17. SENTIMENTOS
Volterra, ano 2052
A biblioteca do castelo Volturi era impressionante. Com mais de trezentos mil exemplares entre romances de todos os tipos, estudos sobre política, economia, história, filosofia, ciências, estratégias militares, artes, teologia, etc., era o lugar perfeito para quem buscava conhecimento.
Nos últimos trinta e cinco anos, esse era o lugar onde eu passava metade dos meus dias quando não estava em missão ou caçando.
A primeira vez que entrei na biblioteca foi três anos após minha transformação. A sede incontrolável de recém-criada só diminuiu depois do segundo ano, e levou mais um para conseguir ficar centrada o suficiente para buscar aprender outras coisas que não fossem combate físico e estratégias de guerra.
Marcus foi quem primeiro notou minha vontade de ocupar meu tempo com assuntos intelectuais. Quando humana, fui estudante de história, e o gosto por esse assunto foi uma das poucas coisas que não desapareceu com a transformação. Ele passava horas conversando comigo sobre a Grécia antiga, seu país de origem, assim como de Caius e Aro.
No terceiro ano como guarda Volturi ainda em treinamento, Marcus conversou com seus irmãos sobre me permitirem o acesso controlado à biblioteca, mesmo sendo tão nova, pois via em mim um potencial para me tornar uma líder de confiança dentro do clã, com a direção certa, é claro.
Caius já se orgulhava de ter passado meus primeiros anos me moldando como uma guerreira estrategista, fria e cruel, semelhante a ele, então não foi difícil para Marcus convencê-los de que eu seria ainda mais perigosa se treinasse também a parte intelectual.
Nos primeiros cinco anos eu fui observada, acompanhada de perto, e ao ver que minhas escolhas majoritárias de leitura eram livros de História, política, filosofia e guerras, Aro ficou feliz e passou a discutir comigo os assuntos lidos, como uma forma de maximizar os conhecimentos obtidos.
É claro que eu também lia romances. Meus autores favoritos eram Victor Hugo, Edgar Allan-Poe, Jane Austen, Mary Sheley e as irmãs Brontë. E Marcus ficava feliz em discutir as temáticas contidas nos romances, contos e poemas desses autores. Apesar de gostar de algumas das peças de William Shakespeare, eu não tinha paciência para dramas tolos e revirava os olhos com Romeu e Julieta. Adolescentes estúpidos.
A partir do sexto ano de leitura voraz, recebi permissão para tirar os livros da biblioteca e ler onde quisesse. Eu era acostumada a ler vários títulos sobre assuntos diferentes ao mesmo tempo, por isso havia um lugar especial no meu quarto para guardar os livros até terminá-los para então devolvê-los às prateleiras escuras e intermináveis da biblioteca.
Depois de cada leitura, passava horas debatendo com Aro e Marcus. Caius observava e colaborava às vezes, mas seu interesse maior eram as estratégias militares e as artes. Ele preferia observar de perto os treinamentos da guarda de elite, embora deixasse sob responsabilidade de Félix e Demetri o treinamento dos guardas inferiores.
O meu caso era diferente. Por ser criada com o veneno dele, Caius não permitiu que eu começasse como guarda inferior, mas fez questão de me treinar pessoalmente, e depois me colocou sob os cuidados de Demetri na guarda de elite.
Nosso começo em combate foi conturbado, especialmente porque Alec e Jane não eram acostumados a terem seus poderes repelidos e se irritavam com a minha habilidade única, mas não demorou a nos tornarmos amigos, pois eu era grata por eles me salvarem e eles cuidavam de mim como uma irmã mais nova.
Após dez anos desde que fui transformada, recebi minha primeira missão. Foi difícil. Eu me questionava se era certo, tinha compaixão, mas logo aprendi que não havia lugar para hesitação e pena em meu trabalho. Infratores e criminosos são nada mais que réus a serem julgados por seus atos, e eu não devia me envolver emocionalmente.
Quando completei treze anos como imortal, o presente de Aro, Caius e Marcus para mim foi abrir a sessão reservada da biblioteca, cuja chave ficava em um colar no pescoço de Aro, e me dar acesso aos arquivos pessoais sobre a história deles e do surgimento do clã Volturi.
Foi o paraíso na terra. Fiquei dias mergulhada naquela sessão, devorando cada linha, diários escritos de próprio punho pelos três, e depois passava muito tempo conversando com eles sobre os fatos ocorridos.
Quando demonstrei compaixão com a situação de Marcus por perder sua esposa Didyme, que era irmã de Aro, o irmão do meio mostrou desaprovação e me deu uma bronca pela primeira vez. Eu fiquei surpresa com o quão bravo ele ficou, e Caius também me chamou atenção por mostrar sentimentos.
— Guarde seus sentimentos para seu parceiro de vida, se um dia tiver um, e de preferência mantenha na privacidade de seus aposentos — ele disse zangado. — Você é uma guarda de elite Volturi, não uma colegial sensível apegada a sentimentalismos baratos!
Foi a única vez em que demonstrei algo além da máscara fria, insensível e desinteressada que demonstrava para todos. Com sede de provar ao Caius que eu era a executora que ele me ensinou a ser, passei a demonstrar mais frieza e crueldade nas execuções, e assim fui criando uma fama entre os membros da guarda inferior e quaisquer testemunhas dos julgamentos.
Agora não eram mais apenas os gêmeos bruxos que assustavam, e sim a executora que bloqueava quaisquer dons psíquicos ofensivos e demonstrava prazer em sentenciar e matar os réus.
Depois de vinte anos no clã Volturi, Caius decidiu que eu faria melhor o trabalho de caçadora de criminosos, e por ter pouco tempo no clã e ser desconhecida por vampiros mais antigos, eu passei a ser investigadora, para espiar clãs que oferecessem riscos para a sobrevivência da nossa espécie.
Em menos de cinco anos nesse trabalho, minha eficiência era tanta e eu era tão respeitada pelos meus irmãos e temida pela guarda inferior, que os três mestres se reuniram e conversaram conosco para que eu fosse a líder da guarda de elite. No começo, achei que isso deixaria Jane ou Demetri chateados, mas eles apenas continuaram cumprindo seus papeis e seguindo minha liderança. Jane era porta-voz de Aro, assim como eu era de Caius. Marcus não fazia questão de ter alguém que falasse por ele, então aquele grupo apenas agia como uma unidade.
Minha liderança uniu mais a guarda e fortaleceu nosso relacionamento fraterno, apesar de não se estender às esposas de Demetri e Félix: Bianca e Heidi. Elas tinham medo de mim, não importava o que seus maridos dissessem, e o fato de não gostarem muito de Alec e Jane, de quem eu era mais próxima, não ajudava.
Mas naquela semana entre a comemoração de Natal e Ano Novo, eu faria qualquer coisa para não ser a líder e, portanto, não ser obrigada a ter em minhas mãos a decisão de voltar ou não a Forks.
— Mestre Aro...
— Jane, minha querida, você tem meu apoio, assim como seu irmão, para ir atrás de sua pequena fada, mas como Bella é a responsável pela guarda de elite e a garota faz parte da família do meu amigo Carlisle, que Bella estava investigando...
— Isso não é justo! — Alec exclamou. — Mestre Caius...
— Eu já disse que essa decisão não cabe a mim, Alec. Se não é uma missão de reconhecimento, nem investigação ou execução, não sou eu que permito.
— Mas Bella está emocionalmente envolvida também! — reclamou Jane.
— Eis a questão, minha jovem — Marcus falou. — É um assunto que envolve as emoções de vocês. Nós lidamos com questões do cumprimento da lei, os assuntos pessoais são entre vocês. Bella decide se e quando vocês sairão nessa excursão.
Jane me encarou, assim como Alec. Eu apenas ignorei e fui para a sessão reservada. Não demorou a Jane me seguir.
— Bella...
— A resposta é não, Jane. Deixe os Cullen em paz. Eles já estão suficientemente magoados comigo para ainda terem que receber os gêmeos da guarda Volturi. Você não entende que eles têm medo de nós?
— Alice será minha companheira, mesmo que você tente atrapalhar, Isabella! — ela gritou com raiva, e logo a voz de Alec chegou a nós:
— Não se eu conquistar o coração dela primeiro!
Eu suspirei.
Desde a festa de Natal, quando os dois foram pedir a Aro para ir atrás de Alice, e assim descobriram que estavam apaixonados pela mesma mulher, Alec e Jane não se falavam e viviam se olhando de cara feia. Eles até chegaram a se atacar. Era um pesadelo.
Isso até eles descobrirem que era eu quem decidia, já que os mestres me colocaram como líder da elite, e aquele assunto era pessoal. Aí o pesadelo se voltou para mim.
— Vocês não vão — falei calmamente. — Já conversei com o tio Aro sobre isso. Ele me permitiu voltar quando Carlisle me chamar para me despedir do meu pai. Quando eu for, vocês me acompanharão.
— Mas Bella, isso pode demorar anos! — Alec declarou, frustrado.
— Escutem! Alice se tornou minha amiga e é quem está mais magoada comigo. Deixem o coração dela se curar antes de declararem seu amor eterno. Isso não é um jogo e vocês têm a eternidade para conhecê-la. Até lá, cuidem de lidar com suas diferenças. O que vai acontecer se ela não puder escolher ou se não quiser nenhum de vocês? Já pensaram nisso? Agora me deixem em paz.
Jane saiu com um rosnado e Alec murmurava xingamentos enquanto corria para fora.
Eu avaliei os manuscritos da sessão reservada e fiz uma careta. Já tinha lido todos eles, mas peguei um que contava a história do clã Denali, que os Cullen consideravam “primos” por causa da dieta semelhante, mais precisamente a história da execução de Sasha, criadora das russas que se consideravam irmãs. Sasha foi condenada pela criação de uma criança imortal chamada Vasilii.
Com um suspiro, devolvi o diário ao seu lugar, pois o motivo para escolher aquela história específica era o fato de Edward ter falado sobre ela para Alice e Jasper.
Coloquei a mão no peito como se pudesse aplacar a dor que se espalhava lentamente só por pensar neles. Ainda não estava pronta para enfrentá-los, por isso não podia permitir que Jane e Alec fossem até os Cullen. Isso seria como uma provocação, eles ficariam ofendidos.
Além do mais, ainda tinha a questão do meu irmão, que os gêmeos pensavam que não sabia nada sobre o nosso mundo. Se Jane e Alec chegassem lá quando Joseph estivesse com os Cullen, a situação poderia sair de controle, e Aro só não sabia que eu havia permitido uma infração da lei com relação ao Joseph porque não podia ver meus pensamentos.
Senti a presença de Caius antes de desistir de ler.
— Por que está tão sentimental? Não estou te reconhecendo, Bella.
Eu bufei.
— Não sei do que você está falando.
— Sabe sim. Desde que voltou da sua estadia com os Cullen, você está mais reservada do que nunca. Não se diverte mais nos treinamentos, não discute com meus irmãos sobre política, história ou quaisquer outros assuntos que estiver lendo. Aliás, você nem está mais lendo. E agora demonstrou preocupação com os sentimentos da garota que os gêmeos querem como companheira... Desde quando você faz amizade com imortais de clãs que está investigando?
— Eles são diferentes. A situação toda foi diferente, envolveu meus parentes humanos, Caius. Sei que não devo demonstrar sentimentos, mas isso não significa que não sinta nada. Eu desenvolvi com Alice uma amizade como a que tenho com meus irmãos, exceto que levei anos para admitir que os amo, e com Alice bastou o espaço de dez dias. Você não entende, ela é especial. Aro viu isso nos pensamentos da Jane, mesmo que a própria Jane não compreenda quem realmente Alice é.
— Se ela é tão especial, por que você não permite que seus irmãos a procurem?
Eu suspirei pesadamente.
— É complicado. Os Cullen nos respeitam, e Carlisle tem muita estima por vocês três, é claro, mas a família que ele formou não nos conhece. Sua esposa e seus filhos só sabem de nós o que se comenta por aí. Eles não nos veem de forma agradável. Na verdade, eles não só têm medo de nós, como alguns sentem desprezo pelo fato de não respeitarmos a vida humana como eles fazem.
— E ainda assim você sofre por eles? — Caius riu com desdém. — Bella, se nós não colocássemos ordem no mundo sobrenatural através de leis, viveríamos em guerra contra os humanos que eles tanto amam! Você sabe que já desenvolveram armas capazes de nos destruir, imagina como seria se tivessem certeza da nossa existência? Os Cullen são ingênuos se acreditam que seria melhor se não existíssemos. Você não deveria se importar com o que eles pensam!
— Não me importo com a ignorância deles sobre nós, mas o fato de ter vivido entre eles fingindo ser uma vampira comum... Você não entende, Caius! Eles estão decepcionados porque eu menti. Acreditam que todos os momentos que passei com eles foram falsos, mas não foram! Eu não sei como ou por que, nem mesmo em que momento isso aconteceu, mas eu realmente me importo com eles!
Ele cruzou os braços e me encarou, sério.
— O problema não é ter sentimentos, mas como você os administra. Você é uma imortal temida que tem um trabalho importante, não importa que seja mal-visto pelos de fora do clã. Precisa se recompor, Isabella. A forma como expôs seus sentimentos agora não deve se repetir.
Eu me virei de costas, sentindo minha garganta travada. Não queria chorar, isso seria a pior coisa a se fazer na frente de Caius, principalmente depois da reprimenda que ele me deu.
De repente, senti as mãos dele segurarem meus ombros para me virar de frente, então ele fez algo que nunca ninguém o viu fazer: me abraçou. Eu fiquei sem reação, chocada com o contato físico, pois assim como eu, Caius não era dado a abraços, nem mesmo com sua esposa. Aliás, isso foi algo que aprendi com ele. Sem abraços, sem beijos, sem toques desnecessários.
— Para uma executora Volturi, mostrar sentimentos é uma fraqueza, Bella. Eu sei que você sente, todos nós sentimos, mas escolhemos guardar isso, que é tão íntimo, para nós mesmos e para nossas companheiras. Por isso eu falei que você deve guardar o que sente para a solidão de seus aposentos ou para quando tiver um companheiro. Na frente dos outros, recomponha-se. Não quero mais ver essa expressão aflita, você é minha cria e deve agir como tal. Entendido?
Eu me afastei e assenti com um movimento de cabeça. Ele suspirou e voltou a cruzar os braços.
— Ótimo. Devo assumir que esse descontrole emocional se deve a você ter encontrado alguém que te despertou interesse entre os Cullen?
Eu fiz uma careta.
— Por que todo mundo me pergunta isso? Eu não posso simplesmente ter amizades novas?
— É claro. Mas o único momento em que não consegui controlar meu humor e minhas atitudes foi quando conheci Athenodora.
Eu revirei os olhos.
— Quem está falando de coisas íntimas agora?
Ele deu de ombros.
— Todos sabem que eu a amo, mesmo quando ela é insuportável. A questão é que não perco meu controle emocional nem o foco nos meus deveres por causa dela. Não importa se o que você sente pelos Cullen é só amizade ou se tem alguém que abalou suas estruturas. O que não pode acontecer, é você perder de vista quem é e o que precisa fazer na vida que está construindo desde que se tornou imortal. Bella Volturi não se rende nem perde a compostura. Agora vá chutar alguns traseiros. Demetri está te esperando no treino.
Ele se afastou sem dizer mais nada e eu demorei alguns segundos para colocar minha expressão fria e insensível de sempre antes de sair. Não havia mais ninguém na biblioteca, então fiquei aliviada por não haver testemunhas do momento que tive com Caius.
Não demonstrar sentimentos. Sentir, mas guardar para mim mesma.
Caius tinha razão. Demonstrar sentimentos é uma fraqueza, e eu não posso me permitir parecer fraca. Os Volturi tinham inimigos demais para se deixar vulnerável assim.
Eu sou Bella Volturi, a executora mais temida, fria, cruel e insensível que o mundo sobrenatural já viu. Isso não vai mudar.
Olá! Espero que você esteja bem.
Estou passando para avisar que esse foi o último capítulo desse mês, pois hoje começou o ano letivo e eu vou ficar muito ocupada com os assuntos, atividades, avaliações e notas. Professores trabalham muito, e agora com a reformulação do Ensino médio, como professora de Língua portuguesa, vou ficar ainda mais ocupada, então não terei tempo para escrever.
Talvez eu consiga escrever durante o Carnaval, mas não prometo. A única promessa que posso fazer é que não vou abandonar essa história. Pode demorar, mas vou continuar escrevendo, só peço paciência.
Pinte essa estrela, comente e compartilhe a história.
Beijos no coração e... Tchau!
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