Nota de rodapé
O antes que não existe no agora, e o depois que não existe no agora, compartilham sua não-existência numa mesma fração de tempo, que eu não posso compreender. Vou adiando para amanhã o que eu posso sentir hoje, vou remarcando para outro dia o que posso chorar hoje, vou guardar cada palavra e cada vírgula para o momento mais oportuno, que não parece ser no agora. O antes, que não existe no agora, e o depois, que não existe no agora rivalizam com esse presente que nos resta. E o que nos resta? Eu vou guardar cada palavra e cada vírgula para um momento mais ameno. Se me dizem que há coisas mais importantes que sentir, se me dizem que há coisas mais importantes que dizer. Eu não sinto, eu não digo. Eu me calo. Eu me escrevo, porque escrever é mais que sentir e dizer. Porque escrever é manipular o tempo, é mexer com o agora, mesmo que por pouco. Escrever é potência. Em cada vírgula eu me moldo para falar para ti o que eu entendi no silêncio do meu barulho. E em cada ponto eu me achei esperta por saber quando parar, mesmo sem saber se o como falar foi bom. E quem sabe o que é bom se eu não sei o que é parar? Eu sei parar? Achei que terminaria depois de tudo, achei que tudo não acabaria comigo, e se eu estiver parando no meio? Se eu tiver mais para falar? Ou se eu nunca mais abrir a boca no papel e falar igual as gentes de todos os dias? Se todo dia eu fosse igual... Se eu fosse igual todo dia, não escreveria metade disso. O tédio, a ânsia, a loucura, a gana. Nada disso. E nada disso Importa de verdade. E o que importa é o agora? Se o meu agora e o seu agora estiverem distantes, o que te importa de mim? Eu só me escrevo. O tempo todo eu só me escrevo, porque eu só sei de mim, não sei mais nada, tive sorte de saber alguma coisa de mim mesma. Eu me escrevo. E seu estiver parando no meio, eu volto. Ah, eu volto! Mas isso, é conversa para amanhã.
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