Capítulo 36
Eles passaram o resto do dia no apartamento do Lourenço, matando as saudades. Entre sexo e conversas, até o almoço foi na cama, para não perderem tempo vestindo roupa e indo na rua.
Um dia em que o coração da Bia voltou a ser leve, livre do peso que vinha a colocando para baixo o tempo todo, a sensação boa de estar com o Lourenço não sumindo nem quando a conversa retornou para o período de separação.
— Lourenço, eu não vou te fazer sentir culpado pelo que você fez nesse tempo — ela disse numa hora em que ele pareceu ficar desconfortável e antes que ele sentisse necessidade de ser mais honesto do que a Bia precisava, ou aguentaria, que ele fosse. — A única coisa que me interessa é saber se você, pelo menos, trocou o lençol.
Ele coçou a cabeça, olhando para o teto.
— Eu acho que troquei? Quer dizer, em algum momento eu devo ter trocado?
— Pelamordedeus! — A Bia se preparou para pular da cama, mas foi interrompida pelo namorado a segurando e se deitando por cima dela.
— É claro que eu troquei! — Ele deu uma gargalhada. — Tá limpinho, olha.
Ele levou a ponta do lençol até seu nariz. Ela respirou fundo o cheirinho de amaciante, ao mesmo tempo em que tentava se decidir se não tinha enlouquecido de vez por estar brincando com o fato de ele ter levado outras mulheres para aquela mesma cama, enquanto ela não conseguia nem pensar em outro cara. Mas ele era homem, e eles eram assim. Ou talvez, não fossem todos os homens. Talvez fosse o Lourenço, mas entre ficar magoada com circunstâncias que ela não podia mudar e deixar claro que, brincadeiras à parte, ela não ia tolerar uma recaída, a Bia preferia a segunda opção.
Ela segurou o queixo dele e o obrigou a olhar para ela.
— Falando sério, agora. O que aconteceu antes, não interessa, mas daqui pra frente, sim. Daqui pra frente, tudo o que for importante, ou afetar nós dois, a gente não vai esconder um do outro. Eu não vou te dar outra chance, Lourenço.
— Eu não vou precisar de outra chance — ele assegurou, o tom de voz solene.
Os dois selaram o pacto com um beijo que afastou de vez todas as inquietações da Bia e fizeram da tarde que se seguiu a melhor da sua vida.
A movimentação pelo quarto a despertou de um cochilo gostoso, e ela sentou na cama esfregando os olhos.
— Já tá na hora de você ir pro bar?
— Ei. — O Lourenço se aproximou com a calça do uniforme aberta e a camisa desabotoada e deu um beijo nela. — Eu tentei não fazer barulho, foi mal.
— Não tem problema. Eu tenho que ir pra casa.
— Por que você não fica? — Ele colocou a mão no ombro dela e não a deixou se levantar. — Os seus pais não estão viajando?
Ela retirou a mão dele e deu um beijo, antes de ficar de pé. Ele estava com os cabelos molhados e com cheirinho de sabonete, enquanto ela estava suada e com cheiro dos dois.
— Eu também preciso de um banho. E trocar de roupa.
— Roupa pra quê? — Ele enfiou o rosto no pescoço dela e inspirou fundo. — E se você quer tomar banho, aqui em casa tem banheiro, sabonete e toalha, e... droga! Eu devia ter te acordado pra tomar banho comigo.
— Devia — ela concordou com um gemidinho ao receber uma mordida de leve no ombro.
Ela nunca tinha tomado banho com ninguém, mas sua imaginação a encheu de arrepios e fantasias de corpos molhados e mãos escorregadias.
— Eu volto mais tarde — ela prometeu. — E fico a noite toda, e amanhã a gente toma banho junto, mas você tem que prometer que vai esfregar as minhas costas.
— Eu esfrego tudo o que você quiser, minha linda.
Ele a puxou, se colando a ela, e como podia ser que tudo o que ela queria, era cair de volta com ele na cama, mesmo depois de ter tidos tantos orgasmos que tinha até perdido a conta?
— Se a gente continuar, você vai chegar atrasado. — Ela agarrou as abas da camisa dele, esperando permissão para empurrá-la por cima dos ombros e deixá-la escorregar para o chão.
Para a tristeza dos dois, ele deu um passo para trás.
— Eu não posso vacilar.
Frustrada, mas entendendo o lado dele, a Bia vestiu a calcinha e a blusa e revirou o lençol procurando pela saia, enquanto ele terminava de se arrumar.
— Espera. — O Lourenço saiu do quarto e voltou com a saia na mão. — Você pode vir mais cedo, se você quiser, e me esperar no bar?
— Eu achei que você não me queria no seu trabalho? — Ela terminou de se vestir e o olhou com a testa franzida.
Ele desviou o olhar e suspirou.
— Você sabe porque eu não te queria lá. Não tem mais problema.
— Você disse que trocou o chip do seu celular pra não ter ninguém te procurando, mas as pessoas não vão te procurar no bar?
— Já estão me procurando. — Ele sentou na cama para calçar o sapato e ela sentou do lado dele. — E eu tô dizendo que eu larguei a parada. Eu sei que não é a situação ideal, mas eu preciso desse emprego. Eu preciso me aproveitar que o Toninho é meu cunhado e não vai poder me despedir sem a Mari desconfiar de alguma coisa.
— Não era pra ser o contrário? O Toninho te despedir se descobrisse o que você fazia antes? Que motivo ele tem pra te mandar embora se você continuar a ser um bom garçom?
— Ele não receber a comissão que eu pagava pra ele todo fim do mês? — O Lourenço desviou o olhar dos laços do sapato e a encarou.
— Você tá falando sério? — Ela realmente precisava começar a maldar mais o mundo e parar de se surpreender com até onde as pessoas eram capazes de ir por ganância. — E a sua irmã não sabe de nada?
Coitada da Mariana. O Lourenço estava disposto a mudar, mas o Toninho era um cafajeste irrecuperável.
— Nem desconfia. — O Lourenço segurou as duas mãos dela entre as dele. — Não é uma parada que me deixa orgulhoso, mas eu tenho o rabo preso com o Toninho, ele tem comigo e ninguém conta nada pra ninguém. Se eu pudesse, eu saía de lá, mas eu não posso. O meu patrão da academia deve me dispensar quando eu avisar que ele também vai perder a comissão e eu preciso ajudar a Mari e a Alexa com pelo menos um pouco de grana.
A Bia começou a enxergar as ramificações do que o Lourenço enfrentaria. Mesmo que ele não estivesse dando aquela reviravolta na vida só por ela, que fosse o melhor para ele em todos os sentidos, ela não conseguiu não se sentir culpada.
— Escuta, se precisar, eu converso com o meu pai — ela ofereceu. — Ele conhece muita gente, alguém pode te arrumar um emprego.
— Não. — O Lourenço foi firme na recusa. — É melhor não meter o seu pai nas minhas confusões. Não se preocupa, eu vou dar meu jeito.
— Eu sei que você vai. Você tem potencial pra fazer tudo que você quiser fazer. — Ela se inclinou para frente e deu um beijo na bochecha dele. — Mas lembra que eu não sou sua namorada só pra dividir sua comida e sua cama. Seus problemas também são meus, e se você precisar de ajuda, eu tô aqui.
Ele a olhou com uma emoção diferente nos olhos e colocou uma mecha do seu cabelo atrás da orelha, sem precisar expressar em palavras como o que ela tinha falado o tocou fundo. O mundo parou de rodar por um momento enquanto eles se encaravam.
— Obrigado, minha linda. — A voz dele saiu meio arranhada e foi a vez dele se inclinar e beijar sua testa, se demorando por alguns segundos. Quando ele chegou para trás, parecia recuperado. — Eu preciso da sua ajuda pra não chegar atrasado, então. Me dá uma carona?
— Só se for agora.
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Um banho e uma troca de roupa não eram os únicos motivos para a Bia ir em casa. Deixar todo mundo saber que ela e o Lourenço tinham voltado a namorar, teria que ser feito com cuidado. Ela precisava pensar muito bem em como convencer o Fred e a Vivi de que a mudança dele era verdadeira. Por isso, por um tempo, era melhor manter a volta em segredo e não levantar as suspeitas de ninguém, o que com certeza aconteceria se ela começasse a se comportar diferente do que vinha fazendo.
Ela não se furtava a enxergar como era hipócrita da sua parte fazer com a família a mesma coisa que ela tinha pedido para o Lourenço não fazer com ela, mas enfrentar a Vivi exigiria preparação.
A Bia entrou em casa e encontrou o Fred na cozinha.
— Nossa! — ela exclamou ao ver o irmão de terno e gravata. — Qual a ocasião especial?
— Eu vou com a Roberta no casamento da prima dela — ele respondeu antes de enfiar o último pedaço de um sanduíche na boca.
— O negócio tá sério, hein? Casamento de família e tudo. — A Bia pegou uma maçã da fruteira e foi até a pia lavá-la.
— Ela mandou te convidar, mas você sumiu o dia todo. — Ele jogou o prato sujo dentro da pia. — Não dá pra te esperar, mas se você quiser, eu te mando o endereço da festa e você encontra com a gente lá?
— Agradece a Roberta por mim, mas eu vou numa festa na casa da Júlia, da faculdade. E não se preocupa comigo, eu acho que eu vou dormir na casa dela.
A Bia mordeu a maçã, sem conseguir olhar para o irmão. Repetir a mesma história para a Vivi não seria tão difícil. Mentir via mensagem de celular era sempre mais fácil que cara a cara.
— Não é por causa de mim e da Beta, é? A gente se comportou direitinho a noite passada.
— Mas se eu não estiver aqui, vocês não precisam se comportar. — Ela não conseguiu segurar o sorriso, ainda sentindo no corpo as vantagens de se ter um namorado e uma casa inteira à disposição.
— O seu dia deve ter sido bom. — O Fred passou a mão no rosto da irmã. — Você tá sorrindo, e aquela ruguinha que você tinha bem aqui... — Ele colocou o dedo entre as sobrancelhas dela. — Sumiu.
— O meu dia não foi dos piores.
— E tomara que a noite seja melhor. — Ele beijou o rosto dela. — Eu já tranquei tudo aqui em baixo, você só se preocupa com a porta da frente. Se precisar de mim, me liga.
Ela precisaria ser melhor atriz se queria esconder o Lourenço. Com o peito apertado por estar mentindo, ela se consolou com a justificativa de que seria apenas por um tempo, e se ela contasse a verdade para o Fred, ela não poderia passar a noite com o Lourenço.
O que tinha parecido impossível naquela manhã mesmo, estava para acontecer, ela acordaria com os beijos e abraços do namorado.
Quem não faria a mesma coisa?
Horas depois, ela já tinha esquecido a culpa, ansiosa para rever o Lourenço, enquanto esperava por ele depois de mandar uma mensagem avisando onde estava estacionada. A Bia tinha tomado tanta raiva daquele bar, que não quis chegar nem perto.
Ele não demorou a abrir a porta e se juntar a ela.
— O Shrek e a Fiona ficaram chateados por você não ter ido dizer oi — ele disse depois de lhe dar um beijo.
— Da última vez que eu vim aqui, um foi me entregar pra você e o outro me colocou pra fora. — Ela ligou o carro e saiu da vaga.
A Bia não tinha muitos problemas com o Shrek, mas a fofoca do Antônio ainda a chateava, principalmente agora que ela sabia a razão de ele ter ficado preocupado com a sua presença.
— Eu tô lembrado de você se oferecer pra ser expulsa. — Ele deu uma risada. — E o Antônio sempre defendeu você, lembra? Ele te avisou que você era boa demais pra mim.
Grandes coisas. E os dois não deviam ser tão inocentes na história. Provavelmente ganhavam comissão também, e ela queria distância de todo mundo que se aproveitava do que o Lourenço fazia antes. Para não esticar o assunto e correr o risco de estragar a noite, ela mudou o foco da conversa.
— A pizza é pro seu irmão? — Ela apontou para a caixa na mão do Lourenço. — Você vai querer ir comer depois de levar pra ele?
— A pizza é pra nós. O Mermão sumiu. De vez em quando ele faz isso, daqui uns dias ele aparece.
O tom de voz preocupado foi comovente, mas não a ponto de ofuscar o alívio da Bia em não precisar ouvir como as outras que o namorado levou para casa eram mais bonitas que ela.
A Bia entrou na rua do Lourenço sem imaginar que escutar um comentário sem noção não seria nada perto do que o que os esperava.
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