Capítulo 7

Fecho a porta do sedan e observo tudo à minha volta. A casa por fora é enorme e muito linda, me imagino como será por dentro...

Ariel não diz nada, apenas me observa com seus orbes azuis e frios como o gelo. Ao redor da casa, a variedade de arvores me impressiona. Tem algumas com frutas e outras com flores, um Ipê roxo exibe toda sua beleza imponente e uma vontade de sentar ali debaixo e passar a tarde toda lendo se apossa de mim.

Arrisco uma olhadela para Ariel e percebo que ele se encostou em um dos pilares da entrada da casa, claramente esperando que eu termine de absorver toda a beleza do seu jardim.

Acho que já está parecendo estranha minha cara de idiota olhando para tudo, então subo os poucos degraus e fico quase na altura do garoto.

-Trouxe tudo? –Ele pergunta sem nem se preocupar em cumprimentar.

-Ah sim, está no porta-malas, espera aí que eu vou buscar. –Fiquei tão distraída que esqueci das sacolas com o material para os cartazes.

Abro o porta-malas e observo as seis sacolas, pensando como farei para levar tudo de uma só vez. Tem cartolinas, tintas, canetas permanentes de várias cores, brilhos, borrachas coloridas, papel brilhoso, papel de seda, papel crepom, tinta guache e muitas outras coisas que não lembro.

Começo a pegar algumas e a enganchar nos braços. Umas estão pesadas e outras nem tanto, mas mesmo assim vai ser difícil conseguir essa proeza. Me sinto uma idiota quando por tentar pegar a última sacola, as outras caem da minha mão.

-Argh! –Exclamo enraivecida.

Começo tudo de novo e estou por colocar as mais leves primeiro, quando sinto uma mão quente e grande sobre a minha.

Ariel pega quatro sacolas da minha mão e sai andando sem dizer nada, deixando as duas restantes para que eu leve. Fecho o porta-malas e quase não consigo acompanhar seus passos compridos.

Entramos na casa e quase tenho uma overdose de riqueza. Eu não sou muito chegada em decoração, mas posso dizer que essa casa tem bom gosto. Todos os moveis são com esse estilo meio colonial e combinam com tudo. O sofá é lindo! Parece o lugar onde uma princesa sentaria a tomar um chá. A sala é enorme e cheia de vasos de flores e moveis que nem sei para que servem. Do lado esquerdo, há uma escada que suponho seja para os quartos.

Passamos pela cozinha que é bem moderna, mas que estranhamente combina com o resto da casa e saímos por uma porta de vidro até um quintal igualmente lindo.

Ariel coloca as sacolas em uma mesa que está bem manchada de tinta e sem dizer nada se vai.

Espero alguns minutos e nada dele voltar. Droga!

Se ele espera que eu faça tudo sozinha, está muito enganado. Ambos estamos nesse problema, e o garoto mimado vai ter que ajudar.

-Princesinha, se você acha que eu vou fazer todo o trabalho sujo, está muito engan...-digo ou melhor, grito, entrando pela cozinha novamente, mas não consigo terminar a frase pois Ariel está parado diante de uma mesa cheia de pães, mortadela, queijo, picles, catchup....

-Você gosta de mostarda? –Ele pergunta simplesmente, sem tirar os olhos do pão que está recebendo uma boa camada do molho amarelado.

-Uh.... sim, obrigada. –Consigo lembrar que tenho educação e agradeço o sanduiche que ele me entrega em um prato branco de porcelana.

Não consigo dizer nada coerente. E eu que pensava que o garoto era um completo idiota. Bom, agora ele é meio idiota.

-Não sei se você almoçou, mas eu estava morrendo de fome. –Levanta os ombros se explicando.

-Tudo bem... uh.... Te espero lá fora então.

Saio quase correndo da cozinha. Não por vergonha por gritar na sua casa, mas porque ver Ariel preparando um simples sanduiche, por pouco não me faz ter um AVC. Como um garoto tão bonito, poder ser tão... Ariel?

Coloco o prato de lado e começo a tirar tudo das sacolas. Preciso ocupar minha mente com algo, ou imagens de Ariel mordendo aquele delicioso... sanduiche, vão começar a surgir na minha mente. Ugh!

Separo as cartolinas brancas e os papeis crepom por cores. Arrumo as tintas foscas de um lado da mesa e as tintas brilhosas do outro lado. Aplico a mesma regra para as canetinhas permanentes e os papeis de seda deixo nas sacolas porque são mais frágeis.

Os potinhos de brilhantina, coloco ao lado das tintas foscas para não nos confundirmos com as tintas brilhosas, as tesouras deixo do lado das canetinhas. Depois de ter a mesa totalmente organizada, coloco as mãos na cintura e observo o meu trabalho.

-Uau! E eu pensava que você não era tão louca. –Ariel aparece do nada e eu solto um grito de susto.

-Droga, garoto! Você me assustou! –Quase jogo o sanduiche nele, mas se mamãe souber que estou desperdiçando alimentos, aí sim a coisa fica feia. Ela nunca gostou de jogar comida fora, sempre disse que tem muita gente que não tem o que comer e nós não temos o direito de desperdiçar nada.

-Eu não quis te atrapalhar, você estava muito concentrada fazendo seja lá o que estiver fazendo. –Morde um pedaço do sanduiche e por alguns segundos fico hipnotizada com os movimentos da sua boca. A coisa fica ainda pior quando ele resolve dar um sorrisinho. Cínico.

Balanço a cabeça e pego meu próprio sanduiche. De repente fiquei com fome..., mas não sei se um pão com frios vai saciá-la.

Um pouquinho de mostarda escorre pelo canto da minha boca e passo a língua lentamente tentando limpar o pequeno desastre. Odeio me sujar com comida. Observo a mesa com os materiais, enquanto termino de comer, a mostarda acaba caindo mais algumas vezes, mas termino limpando a mostarda com os dedos mesmo.

Bebo o suco de laranja que apareceu do meu lado misteriosamente e quando já não resta nada para ser comido, nem limpado, esfrego as mãos na minha calça para tirar qualquer excesso de migalhas de pão ou de gordura. Essa é minha calça especial para fazer esse tipo de trabalhos, então não tem problema uma manchinha aqui ou ali.

Resolvo olhar para Ariel, preciso perguntar por onde começamos, mas quando foco meus olhos nos seus, sua pupila está completamente dilatada e ele me encara como se tivesse visto uma assombração.

-O que foi agora princesinha? Viu um fantasma foi? –Debocho, mas sinto meu rosto enrubescendo quase que imediatamente.

Ariel se aproxima de mim, me olhando como um caçador em busca da sua presa. E eu realmente me sinto hipnotizada. Não consigo desviar o olhar do seu. É como se sua íris azul fossem dois imãs. Quando percebo, ele está parado bem na minha frente. Suas mãos sobem lentamente até o meu rosto e ele se encosta em mim ainda mais do que pensei que fosse possível.

-Ariel, o que você pensa que está fazen... –Sou interrompida quando sua boca paira bem em cima da minha e me prende em um beijo arrebatador.

Seus lábios estão um pouco secos, mas isso não atrapalha, ao contrário, aumenta ainda mais a intensidade do toque da sua boca na minha.

Seu beijo é intenso, é viciante, é.... explosivo. Essa é a palavra. Enquanto nos movemos em total sincronia, sinto pequenas explosões no meu estômago, como se milhares de bombas fossem soltas lá dentro.

Suas mãos quentes sobem e descem pelas minhas costas, explorando meu corpo e me causando arrepios. Quando recebo um apertão na bunda, sinto que minhas pernas viram gelatina e quase caio ali mesmo aos seus pés. Como não quero ficar atrás nessa história, começo a explorar seu corpo magro, porém musculoso. Passo a mão no seu abdômen definido por baixo da blusa branca, logo rodeio seu corpo e arranho levemente suas costas, arrancando um gemido do garoto. Como somos quase da mesma altura, sinto sua ereção crescendo cada vez mais, bem na minha pélvis, me causando sensações deliciosas que eu nem sabia que poderia ter, e seu corpo fica mais tenso a cada segundo que passa.

Nos beijamos por mais alguns minutos até que ambos percebemos que precisamos de ar. Ariel se afasta de mim e me olha, posso ver a confusão nos seus orbes azuis.

-Melissa.... Desculpa, eu... olha, vamos fingir que isso não aconteceu, ok? Isso foi um erro, eu não deveria ter te beijado, desculpa, eu... já volto.

O garoto praticamente corre para dentro da sua casa, me deixando com aquela famosa cara de "What a fuck? ". Olho perdida para a porta da cozinha e uma lágrima teimosa acaba escapando dos meus olhos. A limpo rapidamente com a manga da minha camiseta, não quero em hipótese alguma que Ariel saiba que derramei uma lágrima por ele, nem que essa seja a única, não quero que seu ego se infle tanto ao ponto de explodir.

Por mais que eu não goste dele, sinto como se tivesse levado uma facada no coração. Uma mágoa começa a surgir no meu peito e sobe pela minha garganta. Dói demais, e começo a pensar que essa dor tem nome, se chama rejeição.

Espero ali em pé para ver se ele Ariel vai voltar e dizer que tudo aquilo foi uma confusão e que continuamos de onde paramos, mas o moleque não volta, nem depois de quase dez minutos.

Melissa, chega de pensar nesse garoto! Olho para a mesa cheia de materiais e começo a fazer os cartazes sozinha mesmo. Não preciso e nunca precisei de idiota nenhum para minha causa.

Por sorte comprei letras cortadas em diversas cores, então pego o caderninho onde anotei todas as frases que a diretora disse que deveríamos colocar e começo minha arte.

Primeiro traço linhas com lápis para delimitar o centro e para que as frases não saiam tortas, depois começo colando as letras.

Sempre faço o mesmo, primeiro as frases, depois as decorações. É mais fácil e economiza tempo.

Devo estar a quase meia hora colando as letras quando Ariel finalmente aparece.

Seus olhos estão vermelhos e ele parece distraído. Estranho.

Decido agir do jeito que ele mesmo disse, como se nada tivesse acontecido.

Entrego algumas letras e indico uma cartolina em branco e a frase ao lado que tem que escrever. Ele pega tudo da minha mão ainda calado e começa a fazer o seu trabalho.

Depois de colar as letras, passamos para a fase de colar o papel crepom ao redor da cartolina e a fazer as decorações com brilhos e etc., percebo que Ariel tem certa dificuldade em colar as coisas, já que sua mão treme um pouquinho.

-Está tudo bem com você? –Pergunto sem sequer olhar para o garoto.

-Sim. –Ele se limita a responder e continuamos fazendo o nosso trabalho.

Essa resposta não me convence, mas eu realmente não quero entabular uma conversa com ele nesse momento.

Passamos as próximas quatro horas assim: trabalhando em silencio na maioria do tempo, somente dizendo o necessário, "me passa a tesoura? ", "que cor devo pintar esse cartaz? " ou "esse brilho vai aqui?".

Depois de milagrosamente terminar todos os cartazes que deveríamos fazer, e de agradecer silenciosamente por já ser tarde e eu ter que ir embora, de preferência bem longe daqui, levanto pegando tudo e organizando em uma pilha ordenada e colocando os materiais que sobraram em uma sacola grande.

-Vou deixar os cartazes aqui e venho buscar segunda feira, pode ser?

Ainda não estão secos o suficiente para leva-los no meu carro e como você não tem moto.... –Deixo de falar porque percebo que ele nem sequer está prestando atenção no que estou dizendo, olha distante para um lugar qualquer. –Que seja.

-Praguejo. Pelo visto ele nem se importa, então prefiro correr o risco e levar tudo para minha casa mesmo.

Começo a juntar tudo para levar para o carro, quando sua mão se enrosca no meu pulso.

-Desculpa. –Se eu pensava que nada poderia me surpreender, eu estava muito enganada. –Eu não deveria ter dito aquelas coisas, Melissa. Olha... Eu não sei o que aconteceu, só... desculpa.

-Tudo bem, Ariel, como você mesmo disse: vamos fingir que nada aconteceu. Eu não sei o que deu em mim para te beijar. Isso não vai voltar a acontecer, pode ficar tranquilo.

Pego tudo e ando rápido até o carro. De longe escuto o barulho de alguma coisa sendo quebrada, espero que não tenha sido nada muito caro. Na verdade, realmente não me importa.

Acelero e dou ré, arrancando com o carro passando pelo portão aberto e quase batendo em um carro que estava entrando, provavelmente o pai de Ariel, chegando do trabalho, o que quer que ele faça para ter essa grana toda.

Passo pelas ruas quase voando, e com certeza vou acabar recebendo alguma multa por excesso de velocidade. Chego em casa em tempo recorde e quando percebo já estou estacionando na garagem do edifício. Tiro todos os cartazes do porta-malas e subo até o apartamento, com mil coisas passando pela minha cabeça.

Se eu não gosto de Ariel, porque essa rejeição me afeta tanto?

Não há ninguém em casa quando passo pela porta, melhor, assim posso entrar e ir direto ao meu quarto, sem precisar dar nenhuma explicação da cara de bocó que provavelmente tenho nesse momento.

Deixo tudo espalhado pelo piso do quarto para que nada cole aonde não deve e deito na cama colocando o braço sobre os olhos.

Pela segunda vez em um dia, derramo uma lágrima por um idiota que nem a merece.

Como ele pode ser tão insensível? Me dizer que aquele beijo foi um erro, foi algo tão horrível de se ouvir. Ele poderia ter dito que não gostou, que eu beijo mal, até que tenho mal hálito, mas dizer que foi um erro, foi dez vezes pior. É como se ele tivesse percebido que eu não era boa o suficiente, que não mereço provar o sabor dos seus lábios, que.... Meus pensamentos são interrompidos pelo som de uma mensagem chegando no celular.

Quase caio da cama ao levantar rápido pensando que pode ser Ariel, voltando atrás do que disse, mas é o nome de Becca o que aparece na tela. Mas o que diabos está acontecendo comigo? Desde quando fiquei pendente de Ariel? E porque fiquei decepcionada ao ver que não era ele?

"Amiga, já terminou sua tarefa com o gato de olhos azuis? Estamos indo ao cinema com alguns amigos da aula de dança, se quiser ir, me avisa, bjsss".

Se ela ao menos soubesse o que aconteceu nessa bendita casa-mansão.

Não respondo a mensagem de imediato, não sei se quero sair agora, ainda mais com gente que nem conheço, exceto Becca é claro.

Passo alguns minutos meditando se devo ir ou não, até que mamãe passa pela porta do meu quarto.

-Oi filha, vimos o carro na garagem. Tivemos que ir ao mercado comprar chá de camomila. E aí, conseguiram fazer os cartazes pelo visto, hein? –Ela diz, observando os papeis cheios de brilho e cores, espalhados pelo chão.

-Sim.... Conseguimos fazer todos os cartazes hoje, ainda bem. –Respondo sem olhá-la nos olhos. Mas como se trata de dona Amélia, ela percebe tudo sem eu dizer nada.

-Está tudo bem, filha? –Seus olhos pousam em mim, como os de uma águia.

-Sim, mãe. Só que cansei um pouco de colar e cortar. –Solto uma risadinha falsa. –Becca acabou de me escrever uma mensagem me chamando para ir ao cinema, estou exausta, mas não quero chateá-la. –Mudo descaradamente o foco da conversa. Se minha mãe percebe, ela deixa passar, porque me responde com um sorriso:

-Filha, se não quiser ir, não vá. Simples assim! –Me dá um beijo na cabeça antes de sair dizendo que precisa ajudar ao papai a cozinhar. Como se ele precisasse de ajuda, eu sei que ela só quer é ficar perto dele mesmo. Eles não conseguem ficar separados.

Debato comigo mesma se devo ir ou não ao cinema e chego à conclusão de que nem Ariel, nem um babaca qualquer vai influenciar nas minhas escolhas.

"Amiga, acabei de chegar da casa da princesinha, coloco uma roupa decente e nos encontramos no cinema, te ligo quando chegar, bjsss te amodoro! "

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top