ARIEL - Capítulo 28

-Pegou tudo? –Papai pergunta enquanto coloca as poucas roupas que trouxe para a clínica. E sim, agora o chamo de pai. Tive muito tempo para pensar, para reaver muitas coisas que estavam mal na minha vida, e uma delas era minha relação com ele. Meu pai nunca quis meu mal, muito pelo contrário, ele se mudou por minha causa, refez sua vida para me ver melhor, deixou os amigos para que eu pudesse resolver os meus problemas, ele deu tudo de si e eu o tratei como o inimigo.

-Sim pai, está tudo aqui, não trouxe muita coisa no final das contas. –Sorrio sabendo que é o meu último dia.

Fui tratado super bem, não pensem o contrário, mas no final das contas isso é uma clínica de reabilitação e eu sofri muito.

Sofri pela abstinência, sofri pela falta dela, sofri por tudo o que causei. Conforme os dias foram passando, as coisas ficavam cada vez mais claras, eu pude ver como fui um idiota total, agora reabilitado e sem nenhum vestígio de oxicodona no meu organismo, eu só preciso de uma coisa.

-Bom, se está tudo aqui, então vamos. –Pega a bolsa de lona e caminha até a porta me dando alguns segundos a sós comigo mesmo. Eu não quero me despedir desse lugar, mas eu preciso, afinal graças a todos aqui, eu pude me salvar de mim mesmo.

Abraço a todas as enfermeiras e aos médicos que me ajudaram esses três meses e prometo visita-los em breve, mas ambos sabemos que não colocarei os pés aqui novamente.

Depois de todo o protocolo, finalmente entramos no SUV e escutar o barulho do motor me traz tantas sensações que por um momento não consigo respirar. Medo, felicidade, desconfiança, tudo isso passa pela minha cabeça e meus olhos se enchem de lágrimas ao perceber que eu finalmente consegui. Eu consegui!

-Bom, para onde quer ir? –Papai me pergunta enquanto dirige pela estrada vazia. A clínica fica em um lugar muito afastado para que os internos não tenham a possibilidade de fugir. Eu tinha o direito de ligar uma vez por semana para quem eu quisesse. Tentei ligar para ela várias vezes, mas a vergonha me consumia e eu desligava antes mesmo de discar o seu número e acabava ligando para papai.

-Estou morrendo de fome, acho que seria bom comer alguma coisa. –Olho pela janela contemplando a paisagem. Lembro que quando viemos pela primeira vez eu sentia tanta raiva de todos, que não apreciei realmente as arvores e a estrada pelo qual estávamos passando. Quanto mais nos aproximamos da cidade, mais casas vão surgindo e as plantações dão um ar tão lindo que eu bem queria parar e respirar um pouco desse ar puro, só para sentir que estou vivo outra vez.

-Será que você quer mesmo comer filho? –Droga, ele sabe muito bem aonde quero ir.

-Você acha que ela vai querer me ver?

-Nós só vamos saber se você for lá não é mesmo?

-Eu acho que... sim.

-E aí vamos? –Pergunta já entrando na cidade.

-Diabos, vamos! Deve estar quase na hora de saída do colégio, acho melhor o senhor acelerar. –Digo enquanto olho as horas no meu relógio de pulso. Aprendi a usá-lo já que não era permitido celulares na clínica e papai me deu de presente em uma das visitas que tivemos.

Sem dizer uma palavra, ele pega a avenida que nos leva direto para o colégio. Sinto meu coração pular dentro do meu peito e acho que estou à beira de um ataque de pânico.

Abro a janela para respirar melhor, mas nem isso alivia o nervosismo que estou sentindo nesse momento.

Papai dá risada enquanto dirige e eu o fuzilo com um olhar.

-Vai me dizer que nunca ficou assim? –Pergunto enquanto o encaro e outro sorriso se assoma na sua boca, mas esse é diferente, é um sorriso de nostalgia.

-Ah, já fiquei muito assim Ariel, você não tem ideia. Fique calmo que tudo vai dar certo, Okay?

-Okay. –Estalo meus dedos, troco de estação de rádio, abro a janela, fecho a janela, olho a hora no relógio, no celular, no painel do carro... Merda por que o transito está tão lento?

-Ariel? –Papai pergunta quando paramos em um semáforo.

-Sim? –Respondo olhando as luzes e praguejando pela demora que leva para mudar do vermelho para o verde, luzes malditas!

-Pelo amor de Deus, você pode se acalmar?

Tomo uma respiração profunda e aquiesço. Eu preciso me acalmar, preciso me acalmar. Ela vai estar lá, eu tenho que falar com ela, tenho que explicar tudo.

Por um momento penso que papai está indo mais lento do que o normal a proposito e quando estou quase reclamando a ele sobre isso, estacionamos na frente do colégio.

A primeira coisa que vejo, é o carro dela estacionado no seu lugar de sempre e um sorriso escapa pela minha boca. Lembro de quando a provocava estacionando ali e ela tinha que procurar outro lugar para ir até que fiquei com dó e comecei a deixar espaço para ela. Era o nosso espaço.

Lembro de quando brigamos na grama e nos enchemos de lama, escrevi meu nome na sua testa, quanto tempo será que ela demorou para perceber? Eu a reivindiquei como minha naquele dia e nem percebi que ela também me tomou como dela.

Passamos tantos momentos tensos, mas também tantos outros lindos, como nossos amassos nas salas de aula, na minha casa, na fazenda. Ela me marcou de uma forma tão intensa que seriam necessários mil anos para que eu possa esquecer do seu rosto, dos seus beijos, do seu calor, e ainda assim pequenos fragmentos dela permaneceriam na minha alma.

O sinal toca e de repente o estacionamento é tomado de alunos apressados para chegar logo às suas casas. Seguro a maçaneta da porta com tanta força que meus dedos começam a doer. Merda, desde quando fui tão covarde?

E se ela não quiser falar comigo? E se ela estiver tão brava que não vai conseguir nem olhar para a minha cara? E se...

-Vai logo Ariel! –Papai abre a minha porta e praticamente me empurra para fora do carro.

Fico paralisado ali mesmo por alguns minutos até que escuto uma voz dentro de mim me dizendo para ser forte. Para ir lá e dizer tudo o que tenho que dizer a ela. Dou um passo, e outro, e outro e quando percebo, estou parado ao lado do seu carro. Seja o que Deus quiser.

Espero, espero e espero e ela não aparece. Já passaram mais de dez minutos e nada. Olho as horas pela milésima vez no relógio e o desespero começa a tomar conta de mim. Quem sabe isso seja um sinal de que não é a hora de vê-la? Me levanto do capô e começo a caminhar de volta para o carro quando um som chama minha atenção. Escuto sua risada. Por um momento não quero me virar, não quero dar a volta e perceber que tudo não passou de uma ilusão e no final das contas era outra pessoa. Mas Deus como eu preciso vê-la, como eu preciso saber que ela está bem. O que eu faço? O destino resolve tomar as rédeas da situação porque de repente um braço toca suavemente no meu ombro enquanto me diz:

-Ei, eu pedi para você sair da frente da porta, você está me escutando? –Sua voz soa como uma música suave e quero guardar esse som para sempre no meu coração.

Me viro lentamente e à medida que sua imagem começa a se completar na minha frente, meu coração vai batendo mais e mais rápido. Escaneio o seu corpo como se não o visse a séculos e pisco meus olhos para afastar as lagrimas que insistem em cair. Deus ela é tão linda!

Sua expressão de surpresa permanece no seu rosto por alguns minutos até que...

-Como você se atreve a vir aqui! Como você tem coragem, hei? –Seus punhos me acertam com ira e eu tento segurá-los, mas a garota é malditamente forte, então o único que faço é receber toda a sua raiva sem reclamar. –Você desapareceu, não me ligou, não me disse nada, agora aparece aqui na minha escola, o que pensa que eu sou Ariel? Uma idiota?

-Ei, ei, calma Mel! Você vai se machucar! –O babaca daquele garoto intervém e segura os seus braços impedindo que ela dê mais golpes em mim, como ele se chama mesmo? E porque diabos ele está tocando a minha garota?

-Ricardo me solta, eu vou dar uma surra nesse idiota, ele merece isso e muito mais! –Ela grita e eu não consigo evitar soltar uma risadinha, eu sempre amei esse seu lado briguento, que não aceita ser passada para trás, mas agora eu preciso que ela me escute, preciso que ela entenda tudo o que aconteceu e porque fui tão covarde em não ligar para ela quando pude.

-Melissa, será que podemos conversar a sós? –Digo e vejo a raiva crescer ainda mais nos seus olhos castanhos.

-Conversar? Você quer conversar? Você teve TRES MALDITOS MESES para conversar comigo Ariel! –Grita atraindo a atenção de algumas pessoas que passavam por ali.

-Mel, por favor... eu preciso explicar o que aconteceu...

-NÃO ME CHAMA DE MEL, VOCÊ NÃO TEM ESSE DIREITO!

-Por favor... –Suplico uma última vez, mas o idiota chamado Ricardo, segura o seu rosto e diz algo na sua orelha, ela balança a cabeça e entra do lado do passageiro no seu carro me deixando com o queixo caído. O que eu estou perdendo aqui?

-Eu acho que ela não quer conversar com você, campeão. –O babaca diz. –Será que pode me dar licença? Temos um lugar para ir agora. –Ele tem a audácia de deixar bem claro que ele é quem vai deixa-la onde quer que seja que estejam indo.

Saio da frente da porta, mas não posso deixar isso assim, não mesmo.

-Estou saindo agora, mas não pense que vou desistir dela assim tão fácil, não passei por tudo o que passei para que você possa ficar com ela de mão beijada.

Ricardo me surpreende ao rir na minha cara e entra no carro, não sem antes soltar um "veremos".

Então é isso, os seus dias estão contados Ricardo, porque Melissa é minha e eu sou dela e é assim que tem que ser.

Ele sai cantando pneus e eu fico ali paralisado pensando no que vou fazer para tê-la de volta.

Levo um susto quando dois braços rodeiam minha cintura, mas me tranquilizo ao ver os cabelos rosa choque de Becca.

-Ariel, você voltou! Não sabe o quanto estou feliz em te ver! –Ela diz enquanto aperta os braços em volta de mim. O que essas garotas comem que estão ficando tão fortes?

-Oi Becca, também estou feliz em te ver! –Digo em meio ao seu aperto.

-Pelo visto alguém não está tão feliz com a sua volta. –Ela sinaliza para o lugar vazio que o carro de Mel ocupava a minutos atrás.

-É. –é o único que consigo dizer. Eu sabia que ela iria ficar brava, mas não pensei que fosse tanto assim. –O que está acontecendo Becca, eu preciso saber.

-Uh, eu não acho que você vai gostar do que eu vou dizer.

-Não importa, é meu castigo por ser bem... eu.

Becca solta uma risada mas fica seria logo depois.

-A Mel, bem... ela meio que... ela e Rick, eles...

-Dá para soltar de uma vez Becca!

-Eles estão saindo. –Ela cospe a frase e depois tampa a boca como se tivesse dito um palavrão.

Eu dobro o meu corpo e seguro o meu estomago como se tivesse acabado de receber um soco bem dado. E de certa forma, dói ainda mais do que se tivesse recebido de fato um soco.

-C-como? Desde quando? Eu não acredito nisso! –Começo a disparar perguntas sem sentido enquanto puxo os meus cabelos e olho para o céu em busca de alivio. Essa dor está me consumindo por completo.

-Faz umas semanas já, Ariel..., mas eu vejo que ela não está feliz, ela não quer me dizer, mas ela sente muitas saudades de você, e depois que você foi para a clínica ela ficou quase um mês sem sair de casa.

-Jesus... espera! Como você sabe que fui para uma clínica? Ninguém sabia a respeito.

-Minha mãe é medica no hospital que você foi internado Ariel, eles assinaram os papeis de alta condicional, lembra?

-Eu não... na verdade não lembro de muita coisa daquele dia... –Coço a nuca totalmente envergonhado. Merda, a mãe de Becca me atendeu? –Becca eu...

-Não precisa dizer nada gato, essas coisas acontecem, cada um tem uma forma diferente de alimentar os seus demônios, alguns se drogam e outros bem... se cortam. –Ela levanta a manga da blusa e vejo uma serie de cicatrizes nos seus braços. Demônios, como nunca percebi isso?

-Okay, agora que o momento cute cute passou, precisamos dar um jeito de Mel te escutar. –Ela abaixa novamente a manga e quase posso ver as engrenagens rodando na sua cabeça.

-Ma-mas você não quer que ela fique com o Ricardo? Vocês são melhores amigas...

-Gato, eu quero que Melissa seja feliz, quero que os seus sorrisos sejam sinceros, que ela saia, se divirta, que ela ame incondicionalmente, e sinto muito por ela, mas isso não está acontecendo no momento.

-Mas ela deixou bem claro que não quer me ver nem pintado de ouro!

-Ariel, para por favor de arranjar desculpas, e deixa de covardia! Eu sei que você tem um par de bolas aí, então por favor, use-as! –Ela grita e eu começo a gostar ainda mais dela. Ambos somos almas feridas e curadas e temos que nos ajudar.

-Tudo bem, mas eu preciso que você me faça um grande,grande favor.

-Okay, mas com uma condição. –Ela diz e eu aquiesço.

-Diga rosa choque, qual é o seu preço? –Brinco e ela faz uma careta ao escutar o apelido.

-Primeiro, nunca mais me chame disso, e segundo, você tem que me deixar dar uma volta na sua moto.

Dou uma gargalhada e ela me olha com uma sobrancelha levanta.

-É só isso? Se você me ajudar, eu deixo você dar dez voltas na minha moto garota!

Becca balança a cabeça séria, mas eu sei que ela está contendo a emoção, assim como eu ela é uma aficionada das motos e tem uma muito linda, diga-se de passagem, mas a minha é muito mais potente que a dela, então entendo bem o seu pedido. Apertamos as nossas mãos selando o acordo e começamos a traçar o nosso plano bem ali no meio do estacionamento vazio. Depois de quase meia hora, lembro que deixei papai esperando e corro para o carro para avisá-lo de que irei com Becca para casa. Ele me olha estranho e digo que vou explicar tudo quando chegar em casa. Papai liga o carro e sai ainda desconfiado, mas o tranquilizo dizendo que tudo é por uma boa causa, no caso a minha.

Corro de volta até Becca e voltamos a escrever o nosso plano mirabolante. Isso tem que dar certo. Caso contrário eu estarei totalmente destruído.     

NOTA DO AUTOR

Amoreeesss o livro está chegando na reta final, mas eu garanto a vocês que o que está por vir é tão, mas tão intenso que vocês vão ficar de boca aberta, e se não ficarem, podem dar um pontapé em mim! (Na verdade não podem não kkkk) Mas serio... daqui pra frente é só emoção! Se divirtam! #Arissa for ever! 

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