Eu odeio esse cara
VINCENT CAMERON
Me levanto da cadeira com pouca pressa, sem vontade de ir embora, vou pegar meu skate debaixo da carteira e o abraço para não cutucar ninguém. Guardo o material na mochila e a jogo no ombro, esbarrando-me com algumas pessoas enquanto todos se dirigiam ansiosamente para a porta.
— Oi, Vince.— uma voz feminina me chamou a atenção e eu olhei por cima do ombro, deparando-me com Yasmine Collins e seu sorriso doce.
— Oi.— sim, estávamos na mesma sala de aula pelos últimos cinquenta minutos, no entanto, diferentemente de mim, ela se senta na frente por isso a comunicação é impossível no meio da aula de espanhol.
— Tudo bem com você?— ela pergunta, colando seu ombro no meu enquanto ajeitava os cadernos nos braços.
— Tudo, e com a senhorita?
— Tudo bem também. Como foi seu final de semana?
Eu tenho um clique breve do tipo: como é que ela não sabe o que eu fiz esse final de semana? Mas aí me recordo de que eu e Alice não tiramos nenhuma foto digna de nosso encontro e por consequência a Saltzman não postou nada. Sorrio sem jeito pensando naquela noite divertida, a memória fresca e a vaga vontade que eu tive de beijar minha melhor amiga mesmo que não houvesse ninguém para impressionar e nenhuma câmera pronta por perto.
Não, eu tenho certeza de que quis beijá-la, por um momento, senti que ela também quis. Mas aí ficamos estranhos por causa do nosso trato e voltamos a sermos nós mesmos. Entramos demais nos personagens, balanço a cabeça afastando os devaneios.
— Foi bom, e o seu?— jogo a pergunta de volta sem querer me aprofundar nos detalhes.
— Ah, um tédio.— Yasmine arregala os olhos e nós saímos da sala lado a lado— Meu pai não estava em casa para continuarmos assistindo Game of Thrones então eu tive que acompanhar minha mãe na igreja, e, diga-se de passagem, eu sou uma ateia fervorosa.
Eu ri.
— Ah, pelo amor de Deus, alguém ainda assiste Game of Thrones?— sacudo a cabeça, Yasmine me olha torto.
— É claro que sim, é uma série ótima.
— O fim é uma merda.— retruco e ela estala a língua parecendo pesarosa.
— Não há fim de Game of Thrones na minha casa, senhor Cameron. Meu pai e eu assistimos tantas vezes que eu já sei todas as falas de cor e sorteado.
— Eu te pediria para provar, mas o incesto não encheu meu coração e eu parei na metade da primeira temporada, recebendo milhares de spoilers até hoje para poder dizer com convicção que essa série não foi feita para mim.
— Por isso você sabe do final.— ela concluiu.
— Por isso eu sei do final.— concordo.
— Você deve dar uma chance, Vince, qual é!— ela toca meu ombro e me puxa para mais perto, risonha— Ela tem seus ápices.
— De jeito nenhum, não.— sacudo a cabeça, rindo e quando olho para frente, meus olhos se encontram com o rosto sorridente de Alice Saltzman vindo pela direção oposta. Os cantos dos meus lábios se repuxaram sem que eu pudesse conter e eu desacelerei o passo quando olhei para o lado dela me deparando com o poste do Dean Seok, encarando-a sem olhar por onde andava. Mordi a bochecha e Yasmine tirou a mão de meu ombro, ao passo que o Seok deu um passo para o lado, aumentando a distância entre Alice e ele. Nós quatro nos aproximamos diante da porta de saída tumultuada e Alice veio para meu lado, metendo-se entre Yasmine e eu, toda sorrisos.
— Vamos?— a loira perguntou, olhando-me. Não nos falamos no domingo e hoje mal tivemos tempo para ficarmos juntos. O almoço fora bem silencioso, meio estranho ainda que não absolutamente desconfortável.
— Vamos.— assenti, nós nos afastamos dos nossos colegas e nos despedimos à distância.
— Eu interrompi algo ali?— Alice me perguntou quando descíamos as escadas e nos dirigíamos em direção ao estacionamento de bicicletas.
— Não, nada.— fui sincero apesar que, ao me lembrar do seu pedido de poucos dias para que eu não fizesse nada sugestivamente infiel na sua frente, meu tom pode ter saído com um pouco de receio. Acompanhei-a até sua bicicleta e esperei Alice soltar a corrente de segurança, ajudando-a a guardar a mesma na mochila— Você já está indo embora mesmo? Não tem treino hoje?
— A senhora Montgomery está gripada. Terei até a tarde de quinta de folga até que seu atestado acabe porque além de não terem substitutos para a nossa professora de educação física, não são capazes de mandar nenhum outro para pelo menos nos supervisionar enquanto treinamos.— ela bufa se voltando para mim com uma cara de impaciente— Esse colégio é uma piada.
— Eu o defendo, só não querem que os alunos transem na piscina. Deve ser tenso explicar para os pais que encontraram porra do filho deles na água. E digo isso sem atacar ninguém.— digo e Alice deixa escapar uma risadinha.
— O que, preocupado que sua preciosa Yasmine transe com alguém na piscina?— ela provocou com uma cara de deboche.
— Não, eu estava pensando em você e no japinha.
— Coreano.— Alice me corrige soltando um suspiro.
— Sabe que eu não me importo.— rebato e a loira revira os olhos, montando na sua bicicleta— Pensei que ele estivesse fora da sua mira por ser um garoto bom demais para sofrer nas mãos de Alice Saltzman.
— E ele não está na minha mira, estávamos apenas conversando, assim como você e sua amada Yasmine.
— Pelo jeito que ele te olha, imagino que seja o sonho dele estar na sua mira.— rebato entrando na sua frente quando ela ameaça sair com a bicicleta, me ignorando. Alice passa a língua nos lábios e me mede de cima a baixo com a sobrancelha erguida. Ela se inclina na minha direção e cerra os olhos para mim.
— Se eu não te conhecesse bem, pensaria que está com ciúmes, senhor Cameron.
— Eu poderia dizer o mesmo de você, senhorita Saltzman.— rebato de prontidão e ela sorri de canto, recuando. Nós nos encaramos longamente por um minuto longo sem piscar.
Não tenho certeza do que isso pode significar para nós dois nem para nossa amizade, mas não parece coisa boa. Que isso, eu não tenho ciúmes de Alice. Nunca tive.
— Vamos no Bob's hoje? Estou precisando de um milkshake.— ela comenta, mudando de assunto como se nunca tivéssemos tido essa conversa. Soltei uma risada nasalada e soltei seu guidão.
— Uma boa pedida.— assinto e solto o skate no chão, saindo na sua frente.
Nós dois vamos em direção a saída do estacionamento, desviando de carros e motos com pouca atenção já que há um guardinha cuidando para que ninguém com um automóvel ande mais rápido do que uma tartaruga muito, muito velha. Logo na esquina avisto o bando de imbecis de Lorenzo Smith e me seguro para não revirar os olhos, ignorando-os.
— AÍ, CAMERON!— gritou a voz bem conhecida por mim do maior idiota da face da terra. Reviro os olhos e assim que volto a cara na direção do som, meu rosto é atingido por uma bola de futebol americano e eu perco o equilíbrio do skate, escorregando sem ter a mínima chance de processar o que aconteceu. Caí de costas no asfalto, quase batendo a cabeça no meio fio, e soltei um gemido de dor tendo certeza que ralei o cotovelo. Minhas costelas protestam e eu penso no único xingamento em espanhol que eu conheço inspirado pela aula que acabei de deixar.
— Ai, capullo.— resmungo.
(Filho da puta/desgraçado)
— VINCE!— Alice grita nas minhas costas e risadas trogloditas ecoaram enquanto minha visão ficava embaçada— Vince, Vince, ei!— o rosto de Alice apareceu contra a luz, seus fios loiros parecem ouro sob a luz do sol. Ela tocou meu rosto e eu me senti péssimo— Meu Deus— ela olhou para a própria mão depois de passar os dedos nos meus lábios e eu vi um pouco de sangue— Está bem. Está bem...— ela respira desesperada e olha nos meus olhos atentamente— você deve ter sofrido uma concussão, calma.
— Ah, jura?— eu resmunguei tentando me sentar. Alice me ajudou cobrindo meus ouvidos.
— Eu vou matá-lo, Lorenzo!— sua voz saiu abafada para mim. Com dificuldade, abracei-a e coloquei a cabeça em seu ombro, sentindo náusea— espere um momentinho, Vince.— ela se soltou de mim e pegou a bola que acertou em cheio meu rosto e meu skate do outro lado da rua. Deu para notar que os rapazes acharam que ela devolveria a bola, mas Alice apenas os lançou um olhar mercenário e voltou a se abaixar do meu lado.
— Ai, que inferno.— segurei-me para não vomitar e me levantei, me apoiando nela.
— Calma, Vince, não vá tão rápido. Eu não vou conseguir segurá-lo se você desmaiar.— a loira me acompanha, preocupada e dando uma de equilibrista segurando meu skate e a bola dos rapazes com só um braço.
— Eu estou perfeitamente bem.— teimei e ela cravou as unhas no meu braço, me lançando um olhar torto. Ela deixou sua bicicleta para trás, me guiando de volta para o colégio.
— Ei, está tudo bem?— alguém se aproximou de nós dois e eu ergui o olhar a contragosto, reconhecendo o rosto do Dean.
Incrível, nunca nos esbarramos tanto desde que eu comecei um namoro falso com Alice. Ele está começando a me irritar.
— Perfeitamente bem.— respondo rispidamente voltando a me curvar como um velho com problema na coluna bastante ranzinza.
— Ajude-me a levá-lo para a enfermaria.— Alice pede e os dois ficam me flanqueando, dando-me apoio nos braços de uma forma totalmente irregular, já que um é muito baixo e outro é muito alto.
— Eu já disse que estou bem.— reclamei.
— Cale a boca, Cameron.— Alice mandou e eu comprimi os lábios, desgostoso.
— O que foi que aconteceu?— Dean perguntou.
— Você não devia já ter entrado no seu carro e ido embora ou coisa assim?— resmunguei.
— Vincent!— Alice me censura— Me desculpa, ele é um péssimo paciente, fica intolerante quando está com dor.
— Tudo bem.— Dean diz, pelo seu tom parece que está sorrindo, mas não olho para conferir, não me sinto capaz para tal.
— Querida!— Lorenzo cantarolou atrás de nós e nós paramos nas escadas, olhando para trás assim como um monte de outras pessoas porque Lorenzo é assim, ele gosta de chamar atenção. Ele encara Alice fixamente com um sorriso malicioso estampado na cara escrota dele enquanto brinca com o sino da bicicleta dela. Alice bufa audivelmente e eu cuspo sangue na direção do Smith que ri e se afasta com a bicicleta de minha amiga, divertindo-se como um palhaço no circo. Deus, como eu odeio esse cara.
Eu sei que o provoco grande parte do tempo, mas hoje mal tinha olhado em sua direção, cara!
— Você não devia ter deixado sua bicicleta— digo o óbvio. Alice revira os olhos voltando a me puxar para a enfermaria.
— Era ela ou você, mas já me arrependi da minha escolha.— ela resmunga e me olha, emburrada. Eu lhe ofereço um sorriso amarelo.
— Eu sei que não.
Alice balança a cabeça como se eu fosse um caso perdido e me examina com o olhar preocupado. Sei que ela nunca gostou de me ver machucado.
— Tenta não desmaiar, seu idiota.— ela sussurra e beija minha bochecha duas vezes com ternura. Me sinto só um pouco melhor com o seu toque, só um pouquinho.
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