesse outra saída, que ela apenas se desse por satisfeita em suas palavras, mas agora estava encurralado em sua própria conversa. Não havia mais saídas, ele teria de provar de algum modo. Infelizmente, apenas um lhe vinha em sua cabeça, embora o coração lhe implorasse para não fazê-lo.
Ele então tomou coragem, reuniu todo pingo de forças que tinha e juntou-as esperando que realmente fosse capaz de suportar aquilo. Então, tomando o queixo dela em mão, ele deixou que seus lábios se aproximassem lentamente, em uma cerimônia lenta, quando finalmente deixou que se tocassem. Ele sentiu os lábios secos dela junto aos seus, a temperatura fria lhe deu a impressão de beijar um morto como si mesmo, mas mesmo relutante e muito tentado a recuar, ele deixou que seu lábio inferior envolvesse o dela. Ela nada fez, apenas sentiu a textura de seus lábios em um encontro gélido de morte e ódio.
Ele novamente movimentou os lábios lentamente, envolvendo-a nas carícias do seu próprio, e sentia, a cada mínimo movimento, uma ânsia de fugir, sair dali o quanto antes embora não pudesse. Talvez ele estivesse enganado, mas ela parecia ceder. Talvez ela estivesse de fato acreditando em suas palavras e em seu gesto, talvez aquilo desse certo e a esperança sorrisse para si. Mas só talvez.
Antes que pudesse raciocinar qualquer coisa, ele sentiu um impacto em suas costas, algo pontiagudo rasgando sua pele, e embora não doesse, havia um incômodo ali. Ele então recuou de pronto, confuso com aquela sensação, e ao dar as costas para ver o que havia acontecido, deu de cara com a própria Elizabeth que havia acabado de enfiar a adaga antes no poder de Kristen em suas costas. Ele fraziu o cenho totalmente confuso, olhando para trás onde a poucos segundos havia beijado Elizabeth, encontrando-a lá o deixando ainda mais confuso. TTodavia, quando aquela imagem dela mesma se desfez em uma cinza que caiu ao chão, ele entendeu que havia fracassado, e caído em uma armadilha.
— Boa tentativa, meu amor — a verdadeira Elizabeth disse atraindo o olhar dele para si — mas deveria aprender a controlar seus pensamentos.
Antes que pudesse fazer ou falar qualquer coisa, Elizabeth encostou seus lábios nos deles em um toque rápido, mas o suficiente para que uma dor absurda o tomasse, começando por onde aquela mulher havia o beijado. Ele recuou sentindo a dor se alastrar de forma lenta e mais dolorosa possível. Tentando entender o que diabos estava a acontecer consigo, ele olhou para suas mãos, avistando ali a mesma imagem aterrorizante de um século atrás.
— A mald... — ele não conseguiu falar deixando um grunhido de dor escapar de sua boca que se tornou um som contínuo a cada mínimo avançar das veias negras mortais a consumi-lo lentamente como as chamas de umas fogueira.
Naquele momento ele entendeu que maldição estava viva novamente, desta vez contra si mesmo. Atemorizado, a dor tomava-o lentamente, enquanto a veias negras pintavam suas mãos e seu rosto. A dor não podia se contida e novamente ele se viu gritando diante da dor, enquanto o corpo cedia a mesma.
— Achou mesmo que poderia me enganar assim tão fácil, querido? — ela perguntou aproximando-se dele usando um tom debochado de uma verdadeira ganhadora pisoteando seu adversário. Ela riu alto, cada vez mais perto do corpo dele, que constorcia-se em uma dor indescritível, como se um bilhão de adagas ardentes em brasa dançassem dentro de si.
— Quando irá aprender que você não tem qualquer controle sobre mim, meu amado?
No instante seguinte, ele sentiu uma ânsia de vômito que a muito não sentia, e logo vomitou o mármore com um líquido negro.
— Pare! — Elena lançou uma bola de energia em direção a Elizabeth, não podia permitir que aquela mulher destruísse mais uma vez a vida de Viktor, ela tinha de salva-lo.
Mas mesmo sem sequer olhar a bola mágica que vinha em sua direção, Elizabeth ergueu a mão, fazendo com que a magia da outra fosse desfeita no ar, como uma simples poeira branca. Elena de pronto fraziu o cenho. Como poderia? Ainda chocada com a cena, Elena sequer tivera tempo para defender-se quando uma onda forte, como uma parede de pedras bateu contra si, fazendo suas pernas cederem diante a dor que tomara seu corpo. Ela sucumbiu ao chão, ajoelhando-se sobre suas pernas tossindo sem controle enquanto o sabor metálico tomara seu paladar e narinas enquanto sua mão segurava a costela, que doía de forma inexplicável.
— Fique fora disto, minha irmã — Elizabeth a olhou de forma obscura — odiaria ter de fazer com você o que fiz com nossos pais.
A dor tomava Viktor como um veneno letal, e ele podia ver as veias negras pintando sua pele no prenúncio de morte que experimentara outrora. Ele mal conseguia se mover sem que sentisse que a morte tocava todo seu corpo. Novamente vomitou o líquido negro que reconheceu ser seu sangue e sentiu o mesmo líquido escapar por suas narinas.
— Ahh — ele gemia de forma dolorosa, cedendo e perdendo suas forças aos poucos. Ao olhar para o cenário em sua frente, a visão ficava turva, como algo estivesse em sua frente embaçando sua visão. As veias alastravam-se ainda mais, agora já por toda a extensão de ambos os braços, fazendo com que seu corpo caísse ao chão, dentro de sua própria sujeira.
Elena sentiu a mandíbula travar. Mesmo com uma dificuldade imensa para respirar ou mesmo falar, ela apoiou sua outra mão no chão, mantendo a outra sobre a costela que doía ainda mais como se fosse explodir a cada mínimo movimento. Ela gemia, era difícil não demonstrar dor quando ela estava tão presente por todas as partes.
— Não a temo, Elizabeth Sírius — Elena disse com dificuldade, sentindo o ar lhe faltar e todo o corpo protestar com seus esforços para se erguer. Ela sentia cada mínima parte de si quebrar-se aos poucos, em uma dor grave e aguda em sintonias dolorosas. Mesmo assim, ela se ergueu, e não hesitou um segundo sequer em encarar aquela que era sua semelhança, mas ainda assim um abismo de diferenças suas.
Elizabeth lhe olhou em desafio mantendo no canto de seus lábios um sorriso discreto, mas ainda assim perceptível.
— Deveria, querida — disse no mesmo tom obscuro de antes — Não tens idéia do quanto deveria me temer.
— Aprendi a não temer demônios quando nasci junto de ti.
Elizabeth novamente lhe olhou em desafio, mas o pequeno sorriso no canto de seus lábios já não estava lá. Elizabeth, fria, ergueu em sua mão uma chama verde, e Elena sabia que seria direcionada a si, no entanto não temia. Mesmo machucada e sentindo todo o corpo protestar, ela imitou o gesto da outra gerando em sua própria mão uma bola de energia branca vascilante que já havia destino certo. No entanto, sem que ninguém esperasse, uma magia prata cortou o ambiente atingindo Kristen em cheio.
Ainda sentindo-se presa dentro de si mesma, Kristen sentiu algo adentrando o seu corpo, não como o ser sombrio que tomava-a naquele momento, mas algo bom, como uma luz em meio a escuridão, que logo desfez a sombra dentro de si, e finalmente ela fora solta de sua masmorra.
Novamente o corpo de Kristen era seu de novo, e ela caiu de joelhos puxando o ar em seus pulmões como se durante o tempo em que estivera tomada ela sequer houvesse respirado, e logo a sombra negra que a pouca havia tomado-a voou velozmente em direção a Elizabeth, fundindo-se a ela novamente.
— Mas o que... — antes que Elizabeth pudesse completar sua frase, Elena lançara sua magia em sua direção, fazendo com que o corpo de Elizabeth fosse arremessado para longe, Elena, no entanto, sucumbiu diante do esforço, sentindo a costela doer mais que qualquer outra coisa até ali.
No momento seguinte, figura de uma mulher surge ao topo da escada, parada imponente com os olhos ardendo em luz. Os olhos de todos os presentes foram sugados por aquela mulher, ainda mais por se tratar de uma figura conhecida. No alto da escada estava Margareth, ardendo na magia de uma verdadeira bruxa que era.
— Alninaram? — Elizabeth perguntou atônita em um misto de confusão e uma terrível surpresa.
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Teneat eam* - segurem-na.
7896 palavras
Olá Olá Jubinhas do meu ❤ Aceitam um café? ☕
Eu sei, faz um século que não apareço por aqui, é verdade, e peço desculpas, pois estava com um bloqueio criativo horrível e simplesmente não saía nada. Com a graça do altíssimo, eu consegui escrever esse capítulo GIGANTE e admito que seria bem maior que 10 000 palavras mas eu preferi cortar e transformar em outro capítulo. Mas então, o que acharam? Elliot estava louco! Deuses, a maldição fora ativada contra nosso Viktor! E Margareth, quando pensaríamos que ela seria uma bruxa?! O Alninaram? Que diabos é isso?
Me contem tudo!!!!
Aguardo manifestações 🎉🎉
Até logo ❤❤
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