Capítulo 39 - Serena
- Não estou de acordo sobre a gente ter vindo aqui. – Sarah murmurou, caminhando ao lado dela em direção a recepção do prédio de Bia.
Serena se deteve na frente do elevador, posicionado na parede central do térreo composto de poltronas modernas e plantas ornamentais.
- Não precisa estar comigo. Sabe disso, não é?
- Eu sei, e já disse que estou com você pra qualquer coisa. – a mão lhe deu um apertão solidário no pulso, antes de voltar a rigidez e soltar: - Só estou avisando meu posicionamento.
- Eu escutei da primeira vez, Sarah. – Serena a lembrou de quando, naquela manhã, elas haviam tido a mesma discussão a caminho da casa de Bruno.
A amiga assentiu, observando-a acionar o elevador. Ainda assim, o cenho franzido indicava que não havia esquecido o assunto.
Finalmente dentro, Sarah recomeçou:
- Só acho que está procurando mais motivos para se entristecer. – a amiga a encarou, procurando por alguma coisa em sua expressão. E quando não encontrou, suspirou derrotada. – Isso não é certo, Serena. Já se foram duas semanas. Duas! A Luna está batendo na porta, e ficar correndo atrás de Bruno não é o que deveria estar fazendo.
Seu coração se apertou dentro do peito, tentando esquecer aqueles quinze dias que pareciam uma noite de pesadelos sem fim.
Cada vinte quatro horas se arrastavam como se fosse o dobro, e o dobro progredia como se fosse o triplo.
Estava insustentável.
Mas, ainda que a amiga insistisse que era tortura ir atrás dele, ela precisava fazer aquilo pra se convencer de que ele estava bem e seguira em frente.
Não que não tivesse explicado um milhão de vezes. Porém, Sarah estava desesperada, se antecipando ao provável sofrimento dela em um momento tão frágil como o fim da gravidez.
E a consequência disso era a matraca que se tornava. Falando muito mais que ela, mesmo em dias aflitos onde a saudade de Bruno apertava:
- Sei que acha que errou ao não contar tudo a ele, eu sei! Mas Bruno não tem o direito de se chatear com isso. A vida toda ele escolheu se enterrar em um buraco de sofrimento, então não pode sair por aí exigindo isso das pessoas... ainda mais de você!
Serena ergueu o olhar, murmurando num tom apaziguador:
- Sarah... tudo bem.
A íris da amiga sobrou de tamanho:
- Como pode estar tão calma?!
- Eu não estou calma, Sarah! Esse sentimento é algo que não existe há séculos dentro de mim! - revolta faiscava dentro dela ao mesmo tempo em que se esvaia a cada palavra que os deixava mais perto de um fim: - Só estou fazendo isso porque preciso saber a verdade, entende? Tenho que seguir em frente. São duas semanas que não sei nada dele.
O telefone estava na caixa postal. A casa, fechada. As redes sociais, desativadas.
Onde estava Bruno?
- É porque ele está fazendo exatamente o que te falou: dando um tempo!
- E isso significa o quê? Acabou?!
- Serena, Serena... Isso está muito longe de acabar! O problema é que Bruno demora muito tempo pra processar tudo. - Sarah comentou. - Por isso que digo: enquanto isso, segue a sua vida. Aquele homem está apaixonado e vai voltar.
Ela meneou a cabeça repetidas vezes. Em resposta, a psicóloga soltou um resmungo.
- Não estou entendendo o que quer descobrir...
Serena sentiu os olhos encherem-se de água, o coração latejando de saudade. Ainda assim, respirou fundo e saiu do elevador quando este se abriu, deixando-as no corredor do apartamento de Bia.
- Quero saber se ele seguiu em frente.
- É lógico que não, Serena! – a amiga abriu os braços. – Basta ver o desempenho dele nos jogos: em duas semanas, Bruno foi de titular à reserva.
Ela uniu as sobrancelhas para algum ponto do carpete creme em que caminhavam.
- Não consigo entender que lógica sentimental você vê nisso...
Sarah ergueu os braços, balançando-os em irritação. Provavelmente, se Serena não estivesse ali, a psicóloga continuaria naquele gesto por muito tempo.
Porque se ela não estava bem, a amiga estava uma pilha de nervosos.
A aceitação do término do casamento parecia um grau que jamais seria atingido. Pelo menos, não enquanto ela se sentisse dividida entre Dodô e Guilherme.
Serena a cutucou, trazendo-a de volta para o presente.
- Desculpa... é que o Bruno é o futebol. - Sarah inspirou pesadamente para se recompor - De todos os jogadores com quem trabalhei no clube, ele era um dos poucos que não conseguia dividir vida pessoal e trabalho. Então o que acontece em um, reflete no outro.
Ela mordeu os lábios, assentindo.
Mas Sarah não ouvira a ligação dele antes da visita que mudara tudo.
Serena se lembrava de ouvi-lo falar para uma mulher: "Aline, me devolve o celular. Não tô no clima". E a resposta atiçava ainda mais a pulga em sua orelha: "Poxa, fico meses fora e é assim que me recebe?!"
O pior é que, a última discussão que tiveram fora tão acalorada e seguira rumos tão distantes do que previra, que mal pudera tocar no assunto.
Porém, se Bruno não tivesse sozinho, mas sim com aquela mulher...muita coisa se explicaria. Por exemplo: seria um motivo para que ele pensasse que ela e Renato pudessem estar juntos, não? Exatamente como aquele ditado popular: "o mau do ladrão é pensar que todo mundo é igual a ele." Porque ela jamais o trairia, mas pra Bruno essa sempre fora uma possibilidade real.
Sarah cortou seus pensamentos:
- Ah não!
- O quê? Eu não disse nada!
– Nem precisa! - a psicóloga massageou as têmporas com o semblante descrente. - Não acredito que a verdadeira razão de estarmos aqui é aquela ideia absurda de traição.
- Não é absurda, ok?! Eu escutei com esses ouvidos. – ela apontou para as orelhas quando finalmente estavam na porta da cunhada. – Você se recusa a conversa comigo sobre isso! Não tenho escolhas a não ser perguntar pra Bia.
- Eu me recuso porque não é o que está acontecendo!
Serena se virou para a amiga de braços abertos.
- E como você pode ter certeza disso?!
Sarah baixou a cabeça.
- Eu tenho certeza porque uma pessoa que traiu ou quer trair, tem comportamentos como o meu: às vezes evasivo, às vezes meloso... mas sempre distante.
A boca de Serena se abriu. E não era porque queria falar algo. Era porque estava completamente surpresa pela informação.
- E o motivo para que eu continue nesse limbo deprimente é a culpa... por Dodô estar certo. Pronto, falei – a psicóloga completou com lágrimas nos olhos. Contudo, antes que Serena pudesse perguntar mais, completou: – Mas apesar de Bruno ser quem é, ele não...
O tranco da porta sendo aberta as interrompeu. E uma Beatriz descabela surgiu com o semblante alarmado.
- Meu Deus! Achei que estivesse acontecendo uma briga no corredor... - A cunhada levou a mão ao coração. Então, como se desse uma segunda olhada em Serena e enfim a identificasse, tomou outro susto. – Serena?! O que você e Sarah estão fazendo aqui... aí, não. Eu não sei aonde o Bruno está!
Serena e Sarah piscaram, ainda atordoadas pelo rompimento da conversa anterior para se situar naquela.
Foi Serena quem primeiro se manifestou depois de um longo suspiro:
- Não viemos só por isso...
Bia as encarou com o olhar semicerrado e deu passagem à elas.
- Venham, entrem! Só não reparem na bagunça. Estou com um processo que está me tirando o sono...
Elas acompanharam a cunhada para a sala que era uma mistura de brinquedos e papéis espalhados. Bia sorriu amarelo, catando algumas coisas do sofá e empilhando-as em um cesto situado no canto do cômodo.
Meia hora depois, estavam as três sentadas no estofado marrom com xícaras de café nas mãos, assistindo com tédio um programa de cozinheiros que ensinava uma receita de rolinhos primavera.
Sarah soltou um resmungo:
- Nunca gostei disso.
- Sério?! Eu acho tão saboroso. – Bia comentou com pesar.
Serena pigarreou, chamando a atenção das duas para o que tinha pra dizer. Porém Bia a interrompeu, encarando sua barriga gigante:
- 9 meses, né?
Serena confirmou com um acenar e um sorriso ansioso. A cunhada emendou outra pergunta. Só que, dessa vez, não tinha nada a ver com a gravidez:
- E...Hector? – Com Bia era sempre direto ao ponto, não importava quanto o assunto fosse desconfortável. – O Bruno conversou comigo.
Sarah pendeu a cabeça e perguntou com desconfiança:
- E não te falou onde estava?!
Bia suspirou e deixou a xícara de café na mesa de centro.
- Me desculpa, Serena... Sim, ele falou. Mas como sabe que sou péssima com segredos, me avisou para não contar a ninguém. – a cunhada pegou sua mão livre. – Isso o que estão passando é péssimo, e pelo seu estado... – o olhar se deteve no rosto dela. Provavelmente nos olhos inchados que a maquiagem mal feita não conseguira esconder – Ambos estão sofrendo. Então estou perguntando sobre Hector porque não vejo a hora de ficarem juntos novamente.
Serena engoliu em seco, tomando fôlego antes de prosseguir:
- Não é tão simples assim. Sobre o Hector, o que eu precisava para me livrar de uma vez por todas... não sei se vou conseguir – ela piscou os olhos marejados, guardando as lágrima de frustração. – E sobre Bruno... – até o nome dele doía dizer. – Na última vez em que nos falamos...
- É, eu sei. Ele me contou as coisas absurdas que tem na cabeça. Tão absurda quanto os monstros que Miguel jura que tem debaixo da cama.
Sarah riu baixinho da analogia de Bia. Mas a alegria logo se dissipou quando Serena prosseguiu:
- Eu desisti de procurar o que precisava para não ter mais problemas com o Hector.
A desistência não fora uma decisão tomada a cargo do problema com Bruno. Mas sim de Renato, agora inimigo de Hector, que descobrira que o jogador se livrara do vídeo orquestrado para prender Bruno.
Porém, havia um lado bom.
Ela já estava a meio caminho andado na estrada da liberdade: com o acordo feito, a certidão de divórcio estava sendo elaborada. E o fatídico exame já expunha o resultado para paternidade do ex-marido: negativo.
Como esperado.
Além disso, o ex até voltara pro Sul. Com certeza percebera que, depois do rompimento real dela e Bruno, não havia mais nada pra ser feito.
Serena ergueu os olhos, encarando Bia e Sarah. As duas tinham expressões tão cabisbaixas que pareciam prestes a cair no choro com ela.
- Tudo bem... – Bia ia dizendo, quando um menininho de pijama entrou na sala massageando os olhos.
- Mamãe, você pode fazer um nescau... - Miguel largou a preguiça para abrir um sorriso para as visitantes, gritando: – Tia Serenaaaaa
Serena abraçou o menino que tinha os cachos revoltados e amassados. Depois de um beijo na testa, Miguel se aninhara no seu colo, erguendo o olhar atento para perguntar:
- Por que está tão triste, tia?
- Ah... eu não estou triste não.
- Está sim. E o tio Bruno também... É por isso que ele está morando no centro de treinamento?
- MIGUEL! – Bia soltara um grito, assustando o garoto que prontamente se colocara de pé.
- O que mamãe?! Você também já colocou o papai pra dormir na casa da vó Inês uma vez, lembra?
Sarah levou a mão à boca, abafando um riso. Bia enxotou Miguel pra cozinha, para que este tomasse o café da manhã caladinho e longe dos adultos.
- Meu Deus, se Bruno souber vai me matar... – a cunhada voltou pra sala, fechando uma porta de correr que dava para cozinha.
Serena sorriu triste.
- Está tudo bem. Não vou atrás dele, só queria saber onde está.
- Pensando bem, foi até melhor assim. – Bia concluiu com um gesto. – E digo mais! Ele está no centro de treinamento porque não aguenta ficar em casa sem você.
- Viu, Serena?! – Sarah complementou, apontando com fervor em sua direção – Bia, é só ela que não percebe que Bruno pode usar a armadura mais dura que tiver, que ainda assim vai ser uma manteiga por dentro.
- É verdade. - A cunhada acenou em confirmação. – E como meu irmão sempre achou que o futebol fosse sua verdadeira casa, não me surpreendeu que ele preferisse ficar no CT em vez de alugar um lugar.
Sarah comentou:
- E outra, o fato dele ter virado reserva, só mostra o quanto não sabe dividir profissional do pessoal...
Serena franziu o cenho. Bia se adiantou em perguntar:
- Como assim?!
- Bruno estava convencido que havia algo entre ela e Renato. Então, ter se tornado reserva nada mais é do que uma causa e efeito: ele também acha que se tornou segunda opção no relacionamento com a Serena.
Ela revirou os olhos, cansada de toda aquela psicologia. Mas Bia não, porque levantou as sobrancelhas e exclamou:
- Nossa, isso faz todo sentido!
Sarah assentiu, pronta pra continuar:
- Sim, e...
- Gente! – Serena cortou a conversa.
E somente quando o olhar da cunhada foi pra cima, notou que tinha dado um pulo do sofá. Ela trocou o peso dos pés, se preparando pra finalmente manifestar o motivo que a tinha conduzido até ali.
- Eu preciso saber de uma coisa.
- Ok... - Beatriz murmurou com receio.
- Aline.
Bia franziu o cenho.
- Quem?!
Serena suspirou, observando que havia colocado os pés entre as mãos, jogando o nome de alguém sem nenhum motivo aparente.
- É que antes da minha discussão com Bruno, ele me ligou. Mas quando atendi, o ouvi dizendo: "Me devolve, Aline. Não tô no clima". E ela respondeu: "Poxa, eu fico meses fora e é assim que me recebe?!"
Beatriz comprimiu os olhos, como se estivesse averiguando um documento complexo. Porém, depois de alguns segundos, perguntou:
- E depois, o que ele disse?!
- Nada, desligou.
De repente, Bia também deu um pulo do sofá, andando de um lado a outro com o indicador erguido.
- Não, ele não teria coragem...
- Bia, eu tenho quase certeza que não é o que parece. – Sarah meneou a cabeça, a preocupação evidente na voz.
- Mas e essa conversa, Sarah?! Não é normal! – Serena estava se irritando com a conclusão da amiga. - Se fosse com você, o que imaginaria?!
- É... dessa vez tenho que concordar com Serena. Essa resposta do Bruno foi péssima. Ele disse "não tô no clima". Mas e agora, será que está?!
Os olhos de Serena se arregalaram enquanto o coração retumbava. Sarah cruzou os braços:
- Você está dando corda à esses pensamentos infundados, Bia...
- Eu estou sendo franca, Sarah!
Serena pegou a xícara de café, colocando pra dentro o líquido já frio com um só gole. Todo aquele papo estava lhe dando calafrios e rebuliços no estômago. Até as costas começavam a doer.
- Aline... esse não é o nome daquela repórter do premiere?! – a cunhada perguntou, tirando uma confirmação receosa de Sarah. – Eles ficavam antes, não é? Toda aquela melação dela com ele nas entrevistas me dava nojo.
- Bia! – Sarah repreendeu.
Serena pegou a xícara inacabada de Sara, e também virou. No entanto, um líquido morno molhou seus pés.
Toda a atenção se desvirtuou da conversa para seu corpo.
Serena seguiu o caminho molhado com os olhos, levando algum tempo para perceber que não fora o café que derramara.
Sarah abriu a boca, levando as mãos à cabeça:
- Ai. Meu. Deus.
Mas foi Bia quem deu o veredito:
- Sua bolsa estourou, Serena. A Luna está vindo.
Eita que saiu mais um cap, pessoinhas! E essa separação meio abrupta entre nossos protagonistas? :(
Esse terminou com uma certa expectativa, mas o próxima trará tensão... hehe Além disso, o nascimento de Luna guarda fortes emoções. Eu estou tão ansiosa aaa
Obrigada por acompanhar esse casal, e não se esqueça da estrelinha!! <3
Não está revisado.
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