Capítulo 34 - Serena
- Ela está acordando. – uma voz disse ao fundo.
- Ah, acordou! – outra pessoa murmurou – Viu?! Eu disse que era pressão baixa! Minha filha teve isso na gravidez.
Serena franziu o cenho, se esforçando para abrir os olhos. Porém, a claridade em contraste com a visão nublada a confundiu, levando um tempo para revelar uma das duas sombras: Silvana.
Sentando-se com dificuldade, os últimos acontecimentos retornaram, pesando como uma tonelada em sua coluna.
- Com quem você estava falan...- os olhos dela o encontraram – Renato?!
Serena bufou de irritação, se ajeitando no que identificou ser a cama de Bruno.
- Eu já disse que não quero te ver. Você poderia fazer a gentileza de se retirar, por favor? – tentou soar gentil enquanto a raiva se expandia.
Silvana olhou na direção do jogador, como quem diz "eu avisei". Renato meneou a cabeça.
- Não vou sair daqui até que você me escute, Serena.
- Eu não sou obrigada a te escutar, muito menos a te ver! - Ela exclamou, perdendo a paciência. – Vá embora!
Silvana resolver se manifestar:
- Menina, eu não sei o que aconteceu e confio totalmente no seu julgamento de este homem aqui não presta. - ela apontou com desgosto para Renato - Mas olha só: ele disse que tem uma ideia de como tirar você das garras daquele doido. Não vale a pena escutar?
Serena encarou a governanta e depois Renato, que suplicava através do olhar.
- Ele me usou e me enganou. - explicou. - Não vale a pena.
- Tem certeza? - Silvana se levantou com uma das mãos na cintura - Eu acato qualquer decisão sua. Até enxoto ele daqui com a vassoura, se quiser.
Renato interviu.
- Serena, por favor. Eu sei que traí sua confiança, mas somos amigos.
- Como pode falar de amizade depois de tudo?! - estava perplexa – Quem pode dizer que alguma coisa vinda de você foi sincera?!
- Eu. – Renato bateu no peito. – Posso ter sido um filho da puta, mas a amizade que nutri com você foi verdadeira.
Serena meneou a cabeça, se negando a acreditar.
- Por favor, só me escute. Vou te contar toda a verdade, e depois direi o que sei sobre o que Hector quer e a forma que encontrei de te tirar dessa. Se ainda assim você não acreditar, e não quiser me ver nunca mais... Eu sumo da sua vida.
Ela o encarou por alguns segundos, percebendo a determinação com que a observava.
- Tudo bem. - murmurou resignada, se agarrando a possibilidade de nunca mais vê-lo.
Silvana pareceu ter suspirado de alívio, e pelo modo afoito como se movia, era possível perceber seu desespero por qualquer solução.
- Vou deixar vocês conversarem. – a governante se retirou, mantendo a porta aberta. – Qualquer coisa, grita. Eu venho correndo!
Silvana mal saiu e Renato se virou pra ela, confessando:
- Bruno estava certo sobre mim. - A expressão dele se retorceu por um momento. – Fui um canalha com minha ex-mulher e a traí diversas vezes. E quando soube que ela ficou com Bruno, enlouqueci. Pensei que ele tivesse seduzido ela, e... droga. Fiquei com tanta raiva, que só de vingança, retomei o relacionamento para traí-la novamente.
Serena ficou boquiaberta, o estômago se retorcendo numa mistura de nojo e espanto. Ele engoliu em seco e retomou:
- No dia em que te conheci, percebi que poderia te usar para atingir Bruno. Você estava tão concentrada em ver o bem, que nem pensou que eu poderia lhe fazer mal... - Renato inspirou fundo, como se tivesse dificuldade de respirar - Era a oportunidade perfeita para se vingar dele. Então...
- Você estava tentando ficar comigo para irritar ele?!
- Eu errei, Serena! – ele murmurou, se encolhendo. – Te conheci melhor e vi que era uma pessoa encantadora. Tem o coração mais gigante que encontrei, e não merece que ninguém lhe faça mal. - os olhos claros dele recaíram sobre ela. - Eu desisti de me vingar. E só de ser seu amigo...juro, eu já estava feliz.
A declaração só a deixou mais confusa.
- Por que ajudou o Hector?
- Porque quando eu percebi que sua amizade bastava, era tarde demais... – ele balançou a cabeça. – Quando saímos para jantar, deu tudo errado. Eu não fazia ideia de que Rebeca estava sofrendo daquela maneira e queria descontar em você. – as mãos deles repousaram sobre os joelhos. – E quando Bruno chegou e ficou puto comigo, eu finalmente percebi o que estava acontecendo.
Serena franziu o cenho, se irritando com o suspense. Antes que perguntasse, Renato abriu os braços, esclarecendo:
- Rebeca estava irada porque achou que você afastou Bruno dela, dando o golpe da barriga nele. Mas estava claro que, na verdade, Bruno não só se importava com você, como também estava apaixonado.
Serena sorriu ironicamente.
Ela sabia que Bruno se importava e queria ficar com ela, mas apaixonado ainda era difícil de acreditar. Até porque, sendo ele tão sincero, era provável que já tivesse dito.
- Renato, se você veio se justificar com outras mentiras...
- Serena, vamos ser sinceros: vocês são loucos um pelo outro. Independente de qualquer mentira ou verdade que Rebeca jura que há na história de vocês, o sentimento que sentem é muito maior. – a voz dele estava firme. – Isso está claro pra todo mundo.
Serena pigarreou, sentindo as maçãs do rosto queimarem. Renato recomeçou:
- O que importa é que Bruno ficou tão puto por causa do que Rebeca fez, que destruiu todos os mantimentos do bar... O pouco que tinha sobrado para continuar depois que o pai dela saiu da direção, levando quase todas as economias para tratar da saúde.
Serena ficou sem palavras. Ele emendou triste:
- E isso aliado ao vexame que ela deu... Rebeca está muito mal.
- O que Bruno fez não foi certo, Renato. Mas as atitudes de Rebeca também foram sérias... Eu ainda fui muito boa não dando o tapa que ela merecia!
- Eu sei, não quero justificar. - ele se adiantou. - A Rebeca está obcecada pelo Bruno, e isso está tão perigoso que já virou um caso psiquiátrico. Graças a Deus ela está em tratamento.
- Que bom. - Serena pendeu a cabeça. – Mas ainda não entendi o porquê de você ter ajudado o Hector.
- Vou chegar lá. – Renato umedeceu os lábios novamente e retomou – Não sei você sabe, mas aquele bar é a herança de Rebeca, é tudo o que o pai dela deixou depois que...
O coração dela murchou.
- O pai dela morreu?
- O câncer dele estava em metástase...foi inevitável. Ele faleceu no mês passado, e ela... – a voz dele se esvaia, embargada – Rebeca não é flor que se cheire, mas é minha amiga, entende? Ela já estava desequilibrada e com o coração partido. O falecimento do pai só a deixou mais vulnerável.
Ela viu uma lágrima solitária escapulir por um dos olhos dele.
- Foi aí que Hector viu a oportunidade. Ele queria a ajuda dela para destruir vocês. - Renato respirou fundo, afastando a lágrima. - Rebeca ia aceitar. Mas eu não podia deixar que Hector a manipulasse, ainda mais agora que ela está melhorando...
- O que vocês fizeram?!
- Eu me ofereci no lugar dela.
- Você...
- Me desculpa, Serena! Eu não podia deixar a Rebeca se envolver nisso! Já me estraguei por causa de vingança, e se tinha uma chance de evitar que ela tivesse o mesmo erro... – Renato se levantou de repente, revelando enfim: – Fiz o que Hector queria: o levei para o chá de bebê e garanti que Bruno ficasse com raiva suficiente para golpeá-lo.
Lágrimas se empoçaram nos olhos dela. Renato continuou:
- Eu sabia como isso podia ser ruim. Eu sabia! Só que não pude fazer nada, estava sem opções! Até tentei avisar Bruno e fazer com que batesse em mim, pensando que de algum modo isso evitasse que ele tocasse em Hector...
Serena piscou para dispersar as lágrimas. Renato ia prosseguir quando Silvana o interrompeu, aparecendo na frente da porta com uma bandeja e duas xícaras com líquidos fumegantes.
- É chá. Bebam logo. Estou percebendo que os ânimos estão ficando exaltados...
Eles pegaram as bebidas. Serena logo a levou à boca, provando um gole tranquilizante do chá de camomila. Contudo, Renato nem tocou no dele, voltando a falar assim que Silvana se retirou.
- E hoje, eu... – ele desistiu de ignorar o chá, se servindo às pressas. – Me ofereci para vir porque queria ajudar você.
- Queria... Então não quer mais?! - O próximo gole dela parou no ar. - Aquilo de dizer que tinha um plano era mais uma mentira?!
- Não! – ele se adiantou. – No início do dia, admito: não sabia como poderia ajudar. Mas no caminho para cá, Hector revelou algumas coisas e eu tive uma ideia.
- Isso é estranho. - Serena semicerrou os olhos. - Como assim ele ''revelou'' algumas coisas?
Ela se lembrou que, mesmo quando casados, o ex não compartilhava dos planos facilmente.
- Hector acha que eu estou ajudando porque odeio o Bruno.
- E odeia?
Ele negou.
- Hoje consigo ver que ele não teve culpa no que aconteceu. Quem estragou meu casamento anterior foi eu e minhas próprias ações.
Uma pontada de orgulho a comoveu por ver que ele reconhecia isso. No entanto, ela balançou a cabeça, afastando o sentimento benevolente e indo direto ao ponto:
- Quais são os planos de Hector?!
- Dinheiro e vingança – Renato sorriu triste. – Ele quer destruir vocês, e quer também todos os bens do casamento.
As ameaças de Hector retornaram, a fazendo abraçar o corpo.
- Ele está conseguindo...
- Não, não está. – Renato deu mais um gole. – Lembra quando Hector disse que tinha indícios de que sua filha poderia ser dele?
- É mentira! Eu já estava grávida quando aquilo aconteceu, e...
- Eu acredito em você. - a mão dele pousou em seu antebraço. - Estou querendo dizer que, quando Hector falou de indícios, minha mente logo me lembrou que hoje de manhã ele não parava de falar de um vídeo...
- Vídeo?!
- É uma filmagem de segurança privada de uma garagem - deu de ombros. - Não sei ao certo... mas parece muito importante.
Renato ia dar mais um gole, porém um estalo ressoou na cabeça de Serena, fazendo seu corpo se chacoalhar num sobressalto e esbarrar no braço dele. O chá de Renato voou, se derramando em cima de sua camisa.
O jogador afastou a xícara, se levantando de supetão com a quentura.
- Me desculpa! – Ela murmurou desesperada, o observando suspirar de dor e retirar a camisa antes que o líquido o queimasse mais - Te machuquei?!
Renato inspecionou a lombar nua e musculosa, onde havia um ponto vermelho.
- Tudo bem, já passou. - ele ainda tocava o local - Parece que eu te assustei.
- Não, você me lembrou. – Ainda que preocupada, ela se levantou eufórica, deixando a xícara no criado mudo. – Eu sei que vídeo é esse!
Renato uniu as sobrancelhas, se esquecendo da dor.
- Sabe?!
- Essa foi uma das esperanças para que eu o colocasse atrás das grades. Aquela noite que Hector falou...– ela pigarreou, reunindo forças para continuar – Aconteceu na garagem. Só que não foi da maneira que ele disse. Foi... Pior.
- Serena, posso não ter visto o conteúdo do vídeo, mas entendi o que aconteceu. Ele tem que ser preso.
Ela confirmou, sentindo o peito aberto e exposto por aquela ferida. A mera menção a fazendo retornar para memória.
- Eu ia denunciá-lo no dia seguinte. Só que... fiquei com medo.
Hector já tinha tirado o trabalho dela. O que mais ele poderia fazer se soubesse que ela o denunciou? Estava grávida e desempregada. Não queria colocar seu bebê em risco caso ele retornasse a fazer algo.
Foi assim que preferiu fugir.
E o que parecia ser uma opção covarde, se mostrou uma solução muito maior do que poderia esperar. Pois, senão fosse assim, talvez não conhecesse Bruno e a família paterna de Luna.
Afinal, o que teve com Henrique foi um deslize passageiro. E Serena tinha se convencido a somente avisar o pai e ser uma mãe solteira.
"Deus escreve certo por linhas tortas". Sua mãe sempre dizia, quando em vida. E ela se agarrara aos mínimos aprendizados para crescer com fé, erguendo a cabeça na crença de que tudo melhoraria.
Assim chegara ali.
Em um novo estado, em um outro trabalho, em uma nova família. E principalmente, em um novo amor. Podia até não ter certeza se Bruno estava apaixonado. Porém, ela não somente estava apaixonada como o amava.
Então, tudo dera certo de um jeito muito maior do que o esperado. Um jeito tão, tão grande que não poderia sequer pensar em permitir que Hector tirasse dela.
Serena ergueu os olhos que divagavam, e afirmou:
- Tenho que pegar esse vídeo.
- Foi exatamente o que pensei! - Renato concordou.
– Hector está tão convencido de que aquele vídeo pode colocar dúvida sobre a paternidade de Luna, que não percebe que é a maior prova sobre o que ele fez.
- É porque ele não acredita ter feito alguma coisa, senão o ''direito'' de marido. - Ele murmurou com uma careta. - O que o torna ainda pior.
Serena assentiu e inspirou fundo:
- Isso resolveria somente um lado do problema. Os outros... - ela mordeu os lábios.- Eu posso fazer o acordo e dar todos os bens que Hector quiser... Já estou começando de novo mesmo. - percebeu. - Só não quero guardar segredos de Bruno, muito menos me separar dele.
Renato ergueu os olhos.
- Eu sei.
- Mas se eu contar para Bruno... - ela balançou a cabeça, descrente que ele fosse se conter. Na verdade, era bem provável que Bruno explodisse e fosse atrás do ex. - Hector vai denunciá-lo e ele será preso.
- Bruno não vai ser preso.
Serena piscou.
- Como...
- Hector está ameaçando dar queixa de Bruno por lesão corporal. Mas, apenas com as testemunhas que estavam lá, jamais iria conseguir. Todos são amigos de vocês e sabem sobre as reais intenções dele – Renato murmurou. – Por isso, uma câmera estava dentro do carro.
As linhas dos lábios de Serena se pressionaram.
- Hector é doente.
Ele concordou. Porém a tocou na novamente, em tom de apaziguamento.
- Mas não se preocupe, ele não vai usar o vídeo.
Ela uniu as sobrancelhas.
- Como pode ter certeza?!
- O vídeo foi feito do meu carro, com a minha câmera. - Ele tirou o celular do bolso, balançando-o para indicar que estava ali. – Hector confia em mim porque acha que meu problema com Bruno é maior do que qualquer sentimento.
Serena o observou, uma desconfiança crepitando no âmago. Sem perceber as divagações do pensamento dela, ele continuou:
- Eu acho que a melhor maneira de você sair dessa, é fazê-lo pensar que você está dando o que ele quer: assine o acordo, faça o exame de paternidade, deixe-o pensar que se separou de Bruno. - Renato gesticulava, explicando. - Hector vai relaxar nesse meio tempo, e então...teremos a oportunidade de agir. Se pegarmos o vídeo, o prenderemos.
Ela ergueu as sobrancelhas, deixando de lado os receios para dizer:
- O jeito que você falou, pareceu fácil demais.
- Não é. - Renato riu de nervoso. - Eu não faço ideia de onde o vídeo da garagem esteja. Como também não sei se ele vai acreditar se você fingir que terminou, e se o Bruno vai entender isso sem fazer nada contra Hector. Não sei nem...
- Eu nem sei se acredito em você. – ela o cortou com a admissão. A expressão de Renato murchou.
É claro que queria uma solução para se ver longe de Hector. Contudo, Renato estava longe de ser confiável. E criar expectativas quando o risco é grande, pode ser mais perigoso do que criar esperanças.
– Por que eu deveria confiar em você sabendo de tudo o que fez?
Os olhos claros de Renato colaram nos dela.
- Eu disse toda a verdade, estou aqui pedindo desculpas e oferecendo ajuda. Mas, na realidade, deveria estar no meu primeiro dia de treino. Na minha apresentação no clube dos meus sonhos, aquele que quis jogar desde menino. – ele levou a mão ao peitoral nu. – Não estou dizendo essas coisas para que se sinta lisonjeada, com pena ou raiva de mim. Estou dizendo porque quero reparar o dano acima de qualquer coisa. Em consideração a nossa amizade, e principalmente, ao outro sentimento que tenho por você... Serena, eu te amo.
Eita que saiu mais um capzinho, hehe
Então, me digam: vocês aceitariam a ajuda de Renato? Confiam nele?
O próx cap sai logo logo com a visão de Bruno. Teremos novas intrigas e até...provações hehe
Não deixem de prestigiar estes dois com a estrelinha! Até o próximo <3
Não está revisado :(
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top