09


Don't make me sad, don't make me cry
Choose your last words, this is the last time
'Cause you and I, we were born to die
We were born to die

•Born to die - Lana Del Rey •
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Frase do Capítulo:
-Tu podes negar, mas eu foi quem ele amou em primeiro!

Núria Fonseca, 2012

💄💋⚽️

Aurora Torres
10:50h, no carro

S/n e Ferran adoravam a companhia da Natasha e já vinham pedindo há algum tempo para passar um dia na casa dela. Por isso, conversei com António, e ele concordou que seria uma boa ideia. Eles precisavam de novos ares, e como a pequena já estava de férias, parecia o momento perfeito.

Hoje eu não dirigi porque estava me sentindo indisposta, mas isso não era um problema. Em pouco tempo, já estávamos perto do prédio onde Natasha morava.

S/n e Ferran estavam radiantes com a ideia de passar o dia com ela. Levaram vários brinquedos e até algumas surpresas. Antes de sairmos, confirmei que Natasha estava de folga, e ela me garantiu que sim, o que deixava tudo ainda mais fácil. Alguns minutos depois, chegamos ao destino.

— Natasha, que saudades! — exclamou Ferran correndo até ela, acompanhado por S/n. —Hoje vamos fazer muitas coisas!

— Crianças, eu também estava com saudades! Mas nós nos vimos há apenas dois dias. Já sentem tanta falta assim? — respondeu Natasha, sorrindo.

— Sim! E eu tenho um segredo pra te contar! — cochichou S/n com ar conspiratório. —O nosso papai gosta de ti!

— Pequena, isso não é verdade! — disse rapidamente, tentando disfarçar. —Agora, deem um até logo à vovó, e depois podemos subir.

— Tchau, meninos! Fiquem bem, está bem? A vovó vai ao SPA, e o papai e o avô estão na empresa.

— Sim, vovó! Não vai acontecer nada, prometemos que vamos nos comportar!

— Eu sei que vão, meus amores. Bem, Ryan, Nuno, fiquem de olho neles. Obrigada por tudo, Natasha.

— Não se preocupe, Aurora. É sempre um prazer cuidar deles.

— Até logo!

Natasha passou o dia inteiro com as crianças, e eles se divertiram muito. Contaram que fizeram vários doces, pintaram, ajudaram-na nas tarefas de casa e até saíram para tomar sorvete. Quando finalmente voltaram, estavam tão cansados que adormeceram no sofá logo depois de entrar. Achei melhor deixá-los ali para não acordá-los e fui direto preparar o jantar. Afinal, um dia cheio de diversão merecia uma noite tranquila para todos.

Natasha Costa
21:10h em casa

O dia tinha sido cansativo. Eles não paravam nunca. Precisava de um momento para mim, então sentei-me no sofá, liguei a televisão e coloquei nas notícias. Observei as imagens passando, mas logo decidi levantar e preparar algo para comer antes de me deitar. Amanhã seria outro dia cheio de trabalho.

Apesar do cansaço, o dia também havia sido repleto de alegria. Os filhos de António irradiavam energia, com sorrisos que iluminavam o ambiente. Eram a vida dele e dos avós. Enquanto fazia uma salada de frutas na cozinha, ouvi a campainha tocar. Estranhei; ninguém tinha me avisado de visitas. Limpei as mãos e fui atender.

Ao abrir a porta, deparei-me com uma mulher de cabelos loiros e um vestido verde. Ela exalava uma postura confiante, quase fria.

— Boa noite, Natasha, certo? — disse ela, com um leve sorriso.

— Sim, sou eu. Quem é a senhora?

— Sou Núria, mãe do Ferran e da S/n. Podemos conversar?

Apesar da surpresa, fiz um gesto convidativo para que ela entrasse, mas deixei a porta entreaberta. Algo no tom dela me deixou alerta.

— Entre, por favor. Sobre o que deseja falar?

Ela não perdeu tempo. O sorriso desapareceu, e sua voz tornou-se mais ríspida.

— É sobre António e os meus filhos. Quero deixar algo claro: ELES SÃO MEUS. António amava-me primeiro. Ele só está contigo porque queres preencher um vazio que não te pertence.

O impacto das palavras foi imediato, como um soco. Antes que pudesse responder, ela continuou:

— E tem mais. O segurança ali fora? Ele está aqui para garantir que não faças nenhuma besteira.

Minha paciência se esgotou.

— Quem pensa que é para vir à minha casa e falar assim comigo? Por favor, retire-se! — disse, tentando manter a compostura. Mas Núria segurou meu braço, apertando com força.

— Não me subestime. António pode estar ao teu lado, mas nunca será como era comigo. Eles ainda são meus, Natasha.

A raiva e o desespero subiam como um nó sufocante na garganta.

— Solte-me agora, ou chamarei a polícia! — gritei, tentando me desvencilhar. Mas ela apenas riu, aproximando-se.

— Vou expor o teu segredo. Em três dias, quero que saias da vida dele, ou todos saberão quem tu realmente és.

Antes de sair, ela deu-me um papel dobrado. Lá estava escrito: "Em 3 dias."

Fiquei paralisada. Enrique, apareceu na porta.

— Está tudo bem, senhora? — perguntou, com uma expressão preocupada.

Forcei um sorriso, escondendo a tensão.

— Sim, está tudo bem. Obrigada, Enrique.

Quando ele fechou a porta, minhas forças se esvaíram. Caí no chão, em lágrimas. A ideia de abandonar António e os filhos rasgava-me por dentro. Eles eram minha felicidade, mas o peso daquela ameaça era insuportável. Encolhi-me junto ao sofá, buscando algum alívio, mas nada vinha.

De repente, ouvi batidas na porta, insistentes.

— Natasha! Abre, por favor! — a voz de António chegou como um bálsamo e ao mesmo tempo uma nova tormenta. —Sei que estás aí. Deixa-me entrar.

Antes que pudesse reagir, Enrique abriu a porta com a chave reserva. António correu até mim.

— Pequena, o que aconteceu? — perguntou, ajoelhando-se. —Não tens que enfrentar isso sozinha. Conta-me.

As palavras estavam presas na minha garganta. Como eu poderia contar sobre a ameaça de Núria? Sobre o meu passado? Ele não entenderia. Apenas balancei a cabeça.

— Não foi nada, António. Estou bem.

— Natasha, estás a mentir. Diz-me o que ela te disse. Eu sei que foi Núria. Enrique contou-me.

Levantei-me e fui para o quarto, tentando fugir do confronto. Mas ele seguiu-me.

— Ouve, eu estou aqui. Não importa o que seja, podemos superar juntos.

A pressão tornou-se insuportável.

— Superar? António, tu nem sabes o que eu passei. Não podes comparar as nossas dores. Quero que sejas feliz, mas nós...não podemos continuar.

Ele ficou em silêncio por um momento, e então, de repente, envolveu-me num abraço forte.

— Não faças isso, Natasha. Eu amo-te. Vamos resolver isso juntos.

O calor daquele abraço quase derreteu minha resistência, mas as palavras de Núria ecoavam na minha mente. António afastou-se apenas para me envolver com um cobertor, colocar música e tentar fazer-me sorrir, dançando desajeitadamente. Ri por um breve momento, mas sabia que aquilo não mudaria nada.

— António, não posso. Não agora. Por favor, vai.

A tristeza nos olhos dele partiu-me ainda mais, mas ele respeitou o meu pedido e saiu. Fiquei sozinha, com o peso de três dias pendendo sobre mim como um relógio em contagem regressiva.

💄💋⚽️

António Torres
3 dias depois - na empresa

Hoje era um dia cheio de compromissos importantes na empresa. A agenda começava com uma reunião envolvendo todos os diretores de departamento, seguia com um encontro crucial com os investidores, e terminava com uma conversa particular entre mim e o meu pai. Apesar da intensidade do dia, não conseguia afastar um sentimento de tristeza que vinha me acompanhando. Natasha ocupava os meus pensamentos. Tentei encontrá-la em casa, mas não obtive resposta. Fui até o trabalho dela, mas novamente nada. Ela parecia estar a evitar-me, e eu não entendia o porquê.

Enquanto ajustava os últimos detalhes para a primeira reunião, recebi uma ligação inesperada. Era Patrícia, dizendo que Natasha precisava falar comigo com urgência. Pedi que a deixasse entrar imediatamente, ansioso por respostas. No fundo, algo me dizia que não seria uma conversa fácil.

Minutos depois, Natasha entrou na minha sala carregando várias sacolas, os presentes que eu tinha dado a ela. O meu coração apertou, e senti o peso daquela cena. Era difícil desviar o olhar dela, e as lágrimas começaram a se formar nos meus olhos. Queria gritar ao mundo o quanto ela significava para mim.

— Natasha, que surpresa! Não estava à espera. — disse, tentando manter a compostura enquanto abria a porta. —O que significa tudo isso? Por que trouxe os presentes?

— Precisamos falar. É sério. Não sei se viste as notícias...mas eu queria dizer que sinto muito. — a voz dela estava trêmula.

— Vi as notícias, mas não entendo o que isso tem a ver. Natasha, por favor, explica-me. Por que estás a fazer isto?

Ela hesitou por um momento, mordendo levemente os lábios, antes de responder.

— António...eu sinto muito! — disse, estendendo a chave do Ferrari que lhe tinha dado. —Não posso continuar com isto.

— Não podes? O que aconteceu? O que estás a esconder? Por favor, fala comigo! — insisti, a voz carregada de desespero.

— Não posso. Tu foste incrivelmente gentil comigo, e eu sou muito grata por isso. Mas agora...não posso mais. —A dor era evidente no rosto dela.

— Natasha, não faças isto! Explica-me, por favor! Foi por causa da Núria? Ela fez alguma coisa? — A minha voz subiu de tom, a frustração começava a tomar conta.

Ela balançou a cabeça, os olhos cheios de lágrimas.

— Não foi Núria. Eu... vou voltar para Espanha. Não nos veremos mais. Desculpa! — disse, acariciando o meu rosto antes de se afastar.

— Natasha, não! Por favor, não vás! — tentei segurá-la, mas ela se desvencilhou com suavidade.

— António, não tornemos isto ainda mais difícil. Deixa-me ir.

Ela saiu rapidamente, os ombros tremendo de tanto chorar. A raiva e a tristeza misturavam-se dentro de mim, esmagando-me por completo. A sala parecia sufocante, o ar pesado. Sem conseguir conter-me, comecei a derrubar tudo à minha volta, a frustração escapando em forma de destruição.

Os olhares curiosos de quem estava do lado de fora da sala não me importavam. Finalmente, o meu pai entrou, aproximou-se e, sem dizer uma palavra, ajoelhou-se ao meu lado. Ele envolveu-me num abraço apertado enquanto eu chorava, incapaz de controlar a dor de ter perdido, mais uma vez, alguém que amava profundamente.

Eu não aguentava mais sofrer. Perdi a pessoa com quem estava a construir uma conexão imensa, e tudo por minha própria culpa. Tentei secar as lágrimas, mas elas teimavam em cair. O meu coração doía tanto que parecia impossível aceitar que Natasha tinha ido embora. Sentia-me à beira de uma crise de ansiedade, mas o abraço firme do meu pai mantinha-me ancorado no chão.

— Por favor, tirem as pessoas daqui. Quero falar com o António a sós. — pediu ele, claramente abalado, enquanto olhava para as sacolas dos presentes ao nosso lado. —António, filho, o que se passou? Isto não são os presentes que deste à Natasha?

Eu, ainda chorando, mal conseguia responder. As palavras saíram como um desabafo, quase sem força. — Perdi, pai. Perdi o amor da minha vida. A pessoa com quem criei um laço tão profundo... fui um tolo.

— Meu filho, calma. Está tudo bem, vamos resolver. Mas o que aconteceu exatamente? — perguntou ele, tentando entender.

— Foi por causa daquelas notícias de ontem. Havia uma que insinuava que ela tinha um segredo a esconder. Em vez de confiar nela e esperar que ela me contasse no momento certo, eu perdi o controle e fui um idiota! — explodi, cheio de arrependimento.

— António, escuta-me...Por que não vais atrás dela? Resolve isso!

— Ela pediu para eu não ir, mas acho que tem algo a ver com a Núria. Enrique disse que a viu falando com ela no dia em que fui procurá-la.

— António, sabes que a Núria ainda gosta de ti. Ela já admitiu isso.

— Não me interessa a Núria, pai! Ela teve a oportunidade dela e só tentou se desculpar depois de dois anos. Já não faz diferença.

O meu pai trouxe-me um copo de água com açúcar para tentar acalmar-me, mas aquilo parecia inútil. Estava tão perdido nos meus pensamentos que mal percebi quando S/n e Ferran entraram na sala. A alegria nos rostos deles iluminou o ambiente, e, ao sentarem-se no meu colo, consegui esboçar um sorriso. Aqueles dois tinham o poder de trazer luz mesmo nos momentos mais sombrios. Eles secaram as minhas lágrimas com as pequenas mãos e encheram-me de abraços.

Ficamos assim por um tempo, até que chegou o momento de ir para a reunião. Apesar do estado em que me encontrava, tinha de continuar. Precisava mostrar força, mesmo que por dentro me sentisse despedaçado. S/n e Ferran ficaram com Patrícia, ajudando-a no escritório, enquanto eu tentava focar nos números e nos relatórios.

Durante a reunião, a minha mente divagava. O vazio que Natasha deixou parecia consumir-me lentamente. O movimento repetitivo dos meus dedos denunciava a minha inquietação. Pelo vidro da sala, vi a pequena entrar com um papel, e depois fez-me um gesto de adeus, sorrindo. Aquela pequena cena foi suficiente para reacender um brilho nos meus olhos. Chamei os dois para dentro.

— Ferran, olha o papá. Ele quer que fiquemos com ele na reunião! — gritou S/n.

— Venham, pequenos. Fiquem aqui comigo. — disse-lhes, tentando manter-me presente.

Eles sentaram-se ao meu lado, e a reunião continuou. Ainda que a alegria deles me fizesse bem, a dor de não ter Natasha ali era esmagadora. Sentia-me cada vez mais frágil, e a cada minuto, a reunião se tornava mais difícil de suportar.

De repente, uma sensação avassaladora tomou conta de mim. O peso no meu peito era insuportável. Levei as mãos trémulas ao rosto, tentando conter o colapso iminente, mas era tarde demais. Minhas pernas cederam, e eu desabei no chão.

— Papá, papá, acorda! — gritou S/n, desesperada. —Vovô, ele não acorda!

— Rute, tire as crianças daqui! Alguém, chamem uma ambulância, rápido! — ordenou o meu pai, tentando manter a calma.

— Sim, chefe! — respondeu Rute, pegando S/n e Ferran, que choravam sem parar.

— O papá vai ficar bem, não vai? — perguntou Ferran, soluçando. — Por favor, papá, não nos deixes.

— Vai ficar bem. O vosso pai é forte. Ele vai superar. — disse o meu pai, tentando tranquilizá-los, enquanto eu lutava para manter-me consciente.

— Chefe, a ambulância chegará em cinco minutos! — informou Bruno, correndo para ajudar.

— Vamos, ajudem-me a colocá-lo na cadeira! — disse o meu pai, determinado, enquanto tentava manter-me estável.

A sala, antes cheia de tensão pela reunião, agora era palco de desespero e preocupação. E ali, no limite entre a consciência e o apagão, uma única imagem vinha à minha mente: Natasha, sorrindo. Ela era a razão de tudo, e eu sabia que precisava lutar. Mas a dor era esmagadora, e o silêncio, inevitável.

Natasha Costa
19:00h, em Espanha

Já estava em solo espanhol, de volta à minha cidade natal, Barcelona. Cresci aqui até ao momento em que percebi que este lugar já não era o meu lar. Agora, tantos anos depois, encontrava-me novamente à porta da casa dos meus pais. As malas, que retirei do táxi, estavam aos meus pés, e eu respirei fundo, tentando preparar-me para enfrentar um turbilhão de memórias e emoções.

Meu pai havia pedido o divórcio à minha mãe dois anos após a minha partida e vivia agora com o meu irmão. Apesar de tudo parecer familiar, algo me incomodava. Eu sentia que algo estava errado. Não tinha tocado no telemóvel desde que deixei Portugal. Assim que o liguei, uma enxurrada de notificações surgiu: inúmeras mensagens e chamadas perdidas de Aurora e, para minha surpresa, duas de António. Rolei a tela e vi uma notícia que congelou o meu coração: António tinha sido hospitalizado após um colapso.

A culpa recaiu sobre mim como um peso insuportável. Eu tinha causado aquilo. Não conseguia acreditar. Tudo dentro de mim gritava para voltar a Portugal, para estar com ele, para corrigir os erros que nos afastaram.

— Filha, que saudades! Não esperava ver-te aqui. — disse o meu pai, ao abrir a porta com um sorriso surpreso, enquanto o meu irmão mais novo corria para me abraçar.

— Tive tantas saudades, maninha! — exclamou ele.

— Também senti tua falta, pequeno. — disse, apertando-o contra mim. Depois, virei-me para o meu pai. —Podemos conversar?

— Claro, filha. Vem, deixa-me ajudar-te com as malas. Mas...não pareces bem. O que aconteceu? — perguntou ele, observando-me atentamente.

— Podemos falar na cozinha? — pedi, tentando evitar o olhar curioso do meu irmão, que já voltava para a sala, colocando os fones e mergulhando nos seus vídeos do YouTube.

— Claro, vamos. — concordou meu pai.

Enquanto caminhávamos para a cozinha, o peso da culpa e da dor aumentava. A minha mente estava um caos, os pensamentos giravam como soldados derrotados num campo de batalha. Dentro de mim, um desespero avassalador crescia, como se eu estivesse a dançar perigosamente perto da linha que separa a vida da ruína. Quem me dera poder voltar no tempo, ao dia em que conheci António, e contar-lhe tudo, sem medos, sem segredos. Agora, restavam apenas as nossas fotos vazias e as memórias que atormentavam os meus pensamentos.

— Conta-me, pequena. Estou aqui para te ouvir. O que aconteceu? É sobre as notícias, não é? — perguntou o meu pai, sentando-se ao meu lado.

As lágrimas ameaçavam cair enquanto eu tentava encontrar palavras que fizessem sentido.

— Sim, pai. Eu...eu amo-o. Mas...não consigo encontrar coragem para dizer o que sinto. E agora eu o perdi. Ele foi parar ao hospital...por minha causa. — confessei, a voz embargada.

— Não digas isso, filha. Tu não tens culpa. Às vezes, o coração quer gritar aquilo que a mente insiste em esconder. É uma luta difícil. Mas, escuta-me: Se ele realmente te ama, ele não deixará que isso o impeça. Ele encontraria uma maneira de estar contigo, até mesmo aqui, em Espanha. — disse ele, com um tom tranquilizador.

— Pai, ele tem filhos. Ele não pode simplesmente deixar tudo e viajar para cá! — respondi, defendendo António.

— Eu entendo. Mas ouve-me, filha: se realmente amas alguém, deixa-o livre. Se ele voltar para ti, será teu para sempre. Se não voltar, é porque nunca foi para ser. — disse ele, com uma clareza e sabedoria que me desarmaram.

— Pai... — murmurei, incapaz de conter as lágrimas que escorriam silenciosamente.

Naquele momento, percebi a verdade nas palavras do meu pai. Precisava dar espaço a António, deixar que ele resolvesse os seus próprios sentimentos e prioridades. E, embora fosse doloroso, tinha de aceitar a possibilidade de que ele talvez não voltasse.

Às vezes, as pessoas precisam de distância para perceber o quanto necessitam estar perto uma da outra. E, naquele instante, decidi confiar no destino. Se era para sermos um do outro, o tempo trataria de nos unir novamente.

S/n Torres
20:09h - em casa 

O papai já tinha voltado para casa. Hoje foi um dia assustador, e só de pensar que poderia tê-lo perdido, meu coração apertava. Ele é tudo para mim: a minha alegria, a minha felicidade, o meu companheiro de todas as horas. A ideia de ficar sem ele era algo que eu simplesmente não conseguia suportar.

Desde que chegamos, ele preferiu ficar sozinho. Não queria falar com ninguém. Os avós pediram que não o incomodássemos, mas eu e Ferran não conseguimos simplesmente ignorar. Sabíamos que ele precisava de espaço, mas também acreditávamos que ele precisava de nós. Mesmo que fosse apenas para ficarmos ao lado dele em silêncio.

— Então, maninho, preparado para ir ao quarto do papai? — perguntei, segurando o meu gelado.

— Vamos, mas temos que fazer pouco barulho. Os vovós estão no escritório e não podem nos ver! — respondeu Ferran, com um brilho travesso nos olhos.

Subimos as escadas devagar, pisando cuidadosamente para não fazer nenhum ruído. Quando chegamos à porta do quarto, batemos suavemente. Esperamos, mas não houve resposta. Batemos mais algumas vezes, e já estávamos prestes a desistir quando a porta se abriu. Lá estava ele, com os olhos cansados, mas ao nos ver, um leve sorriso brotou em seu rosto. Sem pensar duas vezes, corremos para ele e o abraçamos com força.

— Meus amores... como eu poderia ficar chateado com vocês? Venham, entrem. Deitem aqui com o papai. — disse ele, abrindo espaço na cama.

— Conseguimos, S/n! — comemorou Ferran, sorrindo para mim.

— Vocês já tinham tudo planejado, não é? Seus espertinhos! Venham, um de cada lado, aqui no meu braço. — disse ele, rindo pela primeira vez naquele dia.

Deitamos ao lado dele, cada um aconchegado em um braço. Era tão bom estar assim, como se nada mais no mundo importasse.

— Papai, não fique bravo agora, mas...onde está a Natasha? Não a vimos no hospital. — perguntei, tentando soar casual.

O sorriso no rosto dele desapareceu por um instante, e ele respirou fundo antes de responder.

— Ela...ela precisou ir para a Espanha por um tempo. O pai e o irmão dela precisavam dela lá. Mas...logo ela volta. — respondeu, a voz levemente hesitante.

— Ela vai voltar logo, não vai? Estamos com saudades! — disse Ferran, apertando-se ainda mais no abraço.

— Claro que sim, meninos. — respondeu ele, com um sorriso fraco, tentando disfarçar a tristeza.

De repente, ouvimos uma batida na porta. Era o vovô.

— Crianças, eu não disse para não incomodarem o vosso pai? Ele precisa descansar! — disse ele, com o tom firme de sempre.

— Está tudo bem, pai. Deixe-os ficar aqui comigo hoje. Não tem problema. — respondeu o papai, olhando para nós com carinho.

— Eba! — gritamos, em uníssono, antes de cada um dar um beijo em uma das bochechas dele.

— Boa noite, meus amores. — sussurrou ele, fechando os olhos enquanto nos abraçava.

Aquela noite foi especial. Sentir o calor do abraço do papai, ouvir sua respiração se acalmar aos poucos, fez com que tudo parecesse um pouco menos pesado. Mesmo que o mundo lá fora estivesse um caos, naquele quarto, naquele instante, estávamos seguros. E isso era tudo o que importava.

James Rodriguês
00:20h - em casa, no Algarve

Todos os meus planos estavam seguindo exatamente como o esperado. Agora, só faltava levar António ao tribunal, e esse momento estava cada vez mais próximo. Ele estava vulnerável, e eu sabia que era a hora perfeita para agir. Faltavam apenas alguns dias para que tudo fosse colocado em prática.

— Então, Núria, vejo que fizeste a tua parte com maestria. Muito bem feito, na realidade. — disse, recostado na cadeira com um sorriso satisfeito.

— Sabes que eu quero conquistar o António, e a Natasha era o único obstáculo no caminho. Mas agora, esse problema está resolvido. — respondeu Núria, com um olhar frio e determinado.

— Excelente. Rafael, o que achas disso? — perguntei, voltando-se para o homem sentado à frente da sua secretária.

— Não tenho limites, senhor. Faço o que for necessário. Não sou de recuar, seja qual for o plano. — disse Rafael, com um tom de voz firme, enquanto ajustava a gravata.

— Somos predadores disfarçados atrás de gravatas, aguardando apenas que o elo mais fraco ceda. E este foi o momento certo. — disse, com um sorriso calculista. —Quanto à Natasha, aqui está o próximo passo. Tenho uma passagem de ida para Espanha e duas de volta para cá. A tua missão é simples: trazes Natasha de volta e fazes o que sabes fazer melhor. Sei que Enrique já não está ao lado dela. Isso facilita as coisas.

— Considere feito, senhor. António não desconfiará de nada. — respondeu Rafael, pegando o envelope com os bilhetes.

— Muito bom. Com isso, todos estarão exatamente onde devem estar, e finalmente o jogo será nosso.

James olhou para Núria, que sorria de forma satisfeita. Ele sabia que ela era uma peça essencial no plano, tão astuta quanto ele.

— António nunca saberá o que o atingiu. O que vocês estão a ver agora é apenas o começo. Posso ser mau...mas ainda posso ser muito, muito pior. — disse, deixando escapar uma risada amarga.

Posso ser mau mas ainda posso ser bem pior!

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