A Dor Precisa ser Sentida

Malévola sobrevoou Moors apenas para se certificar de que nada estava tão fora de lugar. As criaturas do lugar já haviam vivido dias de dor da sua guardiã, o sentimento que ela expelia era o mesmo, só que sem ódio dessa vez, havia apenas dor e tristeza. Viram a grande e bela fada voar pelo céu e então desaparecer em certa parte dos picos mais altos atrás das montanhas. Era lá o lugar que ela e seu servo corvo viviam e era lá que ela queria estar por um tempo. Sozinha.

(...)

Já havia se passado uma semana que Aurora visitava sua Moors todos os dias em busca de sua mãe. As fadas negras que haviam estado ali para fugir da guerra na ilha sagrada já haviam partido de volta para sua terra. Malévola não havia aparecido para se despedir ou desejar boa viagem.
Phillip estava sendo preparado pelo conselho real e na sua maioria por Tenerife e o conselheiro do antigo rei, Almond Chloe, para assumir seu trono, na próxima semana. Aurora estava ainda agindo como a guardiã de Moors, apesar de já ter sido informada de que o tal guardião escolhido pela "lua" estava fazendo sua parte, guardando as fronteiras e vigiando toda Moors durante as noites.

Aurora acordou determinada no começo da segunda semana de exílio da sua mãe. Determinada a encontrar a grande fada negra e dar uma bela bronca nela por agir feito uma adolescente desamparada, sendo que ela tinha a princesa e muitos amigos em Moors, não só amigos. Aquelas criaturas eram a família dela, desde que Malévola se entende por gente sempre viveu em Moors, eles eram a sua família, independente do sangue e ela precisava saber daquilo. Se ninguém tinha coragem pra falar, então Aurora teria.

Já se passava mais que duas horas que a pequena Pinto e o Mushroom-boy iam e voltavam em Moors, até mesmo as pequenas pixies estavam na caçada. E enfim encontraram a caverna onde a fada se encontrava, não avisaram a ela que haviam encontrado, mas avisaram a Aurora e era a quem importava no momento. Aurora pegou uma carona com uma criatura alada de Moors e em poucos minutos se encontrava na entrada do lugar. Era fim de tarde e a vista dali era de tirar o fôlego. A loira nunca havia se sentido tão ansiosa. Não queria ser invasiva, e não estava sendo não é? Apenas estava preocupada com a saúde física e emocional da sua mãe. Não era errado querer saber se ela estava bem.

"Mamãe?" A loira chamou quando já havia entrado no local, o odor ali era úmido e ácido. Não era como o exterior onde o ar era limpo. Ali dentro carregava muitas coisas, era um ambiente triste, como se te empurrasse para baixo. "Eu sei que está aqui, eu preciso te ver." A voz da menina estava quebrada, ela não queria imaginar como estaria sua mãe.

"Estou aqui." Uma voz profunda soou de uma parte levemente mais iluminada da caverna.

Aurora sentiu as pernas falharem quando viu a mãe. Malévola estava acabada. Imensamente diferente da fada de uma semana atrás. Sentada no chão recostada na parede usando as enormes asas como um cobertor. As olheiras ao redor dos olhos eram enormes, os labios outrora vermelhos estavam opacos e ressecados. As asas não estavam brilhantes e limpas como costumavam ser, os cabelos emaranhados mostrando o descuido. A roupa nem se compararia, a fada estava trajada com um trapo qualquer e os ossos que sempre foram proeminentes pareciam ainda mais aparentes. Certamente por desnutrição.

"Mamãe." Aurora sentiu as lágrimas rolarem por seus olhos contra sua vontade. No momento a dor no peito da princesa falava mais alto que qualquer coisa. "Você pretendia morrer aqui?" A princesa se aproximou da outra inquisitiva. "Eu sei que você está sofrendo..."

"Não você não sabe." Malévola interrompeu a outra de abrupto. "Você nunca perdeu algo assim Aurora, eu nunca deixei que você sofresse, mesmo quando eu fingia que não me importava." Continuou aumentando a distância entre as duas. "Toda sua fome, sede, angústia, agonia, nunca foram se quer comparadas a isso, você não tem ideia de como é perder alguém."

"Eu também o perdi Malévola. Você não o perdeu sozinha, eu também o perdi." Agora foi a vez da princesa interromper a mãe. "Eu senti a dor, e estou tentando passar pelo luto e acredite em mim, seria mais fácil passar por ele se eu não precisasse desprender uma semana inteira vasculhando Moors pra encontrar você."

"Eu não pedi que me procurasse." Malévola gritou interrompendo a outra mais uma vez.

"Deixa eu te contar uma novidade que talvez você não saiba, mas é exatamente isso que famílias fazem. Buscam uns aos outros em momentos de dor, pra que possam se ajudar e é por isso que eu fiz." Aurora não conteve as lágrimas. Era doloroso discutir com a mulher que a criou. "Você não precisa ficar sozinha, se deteriorando lentamente."

"Va embora." Malévola deu as costas a menina pra que ela não fosse testemunha de suas lágrimas.

"Eu vou, assim que você me jogar do penhasco. Então eu irei pra fora como pediu. Caso contrário eu ficarei aqui até que você decida passar pelo luto ao invés de deixar ele te destruir." A loira se aproximou mais alguns passos da outra.

"Por que tudo dói praga? Porque ele precisava morrer, eu escolhi isso, eu podia tê-lo trazido de volta a vida, ele estaria aqui para ser um avô bobo e brincalhão e eu não quis." Aurora podía escutar e sentir a dor nas palavras da mãe. "Ele disse que me amava, foi a última coisa que ele me disse e eu não respondi. Ele morreu pedindo pra que eu por favor o libertasse, que o deixasse viver em paz." Malévola se virou novamente pra filha em busca de um abrigo.

Aurora abraçou a fada o mais apertado que pode, a grandiosidade que Malévola era a uma semana atrás agora cabia no colo de Aurora. O calor de outro ser era estranhamente aconchegante.

"Tudo dói mãezinha, mas vai passar. Você não fez isso porque quis, você fez porque Diaval te pediu. E fazendo o que ele te pediu na hora da morte deixou ele saber no último momento que você o amava." Ela acariciou os cabelos emaranhados. "O amava ao ponto de atender sua vontade, mesmo que isso lhe custasse tudo que você é. Você abriu mão de tudo pra atender ao desejo dele e acredite, ele te ama ainda mais agora." Malévola se permitiu soluçar e externalizar sua dor, as palavras da filha atingiram exatamente onde precisava. "Eu confiaria a você qualquer coisa no mundo. Você não é perfeita e eu também não, e se você me deixar entrar eu vou te tirar dessa. Eu não quero perder você." A princesa secou as lágrimas insistentes.

"Eu... Eu te amo. Filha." Malévola usou sua magia para recupera sua antiga aparência.

Sem sair dos braços delicados de Aurora ela reabriu as "janelas" da caverna onde estavam mostrando a beleza do lugar. Haviam várias flores diferenciadas pelas paredes, havia pedrinhas brilhantes espalhadas por alguns cantos, Aurora tinha certeza de que aquilo era arte do lado corvo de seu padrinho. O cajado que ele usava estava encostado em uma parede logo ali. Aquele lugar estava repleto de lembranças de Diaval. Era lindo, tudo bem conservado e organizado. Quando ela olhou a mãe foi que percebeu que ela havia tentado refazer sua antiga aparência, funcionou em certas partes como as roupas, o cabelo e os lábios. Mas os ossos ainda levaria uns dias.

"Me desculpa por me isolar e fugir." Aurora continuou seu carinho.

"Não precisa se desculpar, só precisa tentar melhorar daqui pra frente. Eu jamais cobraria algo de você, já aprendi minha lição." A princesa afirmou. "Você tem uma família de pequenas e grandes criaturas lá fora, você tem a mim. Nós todos amamos você e sentimos sua dor. Não se isole, nunca mais." Os cabelos que já não estavam mais embaraçados agora permitiam que Aurora fizesse um carinho mais incisivo.

"Preciso de um banho e de um café da manhã reforçado." Malévola brincou secando algumas lágrimas.

"Vou preparar o almoço, te espero em casa." A loira corrigiu a mãe.

Ainda abatida, mas levemente melhorada Aurora e Malévola se levantaram. A loira pegou uma carona com a fada até Moors e de lá seguiria até o castelo para preparar o almoço pra mãe. Malévola seguiu em direção ao pequeno lago de águas quentes que ficava num canto mais isolado da ilha. Não queria criaturinhas curiosas a olhando. Mas qualquer um podia sentir que a energia da fada estava diferente. Estavam gratos por Aurora.

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E aí galerinha, mais um fresquinho e quentinho pra vocês. Vamos reintroduzir essa família para o mundo.

Como eu disse, o fim está próximo.

Ate o próximo!
❤️

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