Sem querer


A semana que se segue é perfeitamente tranquila, sem muitas ocorrências ou bem.... ao menos é disso que eu quero me convencer.

É estranho estar solteira e não estar solteira ao mesmo tempo. Pensei que aguentava passar disso sem ter recaídas, mas por muitas vezes, me pegava indo para o Insta de Lorenzo para ver se ele postou alguma coisa nova. Sua rede social é privada e apenas por isso ele não tem muitos seguidores. Me surpreende que este inconsequente ainda não tenha arquivado nossas fotos como eu já fiz. Ele age como se ainda tivéssemos algo e eu surto todos os dias que vejo que sua última foto publicada é comigo, uma onde a gente estava saindo do cinema no meio da noite, a foto está borrada e nós erguíamos os rostos para encarar a lua. Foi mais um dia perfeito ao lado de Lorenzo Smith porque nós éramos assim. Perfeitos demais para ser realidade. Quando mais um final de semana começa e meu despertador toca me mandando levantar, eu tenho vontade de tacá-lo no chão.

Sonhei com o maldito, lembrei-me do seu beijo e da sua pegada de tirar o fôlego. Por que ele tinha que parecer um sonho? Por que ele tinha que arruinar tudo?

Na força do ódio, me arrumei com todo cuidado do mundo. Coloquei uma maquiagem um pouquinho colorida e me trajei com uma regata de decote significativo porque eu quero mostrar que eu estou muito bem, além de ser uma gostosa.

Coloco meu melhor — e mais justo — jeans e sorrio para meu reflexo, a imagem um pouco mais confiante melhorou meu humor pelo menos uns quarenta por cento. Peguei minha mochila e desci as escadas correndo. Vincent já estava na sala, jogando alguma coisa no celular e se movendo como se estivesse virando um volante. Reviro os olhos e balanço a cabeça. Parei de me preocupar como ele entrava na minha casa sem fazer nenhum ruído quando a gente tinha dez anos.

Se meu pai não está de pé e não apareceu até agora é porque ele não quer ser perturbado e está cansado demais para nos levar para o colégio. Isso significa: bicicletaaa!

Dou uma passada na cozinha para montar minhas cópias dos sanduíches que meu pai prepara e vou para o lado de Vincent chutar seus pés para que ele pare de fingir que não me ouviu. Ele desliga o celular o jogando no colo e me olha com um sorrisinho.

— Bom dia, castorzinho.— ele cumprimenta, animado e eu balanço a cabeça, pensando duas vezes antes de estender o seu almoço.

— Eu vou ter que chamar a polícia para que você devolva a cópia da chave da minha casa?— pergunto e ele se levanta, pegando o sanduíche embrulhado por insulfilme da minha mão e o enfiando na sua mochila vermelha com um chaveirinho de skate.

— Pode chamar, eu faço outra.— ele zomba e me empurra pelos ombros para que eu ande na sua frente até a garagem. Nós dois sabemos o que a ausência do senhor Oliver significa.

Vincent sempre deixa seu skate aqui em casa exatamente para casos como esse, que, infelizmente, estão ficando mais comuns já que papai está se atolando cada vez mais com o trabalho e sempre que está em casa só quer tomar um banho quente e ir para a cama.

— Esse decote está grande, hein, Ali.— Vince comenta quando a gente deixa a garagem. Ele sai antes que eu consiga subir na bicicleta, exibindo sua mobilidade. Eu podia ter escolhido um jeans menos justo, mas agora está tarde para mudar— Aprovado!— ele grita metros a frente exibindo-me os polegares. Sopro uma risada e o acompanho de bicicleta dando "buzinadas" com meu sino para que ele saia da minha frente.

— Vê se curte a visão de trás também!— provoco lhe mostrando o dedo do meio, não foi nada difícil ultrapassá-lo. Posso ouvir sua risada me seguindo.

— Posso fazer isso o dia todo!— ele grita de volta e eu bufo. Garoto idiota.

Demora pelo menos meia hora até que a gente chegue no estacionamento do colégio, e eu só perdi a corrida porque não estava aguentando pedalar com esse maldito jeans. Ofegante, desci da bicicleta e Vince veio até mim com um sorriso convencido, segurando seu skate debaixo do braço.

— Pode ir passando.— ele estende a palma da mão em minha direção e eu o fulmino com o olhar, prendendo a minha bicicleta azul de estrelas roxas com as correntes de segurança— Vamos, xuxu, não fique emburrada.— ele sussurra, inclinando-se para mim com aqueles olhinhos brilhantes e perversos.

— Tá bem!— eu não devia ter apostado corrida só porque estava na liderança. Tiro um dólar do bolso e o bato na mão de Vince que abraça meu pescoço e lasca um beijo em minha bochecha.

— Boa garota, amorzinho.— ele elogia e eu forço um sorriso duro em sua direção. As vezes esse garoto abusa do cinismo e da minha paciência.

— Não fode.— sussurro para ele entre dentes.

— Ah, eu estou tentando.— ele debocha e nós damos as mãos, encaminhando-nos com o resto da manada para dentro do colégio. Fingir que somos um casal é tão fácil que parece ser loucura, eu estou mesmo passando a imagem que eu quero para os outros? É que é engraçado vê-los nos olhando como se ainda não tivesse caído a ficha, ainda mais depois que Vince e eu damos um selinho demorado ou ficamos nos tocando de forma mais íntima fingindo não notar os outros notando em nós— Eu estava pensando— começa o meu melhor amigo balançando nossas mãos entre nós— A gente devia sair esse final de semana.— ele cerra os olhos para mim e eu inclino a cabeça para o lado, focada em seu rosto.

— Ok, onde vamos?

— Não, sem essa de "ok", quando digo que a gente tem que sair, digo que a gente deve ter um encontro.

Eu sorrio e faço careta, divertindo-me com a ideia.

— Um encontro?

— É.

— Eu e você?

— Você e eu.— ele confirma e eu dou risada.

— Por que?

— Por que não?— ele rebate e eu comprimo os lábios, pensando.

Olho ao redor, neste exato segundo, meus olhos se encontram com os de Dean Seok que está caminhando na direção oposta. Ele sorri para mim e eu, como uma garota legal e nada bruta, sorrio de volta. Quando ele passa, eu demoro um pouco em o olhar por cima do ombro, mas quando o faço, ele me olha de volta.

Eu pensei e levei a sério a recomendação de Vincent de que ele não é do tipo de garoto que merece ser usado por mim, mas.... tem sido estranho e inevitável.

Eu não faço porque quero, eu juro, mas quando pisco, ele já está lá! Seja abrindo a porta da sala para mim ou apenas puxando assunto comigo antes que o ginásio seja aberto. São trocas de olhares e nada mais que isso. Eu não deveria dar corda, mas ele é tão gatinho!

— Tá aí, doida?— Vince me dá um puxão de orelha para que eu volte a olhá-lo.

— Estou, estou, desculpa.

— Tenta não babar demais no grandalhão tão cedo, falou?— ele arregala os olhos para mim— Já vai me trair, castor? O abusado se torna o abusador... nunca vi isso acontecendo tão rápido.— ele caçoa e eu o olho torto pela segunda vez no dia que acabou de começar praticamente.

— Eu não estava fazendo nada.

— Aham, eu vou fingir que acredito.

— Continua— sacudo a cabeça querendo dar esse papo por acabado— Por que esse encontro?

— Eu estava pensando, Lorenzito anda muito tranquilo, nesses últimos dias.

Se por ficar nos encarando com um ódio lascivo todo santo dia e toda hora é estar tranquilo para Vincent, então, é, Lorenzo não nos perturba tanto quando estamos juntos.

O que me irrita é que quando estou sozinha, ele vem falar comigo quase como se fôssemos amigos. É insuportável sua capacidade de perdoar os próprios erros.

— Topa cutucar a ferida? A gente pode ir no parque em que vocês tiveram seu primeiro encontro e postar umas fotos juntos.— ele se aproxima para sussurrar contra meu rosto, roçando seus lábios na minha bochecha e me fazendo me encolher e rir baixinho.

— Não podemos postar uma foto nos beijando, meu pai te mata se alguém mostrar qualquer evidência de nossa brincadeira para ele.— eu sussurro para ele olhando para todos os lados o mais discretamente possível para ter certeza de que ninguém vá ouvir o que não deve.

— Não precisamos nos beijar nas fotos, bobona, só vamos mostrar que estamos juntos e onde estamos. Acho que ele vai surtar com isso.— Vince, arteiro como é, se anima muito com a perspectiva que sua mente perversa cria.

— Sabe, eu realmente não acho que Lorenzo te bateria por isso, mas parece que você está pedindo para apanhar.— arregalo os olhos e nós nos encaramos de perto. Temos feito tanto isso ultimamente que eu me acostumei com sua proximidade, seu rosto preenchendo meu campo de visão, seus olhos se juntando — quase o deixando vesgo — para me encarar. Vince é uma gracinha, é agradável vê-lo de perto.

— Está tudo muito parado, mas isso é só para mim, pelo que tenho visto, já que os amigos do seu garotão lá estão caindo matando em cima de você— ele olha para minha boca por um segundo e faz uma careta engraçada de desgosto.

É claro que ele sabe, eu vivo o mostrando as mensagens de consolo que estou recebendo e nós rimos horrores, zombando destes otários que eu só pretendo usar de tapa-buraco quando me convir.

— Vince, Vince, se você quer que alguém te dê uma surra, é só pedir com jeitinho que eu te dou.

— Nem vem com esse papo que você não está me dando a surra que eu quero.

— De novo esse papo, garoto podre!

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