08

Winter's pov:

"Em que tipo de confusão você me meteu? E porque parece que não me importo com isso?"

— Mas que grande sorte! — Eu me deito na minha cama, com o celular no ouvido, sabendo que Ningning está nas nuvens, e fico feliz por ela.

Olho na direção da porta para me certificar de que meu pai não está por perto, prestes a começar uma discussão pelo conteúdo da minha conversa.

Ele não está.

— Aonde vocês vão? — Pergunto.

Ningning enfim conseguiu se aproximar da sua paixão transcendental durante a aula de História da Arte. Acredito que a interação de Aeri com Jimin no refeitório tenha influenciado nisso, mas não vou comentar. O que importa é que as duas parecem estar se dando muito bem.

— Vamos a um Café — A voz de Yzhuo já não tem o mesmo tom agudo de euforia. — Por que... por que você não vem conosco?

— No seu encontro? Está louca?

— Isso não é um encontro, Winter. Só estamos saindo como amigas. Além disso, eu...

— Não. Mas não mesmo! – Digo, interrompendo-a.

— Mas se você...

— Pode parar. Não vou ficar segurando vela.

O silêncio paira no ar. Então olho para o relógio na cabeceira da minha cama. Hora do jantar em família.

— Tenho que desligar. – Digo, levantando-me da cama. — Preciso descer agora.

— Mas... — Ningning tenta novamente.

— Não. Mas você vai me contar tudo depois. Todos os detalhes interessantes: se ela de fato gosta de garotas, se tem um bom papo, quantas vezes você sorriu como uma idiota só por estar perto dela.

— Ah, por favor — Ela retruca, mas sei que está sorrindo. — E você sabe que eu sempre te conto tudo.

Não conta, não, mas costumava contar. Até Yzhuo evita conversar sobre certos assuntos comigo, com receio de dizer algo que me faça ter uma crise, algo que me leve a um estado de instabilidade. Entendo que ela faz isso por se preocupar com meu bem estar, mas chega a ser um pouco cansativo. Não gosto quando as pessoas ficam fazendo rodeios em vez de falar a verdade.

— Tenho que ir. — Desligo, então desço as escadas e vou até a sala de jantar.

Hoje meu pai ficou responsável pelo jantar, então preparou algumas de suas iguarias culinárias, com alguns ingredientes secretos que ele nunca revela.

Sentamos ao redor da mesa, e Seungmin não para de falar sobre a mostra de fim de semestre que acontecerá em alguns meses.

— Vamos apresentar nossos trabalhos em uma galeria local, e o professor encarregado disse que alguns curadores de arte importantes estarão lá.

— Acha que está pronto para isso? Tem conseguido fazer as aulas extras? — Pergunta meu pai, colocando uma travessa de Gimbap no meio da mesa.

— Sim, senhor. O professor disse que não preciso me preocupar, que já estou praticamente garantido quando terminar o curso. Então vou conseguir escolher o trabalho que eu achar melhor.

— Mas não fique convencido por causa disso, ok? E continue tirando boas notas. Você precisa de um plano B.

Meu pai senta-se na cadeira e olha para mim antes de se voltar de novo para Seungmin.

— Todo mundo deveria ter um plano B.

Seungmin concorda com ele, e minha mãe apenas franze o rosto para mim. Faço o melhor que posso para não chamar atenção durante a refeição. Afinal, nos últimos jantares em família, o assunto rapidamente migrou para mim e tudo foi por água abaixo bem rápido. Hoje eu só quero aproveitar minha refeição em paz.

— Como estão as coisas na faculdade? — Minha mãe pergunta.

— Vou trabalhar em mais um projeto esse semestre.

— Mais um? — Meu pai questiona. Ele me olha por menos de dois segundos antes de desviar, colocando a salada no prato.

— Esse é diferente dos outros. — Digo, focando na comida em meu prato. — Preciso criar uma composição que contará como a maior nota de conclusão de curso. Além disso o resultado final deve ser performado em um mostruário no final do ano.

Minha mãe recebe essa informação com um gesto de aprovação.

— Isso é ótimo, Minjeong. Esses mostruários geralmente reúnem nomes de peso da área de formação em questão. Foi através de um desses que o filho da Sra. Min conseguiu entrar no mercado de trabalho.

— É aquele rapaz, Min Yoongi, certo? — Diz meu pai, indiferente. — Ele me pareceu um bom rapaz na festa de final de ano. O pai dele tem um dos melhores escritórios de advocacia de Seul.

Apesar do seu tom, eu sei exatamente o que está implícito em suas palavras. E odeio perceber que a conversa gradualmente retorna ao assunto "orientação sexual". Eu não quero estragar o jantar do meu pai mais uma vez. Minha mãe cruza os braços e sorri para mim compreendendo.

— Não vamos seguir por esse caminho, Mingyu — Ela diz.

Meu pai se contrai e empurra a cadeira para longe da mesa. Toda vez que ele se irrita, seu rosto fica mais vermelho.

— Certo. Então acho que já chega.

— Mingyu... — minha mãe diz baixinho. — Sente-se.

— Não. Não se for a mesma coisa que aconteceu da última vez. Não quero passar por isso. Não quero lidar com...

Ele gesticula para mim como se eu fosse um vírus, uma praga. — Isso.

— Eu sou lésbica — respondo.

Meu pai me lança um olhar de ódio, mas eu não aguento mais ser tratada desse jeito.

— Sou lésbica e lamento se você me odeie, mas isso é uma parte de quem sou. Não é algo que eu escolhi nem tampouco é um problema que precise ser resolvido.

Antes que ele possa responder — ou muito provavelmente gritar — a campainha toca. Ele corre para abrir a porta e ficamos em silêncio. Seungmin me lança o mesmo olhar zangado do meu pai, como se isso fosse me intimidar de alguma forma.

— Você realmente precisa escolher melhor os momentos de falar — Ele diz, irritado com a minha existência.

Instantes depois, meu pai volta para a sala de jantar, e fico um tanto surpresa ao ver Jimin com ele. Fico em pé imediatamente.

— O que você está fazendo aqui?

— É ela? — Meu pai pergunta, gesticulando para mim. — Foi ela que te influenciou a seguir por esse caminho?

— O quê?! — sussurro, envergonhada e chocada. — Não!

Jimin ergue a sobrancelha e segura a alça da mochila que traz nas costas.

— Desculpem, se eu não tiver chegado em um bom momento...

— O que você está fazendo aqui? — Indago de novo.

— Quem é você? — Minha mãe pergunta para Jimin.

Sinto minha face esquentar. Dentro do peito meu coração acelera. Jimin tem a incrível capacidade de me deixar nervosa e empolgada ao mesmo tempo.

— Eu me chamo Yoo Jimin. Sou sobrinha de Bae Joohyun e vim concluir meu curso de música na KArts. Sou parceira de Minjeong.

Ela parece tão inocente ao falar isso.

— Sobrinha da Joohyun? Parceira? O que isso significa? — Pergunta meu pai, ainda mais irritado.

— Pai! — Grito, extremamente envergonhada, cobrindo o rosto com a mão.

— Quero dizer, ela é minha parceira na nossa aula de Composição e Prática Instrumental.

Minha mãe se levanta e faz o que pode para acabar com o momento constrangedor.

— Desculpe, Jimin, mas acho que você não chegou num momento muito bom.

— Desculpe, Sra. Kim. Mas eu queria falar com a senhora um instante.

— Comigo?

— Sim, senhora. — Ela diz, pegando a mochila e tirando uma pasta de dentro dela. — Minjeong mencionou que a senhora é médica, e eu queria saber se podemos conversar. Prometo que vai ser rápido.

Jimin estende a pasta para minha mãe, e ela começa a franzir o rosto. Então a conduz até a sala de estar, e sentam-se no sofá. Observamos a conversa aos sussurros. Jimin parece contar detalhadamente algo a minha mãe. De vez em quando, franze as sobrancelhas, mas passa a maior parte do tempo escutando tudo com atenção.

Quando as duas terminam, ela fica de pé e agradece a minha mãe antes de se virar para a porta da casa e ir embora.

Vou para a sala rapidamente.

— O que aconteceu? — Pergunto, indo até a janela para ver Jimin se afastando com as mãos nos bolsos da calça, pensativa.

— Que situação — minha mãe diz, balançando a cabeça e voltando para a sala de jantar.

— Não quero nenhuma garota vindo aqui, Minjeong! Principalmente uma garota que é parente de uma funcionária da sua faculdade! Está me ouvindo?

Quando minha mãe passa por ele, levando as mãos aos cabelos, vira-se e diz:

— Deixe ela em paz, Mingyu. Você está sendo um completo babaca.

Ele não responde, talvez por saber que é verdade.

— O que aconteceu? — Pergunto para minha mãe.

Ela senta de novo na sua cadeira na sala de jantar e começa a comer como se nada de estranho tivesse acabado de acontecer. Meu coração está acelerado, querendo saber sobre o que ela e Jimin conversaram.

— É pessoal, Minjeong. Não posso falar sobre isso.

— Mas... Ela está bem? Tem algum problema com ela?

Minha mãe abre um sorriso tenso, indicando que não vai falar mais nada sobre o assunto. Eu até considero ir até a casa dela para perguntar o que está acontecendo, mas meu pai vai surtar se souber que eu vou sair para encontrar Jimin.

\[...]

Meu alarme dispara às 6h na manhã seguinte. Coloco uma calça de moletom, um agasalho, calço os sapatos e saio de casa.

O ar da manhã está frio. Caminho pela calçada até o Yongsan Park. Estou planejando passar um tempo perambulando por ali, tentando distrair minha mente dos problemas familiares. Mas quando avisto Jimin parada a poucos metros de distância, o frio na barriga é imediato. Parte de mim fica surpresa por vê-la ali, mas durante uma de nossas conversas, ela comentou que gostava de correr no parque.

Jimin está com as mãos no bolso da calça de moletom, observando as margens do lago. Ela usa um boné, e coro só com meus pensamentos. Eu nunca a vi com um boné antes.

— Oi — digo ao me aproximar.

Cruzo os braços, tentando me manter aquecida. Ela ergue a cabeça e abre um sorriso discreto. Eu pigarreio e me encosto numa árvore.

— O que você conversou com minha mãe ontem a noite? Você está doente ou algo assim?

— Você ficaria triste se eu estivesse? — Ela pergunta.

— Sim.

— Mesmo que a gente só se conheça há algumas semanas?

— Sim.

— Não estou doente — Ela diz, olhando para mim. — Minha visita foi por causa do que aconteceu. Precisei fazer algumas sessões de fisioterapia depois do acidente e ainda estou em fase de acompanhamento especializado.

Solto o ar que estou prendendo.

— Sinto muito.

— Está tudo bem.

Eu não sei muito sobre lesões traumáticas. O tio de Ningning teve um problema semelhante muito tempo atrás, mas ele está bem há anos. Mas eu me lembro de ouvir minha mãe dizer que algumas lesões são muito delicadas e sem o tratamento adequado, o paciente pode não recuperar os movimentos e a sequela se tornar permanente. Essa ideia é apavorante e triste, e um tanto familiar para mim.

— Você não me pareceu ter nenhum problema físico — Digo, esperando confortá-la.

— Eu tive um pouco de sorte — Jimin diz, secamente. — Apesar de ter sofrido algumas fraturas sérias, consegui me recuperar bem depois de alguns meses de tratamento. Nem todo mundo consegue esse feito.

Ela é sempre tão otimista, tão feliz; vê-la desse jeito é desanimador.

A curiosidade abala todo o meu ser. Quero saber mais. Mais sobre esse acidente. Mais sobre o quanto isso afetou sua vida. Mais sobre ela. Quero saber tudo sobre Jimin, mas não tenho como simplesmente perguntar. Principalmente porque é perceptível o quanto esse assunto é delicado para ela.

Ficamos em silêncio, encarando o sol que nasce à nossa frente. Observo enquanto ela respira fundo e sorri, parecendo absorver a energia a nossa volta. Por algum motivo, estar em contato com a natureza a consola um pouco.

Ela é tão diferente. Ela é tão fascinante.

— Qual é a sua peça preferida de Bethoveen? — Ela pergunta.

— Peça preferida?

Ela assente com a cabeça.

— A minha é a Sonata n° 5. Minha mãe me fez começar a praticar ainda no colegial, e quando descobri tudo o que envolveu a criação dessa peça, fiquei fascinada. Quero dizer, nunca imaginaria que a história de uma música tão bela pudesse envolver tantos episódios egoístas.

Estaria mentindo se negasse o quanto acho encantador ver que essa é sua peça preferida de Bethoveen.

— O fato de Heifetz ter interpretado essa peça não influenciou nessa escolha, certo?

— Talvez um pouco. — Ela diz, sorrindo.

— Essa também é a minha preferida — Digo, observando a surpresa passar por seu olhos. — E concordo com o seu pensamento. Algo belo nascendo de tantas discórdias; isso tem que ser especial, não é?

— Isso é perfeito, não? — Ela diz com um sorriso malicioso, esperando que eu entenda o que está subentendido.

Eu entendo. É claro.

A Sonata n° 5 é uma peça para piano e violino. Então não é difícil deduzir que ela quer que façamos um dueto.

— Pois é, parece que você tem razão.

— Então, o que me diz?

— Está bem. Podemos tocar na segunda, antes do início das aulas — respondo, rindo. Ela ri também, nossas risadas mesclando-se em uma. O silêncio vem logo em seguida.

Ficamos sem dizer nada por um bom tempo. É muito fácil com ela. É como se continuássemos conversando sem usar nenhuma palavra.

Depois de um tempo, percebo que preciso voltar para casa.

— Minjeong? — Jimin afasta-se da árvore. — Tudo bem se eu acompanhar você até sua casa?

Passo a mão no cabelo e assinto com a cabeça. Jimin caminha ao meu lado e, apesar de não estarmos nos tocando, eu quase consigo sentir meu coração parando só de pensar nisso. Ela tem essa aura calorosa, que me conforta de uma forma que não sei explicar.

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