04
Winter's pov:
"Não vou me importar, não vou chorar. Só queria que fosse tão fácil fazer quanto é falar."
A primeira semana de aulas tem sido relativamente agitada por conta do início dos projetos acadêmicos. Mas hoje as horas estão se arrastando como anos, o que, por mim, tudo bem, pois no fim do dia tenho um encontro marcado com minha psicóloga, algo que realmente gostaria de adiar.
Ao menos ainda tenho um tempo para aproveitar um dos meus momentos preferidos do curso de música; a aula de composição musical com o Professor Jeon.
O Professor Jeon Wonwoo é um homem atlético, casado, 32 anos, que ama a profissão e sempre espera extrair o melhor de seus alunos. Ele atribuí sua paixão pela música a um caso de amor que teve na adolescência. É claro que o caso de amor no final transformou-se em uma união estável. Mas ainda assim é uma história de amor magnífica todas as vezes que o meu professor preferido conta.
Na classe, estamos envolvidos em um debate cujo objetivo é descobrir novas formas de enxergar a música como um todo. Nossa sala é semelhante a sala de prática instrumental. As mesas ficam voltadas para dentro em um semicírculo. Na abertura do círculo, há um grande quadro-branco.
O professor Jeon escreve as palavras Composição com Parceiros no quadro.
— Me digam o que vocês pensam sobre esse tema. — Ele diz, segurando o pincel em mãos.
A turma começa a gritar palavras aleatórias enquanto o Professor Jeon as escreve no quadro com toda a calma do mundo. Ele nunca se abala com a agitação do pessoal e considera isso parte da experiência de aprendizado.
— Equipe — sussurro baixinho, quase sem voz.
Os olhos do Professor Jeon focam em mim, e ele abre um sorriso enorme. Eu sei que professores não podem afirmar que tem alunos preferidos, mas é óbvio que o Professor Jeon gosta bastante de mim.
— Neste semestre, vocês vão formar duplas com um parceiro. — Ele diz enquanto escreve "equipe" no quadro. — Vocês vão explorar o mundo da música, considerando as personalidades de ambos e criando ao final uma composição que mostre esses dois mundos colidindo. Desse modo, sugiro que aprendam tudo que o outro gosta, não gosta, sonha, deseja e tem medo. Descubram tudo que puderem sobre o seu parceiro.
Observo a sala, tentando descobrir quem será a minha dupla. O único problema com projetos em equipe é o conceito de trabalhar com outra pessoa. A pior sensação no mundo é dar uma olhada na sua turma e perceber que apesar de você conhecer todo mundo, sente como se não conhecesse ninguém.
— Não precisam fingir. Eu estou vendo vocês em pânico, tentando descobrir quem vai ser sua dupla. Mas sinto em lhes informar que suas duplas não estão aqui.
O Professor Jeon ergue o dedo, silenciando nossas mentes confusas antes de sair da sala.
Alguns minutos depois, ele volta com Kang Seulgi, a professora de prática instrumental. Uma mulher de 29 anos, elegante e altamente qualificada. Ela foi a mais jovem concertista a fazer parte da Orquestra Sinfônica de Seul e alguns anos depois já estava sendo promovida a rengente. Além disso, em seu currículo constam importantes prêmios no meio musical.
Atrás da Professora Kang, aparecem alguns alunos segurando instrumentos. Fico surpresa quando vejo a novata entrando com um violino.
Durante a semana, eu fiquei sabendo de mais coisas sobre ela pelas fofocas do corredor do que por ela própria.
No segundo dia de aulas, os garotos do último ano já estavam querendo tomar posse da novata, enquanto as garotas ficavam à espreita. Todos se aproximavam dela como adolescentes apaixonados, sorrindo e sendo gentis. Fico me sentindo mal pela garota. Ela não tem a menor chance de manter o ar misterioso de novata com esse rosto.
Olho para o chão, fingindo não ter percebido sua presença. Então olho para cima.
Ela sorri para mim. Não sorrio de volta.
— Permitam-me explicar… — começa o Professor Jeon. — Em todos esses anos como compositor, eu aprendi o quão gratificante são os trabalhos em parceria. Compartilhar ideias e opiniões é uma excelente forma de expandir seus conhecimentos. — Ele se encosta em sua mesa e continua em tom sério. — Por isso a Srta. Kang e eu decidimos colocar as duas turmas de formandos do curso de música desse ano para trabalharem juntas.
O Professor Jeon fica em silêncio e gesticula para a Professora Kang. Ela dá um passo a frente antes de dizer:
— Sendo assim a partir de hoje vocês vão encontrar seus parceiros três dias por semana e farão um trabalho em conjunto. Teremos reuniões todas as semanas para avaliar seus progressos, tanto na composição quanto na prática instrumental. — Ela sorri e coloca as mãos nos bolsos do blazer. — Esse projeto vai contar como a maior nota de todo o semestre. E ao final do ano haverá um mostruário onde seus trabalhos serão performados...
Paro de escutar quase imediatamente. Faço o melhor que posso para não demonstrar que percebo a novata se aproximando. Faço o melhor que posso para evitar olhar para a carteira vazia ao lado da minha. Torço ao máximo para que minha parceira seja Choi Jisu, que fala demais e toca flauta.
— Oi, Minjeong — diz a novata, sentando-se a meu lado.
Ergo a sobrancelha, um pouco irritada com o ar presunçoso de “sou linda e sei muito bem disso”
— Como você sabe o meu nome?
— Ah, eu perguntei para Yeji no meu primeiro dia de aula. Estamos todas juntas em História da Música, mas durante a aula você não olha para os lados então acho que nem percebe que eu estou lá.
— E por que você estava perguntando sobre mim?
— Não sei. Acho que fico curiosa com garotas que são talentosas e incompreendidas.
Seus olhos aparentam tamanha tranquilidade e sinceridade que quase me perco neles.
— Ah.
— Meu nome é Yoo Jimin.
— Então, você é a sobrinha da Srta. Bae? — Pergunto, pensando por um momento.
— Pois é, nossa família é maior do que parece. — Ela franze as sobrancelhas e fica com uma expressão levemente séria antes de piscar, recuperando a ternura na expressão. — Acho que isso é um sinal, não?
— Como é? — Pergunto enquanto observo o restante da turma formando duplas. — Do que você está falando?
— Do fato de que o universo finalmente resolveu cooperar com a gente. Quero dizer, passei a semana inteira tentando descobrir uma forma de me aproximar de você e agora essa oportunidade finalmente surgiu.
— Não acho que seja nada disso — argumento. — Parece só uma coincidência. Fazer a mesma aula que outra pessoa é muito comum. Não fique achando que tem algo de especial nisso.
A expressão de prazer em seu rosto indica que ela de fato pensa se tratar de algo especial.
— Então os outros boatos também são verdade? — Pergunto.
— Boatos? Que boatos?
— Que você tem se mostrado uma excelente violinista?
— Eu de fato toco bem, mas quanto a ser excelente? Aí eu já não posso afirmar. Ainda não sei os parâmetros avaliativos da faculdade. Estou torcendo para que isso seja verdade.
Sorrio diante da sua resposta.
— Quais são os outros boatos? — Ela pergunta.
— Bem, ouvi falar que você ficou com Christopher Bang no terraço durante a aula de contraponto.
— Ah, sim. Obviamente isso é verdade. Foi incrível, aliás. Puxadas de cabelo, falando muita baixaria, tudo muito intenso. Fico surpresa que minha popularidade ainda não tenha aumentado.
— Certo, Sra. Popular. Então qual é a cor do cabelo dele? — Pergunto, sabendo que ela está mentindo.
— E você acha que eu prestei atenção nesse detalhe?
— É mesmo?
— Claro — Jimin diz. — Prefiro prestar atenção em garotas talentosas como você.
Ela fica em silêncio.
As palmas das minhas mãos ficam suadas, e endireito a postura na cadeira. Jimin continua me encarando, e fico chocada com o quanto me sinto confortável com o nosso silêncio. Só que, ao mesmo tempo, eu não estou nem um pouco confortável com o nosso silêncio. Como as duas coisas podem acontecer ao mesmo tempo?
— Sua personalidade combina com sua aparência.
— Sei que minha personalidade é incrível, então vou fingir que você acabou de me chamar de gata.
Dou uma risadinha.
— Minha nossa! Ela também ri! — Jimin diz, abrindo um sorriso malicioso.
Os professores começam a entregar as folhas que devemos preencher para “nos conhecermos melhor”. É um questionário básico, com coisas do tipo comida preferida, estilo musical preferido, esporte preferido, está namorando, etc.
Pisco uma vez. Olho para Jimin e depois para a folha. Não diz nada sobre namoro, então ou eu imaginei, ou ela perguntou.
— O quê?
— Perguntei se você tem namorado. — Ela diz, pensativa. — Ou talvez uma namorada?
— Essa pergunta não está na lista.
— Não podemos desviar um pouco da lista?
— Não.
— Acho que podemos. — Jimin insiste, virando-se e prestando total atenção em mim. — Mas se preferir posso perguntar ao Professor Jeon.
Ela não vai desistir, então cedo.
— Não tenho namorado, nem namorada.
— Então a garota que anda com você seria...
— Minha melhor amiga.
— Isso é ótimo. Porque eu não quero chateá-la. É contra as regras, sabe? Roubar a garota de outra pessoa.
Sorrio.
— E por que você acha que eu posso ser roubada?
Jimim sorri e, assim tão próximas, percebo o quanto ela realmente é linda. Principalmente quando passa os dedos pelos seus fios arroxeados e eles caem de volta perfeitamente.
— Não acho. É só uma esperança minha.
— E por que eu? Não tem nenhuma garota se jogando em cima de você? Além disso, você nem sabe se eu gosto de garotas.
— Ah não? — Ela diz, chegando mais perto. — Então talvez eu precise mudar essa sua forma de pensamento. Tenho certeza de que não vai se arrepender.
Não consigo não rir.
— Você é muito estranha.
Ela não diz mais nada e simplesmente fica ali, me encarando, os olhos e lábios formando o sorriso mais doce do mundo. Eu me remexo no assento. Jimin me olha de um jeito que me deixa constrangida, como se ela conseguisse me enxergar por dentro. Ela sorri ao colocar os antebraços na mesa e une as mãos, apoiando o queixo nelas.
— Só para constar — ela diz baixinho —, eu sei que você gosta de garotas. Caso contrário já teria acabado com qualquer fonte de esperança minha.
Desvio o olhar e permaneço em silêncio. Então, passo o resto da aula encarando meus pés. Pensando nesses olhos castanhos o tempo inteiro.
\[...]
Quando a aula chega ao fim, Jimin insiste em me acompanhar pelos corredores, apesar de eu ter dito que era desnecessário. Ela discorda e nós discutimos até chegarmos ao corredor onde ficam os escaninhos.
— Aliás, não fiquei com esse tal de Christopher no terraço — ela brinca, mas não consigo responder.
Fico sem ar quando vejo o grupinho de Yuna se aproximando. Quanto mais perto eles chegam, mais acelerados ficam meus batimentos.
Apesar de ser uma das melhores alunas da faculdade, Shin Yuna tem um talento nato para fazer escândalo e plantar intrigas dentro do campus. É a única pessoa que já vi deixar Ningning realmente furiosa.
Ela para e olha para mim com um sorriso malicioso no rosto antes de dizer:
— Parece que até garotas vindas de boas famílias podem ter algumas tendências peculiares.
Quando escuto essas palavras saírem de sua boca, meus olhos imediatamente se enchem de água, mas me contenho e respiro fundo. Infelizmente, esses babacas vão ficar muito decepcionados porque eu não vou chorar na frente deles.
Eu odeio muitos momentos da minha vida. Mas agora o nível de ódio é novo. Eu não me odeio por ser quem sou, mas por ter me colocado numa posição de destaque. Mesmo que tenha sido de forma involuntária.
Jimin está parada à alguns metros, olhando o grupinho se afastar. Quando nossos olhares se encontram, percebo que todo o seu jeito divertido de antes desapareceu. Sua expressão está fechada e suas mãos fechadas em punho.
Ela começa a se aproximar de mim e eu ergo a mão, balançando a cabeça e seguindo apressadamente pelo corredor.
— Minjeong.
Escuto alguém me chamar e, quando me viro, vejo Somi, uma das amigas do meu irmão, me encarando com o olhar mais ridículo de todos. Jeon Somi sempre fizera parte da minha vida familiar — nossos pais trabalham juntos. E também é minha paixão mais antiga, desde que eu tinha 17 anos.
Somi é o tipo de garota que nasceu com o gene sociável. Ela é amiga de todo mundo, independentemente do status social das pessoas. Foi também por causa disso que fiquei tão encantada por ela ainda na época do colegial.
Engraçado como uma única atitude mudou tudo que eu pensava sobre ela.
Somi abre a boca para falar, mas desiste rapidamente.
— Sabe o que é o pior? Só quatro pessoas no campus sabiam. Seungmin, Ningning, você e eu. Tenho certeza de que Seungmin nunca contaria para ninguém, pois ele faz tudo que pode para convencer as pessoas de que nem somos parentes, e sei que Ningning jamais faria isso.
Ela baixa a cabeça, seus olhos dançando pelo chão.
— Foi um erro. Yeji estava me falando sobre a novata na biblioteca, e eu posso ter contado sem querer sobre...
Ela nem consegue terminar a frase. Meu coração está se despedaçando. Somi prometeu que não contaria a ninguém.
— Me deixa em paz, Somi.
Seguindo pelo corredor, entro no banheiro feminino, onde abro a porta de uma cabine e a fecho com rapidez. Tranco a porta e respiro fundo. O pânico me sufoca e eu não consigo decidir se é melhor puxar ou soltar o ar. Apoio as mãos na parede e fecho os olhos, tentando estabilizar minha respiração.
As ondas de emoções são fortes, mas eu também sou. Eu preciso ser mais forte do que meus sentimentos, do que essas pessoas. Algumas vezes não há escolha. Sei como a vida funciona, mas não vou permitir que ela tire minha força. Vou lidar com isso, independentemente do que aconteça.
Instantes depois, abro a porta da cabine. Observo o banheiro e quase tenho outro ataque de ansiedade quando vejo Jimin encostada na pia.
Tomada pela vergonha, vou lavar as mãos na pia mais longe dela. Ela sorri e aponta a cabeça na direção do corredor.
— Você está bem?
Eu a ignoro.
— Você está bem? — Ela repete. Seu tom de voz é casual, mas consigo ver a preocupação em seus olhos.
Inclino minha cabeça para o lado, e apesar de eu saber que nós duas somos as únicas ali dentro, dou uma olhada atrás de mim para conferir se está falando comigo.
— Por que você ficou em silêncio?
— Não me importo com o que aqueles desocupados pensam.
— Por isso que acabou de ter uma crise de ansiedade?
Passo as mãos nos cabelos e respiro fundo.
— Eu não tive isso.
Jimin não acredita nas minhas palavras, tenho certeza disso. Ela se aproxima. Antes que eu possa dizer mais alguma coisa, duas garotas entram no banheiro, rindo, e param ao me ver em sua companhia.
Então riem ainda mais e saem — não sem antes murmurar um belo comentário homofóbico. Ótimo. É realmente disso que eu preciso.
Respirando fundo, fecho os olhos.
— Escute, não preciso que você se sinta mal pelo que aconteceu. Não preciso da sua pena. Além disso, você está parecendo uma novata intrometida, e a última coisa de que eu preciso é de mais pessoas se intrometendo na minha vida.
Não era minha intenção dizer isso e me arrependo no instante em que as palavras saem da minha boca. Só que eu estou morrendo de vergonha e não sei quanto mais eu sou capaz de aguentar.
Toda essa situação está me deixando emocionalmente desgastada e afastá-la é a única coisa que está sob meu controle. Eu não preciso dos seu olhar afetuoso nem do seu sorriso encantador.
Ela não responde. Simplesmente baixa a cabeça, coloca as mãos no bolso da calça jeans, se afasta e pede desculpas baixinho.
Eu sou oficialmente uma babaca.
Depois que saio do banheiro, me apresso pelo campus da faculdade. A maioria dos carros no estacionamento já foram embora. Encontro minha mãe encostada em seu Audi, encarando o celular.
Maravilha. É hora da minha rotineira ida ao psicólogo.
Encurvo o corpo e vou me arrastando até o carro. Ela ergue o olhar quando me aproximo.
— Posso saber onde você estava, Minjeong? Estou esperando há mais de meia hora e você nem atendeu minhas ligações! — Ela sussurra, zangada com o meu atraso. — Preciso trabalhar hoje à noite no hospital e você tem uma consulta do outro lado da cidade em dez minutos, e agora vamos chegar atrasadas!
Olho para ela e tento encontrar as melhores palavras para contar o quanto meu dia foi um fracasso. Eu quero conversar sobre todo o meu dilema emocional com minha mãe, mas minha cabeça está uma bagunça.
Mordo o lábio inferior enquanto olho nos olhos dela. Isso suaviza um pouco sua expressão irritada. Ela assente uma única vez, entendendo.
— Tudo bem, querida — sussurra.
Ela se afasta do carro e se aproxima de mim. Então me envolve pelos ombros e me puxa.
— Tudo bem.
E ali, nos braços da minha mãe, eu me permito chorar. E ela não me solta.
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