Capítulo 4

Queridas, Feliz Natal!!!
Com o lançamento do livro na Amazon, tudo ficou uma loucura por aqui. Então estou postando hoje.

Desde já, desejo que 2021 venha para nos abençoar. Desejo alegria, sabedoria, paz, amor e muita saúde pra todas nós!!! Obrigada pela companhia, por acreditarem em meu trabalho e por seguirem sempre comigo.

Não deixem de votar e comentar!!

Beijo grande e até logo!!!

Amo tus!

Os últimos dias passaram com uma rapidez desenfreada. Ainda estou tentando me acostumar com o fato de estar gerando e, por vezes, diminuo o ritmo frenético que sempre exerci. Não digo no trabalho, porque tirei uma folga de final de ano — como faço todos os anos —, mas em casa mesmo. Tenho me permitido desacelerar, fazer meus deveres domésticos com calma e me curtir, já que pedi para minha ajudante do lar folgar também. Ela merece por cuidar da minha casa o ano todo.

A noite de réveillon será daqui a três dias e é impossível não visualizar como o novo ano será desafiador. Uma etapa desconhecida e imprevisível.

Como está muito recente, é como se eu não estivesse grávida fisicamente, porém, uma sensação inexplicável vem crescendo dentro de mim. Uma paz, um amor, plenitude... quando me disseram que a gravidez muda uma mulher, não pensei que fosse desta forma. Achei que era exagero ou uma daquelas formas de romantizar o que nem sempre é perfeito. Entretanto, estou sentido na pele como o corpo vai se ajustando, os sentimentos embaralhando. Uau!

Faz quatro dias desde que a mais linda e incrível notícia chegou aos meus ouvidos.

Eu serei mãe!

Às vezes acho que estou sonhando, que vou acordar a qualquer momento e perceber que nada disso é verdade. E para não haver dúvidas, a clínica se encarregou de enviar o resultado do exame de sangue para o meu e-mail. Um exame que não paro de olhar por, pelo menos, trinta minutos desde que recebi. Será que vou parecer muito louca se emoldurá-lo?

Rio sozinha, balançando a cabeça ao repetir em minha mente o que acabei de pensar. Definitivamente estou me tornando o que sempre temi: uma mãe neurótica. E olha que meu bebê nem nasceu.

O forno apita, indicando que as sobrecoxas estão prontas. Eu amo sobrecoxa de frango e hoje me deu vontade de fazer uma receita fácil e gostosa, a qual tiro a pele, "molho" as peças na manteiga e depois dou uma empanada com creme de cebola. Nossa, fica uma delícia!

Como serei apenas eu, não fiz muita comida. Meus pais me chamaram para almoçar na casa deles, mas hoje estou com uma leve preguiça e, para falar a verdade, eu adoro a minha própria companhia. Assistir a uma série, ouvir uma música, ler um livro, beber um vinho — um prazer que será adiado por alguns meses, mas por uma boa causa.

Vestida apenas com um robe de seda preto, coloco minha luva de silicone e retiro o refratário do forno, ao mesmo tempo que meu celular, que está apoiado no balcão da cozinha, toca.

Coloco a forma em cima da bancada de mármore, tiro a luva e pego o telefone.

Franzo o cenho ao ver que é da clínica.

— Alô — atendo.

— Raquel Souza Travassos?

— Sim — respondo, alarmada.

— Vou passar a chamada para o Dr. Arantes.

— Tudo bem.

Enquanto escuto a musiquinha de passagem de ramal, meu coração se aperta. O que está acontecendo? Meu médico disse que só voltaríamos a conversar depois da virada do ano, a não ser que acontecesse alguma emergência da minha parte.

Raquel? — A voz grave me arranca dos meus pensamentos.

— Oi, doutor. Está tudo bem?

Ele solta um longo suspiro e, para meu desespero, faz um pedido que eu não esperava ouvir.

— Preciso que venha na clínica amanhã.

— Amanhã? Tão de repente?

— Sim, preciso conversar você.

Ah, meu Deus! Todo o sangue do meu rosto some, minhas mãos começam a tremer e o choro ameaça irromper pelos meus olhos. Com a voz vacilante, pergunto:

— Há algum motivo para eu me preocupar?

— Está tudo bem com o bebê, não se preocupe, mas precisamos conversar.

Um alívio percorre todo meu corpo e sinto que posso voltar a respirar.

— Certo! Que horas?

— No primeiro horário, às 8h, pode ser?

— Pode sim.

— Ótimo. Até amanhã, Raquel.

— Até, doutor.

Logo que encerro a ligação, fico alguns minutos tentando imaginar o que o meu médico tem de tão urgente para falar comigo. Ele parecia sério demais. Se não é sobre o procedimento, o que mais pode ser?

Bem, de nada adianta ficar tentando adivinhar. Isso só vai me deixar mais ansiosa e o que menos preciso no momento é me estressar. O que posso fazer é esperar e torcer para que não seja nada de mais.

*

Antes do horário marcado, já estou na frente da clínica, dentro do carro. Não quis alertar minha mãe, Renata ou Vanessa, até porque estou acostumada a lidar com as situações por mim mesma e sendo mãe solo isso será recorrente.

Faltam quinze minutos para às 8h da manhã. O tempo nunca demorou tanto a passar. Se eu disser que dormi tranquilamente, mentirei. Foi uma noite agitada, revirando para lá e para cá na cama, a todo momento recordando do longo suspiro do meu médico, a voz séria...

Olho para o espelho retrovisor e passo um pouco de hidratante labial. Minha boca está ressecada por conta do clima seco e involuntariamente acabo tirando as pelezinhas com os dentes, então preciso ficar aplicando um hidratante de hora em hora.

Aproveito e prendo meu cabelo em um rabo-de-cavalo, ajeitando a franja longa para cada lado do rosto. Satisfeita, saio do carro e aliso o vestido longo, de alcinhas e com estampa floral, peça da nova coleção da RaVa.

Ao consultar o relógio, fico grata por faltar apenas cinco minutos. Alarmo o carro, coloco meus óculos escuros e caminho em direção à casa — ou mansão, como preferir — que abriga a clínica de fertilização. Perdi as contas de quantas atrizes e modelos já encontrei aqui. A mídia diz que o Dr. Arantes é referência na inseminação artificial no país e este foi um dos motivos pelo qual o escolhi. Eu queria um ótimo profissional, que fosse de São Paulo e me desse a segurança que eu precisava para realizar o procedimento.

Aperto o interfone e olho para a câmera localizada na entrada, rapidamente o portão se abre. A quantidade de vezes em que vim, me permite ser reconhecida facilmente.

A recepção está vazia a não ser pela Carla, a funcionária que Vanessa ficou conversando quando veio me acompanhar.

— Olá, tenho um horário...

— Com o Dr. Arantes — ela completa, sorrindo. — Daqui a alguns minutinhos ele vai te chamar, Raquel.

— Obrigada.

Acomodo-me em uma das poltronas espalhadas pelo local e pego o celular para passar o tempo. Com os dentes vou arrancando uma pelezinha que está prestes a sair do meu lábio inferior e no mesmo instante sinto um gosto metálico.

Droga!

Vou ao banheiro que fica ali perto e constato o que já esperava. Minha boca está sangrando. Porém, outra coisa chama minha atenção. A princípio penso ser o barulho de choro, mas segundos depois consigo ouvir sussurros desesperados:

— Eu estou fodida demais... Eu não sei... Não sei! Ai, meu Deus!

Ergo as sobrancelhas com a aflição da mulher que está do outro lado e resolvo sair logo dali. Se fosse comigo, eu detestaria que alguém estivesse me ouvindo.

Ao voltar para a recepção, nem preciso sentar novamente, pois a porta do consultório do Dr. Arantes se abre e meu médico me encara com uma expressão ilegível.

— Bom dia, Raquel. Pode entrar, por favor. — Ele se afasta um pouco para me dar espaço e entro em sua sala.

— Bom dia, doutor.

Sento na cadeira que estou acostumada e cruzo minhas mãos sobre o colo, a fim de evitar demonstrar meu nervosismo.

— Como está se sentindo? — pergunta, ao se acomodar em sua poltrona.

— Estou ótima. Muito feliz que deu tudo certo e um pouquinho preocupada pela reunião de emergência.

O médico abre um sorriso, porém, o gesto não chega aos seus olhos. É quase como se ele não quisesse ter esta conversa.

Hummm, tem coisa aí!

— Eu não vou me prolongar, Raquel. Confesso que nunca passei pela situação que estou prestes a compartilhar e peço que tente manter a calma, para o bem do seu bebê. Tudo bem?

— Doutor, pelo amor de Deus, o que está acontecendo? Que situação o senhor nunca passou?

Ele molha os lábios com a língua e chega o corpo mais para frente, apoiando as mãos cruzadas na mesa imponente de madeira de lei.

— Raquel, houve um equívoco gravíssimo. A funcionária responsável por fazer a coleta em nosso banco de sêmens trabalha na clínica há anos, porém, de uma maneira inexplicável, ela cometeu um erro.

— Como assim, Dr. Arantes? — Não sei como consigo falar, porque minha garganta parece que vai fechar a qualquer momento.

— Em vez de coletar o material do seu doador, ela coletou o sêmen de outro homem...

— O quê?! — interrompo sua explicação com um grito, contudo, minha voz quase não sai, tomada por uma rouquidão repentina. — Eu não estou conseguindo acreditar no que está acontecendo. Me diga que é uma pegadinha, uma brincadeira, por favor, Roberto!

Esqueço que ele é meu médico, dos bons modos, que estamos em um bairro elegante de São Paulo, esqueço de tudo porque meu mundo está virando de cabeça para baixo neste exato momento.

Ele fecha os olhos e nega com a cabeça.

— Eu nunca brincaria com algo tão sério, Raquel. Você não foi a única prejudicada. O sêmen inserido em seu útero é de um cliente nosso que busca a produção independente, como você. O material dele deveria ter ido para os Estados Unidos, onde seria direcionado para uma barriga de aluguel, já que lá é permitido, mas então houve essa confusão.

Como se não pudesse ficar pior.

— Recapitulando, você está dizendo que não inseminaram o esperma do doador que escolhi? O doador que demorei semanas procurando, estudando, me dedicando para fazer tudo de acordo com o que havia planejado para a minha vida... É isso que você está dizendo?

Apesar de ter compreendido cada palavra dita, eu preciso que ele me confirme.

O que eu não daria para que fosse apenas um pesadelo.

— Infelizmente sim, Raquel. Olha, a gravidez está bem no comecinho, você pode decidir o que quiser, sem qualquer custo, a clínica arcará com quaisquer gastos.

— Está insinuando sobre aborto?

Só o pensamento faz minha cabeça latejar. Apesar do absurdo da situação, em nenhum momento cogitei me desfazer do meu bebê. Ele é meu, independente de qualquer coisa, porém isso não desabona o fato de que, por um erro, todos os meus planos vão mudar. Tudo será diferente.

— Não estou insinuando nada, só estou deixando a escolha nas suas mãos. Eu nunca me perdoarei por algo tão insensato ter acontecido em minha clínica. A partir do momento que tomamos conhecimento deste erro, a funcionária foi dispensada por justa causa e todas as medidas cabíveis serão tomadas. O que ocorreu é sério demais e vamos lidar com isso da mesma maneira, com seriedade e respeito por todos os envolvidos.

— Tenho que falar com meu advogado — sussurro, perdida dentro da bagunça que está minha mente.

—  Fique à vontade. Você tem todo direito. Os advogados da clínica estarão de prontidão e já estão preparando um termo para apresentar tanto para você quanto para nosso cliente que foi igualmente prejudicado.

— Eu terei que conhecer o dono do sêmen? — pergunto, num sussurro. — Sei da questão do anonimato, mas ele não é um doador. Como vai ser isso?

A expressão do Dr. Arantes é sofrida, como se tivesse envelhecido décadas em minutos.

— Legalmente, ele é o pai do bebê.

Pai do bebê.

Pai do meu bebê.

Um bebê sonhado, planejado e que, por um erro, não é mais meu.

O médico não precisa me dizer mais nada. Eu não terei a minha tão sonhada produção independente. Sinto como se tivesse sido forçada a carregar o bebê de outra pessoa. Enganada, usurpada, roubada. Por um erro único e exclusivo de uma clínica que pensei ser séria e imaculada. Eu realmente vou precisar de um advogado.

O choro vem em uma enxurrada. Soluços atravessam minha garganta e pouco me importo com o homem à minha frente. Eu quero que ele veja o que fez comigo. Pode não ter sido pela sua mão, mas por alguém que ele contratou, portanto, é tão culpado quanto.

Acaricio minha barriga, recordando dos poucos dias que tive de felicidade, dos planos que fiz, sonhei.

— Sei que você não quer ouvir isso, mas precisa se acalmar. Os primeiros meses são cruciais.

— Estou tentando — grunho em sua direção, com uma raiva que nunca senti antes.

— Me perdoe, Raquel. Eu farei o que estiver ao meu alcance para tornar o seu sofrimento o menor possível.

— Não acho que você tenha esse poder.

Levanto-me em um rompante, sem conseguir encarar o médico que ao mesmo tempo foi o mocinho e o vilão da minha história. Que me estendeu a mão e me deu uma rasteira.

Dramática demais? Duvido! Realista e inconformada seria mais apropriado.

Abro a porta, sem me despedir do médico, da recepcionista, e corro clínica afora em direção ao meu carro.

Preciso do abraço da minha mãe. Só depois disso me permitirei vislumbrar uma nova perspectiva e o que precisarei enfrentar, pois não abrirei mão do meu filho. Isso nunca!

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