CAPÍTULO 27

Radishi e Roubert mal tiveram a oportunidade de conhecer Audilha. Estavam em um bosque a norte da vila, num vale entre dois morros altos, quase montanhas. Perto de onde estavam, corria um riacho cujos sons podiam escutar. Muitos insetos tornavam aquela noite um tanto ruidosa. Estava um pouco frio e úmido, ainda assim, os ares eram agradáveis.

Estavam bem quietos, e comiam queijo seco oferecido pelo Cavaleiro Vermelho. Sentavam-se sobre grandes pedras cobertas por musgo macio e levemente escorregadio. O pouco de iluminação com que contavam partia da bela espada carregada pelo Cavaleiro Vermelho. Uma fraca chama rodeava a lâmina que repousava sob a pedra ao lado de seu dono.

O misterioso cavaleiro, não falava muito, conseguia até ser mais quieto que Roubert. O máximo que Radishi conseguiu tirar dele foi, – Vamos esperar aqui. – Logo depois ele se recostou na pedra, sem retirar o elmo e ficou muito quieto, parecendo dormir.

O bosque era pouco denso e podiam avistar o céu estrelado e apreciar a beleza das luas suspensas no céu. Estavam parcialmente iluminadas, divididas exatamente no meio. Radishi e Roubert perceberam que tinham algo em comum quando se alertaram mutuamente sobre o surgimento da pequena lua azul cintilante atrás da maior lua, especialmente amarela naquela noite.

– Então conhece bem as posições das luas? – disse Radishi.

– Um pouco, gostava de observá-las do alto de certas árvores em Shind.

Quando a pequena lua azul cintilante nasceu, saindo de trás da grande lua amarelada, seu forte brilho trouxe iluminação suficiente para o tisamirense observar detalhes na superfície da armadura do cavaleiro. Além de desenhos curvos, pode observar uma série de símbolos escritos em algumas placas da grande armadura.

Um pouco distraído, teve a atenção chamada para um assobio que não parecia ter sido emitido por nenhum animal. O Cavaleiro Vermelho ergueu a cabeça que estava recostada na pedra atento em direção ao assobio.

O assobio soou uma segunda vez e o Cavaleiro ficou de pé erguendo a espada flamante acesa.

Pouco depois, Radishi percebeu sinais e pensamentos de Vekkardi aproximando-se. Estava acompanhado de uma outra pessoa desconhecida.

Para Vekkardi, encontrar-se com Radishi e Roubert, naquela ocasião, foi uma surpresa. Radishi abraçou o companheiro de viagens aliviado.

O Cavaleiro Vermelho observava quieto enquanto Will aproximou-se dando dois tapinhas na lataria avermelhada.

Radishi disse, – Modevarsh está bastante preocupado com você, caro amigo.

Will ao escutar a fala de Radishi intrometeu-se, – Desculpe-me, mas você acabou de dizer Modevarsh?

– Pois sim – confirmou o tisamirense. – Chamo-me Radishi, e este é Roubert.

– Sou Will, prazer em conhecê-lo. Se estão com o Vermelho, acho que posso confiar em vocês. Vermelho, este é Vekkardi, ajudou-me na taverna contra uns guardas abusados.

Vekkardi trocou um aperto de mãos com o cavaleiro que tinha uma pegada forte. Tinha um vozeirão abafado, – Cavaleiro Vermelho, é assim que sou conhecido.

– Acho que já ouvi algo a seu respeito, não lutou na guerra contra os bestiais há mais de vinte anos?

– Sim, é como dizem. – respondeu quase imóvel.

Ao mesmo tempo, Radishi voltou ao assunto, – Diga-me Will, por que o interesse pelo nome Modevarsh.

– Falam do silfo Modevarsh, não é mesmo?

– O próprio – confirmou Roubert.

– Fantástico! Seria possível vê-lo? Quero dizer, vocês sabem onde ele está?

Vekkardi um pouco desconfiado disse, – Por que tanto interesse pelo Sr. Modevarsh, caro Will?

A face de Will iluminou-se quando cruzou as ideias lembrando-se de Vekkardi lutando na taverna. – Oh Vekkardi, não me diga que estudou com ele!? Aprendeu o Kishar com o lendário silfo Modevarsh?

– Sim, sou seu discípulo.

– Isso quer dizer que ele está vivo?!

– Sim, estivemos com ele recentemente. – acrescentou Radishi.

– Quando escutei boatos sobre a atuação do Silfo Modervarsh na libertação de centenas de escravos nas minas próximas a Xilos, imaginei ser um boato, um exagero. Será possível?

Radishi explicou, – Verdade. Eu e Vekkardi estivemos lá também. Ajudamos no conflito contra os necromantes.

– Oh, que dia feliz! Meu coração está cheio de esperanças! Se puderem levar-me até ele ficaria muito grato e feliz.

Roubert, um pouco incomodado com tanta agitação por parte do humano disse, um pouco rude, – Compreendo humano, que meu ancestral seja velho e sábio, mas para que tanto estardalhaço? Qual o motivo de tanta agitação. É um silfo como outros tantos!

– Sim, sim. Mas também sou seu discípulo!

– Você é discípulo do Sr. Modevarsh?!” surpreendeu-se Vekkardi.

– Sim! Quero dizer, não... De certa forma...

– Como assim?

– Na verdade, nunca vi o silfo Modevarsh. Escutei muitas histórias a seu respeito, sim, muitas histórias. Meu avô, me contou tudo.

– Entendo – disse Radishi.

– Sim, meu avô, ele sim, estudou com o silfo Modevarsh, há muitos e muitos anos. Portanto, indiretamente, sou discípulo do silfo Modevarsh.

Vekkardi sentiu-se um pouco encabulado. Vira Will lutar, e logo, percebeu que ele era melhor. Como poderia? Nem mesmo estudou diretamente com Modevarsh e era melhor.

– Talvez – disse Vekkardi.

– Talvez o que?

– Talvez possamos ver os Sr. Modevarsh, mas só depois de cumprir meus objetivos.

– Será que posso ajudá-lo?

– Talvez, estou conduzindo uma investigação.

– Uma investigação em nome do silfo Modevarsh? Maravilhoso! É claro que vou ajudá-lo.

O Cavaleiro Vermelho, não gostando do rumo da conversa decidiu partir. Montou seu cavalo e disse. – Will, cuide deles. Tenho assuntos para resolver.

– Hei! Espere Vermelho, não vá! – disse Will em vão. O Cavaleiro Vermelho, continuava misterioso para Will, mesmo após acompanhá-lo por quase um ano.

Logo Will voltou-se para Vekkardi cheio de entusiasmo, – Você falava sobre uma investigação. Conte-me! Conte-me tudo.

– Claro. Outra hora.

Radishi alertou-os. – Sim, é melhor conversarmos depois. Parece que vocês dois foram seguidos. Sinto presenças malignas aproximando-se. Devemos partir de imediato!

Roubert ficou alerta e questionou, – Will, há algum esconderijo, algum lugar para o qual poderíamos ir?

– Sim. Sigam-me. Vamos até um esconderijo da rebelião. Fica além do bosque.

Não muito longe dali, um grupo sinistro discutia.

– Entraram no maldito bosque! De certo escaparão! – resmungou Clefto, cujo rosto estava coberto pelas sobras de um grande capuz.

O Cavaleiro Edréon estava impaciente e disse, – Desistindo tão fácil? Por acaso está com medo de um bando de rebeldes, necromante?

– Medo? Idiota... Isso se chama uso de inteligência. Eles chagaram primeiro e conhecem muito bem o bosque. Já escaparam diversas vezes por este maldito bosque.

– Inteligência você diz... – retrucou Edréon irônico, – Sua dita, Inteligência funcionou muito bem lá atrás... Se tivéssemos avançados com os soldados, desde o princípio, como eu queria, teríamos derrotado ao menos dois deles.

– Está tão certo disso, cavaleiro? E quanto ao Tisamirense? Acha que poderia ter lidado com ele usando a força? Teria feito com que seus soldados idiotas tivessem destruído uns aos outros, isso sim!

Uma outra voz, sinistra e dolorosa emergiu de trás fazendo com que Edréon pulasse de susto. – Na realidade, se o maldito Cavaleiro Vermelho não tivesse aparecido, com aquela maldita espada flamante, teríamos capturado o tisamirense de acordo com o desejo do senhor Arávner.

– Quem é você? Como sabe sobre Arávner? – quis saber o cavaleiro.

O estranho homem, muito magro, aproximou-se revelando-lhes as mãos. Estavam repletas de feridas abertas, com dezenas e dezenas de pequenas lascas de madeira atravessando a carne. – Sou Hendrish, o mestre da dor. – sorriu o recém-chegado.

Edréon sentiu um forte calafrio ao encarar o medonho Hendrish. Engoliu seco e disse, – O que sugere.

– Queimemos o bosque. Ele e tudo que nele se encontra. Se escaparem, ao menos será a última vez...

Clefto observou Hendrish com atenção e disse sarcástico, – Ótima idéia, meu caro. E como você espera que possamos queimar todo o bosque? Trouxe por acaso alguma poderosa e infinita fonte de energia?

– Claro que não, tolinho...

– Óleo? Traz centenas de galões escondidos em sua manga, de certo. debochou Clefto pela segunda vez.

– Chega Clefto! – gritou Edréon irritado. – Diga de uma vez o que pretende, bruxo!

Hendrish colocou uma das mãos dentro de seu manto, e após um estalo de metal, retirou um objeto que atirou ao chão.

Clefto observou a garrafa metálica com cuidado e sentiu seu coração deprimindo-se. Clefto parecia assustado, – Não está falando sério, está?

Hendrish, olhou-o seríssimo com olhos penetrantes.

– Mas, mas... – engasgava Clefto. – Não há autorização para coisa tal? Não é prudente!

– Quer ou não quer eliminar os malditos?

– Não sei, libertar um demônio, assim?

– Não é um simples demônio, é um demônio sanguinário e incendiário.

– Acha mesmo que pode controlá-lo?

– Sem dúvidas... Na realidade já usei seus serviços por duas vezes. Temos trabalhado muito bem juntos.

– Se é assim, morte aos desgraçados!

Edréon não gostou nada da conversa e afastou-se. Enquanto observava de longe, os dois necromantes evocavam a criatura das trevas, com seus cânticos nigromanticos.

A garrafa tremeu, e acompanhado seu movimento, uma ruptura partindo do mundo invisível formou-se no local.

Hedrish gritava, erguendo as mãos para o céu com olhos úmidos e vidrados. – Therd Fermem! Venha a nós Therd Fermen! Um forte vento partia do redor da garrava retirando o capuz da cabeça de Clefto e soltando mechas até pouco tempo, bem-comportadas do cabelo de Hendrish.

Clefto acompanhava a gritaria em uníssono, – Therd Fermen! Venha a nós Therd Fermen!

Logo depois uma forte explosão arremessou os dois necromantes à distância. Hendrish sentindo suas costas doendo, admirava sentindo forte prazer, a beleza que a horrenda criatura tinha a seus olhos.

Um demônio de formas e feições humanais distorcidas. Era bastante alto e subiu aos céus, impulsionado por enormes asas membranosas. Seu rastro emitia fumaça e rente a seu corpo pequenas chamas surgiam e apagavam-se sem parar. Era careca e tinha a cabeça repleta de pequenos chifres. Sua pele era enrugada, grossa como cascas de árvore e cheias de pequenos espetos. A boca enorme estava repleta de dentes pontiagudos e as narinas eram grandes buracos onde uma adaga poderia entrar sem dificuldades. Sua gargalhada horrível ecoava e poderia ser escutada em Audilha, mesmo distante.

Recebendo instruções de seus evocadores, o demônio Therd Fermem entrou voando no bosque projetando de suas mãos, boca e asas diversos jatos e bolas de fogo. Chamas tão quentes, que incendiavam com vigor tudo o que tocavam.

O bosque movimentou-se em pouco tempo. Animais de todos os tipos e tamanhos fugiam em desespero do incêndio que se alastrava veloz. As gargalhadas e gritos do demônio enchiam a noite com um terror, até então, nunca visto naquelas bandas.

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