Segundo Freud

VINCENT CAMERON

Segundo Sigmund Freud, o pai da psicanálise que eu sou apaixonado, os nossos sonhos são como filtros. Eles nos mostram nossos desejos mais profundos de um jeito distorcido e levemente mascarado, mas não é como se não pudéssemos compreendê-los. Basta um pouco de interpretação e autoconhecimento, mas parece que nem no meu íntimo eu sou muito fã de fantasia, já que os meus costumam ser bastante condizentes com o mundo no qual vivo.

Algo do qual eu sempre me gabei, foi minha capacidade de saber quando estou sonhando. Quando vou deitar, levo um tempo para entender o que está acontecendo, mas é muito difícil eu me deixar ser enganado pelos meus próprios pensamentos.

Meu corpo é mais leve nos meus sonhos e tudo fica embaçado como o espelho do banheiro durante um banho quente, mas infelizmente não posso moldar essa realidade como bem desejo. Eles só vem e eu aproveito enquanto ninguém repara que eu estou consciente.

Nesta noite em questão, eu me lembro de ter ido deitar no meu quarto, mas quando abro os olhos, estou em outro lugar. Outra cama. Eu conheço esse lugar. Olho ao redor, encaro os sapatos bagunçados no chão e a parede roxa do quarto de Alice. Estou sozinho. Me sento e caminho, sinto que deveria procurar por algo então começo a chamar por ela.

— Ali?— chamo, minha voz ecoa como se estivesse em uma caverna, mas não é por isso que eu noto que estou sonhando.— Ali?— me aproximo da porta e envolvo a maçaneta fria com minha mão, girando-a lentamente. Ela faz um clique quando a abro e eu passo pela porta, dando-me de cara com um corredor escuro.

Paro de andar e coloco as mãos nas paredes, confuso, a porta do quarto de Alice sumiu, mas não foi isso que me fez entender que eu estava sonhando. Estou em um beco sem saída, mas aí uma luz vermelha começa a piscar ao meu redor. Eu apenas sinto que estou na Casa dos Gritos, aquela que visitei com Alice em nosso primeiro encontro. Eu tenho que achar ela, pensei, sem nem fazer ideia do porquê teria que achá-la.

Alguém surgiu à minha esquerda de repente, correndo pelo corredor que se estendeu na minha frente. Tomei um susto enorme com as risadas da garota, mas reconheci seus cachos. Não estou tendo um pesadelo, não é um demônio, é só Yasmine. Relaxo minha pose sem nem ter notado que tinha erguido os punhos e sorrio quando a garota olha por cima do meu ombro. Ela está linda sob esta luz vermelha, mas o que me chama a atenção é ela estar usando o vestido de Alice. Por que ela está usando o vestido de Ali?

— Yasmine?— chamo, franzindo a testa. Ela abre um sorriso meigo e volta a rir, correndo para outro corredor, sumindo na esquina. Sem pensar, a segui— Yasmine!

Eu só podia ouvir sua risada gostosa ecoando de todos os lados enquanto corria sem saber para onde estava indo. Ela parecia estar se divertindo bastante em me fazer de tolo.

— Yasmine!— chamo, começando a rir porque até que está divertido, então um lampejo branco passa na minha frente caminhando calmamente e me obrigando a frear minha corrida. Reconheço os cabelos curtos e louros em uma batida de coração. Ela não me olha e continua caminhando lentamente na direção de uma porta pesada— Alice.— chamo, querendo que ela me olhe, mas ela só faz isso quando alcança a porta e sorri maliciosamente por cima do ombro, convidando-me com um aceno da cabeça. Ela passa pela porta e eu vou atrás, empurrando a porta pesada e tropeçando no terraço. O calor que me abraça é insuportável e eu até cogito tirar a camisa, mas meus olhos se concentram no que está acontecendo metros a frente, encima da caixa d'água. Alice está sentada no meu colo e nós estamos nos agarrando de jeito obsceno; totalmente excitante. Me veio uma forte sensação de déjà-vu, mas não foi isso que me fez me dar conta de que estava sonhando.

Ela não estava de vestido aquela noite, mas aqui ela está. As caras de prazer que ela faz enquanto eu — ou melhor, meu outro eu ou meu clone, seja o que for — beijo seu pescoço mexem muito com minha cabeça e eu sinto que poderia ficar aqui, assistindo, para sempre. Nós ficamos bem juntos.

Me encontro em um estado de transe até que Alice joga a cabeça para trás e seu olhar cruza com o meu com toda a malícia que eles poderiam transmitir. Sou arrastado até o casal e de repente tem só um Vincent. Só uma versão minha. E a loira me empurra para que eu me deite de um jeito brusco, totalmente controladora, e eu deixo escapar um sorriso surpreso.

— Ei...— murmuro e ela começa a me beijar. A temperatura ao nosso redor, como se já não estivesse inviável, aumenta.— Ali...— arfo sem me aguentar com o calor, suas mãos se enfiando debaixo da minha camiseta queimavam minha pele, mas não de um jeito ruim. A agarro de volta e me sinto nas nuvens. A chuva cai sobre nós, mas dessa vez não paramos, sequer nos importamos. A ajudo a tirar o vestido e ela me ataca novamente com seus lábios sedentos e apenas uma lingerie preta. Minhas mãos apertam sua cintura, seus peitos, suas coxas, eu sinto a fome chegando, a mesma que senti aquela noite, e desejo intensamente foder com ela.

A mão dela desce pelo meu corpo até o meio de minhas pernas e ela se afasta, insuportavelmente sensual, Alice me olha de cima, os cabelos molhados e a cara convencida como se pudesse me trazer a melhor noite da minha vida.

— Você me quer?— ela pergunta, como se precisasse que eu falasse em voz alta tudo o que o resto do meu corpo estava berrando. Eu estou ofegante, suado e excitado para um caralho, mas paro por um momento como se algo tivesse acendido a lâmpada sobre minha cabeça. Uno as sobrancelhas e a encaro, uma beleza divina de um anjo. Parece muito Alice, mas... não é ela.

— Isso não é real, é?— pergunto sentindo gotas de água caírem em meu rosto sem me molhar de verdade. Ela sorri enigmática e se aproxima de mim outra vez, pressionando seu peito contra o meu.

— Por que não seria?— ela pergunta em um sussurro e depois disso, eu caí da cama.

Solto um gemido porque caí sobre o braço, mas não deixo a posição, o rosto afundado nas minhas camisas sujas e eu sinto que outra cabeça também acordou. Continuo suado, mas nem no meu sonho eu consigo transar com minha melhor amiga.

Fecho os olhos e solto um longo suspiro. Alice, Alice, Alice, o que você está fazendo com minha cabeça?

Eu te odeio, Freud, eu te odeio, mas também sei que um gênio nunca erra.

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