Capitulo 19

O fim de semana passa tão rápido que quando percebo já passa das sete horas do domingo. Conversei com Becca e ela quase surtou e me discse mil vezes "eu te avisei", acabei tendo que inventar uma desculpa qualquer para desligar, já não aguentava escutar essa frase. Ariel não voltou a ligar e eu que não vou dar o braço a torcer.

Escuto mamãe me chamar para jantar e levanto da cama calçando minhas pantufas de qualquer jeito. Se eu demorar ela vai acabr vindo e não quero responder a mais perguntas tipo "você está bem, filha?", "parece triste, aconteceu alguma coisa?", "não vai me contar mesmo?".

Sento na mesa e como tudo sem dizer uma só palavra. Realmente não estou com animos para conversar, mas não perco os olhares que minha mãe lança a meu pai. Quando todos terminam de comer, ajudo a lavar a louça suja e praticamente corro para o meu quarto dizendo que estou cansada e tenho que acordar cedo amanhã. Quero escapar da sessão de perguntas que sei que estão pensando em fazer.

Quando estou na segurança da minha cama, pego meu celular para ver se recebi alguma mensagem ou se tenho alguma ligação perdida, mas adivinhem? Nada. Não o entendo, serio! Me diz todas aquelas coisas de que não pode deixar de pensar em mim e aquele monte de baboseira, mas não dá sinais de vida desde sexta feira.
Coloco o celular no peito e respiro profundamente, fazendo com que o aparelho suba e desça lentamente com o movimento.
Será que ele vai cumprir com sua palavra e virá me buscar amanhã? Esse conflito interno está me matando! Por um lado quero que ele apareça e me peça desculpas, mas por outro lado, não quero vê-lo por um bom tempo.

Droga, eu estou tão ferrada!
De tanto bater a cabeça na parede (figurativamente falando) acabo pegando no sono.
O lago é tão lindo, e tem uma mesa redonda bem no meio do grande cais de madeira. Ela está forrada com um tecido branco e em cima em vez de haver pratos ou copos para um almoço, há um frasco branco. Estranho. Puxo a cadeira branca e me sento, colocando as duas mãos sobre a mesa. Na minha frente há uma pessoa, mas não consigo identificar com certeza quem é, só posso dizer que sinto sua tristeza, como se tivesse algum tipo de radar.
-Quem é você? -Pergunto bastante curiosa, olhando para a sombra e depois para o frasco branco. Parece aqueles frascos de aspirina, mas aquele é diferente, posso sentir que ele não é para curar, ao contrario ele adoece.

-Ninguém que vale a pena conhecer. -Ele diz e para a minha surpresa, desaparece bem ali na minha frente como se fosse apenas uma nuvem de fumaça negra. Volto a olhar para a mesa mas o frasco sumiu também. Começo a procurá-lo por todo o lago, mas o único que consigo sentir, são as ondas de tristeza emanadas por ele.
Levanto de um pulo com a música irritante do despertador. Que sonho foi esse? Eu já escutei essa frase em algum lugar, só não lembro aonde.

Balanço a cabeça para dissipar as imagens que insistem em aparecer na minha cabeça e tomo um banho rápido. Me arrumo em cinco minutos e tomo o café da manhã voando. Ainda não quero responder nenhuma pergunta desconfortável.
-Tchau mãe, tchau pai, tchau Max, amo vocês! -Grito saindo apressada pela porta.

São exatamente seis e cinquenta e cinco quando entro no elevador e aperto o botão do térreo.
Meu estômago está embrulhado e sinto que tem pelo menos cem borboletas dentro esperando para sair. Como se a vida quisesse zoar com a minha cara, o elevador para em alguns andares e quando finalmente consigo descer, já são sete horas em ponto.

Abro a porta de vidro que nos protege da rua, e solto um suspiro meio engasgado quando do outro lado, Ariel está a espera sentado tranquilamente na sua moto com óculos de sol estilo Rayban e uma jaqueta de couro preta, o típico estereótipo de motoqueiro rebelde.
Respiro fundo outra vez e caminho até ele. Por fora não ligo para nada, mas por dentro estou a ponto de desmoronar.
-Bom dia princesa, pelo visto é um homem de palavras. -Digo enquanto me aproximo dele e sinto o seu cheiro delicioso, merda.

-Eu sempre cumpro minhas promessas, agora sobe Melissa. -Responde ríspido enquanto me entrega o conhecido capacete.
Balanço a cabeça em deboche e depois de apertar bem a fivela, subo detrás dele e passo meus braços pela sua cintura fina.
Percebo que ele respira fundo, como se sentisse tanta saudade de mim quanto eu dele.

Sem perder tempo, dá a partida e em questão de segundos estamos no meio do tráfego matinal até a escola.
Demoramos apenas alguns minutos para chegar e fico com inveja da facilidade que ele tem para passar por qualquer lugar com sua moto.
Ele estaciona ao lado do meu carro e quando descemos, percebo que todos estão olhando para nós como se de repente estivessem brotando sei lá caracóis no nosso corpo.

Qual é? Nunca viram duas pessoas chegando juntas no colégio?
Devolvo o capacete para Ariel e ele o guarda no lugar de sempre sem dizer nada. Já chega, isso já está ficando chato.

-Porque não me ligou? -Jogo na lata, quem me conhece sabe que não sou de mandar indiretas.
-Hã? -Ele diz obviamente se fazendo de desentendido.
-Porque, você, não, me, ligou? Entendeu agora? - Digo as primeiras palavras com uma pausa entre cada uma.
-Hum, acho que... esqueci.
-Tudo bem Ariel, dois podem jogar esse jogo. Obrigada pela carona. - Agradeço e começo a me afastar. Sinceramente não estou com pique para isso.

Não dou nem dez passos e ele segura no meu braço. Esse garoto adora fazer isso pelo visto.
-Espera. -Suspira. -Eu... quis te ligar, muitas vezes, mas.. não podia. Não desse jeito.
-O que isso quer dizer? -Estou realmente confusa.
-Você não entenderia, o único que deve saber é eu não consigo não pensar em você Melissa, e eu... não sei como lidar com isso.
Droga, lá vamos nós de novo.

-Ariel, eu já escutei isso de você tantas vezes que acho que está perdendo a credibilidade já. Olha, realmente obrigada pela carona, nos falamos depois.
Dessa vez ele simplesmente aquiesce e entro no colégio indo direto para a sala aonde passamos a primeira aula.

Becca me olha de cima em baixo e fico com medo do que vai sair da sua boca roxa.
-Caramba, é oficial, sou sua fã! -Diz calmamente e fico só um pouquinho tranquila.
-Achei que já fosse minha fã! -Finjo estar indignada e ela sorri.
-Que entrada foi essa hein? Todos estão comentando sabia?
Becca está realmente ligando para isso?

-Acontece gossip girl, que meu carro ficou trancado aqui e Ariel me deu uma carona hoje. -Tento tirar importância do assunto, mas parece que não tem nada mais interessante acontecendo nessa escola porque todos cochicham e me olham como se eu não pudesse perceber que estão falando de mim.

-Conta outra Mel! Sou sua melhor amiga, pode contar para mim! -Ela sussurra e eu viro os meus olhos dramaticamente enquanto observo Ariel entrar na sala fingindo que nem me conhece.
-Becca, olha pra mim. -Viro seu rosto com as duas mãos. -Se eu dormir alguma vez na casa do Ariel, o que é bem provável que nunca aconteça, você vai ser a primeira a saber okay?

-Okay. -Ela balança a cabeça satisfeita e vejo outro brilho nos seus olhos. Becca está... diferente ela tem aquele brilho no olhar, aquele mesmo que minha mãe me disse que tinha quando...
-Eu não acredito Becca! -Sussurro e no começo ela não entende nada, mas depois como se uma luz tivesse acendido bem na sua cabeça, seus olhos brilham ainda mais.

-Ah Mel... foi tão mágico! Ele foi tão cuidadoso e no começo doeu, mas depois foi... bom. -Olho para ela com uma sobrancelha erguida. -Tudo bem, foi maravilhoso! Agora entendo porque você e Ariel fazem toda hora!
Agora quem está com cara de idiota sou eu.

-Ei! -Grito e quando percebo os olhares sobre nós, baixo a voz. -Nós não fazemos toda hora, Jesus! De onde você tirou isso Becca?
-Mel, vocês dois se olham como se quisessem se comer ali mesmo, você tem que ver! Praticamente a escola inteira já percebeu isso.
Arrisco uma olhadela para a razão da nossa conversa e o garoto está praticamente com o rosto em cima do caderno de desenho. Como se ele percebesse que está sendo observado, levanta a cabeça e trava seus olhos azuis nos meus. Sua expressão seria me dá calafrios e eu começo a pensar que tem alguma coisa que ele não está me contando.

Depois de alguns segundos nos encarando, ele baixa novamente a cabeça e continua a desenhar qualquer coisa.
Volto a olhar para frente.
-.... e você tinha que ver como comentaram quando vocês dois chegaram naquela moto maravilhosa dele e...
-Espera! O que comentaram?
-Ah, coisas do tipo "parece que o garoto novo domou a fera" e outras que não lembro.
-Hum. Será que esse povo não tem mais o que fazer não? -Pergunto indignada e Becca apenas levanta os ombros, como se realmente não tivessem muita atração aqui. - De qualquer jeito, daqui a uns dois ou três dias, isso vai ser noticia velha e eles vão deixar de me olhar e cochichar, além do mais...

-Muito bem crianças, o fim de semana a acabou, abram seus livros na pagina cimquenta e dois e comecem a ler o texto, depois quero um resumo de pelo menos duas páginas com o ponto de vista de vocês. -A professora de literatura já chega metendo bala e paro de falar no mesmo instante.
Como se fôssemos robôs programados, cada um abre seu livro na página pedida e começa a ler o bendito texto. Eu leio uma, duas, dez vezes, mas minha cabeça está em outro lugar, especificamente duas filas mais para trás de mim.

Quando faltam apenas alguns minutos para acabar a aula, faço o resumo de qualquer jeito e entrego para a professora que ao pegar o papel amassado, me olha de um jeito estranho.
-Está tudo bem com você, Melissa? -Pergunta enquanto pende a cabeça para o lado me fazendo lembrar de um cachorrinho. Porquê todos me perguntam isso?
-S-sim, tudo tranquilo, se me der licença...-Passo pela porta e nem arrisco olhar para trás para ver a reação dela. O último que quero hoje é chamar mais atenção do que já estou fazendo. É incrível como as pessoas adoram falar mal das outras! Qual a graça nisso?

A segunda e a terceira aula por incrível que pareça, passam voando e quando percebo, já é hora do intervalo. Combino de me encontrar com Becca no refeitório já que ela disse que precisava ir ao banheiro antes. Caminho no automático sem realmente prestar atenção nas pessoas ao meu redor, até que...
-Ah você está aí, fugitiva! -Ricardo me dá um abraço de urso e eu fico paralisada por alguns instantes. Quando lhe dei essa intimidade toda?

-D-desculpa! -Ele me solta provavelmente percebendo minha cara de poucos amigos. -Então, como você está? -Mas que droga! Vou ter que imprimir um folheto com as respostas para essa pergunta.
-Tudo bem. -Me limito a responder.
-Hum, okay. Ei o que acha de almoçar comigo, quero dizer com a gente? -Aponta para uma mesa cheia de garotos e garotas conversando.

-Uh, na verdade combinei de almoçar com Becca e...
-Mas que coincidência, olha ela vindo aí! Ei Becca, quer almoçar com agente hoje? -Lanço olhares de "se você aceitar está ferrada" para minha amiga que caminha feliz até nós, mas parece que o seu desconfiometro está bem quebrado.

-Ah claro Rick! Vamos Mel? -Rick? Argh, agora não tenho como escapar. Caminho resignada até a lanchonete e pego qualquer coisa que oferecem, não tenho muita fome mesmo.
Acabo me sentando entre Becca e Ricardo. Como silenciosamente, para ser sincera, não tenho muita vontade de conversar. Depois de alguns minutos observando a macarronada no meu prato, recebo uma cutucada nas costelas e me viro para repreender a Becca. Minha amiga sinaliza alguma coisa com a cabeça e quando eu sigo a direção que ela aponta, me deparo com os olhos furiosos de Ariel. Levanto uma sobrancelha provocativa e me surpreendo com sua reação. Ele simplesmente balança a cabeça e sai do refeitório na mesma velocidade que parece que entrou. Quando olho ao redor para ver se alguém notou a cena, percebo que Ricardo colocou seu braço está encostado na minha cadeira, então entendo a razão da raiva do garoto. Oh diabos, aqui vamos! Mas... pensando bem, eu não tenho uma gota de culpa sequer, então Ariel que vá ficar bravo com outra pessoa!

Me levanto já cansada de fingir que estou prestando atenção nas pessoas ao redor, mas Ricardo segura minha mão e me olha como um cachorrinho pidão.
-Já vai? -Dá um leve apertão na minha mão e eu a retiro rapidamente como se estivesse me queimando.
-Sim, eu preciso... fazer umas coisas. Te vejo na sala Becca. - Me despeço de todos e corro até a porta da escola. Preciso de ar. Todo esse climão com Ariel está me deixando louca.

Sento na escada da entrada e coloco minha cabeça entre os joelhos. Escuto um barulho de gotas caindo no chão e quando percebo são lágrimas que estão caindo pelo meu rosto.
Mas que merda! Eu Melissa Swansen chorando por um garoto? Argh!
Passam alguns minutos e estou prestes a levantar para voltar para a aula, quando sinto que alguém se senta do meu lado. Dou uma espiada para ver quem é mas meus olhos molhados pelas malditas lágrimas, embaçam tudo e não consigo ver nada.

De repente um braço forte me rodeia e sei muito bem a quem pertence.
-Me desculpa. -Ariel sussurra e eu sinto meu estômago embolar. -Eu não queria te fazer chorar nem ficar com medo...
-Quem disse que estou chorando por você? -Limpo minhas lágrimas com força e ele dá um sorrisinho sacana.

Me abraça mais forte, segura meu rosto com as duas mãos e me dá um beijo cheio de significados.
-Eu n-não posso, mas não consigo... não consigo Mel. -Diz e não entendo bulhufas.
-Do que você está falando princesa? -Brinco para suavizar esse clima e ele sorri com os olhos.
-Nada....só me desculpa, linda.
-Tudo bem. Vamos já está quase acabando o intervalo. -Levanto e sacudo a poeira da minha calça com uma mão enquanto com a outra o puxo para que também se levante.

Caminhamos de mãos dadas até a sala e Becca nos olha feliz e posso jurar que a vi batendo palminhas.
O resto da aula acaba passando tranquilamente e me assusto quando sinal que indica o fim da última aula toca estridente.
Todos saem apressados para chegar às suas casas o mais rápido possível e eu caminho tranquila com Becca. Ariel passa por mim e sinaliza o celular. Quando o pego, vejo uma mensagem sua:
"me encontra em casa em meia hora, te espero lá, bjss gata ;)"
-Pela risada boba na sua cara, deve ser uma mensagem do gato do seu namorado. -Becca me cutuca e eu solto um suspiro. Não consigo me acostumar com essa palavra "namorado".

-Sim Sherlock, era uma mensagem dele.
-Oh, e o que ele queria? Estava te chamando para mais uma rodada de sexo quente? -Levanta as duas sobrancelhas sugestivamente.
-Credo! Não! Eu... não sei... sabe de uma coisa, vou nessa, tchau! -Caminho apurada até a porta e Becca me segue saltitando enquanto me enche o saco pelo corredor. Conforme vamos chegando até a porta, percebo que algumas pessoas correm até a saída e quanto mais nos aproximamos, o barulho de gritos vai aumentando. O que está acontecendo? Empurro algumas pessoas que não se dão o trabalho de sair da frente e vejo que no estacionamento um circulo de alunos gritantes se forma.

-O que é isso? -Pergunto para alguém que passa correndo.
-Uma briga! Corre senão você vai perder!
Uma briga? Mas que merda! Corro até o círculo e vou entrando e empurrando até que estou na primeira fila e a imagem que vejo me deixa completamente sem palavras.
Ariel está em cima de um garoto e desfere socos e mais socos no seu rosto até que está completamente coberto de sangue.
Como se me injetassem adrenalina direto na veia, entro no círculo e paro bem na frente dele. Digo seu nome várias vezes mas ele parece tão compenetrado que sequer desvia sua atenção.

-ARIEL PARA AGORA! -grito e me coloco na sua frente. Ele me olha por alguns segundos como se não estivesse me reconhecendo. Seus olhos estão escuros, cheios de ódio e por um milésimo de segundo sinto medo. Não por mim, por ele. Se ele continuar assim, vai acabar em alguma prisão e eu realmente não quero que isso aconteça, mesmo se não continuarmos juntos. Seria demais para o seu pai.
Seguro o seu rosto correndo todos os riscos e sussurro bem na sua frente:
-Ariel, para com isso por favor! O que quer que tenha acontecido, não vale a pena.
-Mas ele... ele disse coisas sobre você. -Responde e eu me surpreendo. Então ele está me defendendo?
-Eu não me importo, qualquer coisa que ele disse, você sabe que é mentira não sabe? -Ele balança a cabeça e retira a mão lentamente do pescoço do garoto ensaguentado no chão. -Muito bem, você está indo muito bem.
-Me desculpa Mel... eu não queria, juro!
-Eu sei meu bem, eu sei. -Passo minha mão no seu rosto e ele o apoia ainda mais como se precisasse do meu toque.

-ARIEL ALBUQUERQUE NA MINHA SALA AGORA! -A diretora grita e como se fosse Moisés, a multidão de gente se abre ao meio para que ela passe.
Ariel a segue sem dizer nada e quando está quase passando pela porta, me dá uma ultima olhada. O arrependimento nos seus olhos é evidente, mas não sei se está arrependido por ter brigado ou por ter sido descoberto.

Respiro fundo quando ele desaparece e Becca me abraça me dando todo o apoio que preciso no momento.
O garoto praticamente desmaiado é levado em uma ambulância para o hospital mais próximo e eu entro no meu carro e dirijo para casa. Por mais que queira esperá-lo, sei que não é conveniente. Mas que vamos ter uma conversa, ah se vamos.

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