39° Até o fim


Gabriel se afastou, tentando colocar os pensamentos em ordem. A tensão da noite pesava sobre ele, mas o burburinho da festa não ajudava. Ele precisava de um momento longe de tudo e de todos. Depois de alguns minutos vagando pelos corredores da casa, entrou na cozinha, onde o silêncio era um alívio.

Para sua surpresa, encontrou Laís ali, concentrada em guardar os doces que haviam sobrado da festa em uma grande bandeja. Ela estava tão focada que não percebeu sua presença até ele falar:

— Tá roubando os docinhos?

Laís deu um pequeno salto, derrubando uma das tampas de plástico que segurava.

— Você me assustou, Gabriel! — exclamou, colocando a mão no peito. — Parece uma assombração.

Ele deu uma risada baixa e levantou as mãos em sinal de rendição. — Foi mal, me desculpa. Não foi minha intenção assustar.

Ela o olhou por um momento, ainda tentando se recuperar do susto, mas logo um sorriso brincou em seus lábios.

— E o que você está fazendo aqui? Não sabia que era fã de doces.

— Não sou... Mas tem um em especial que me atrai. — Ele encostou-se ao balcão, cruzando os braços. — E você? Como está?

Laís deu de ombros, voltando a guardar os doces. 

— Estou bem.

 O silencio se instalou por um tempo, enquanto Gabriel a observou em silêncio por alguns instantes, as mãos ágeis enquanto empacotava as sobremesas. Era estranho como algo tão simples parecia tão natural para ela.

— Então... o que realmente te trouxe aqui, Gabriel? Porque eu sei que não foram os doces... Diga logo o que você quer dizer de uma vez.

Ele hesitou, passando a mão pela nuca, e desviou o olhar.

— Como sabe que eu tenho algo para dizer?

— Por que eu te conheço Gabriel...

— Talvez... eu só quisesse falar com você.

— Sobre o quê?

Ele a encarou, e por um momento, todo o barulho do mundo pareceu desaparecer.

— Sobre nós.

— Eu só queria tirar uma dúvida — disse Gabriel, aproximando-se lentamente, até encurralar Laís contra a bancada da cozinha.

Ela engoliu em seco, sentindo o coração disparar.
— Que dúvida? — perguntou, quase sem ar, enquanto tentava manter a compostura, pois ainda estava abalada devido aos últimos acontecimentos.—

Mas Gabriel não respondeu. Seus olhos estavam fixos nos dela, intensos e determinados. Ele inclinou a cabeça levemente, a distância entre eles diminuindo ainda mais. Seus narizes quase se tocavam, e Laís podia sentir o calor da respiração dele contra sua pele.

Ela não se moveu. Não conseguia. Estava presa naquele momento, na tensão que pairava entre eles.

Então, Gabriel fez o que parecia inevitável. Ele a beijou.

Foi um beijo firme, mas cheio de hesitação e emoção contida, como se anos de palavras não ditas e sentimentos reprimidos fossem despejados ali. Laís ficou imóvel por um segundo, surpresa, mas logo sentiu o corpo ceder, entregando-se ao toque dele.

Suas mãos, que estavam apoiadas na bancada, subiram instintivamente, tocando os ombros dele, enquanto Gabriel a segurava pela cintura, puxando-a para mais perto. A cozinha, o som abafado da festa e o mundo ao redor desapareceram, deixando apenas os dois naquele instante.

Quando o beijo terminou, ambos ficaram parados, ainda tão próximos que podiam sentir a respiração um do outro. Laís abriu os olhos, encarando Gabriel, a confusão e a intensidade do momento claras em sua expressão.

— Gabriel... — começou ela a voz tremula, e sentindo os olhos lagrimejar, mas ele a interrompeu.

— Desculpa. Eu... — Ele recuou um passo, passando a mão pelo cabelo em um gesto nervoso. — Eu precisava saber.

— Saber o quê? — perguntou ela, a voz ainda trêmula.

Ele hesitou, como se lutasse para encontrar as palavras certas.

— Se... ainda existe algo entre nós... Se ainda existe algum sentimento aqui dentro. — falou pegando a mão dela e levando até o seu peito do lado do coração.—

Laís ficou em silêncio, o coração batendo forte. Ela não sabia o que dizer. Sabia que aquele beijo havia despertado algo que ela tentava ignorar há muito tempo, mas também sabia que a resposta não era simples.

Antes que pudesse responder, passos e vozes se aproximaram da cozinha, trazendo-os de volta à realidade. Gabriel deu um último olhar para ela, cheio de sentimentos não ditos, antes de se afastar.

— A gente conversa depois. — E com isso, ele saiu, deixando Laís sozinha com seus pensamentos e o gosto do beijo dele ainda nos lábios.

Laís ficou ali, imóvel, os olhos fixos na porta pela qual Gabriel tinha saído. O sabor do beijo ainda estava presente em seus lábios, um lembrete de tudo o que havia sido desperto dentro dela naquele instante. Seu coração ainda pulsava rápido, a mente em turbilhão tentando processar tudo o que havia acontecido em tão pouco tempo.

Ela se afastou lentamente da bancada, sentindo as pernas fraquejarem, o corpo ainda tenso, como se estivesse em um estado de alerta. Mas, ao mesmo tempo, algo ali dentro dela parecia se acalmar. Algo que estava escondido, guardado nas profundezas de seu ser, mas que agora estava à tona, à flor da pele.

Laís fechou os olhos por um momento, tentando recobrar o controle de seus pensamentos. O que foi isso? Ela não podia negar que havia algo muito forte entre ela e Gabriel. Sempre houve. Mas ele estava em Tóquio, sua vida estava longe, e ela já tinha suas próprias complicações. E, ainda assim, a verdade que ela vinha ignorando há tanto tempo se fazia clara: ela sentia algo por ele. Algo que talvez nunca tenha deixado de sentir.

Ela estava perdida em seus próprios pensamentos quando uma voz interrompeu seu devaneio.

— Laís? — A voz de Milena soou na porta da cozinha, e ela se virou rapidamente para encontrar a amiga, com um sorriso acolhedor no rosto. — Você está bem?

Laís respirou fundo, tentando recompor a calma.

— Estou, sim, Milena. Só... pensando um pouco, sabe? — disse ela, forçando um sorriso. — Eu precisava de um tempo sozinha.

Milena a observou por um momento, notando a leveza de sua expressão e, ao mesmo tempo, uma intensidade nos olhos dela que parecia diferente.

— Eu entendo. Às vezes, tudo o que a gente precisa é um momento de pausa. — Milena sorriu suavemente, mas Laís sabia que sua amiga a conhecia bem o suficiente para perceber que algo estava acontecendo.

Laís abaixou a cabeça por um instante, depois olhou para Milena, que estava observando-a atentamente.

— Milena, você já se perguntou se... — Ela hesitou, mas a dúvida estava lá, evidente. — Se a gente nunca realmente deixa de sentir algo por alguém, mesmo depois de tanto tempo? Mesmo quando acha que tudo mudou?

Milena ficou em silêncio por um momento, antes de responder, sua voz suave e cheia de compreensão.

— Às vezes, o que a gente sente não muda, Laís. A vida muda, as circunstâncias mudam, mas os sentimentos... eles ficam, às vezes guardados, às vezes abafados, mas sempre ali, esperando para serem vistos de novo. Talvez seja hora de você olhar para o que realmente está em seu coração.

Laís engoliu em seco, os olhos marejados. Ela não sabia o que pensar ou sentir. Milena, sempre sábia, tinha uma maneira de trazer à tona as questões que ela mesma tentava esconder.

— Eu sei... — respondeu ela baixinho, mais para si mesma do que para Milena. — Eu sei que ainda sinto algo por ele. Mas não sei o que isso significa agora.

Milena deu um passo à frente, colocando a mão suavemente sobre o ombro de Laís.

— Não tenha medo de descobrir. Às vezes, a gente só precisa dar um passo para frente e ver onde ele nos leva. Você não está sozinha nisso, Laís. Eu estarei sempre aqui para você, não importa o que aconteça.

Laís sorriu com um misto de gratidão e confusão. O que ela faria agora? Ela não sabia, mas uma coisa estava clara: ela não podia mais ignorar o que estava em seu coração.

Enquanto isso, Gabriel estava em outro canto da festa, tentando desviar os pensamentos de tudo o que acontecera na cozinha. Ele não podia negar o impacto daquele beijo, nem a intensidade da resposta de Laís. Mas ele sabia que precisava dar um passo atrás, entender o que realmente queria. Ele também tinha suas próprias inseguranças, principalmente sobre o que poderia acontecer entre eles. Ele não queria complicar ainda mais as coisas.

Mas o que mais o inquietava era o olhar que Laís tinha lançado para ele antes de tudo acontecer. Algo havia mudado, e ele não sabia se isso era bom ou ruim. O que ele sabia, no entanto, era que não conseguiria ficar distante dela por muito tempo. Algo dentro dele simplesmente não permitia.

O destino, aparentemente, estava empurrando ambos para um encontro de corações que precisavam ser reabertos. A questão era: ambos estavam prontos para isso?

***

A noite continuou com momentos de pura alegria. Discursos emocionantes, risadas compartilhadas e uma explosão de fogos de artifício ao final da celebração marcaram o dia como inesquecível.

Quando finalmente se recolheram para a suíte especialmente preparada para eles na casa de campo, Alessandro e Alice estavam exaustos, mas felizes. Ele a carregou nos braços para o quarto, arrancando uma risada dela.

— Não era necessário tanto drama, Alessandro.

— Faz parte da tradição, senhora Panagazzi — ele brincou, colocando-a delicadamente na cama antes de se sentar ao lado dela.—

Alice o puxou para perto, acariciando seu rosto.
— Sabe, esse é apenas o começo.

— E eu não poderia estar mais animado para tudo que vem a seguir — ele respondeu, selando a promessa com um beijo suave e apaixonado.

A lua iluminava o quarto, enquanto os dois se entregavam à tranquilidade daquele momento, prontos para começar o novo capítulo de suas vidas juntos. O beijo foi se intensificando cada vez mais, porem em dado momento, Alice se afastou rapidamente, a expressão no rosto mudando de prazer para surpresa e uma leve apreensão. Ela colocou a mão sobre o ventre, sentindo novamente o movimento dentro dela. O chute havia sido forte e repentino, como uma pequena explosão de energia do ser que crescia ali. Alessandro, que estava ainda sorrindo, logo percebeu a mudança no semblante de Alice. Ele a olhou preocupado, instintivamente colocando as mãos sobre os ombros dela.

— Alice? O que aconteceu? Você está bem? — perguntou, a preocupação tomando conta de seu tom de voz.

Alice respirou fundo, tentando se acalmar. O coração ainda batia acelerado, mas o gesto de Alessandro a trouxe de volta à realidade. Ela sorriu suavemente para ele, aliviada.

— Está tudo bem, é só... nossa filha, parece que ela está cheia de energia hoje. — Ela riu levemente, tentando dissipar a tensão.

Alessandro olhou para o ventre dela, com os olhos brilhando de uma mistura de surpresa e carinho. Alice estava prestes a entrar no quarto mês, mas sua barriga, ainda era bem pequena, quase imperceptível... Ele passou a mão suavemente sobre a barriga dela, como se estivesse tentando acalmar a pequena que acabara de mostrar sua presença de forma tão forte.

— Uau, acho que ela já está bem feliz, não é? — Alessandro comentou, com um sorriso terno, olhando para Alice.

Alice assentiu, colocando a mão sobre a dele. A conexão entre os dois estava ainda mais intensa agora. O beijo, a festa, o momento de celebração... tudo parecia se encaixar perfeitamente. Mas agora, havia algo novo, algo ainda mais significativo: o pequeno ser que estava crescendo ali, esperando para se juntar àquele amor.

— Ela tem muita energia, já posso ver isso. — Alice brincou, tocando a barriga com carinho. — E eu estou começando a achar que vai ser uma menina bem travessa.

Alessandro riu e inclinou-se para beijar sua testa, seu rosto agora expressando a felicidade de ser pai. A emoção de ser noivo e marido de Alice havia se misturado à alegria de saber que logo seriam uma família completa.

— Vamos estar prontos para ela, tenho certeza. — Ele disse, com confiança.— Por que depois dela, quero que venham mais dois filhos...

Alice olhou para ele, seu sorriso sendo o reflexo de tudo o que sentia naquele momento.

— Nós já estamos prontos, amor. — Ela disse, com a certeza de quem sabia que, com ele ao seu lado, qualquer desafio seria enfrentado com amor.— Construir uma família ao seu lado, é o que eu mais quero.

Eles trocaram um olhar carregado de significado. A musica continuava do lado de fora, onde os familiares aproveitavam a festa.

Para Alice e Alessandro, o verdadeiro tesouro estava naquele instante, com a promessa de um futuro juntos, ao lado de sua filha que já fazia sua presença conhecida.

— Sabe, acho que a melhor coisa que já fiz na minha vida, foi ter correspondido aquele beijo... Você estava linda naquele vestido. Não tinha como não se apaixonar...

— Está querendo dizer, que você ficou apaixonado por mim naquele dia?

— Talvez... Mas, você era uma pirralha insolente demais. — Sorriu.— Quando eu te vi saindo com aquele vestido deslumbrante, eu me senti um cara de sorte... Você estava linda e perfeita demais...

Alice riu, o som de sua risada suave como música para os ouvidos de Alessandro. Ela o olhou com carinho, sabendo que aquelas palavras, embora carregadas de brincadeira, estavam repletas de verdade.

— Pirralha insolente, hein? — Ela brincou, levantando uma sobrancelha. — Eu, que achava que você estava encantado pela minha personalidade encantadora.

Alessandro sorriu de volta, a ternura em seu olhar sendo o reflexo de tudo o que sentia por ela. Ele se inclinou um pouco mais perto, tocando delicadamente o rosto de Alice, como se a estivesse admirando pela primeira vez.

— Eu estava encantado pela sua personalidade, sim. — Ele disse com um sorriso travesso, mas os olhos dele denunciavam a profundidade do que estava dizendo. — Mas a verdade é que, quando te vi naquele vestido, não pude deixar de pensar que você era a mulher dos meus sonhos. E, mesmo que você fosse uma pirralha, eu sabia que nunca ia deixar escapar a chance de estar ao seu lado... 

Alice ficou em silêncio por um momento, tocada pelas palavras de Alessandro. Ele sempre soubera como fazê-la se sentir especial, e aquela sinceridade dele a fazia sentir-se amada de uma forma profunda, completa. Ela segurou sua mão, apertando-a suavemente.

— Você estava muito gato naquele dia... Parecia que tinha acabado de sair de um show de rock... Um verdadeiro bad boy.

Alessandro riu do comentário da loira.

—Quando nossos olhos se encontraram, algo dentro de mim disse que você seria a pessoa com quem eu passaria a minha vida.

O ar ao redor deles parecia mais suave, como se o tempo estivesse favorecendo o momento deles. A música do lado de fora continuava, mas para Alice e Alessandro, tudo ao redor desaparecia enquanto seus corações batiam juntos, alinhados, no mesmo ritmo.

Alessandro olhou para ela, ainda com aquele sorriso encantador no rosto.

— Eu te amo, Alice. — Ele disse de forma simples, mas com um peso imenso. — E eu só quero continuar fazendo você feliz, todos os dias da nossa vida, para todo o sempre.

— Eu te amo também. E você já faz minha felicidade, todos os dias. — Ela respondeu, com um brilho no olhar. — Eu só preciso de você, Alessandro. Para mim, isso é o suficiente.

E enquanto o mundo continuava a girar ao redor deles, com a festa acontecendo ao longe, Alice e Alessandro estavam no lugar mais seguro que poderiam estar: nos braços um do outro, onde a promessa de um futuro cheio de amor, família e momentos inesquecíveis começava a se concretizar. Juntos, eles sabiam que nada mais importava, porque tinham encontrado o que muitos buscam a vida inteira: um amor incondicional e eterno.

E com a certeza de que o melhor ainda estava por vir, os dois continuaram a dançar, embalados pelo ritmo suave da música e pela felicidade que transbordava em seus corações.

O tempo parecia ter parado para Alice e Alessandro enquanto dançavam juntos, seus corpos se movendo em perfeita harmonia. As luzes suaves da festa iluminavam o ambiente, mas nada brilhava mais do que o sorriso no rosto de Alice e o olhar apaixonado de Alessandro. A música parecia mais suave e mais envolvente, como se tivesse sido feita para aquele momento.

— Você sabia que seria assim? — Alice perguntou, com a voz suave, ainda absorvendo o calor do momento e o peso das palavras de Alessandro. — Desde o início, quando nos conhecemos, você sabia que seria comigo?

Alessandro a olhou com um sorriso melancólico, como se as palavras fossem mais do que uma simples resposta.

— Eu não sabia... Mas quando você sorriu para mim pela primeira vez, algo dentro de mim disse que estava no caminho certo. Foi como se tudo fizesse sentido, e eu não queria mais estar em nenhum outro lugar senão aqui, ao seu lado.

Ela sentiu o peito apertar, uma mistura de amor e gratidão transbordando em seu coração. A vida deles havia sido cheia de altos e baixos, mas, ao final, o destino tinha os reunido de uma forma que era impossível de ignorar. E agora, aqui estavam, em um dia especial, com toda a promessa de um futuro brilhante pela frente.

— Eu nunca imaginei que a vida poderia ser tão perfeita. — Alice comentou, quase em um sussurro, se entregando à sensação de completa felicidade. — E eu sou tão grata por tudo o que a gente construiu até aqui. Por você estar ao meu lado.

Alessandro não respondeu com palavras, mas com um gesto que valia mais do que qualquer frase. Ele a puxou para mais perto, a envolveu em seus braços com uma ternura que parecia fazer com que o resto do mundo fosse insignificante. Apenas eles dois existiam ali, em um espaço protegido, onde as promessas de amor e felicidade nunca foram tão reais.

O ritmo da música mudou para algo mais suave, e a dança deles se tornou mais lenta, com os corpos se movendo suavemente, acompanhando as batidas do coração um do outro. Alice repousou sua cabeça no peito de Alessandro, sentindo o calor dele e o ritmo constante de sua respiração.

— E eu prometo a você, Alice... — ele murmurou, com a voz baixa, mas firme, — que tudo o que eu quero é fazer você feliz. Todos os dias. Até o fim.

Ela levantou o rosto, seus olhos se encontrando com os dele, e não houve necessidade de mais palavras. O que eles sentiam um pelo outro estava ali, claro, imensurável e eterno. Nada mais precisava ser dito.

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